Bem-vindos todos os que voltaram, os que nunca saíram e os que acham que nunca chegarão…ao fundo do poço!

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Underground background of inside a scary water well

O fundo do poço é um lugar de passagem, onde se encontra toda a soma das suas escolhas, erradas, claro, mas que agora, acumuladas, observa-o com discrição, através de suas paredes cacimbadas. Mas é passagem! Não é moradia.

Alguém falou que o fundo do poço é o lugar mais visitado do mundo. 

Poço! Imaginário ou real.

Esqueceram de falar, contudo, que a ele se volta mais de uma vez.

Você vai sair de alguma forma; puxado por alguém que jamais imaginaria, ou, voltará para fora empurrado pela própria água, que, em seu reflexo o fez cair.  Mas não se afogou, pelo menos.

O fundo do poço é o melhor lugar do mundo para se conhecer as pessoas. Os amigos, os nem tanto, os próximos, a família, colegas, todos.  Ali é o local onde as ingratidões vêm à tona, com o perdão da anáfora.

É o lugar onde começamos a ver o que realmente importa; a crueldade do ser humano, quando despido de todas as suas máscaras. Muitos não vão ajudar!

Mesmo que passando rente a sua entrada, ao escutarem seus gritos de ajuda, apressarão seus passos no rumo do seu caminho. Até porque, lá fundo, há sempre um depósito de máscaras esquecidas.

Pedidos de socorro ou de perdão, pouquíssimos irão ouvir.  Esqueça os que convivem com você. Salvo exceções, a maioria das pessoas do seu convívio estarão imersas em suas realidades e interesses, e poucos prestarão ajuda.  Talvez por medo de afogar-se ao seu lado.

Pois não será em festas onde se conhecerão os amigos.  Ali, sabe-se, as pessoas estão vestidas para o teatro; em seus trajes de batalhas e suas armaduras. Em festas, quem não tem aquafobia, não afunda.

Mas quando se está na iminência de cair no escuro de um poço, as amizades começam a ficam menos frequentes e os convites, desaparecem. Ninguém quer ficar à disposição de alguém que carrega umidade, com a unhas cheias de musgos, em sua tentativa de sair de um buraco frio. As pessoas gostam de sonhos, alegrias e ainda de outras pessoas que as seguem: em seus desejos ou alienações.

Quando se chega perto de alguém com a retina escurecida, pelos dias em que passou na escuridão, quem quer a sua companhia? 

Um dia, e eles são tantos, quase todos caem; seja porque se esforçaram demais para ver seus rostos refletidos em sua água rasa, seja porque não se importaram com os avisos iminentes:  _ cuidado! Poço sem fundo à vista!

Muitas vezes, foi a curiosidade que o arrastou para dentro, em outras tantas, o desprezo com os avisos ignorados pelo caminho. E todos caem!

Como sair agora?  Todos saem, igualmente.  Molhados e trôpegos, mas saem.

Caso seja você, o novo migrante destas valas escuras, fique sabendo que uma forma de sair é justamente saber submergir um pouco.  Mergulhar na indiferença dos que o cercam, sem se afogar em rancores ou arrependimentos. Ficar com a cabeça para fora, apenas poder respirar, sabendo que os seus apelos poderão não ser ouvidos… Pode ser. Nessa hora, nem os passos dos seus amigos serão percebidos; até porque eles se foram.

Quando se está lá no fundo, o silêncio e o frio o cercam, como se você estivesse a sós no mundo.  _ em nossos dias, seria como deletarmos todos os nossos contatos no celular e nas redes, até porque quase ninguém nesta relação irá parar e ouvir seus gritos.  Aparentemente, não.

Então, é chegada a hora de comprar uma balança imaginária e nela pensar nos nomes dos que sempre estiveram ao seu lado, mas que sumiram, por algum motivo. E os contrapesos que poderiam puxá-lo para cima, desapareceram. Mágoas e rancores, nessa hora, serão inúteis.

Não desanime!

As possibilidades em ser ouvido e puxado por alguém desconhecido ou que jamais esteve entre as suas rotinas, serão enormes. Fique sabendo que são grandes as chances de que o seu socorro virá pelas mãos de anônimos. Os nossos gritos reverberam mais em ouvidos estranhos; Jesus que o diga.

Quase sempre é chegada a hora de reavaliarmos a família, que também pode ter sumido e começar a remontá-la; agora pela nova família de alma, como nos fala Marcelo Cotrim. Isso porque o sangue comum pode não ser suficiente para o seu amparo.

Finalmente, tome todo o cuidado porque o fundo de um poço pode ser cativante, especialmente para sapos e rãs em seu coaxo. Viver em uma umidade pegajosa, acostumar-se com murmurações e rancores diante dos dias que escorrem rapidamente… Quem irá ouvi-lo?

O fundo do poço é um lugar de passagem, onde se encontra toda a soma das suas escolhas, erradas, claro, mas que agora, acumuladas, observa-o com discrição, através de suas paredes cacimbadas. Mas é passagem! Não é moradia.

O seu auxílio está a caminho e você servirá de alerta para tantos que estão na iminência de nele cair.  Mas a sua vontade de gritar e sair deste mundo de musgos e água fria, tem de ser maior do que chamar a atenção alheia, pela pouca estima que restou em você.

Você vai sair, acredite! E bem melhor do que entrou.

Tome fôlego, portanto, e reaprenda a respirar. Inspire o ar possível e já comece a expirar gratidão.

Autor: Nelceu A. Zanatta. Também escreveu e publicou no site “qual é o limite de nossa empatia: sentir o desamparo do outro ou viver a sua dor”: www.neipies.com/quais-os-limites-da-nossa-empatia-sentir-o-desamparo-do-outro-ou-viver-a-sua-dor/

Edição: A. R.

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