O brasileiro precisa aprender de vez que “privatização” foi, e ainda é, literalmente em todos os casos, apenas um eufemismo enganoso para o roubo da riqueza pública e do futuro do país para o bolso de uma meia dúzia de ricaços.
A aprovação pela Assembleia Legislativa do Paraná do projeto do governo Ratinho Jr. que permite privatizar a gestão administrativa e financeira de 204 escolas públicas no estado é um aviso sombrio do que está por vir.
O que está em jogo aqui é a ganância interminável de um tipo de capitalismo que deseja transformar tudo em mercadoria vendável. Isso passa a valer, inclusive, para a Educação, a Saúde e a Previdência, ou seja, as áreas que o avanço democrático do último século tinha definido como dimensões da vida a qual todos têm que ter acesso independente da renda familiar eventual.
Esse é o acordo civilizatório que permitiu a educação e a saúde como um bem público para todos. É este acordo que agora começa a ser quebrado no Brasil.
A educação pública é o fundamento principal de uma sociedade democrática, posto que não apenas um meio de generalizar o acesso ao conhecimento científico, mas, também, possibilitar a reflexão autônoma dos indivíduos.
Não existe educação real sem estimular o espírito crítico, que é o que o indivíduo irá precisar para pensar com a própria cabeça, tanto a Ciência e seus vários ramos, quanto a Política. Só o Estado democrático possui essa visada pedagógica como o ponto essencial.
O mercado só quer, como sempre, uma nova forma de ganhar dinheiro fácil. E eles estão conseguindo isso no Brasil pós-golpe de Estado de 2016.
Como denunciam o professor Daniel Cara, da USP, um dos melhores especialistas que o país dispõe, e Luís Nassif, exemplo de coragem no jornalismo investigativo brasileiro, o próprio MEC já está sendo privatizado por dentro pela mera influência das assim chamadas “fundações privadas educacionais”.
O nome “fundação” é enganoso porque nos faz lembrar da filantropia, mas é só mais um modo de fazer lobby indireto para ganhar ainda mais dinheiro, fingindo que pretendem ajudar a educação pública, mas, na verdade, o interesse real é por mais dinheiro público para bolsos privados.
O projeto paranaense prevê que apenas instituições com experiência efetiva na área sejam as que podem participar das concorrências. Ora, alguém tem dúvida de que a fundação Lehmann e outras iguais serão as principais beneficiadas neste projeto?
Essa é a corrupção real do país: um país que vende o seu futuro, hoje, por um punhado de moedas, para possibilitar o absoluto controle privado das máquinas públicas. Só que nenhum jornal chama isso de corrupção, porque é uma corrupção da elite.
O avanço da extrema direita e sua agenda anti-Estado está no comando aqui. Tarcísio de Freitas e Ratinho Jr. estão sucateando a educação pública para favorecer os que investem em suas campanhas políticas. É um jogo de toma lá dá cá. Também uma corrupção descarada, mas o Brasil aprendeu que quando os ricos roubam é progresso e empreendedorismo, nunca um crime.
O interesse real é o de se apropriar dos R$ 300 bilhões de orçamento do Ministério da Educação e outros tantos dos governos estaduais. Se fossem R$ 600 bilhões, perfazendo os 10% do PIB constitucionais para a Educação, poderíamos ter escolas integrais de qualidade para todos, o que mudaria significativamente o país no espaço de uma geração. Mas nossa elite não tem projeto algum para o país nem nunca teve.
O brasileiro precisa aprender de vez que “privatização” foi, e ainda é, literalmente em todos os casos, apenas um eufemismo enganoso para o roubo da riqueza pública e do futuro do país para o bolso de uma meia dúzia de ricaços.
FONTE: https://iclnoticias.com.br/a-privatizacao-da-educacao/
Autor: Jessé Souza. Escritor, pesquisador e professor universitário. Autor de mais de 30 livros dentre eles os bestsellers “A elite do Atraso”, “A classe média no espelho”, “A ralé brasileira” e “Como o racismo criou o Brasil”. Doutor em sociologia pela universidade Heidelberg, Alemanha, e pós doutor em filosofia e psicanálise pela New School for Social Research, Nova Iorque, EUA
Edição: A. R.
La educación pública en éste continente desgraciado es el último bastión de lo estatal que puede igualar las diferencias originadas en la proveniencia social de las personas. Aún cuando no logre lo que esperamos es el camino para que no se convierta en un consumo de unos pocos. Si hay un camino para polarizar con injusticia la situación social de niños y jóvenes ese camino es la educación privada que con lógica mercantil adorna un “producto” llamado educación.
A educação pública neste infeliz continente é o último bastião do Estado que pode equalizar as diferenças causadas pela origem social das pessoas. Mesmo que não alcance o que esperamos, é a forma de evitar que se torne um consumo de poucos. Se há uma forma de polarizar com injustiça a situação social das crianças e jovens, essa forma é a educação privada que com lógica comercial adorna um “produto” chamado educação.