O fim do Programa de escolas cívico-militares é a retomada da legalidade, do respeito às diretrizes nacionais da educação como política pública de estado, discutida e planejada para além de governos, com a sociedade brasileira.
Assim determina a Constituição Federal no art. 214: ”lei estabelecerá o Plano Nacional de Educação, de duração decenal, com o objetivo de articular o sistema nacional de educação em regime de colaboração e definir diretrizes, objetivos, metas e estratégias de implementação para assegurar a manutenção e desenvolvimento do ensino em seus diversos níveis, etapas e modalidades por meio de ações integradas dos poderes públicos das diferentes esferas federativas que conduzam à erradicação do analfabetismo; universalização do atendimento escolar; melhoria da qualidade do ensino; formação para o trabalho; promoção humanística, científica e tecnológica do País e estabelecimento de meta de aplicação de recursos públicos em educação como proporção do produto interno bruto.”
A Lei 13.005/2014 estabeleceu o Plano Nacional de Educação para a década 2014-2024, a partir de duas grandes conferências nacionais de educação onde a sociedade brasileira participou intensamente, discutida e aprovada pelo Congresso Nacional. Em nenhuma de suas 20 metas e inúmeras estratégias está prevista ou projetada a dita “escola cívico-militar”. A partir dela, foram, igualmente, estabelecidas Leis estaduais e municipais.
Miguel Arroyo, professor emérito da UFMG, sintetizou o problema em entrevista recente: “as escolas militares têm bons resultados para formar militares, mas não são os melhores exemplos para formar cidadãos com valores de democracia e de igualdade.” Leia mais: https://www.neipies.com/escola-nao-e-caserna-modelo-civico-militar-criminaliza-educadores-e-custa-caro/
Esse era, portanto, um programa vinculado a um governo e campo ideológico que se impôs, a despeito do planejamento legal da educação brasileira, primeiro por Medida Provisória, depois com legislações que estão em debate nas esferas judiciais exatamente pela inexistência de previsão legal nacional.
A Lei 9.394/1996, Diretrizes e Bases da Educação Brasileira, de outra parte, explicita os princípios e bases da educação brasileira, sendo a liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, o pensamento, a arte e o saber, o pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas, o respeito à liberdade e apreço à tolerância, preceitos fundamentais – opondo-se frontalmente à exigência de comportamentos padronizados, uma das práticas das escolas cívico-militar. Esse é um dos fundamentos do Ministério Público Federal para ajuizar ação para garantir que estudantes do Acre não tenham que submeter-se a padrões estéticos e comportamentos baseados na cultura militar.
Diante do argumento que a atuação dos agentes de segurança na escola ser apenas na gestão, espaços e disciplina, a Lei Máxima da Educação define claramente quem deve exercer: “a formação de profissionais de educação para administração, planejamento, inspeção, supervisão e orientação educacional para a educação básica, será feita em cursos de graduação em pedagogia ou em nível de pós-graduação, a critério da instituição de ensino, garantida, nesta formação, a base comum nacional. (Art. 64)”.
Aqui no Rio Grande do Sul, a Lei Estadual 10576/1995, assegura a gestão democrática da escola a ser exercida pelos/as profissionais da escola, em colegiado representativo dos quatro segmentos: professores, estudantes, funcionários, mães e pais. Não só como forma de democratizar a política pública de educação, suas regras, critérios de avaliação e escolha dos conteúdos, mas também para a aprendizagem do exercício da cidadania na democracia.
Valores, disciplina e relações respeitosas devem sim ser desenvolvidos no curso da formação dos meninos e meninas, dos jovens e das jovens brasileiras, de maneira que essas sejam posturas assumidas a partir da vivência democrática, multicultural, reflexiva e protagonista, transversalizadas pelas diferentes áreas do conhecimento humano. Tornar-se-ão regras internas e não dependentes de comandos e sanções.
Sonhamos com um povo livre e democrático para realizarmos a República Democrática, sem retrocessos a totalitarismos e ditaduras, assim deve ser a educação.
Autora: Sofia Cavedon – Deputada Estadual PT RS e Presidenta da Comissão de Educação e Cultura da AL/RS
Foto Paulo Garcia/ALRS