A diversidade de Marias numa perspectiva subversiva

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Amemos a Maria e adoremos o fruto do seu ventre. E ainda que não comunguemos com sua devoção por parte de nossos irmãos católicos, que possamos respeitá-la e buscar compreender o contexto de onde emerge.

É deveras complicado para um evangélico entender a devoção mariana. E a coisa se complica ainda mais ao deparar-se com a multiplicidade de “Marias”. Afinal, quantas mães teve Jesus?

No México, ela aparece com feições indígenas a um índio asteca, sendo chamada de “Nossa Senhora de Guadalupe”. No Brasil, sua imagem com feições negras é encontrada por pescadores e recebe o nome de “Nossa Senhora da Conceição Aparecida”.

Em Portugal, ela surge como “Nossa Senhora de Fátima”, cuja aparição teria sido testemunhada por três crianças. Em nenhum dos casos, ela foi vista por sacerdotes ou nobres.

Sem entrar no mérito dogmático, percebo aí uma busca que julgo autêntica por uma fé engajada e radicada no contexto cultural em que emerge. Essas múltiplas facetas de Maria visam atender ao anseio de rebelar-se contra os padrões vigentes.

Uma Maria negra desafia o flagrante racismo de uma era escravagista. Uma Maria indígena confronta os vergonhosos interesses dos conquistadores espanhóis. Não preciso endossar uma devoção popular para compreendê-la enquanto fenômeno social e psicológico.

As diversas aparições místicas podem ser vistas como projeções do inconsciente coletivo; o que, diga-se de passagem, não diminui em nada a sua importância. Mas de onde o inconsciente coletivo buscou material para dar a Maria as características que lhe são atribuídas? Por que surge negra no Brasil e índia no México?

Ao longo dos séculos, o inconsciente coletivo foi acumulando informações via tradição, bem como anseios e fantasias que, ao se mesclarem, produziram as múltiplas Marias, além de uma considerável diversidade de Cristos: Nosso Senhor do Bonfim, Nosso Senhor dos Passos, etc. Assim como em Israel, Deus era chamado de Iavé Jireh, Iavé Shamá, Iavé Tsedikenu, etc.

Obviamente, há um único Cristo, que por Sua vez, nasceu de uma única e bendita virgem. A tradição protestante não endossa qualquer devoção que não seja dirigida exclusivamente ao Deus Trino. Todavia, como profetizou o anjo que a visitou, Maria deveria ser honrada por todas as gerações.

Não faz sentido adorar ao Filho, negando-se a honrar à Sua bem-aventurada Mãe. E a melhor maneira de honrá-la é submetendo-se a seu Filho, bem como destacando suas inegáveis virtudes, dentre as quais, a humildade e a obediência.

Jesus é o único caminho que nos leva a Deus. Maria foi o caminho tomado por Deus para vir ao encontro dos homens.

O desprezo protestante a Maria é uma reação grotesca e exacerbada à devoção que se presta a ela. Deveríamos, antes, optar por uma postura idônea e equilibrada.

Amemos a Maria e adoremos o fruto do seu ventre. E ainda que não comunguemos com sua devoção por parte de nossos irmãos católicos, que possamos respeitá-la e buscar compreender o contexto de onde emerge.

No fundo, todos somos marianos, pois nos submetemos à instrução que ela deu aos serventes em Caná da Galileia: “Fazei tudo o que Ele vos disser” (João 2:5).

Autor: Hermes C. Fernandes

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