Como acolher seus alunos na volta às aulas, professor

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Assim se faz a escola, ou seja, com professores cheios de vontade de ensinar e alunos que também estão cheios de vontade de aprender.

Vamos ouvir o cantor Toquinho na sua linda canção que nos diz “Numa folha qualquer / Eu desenho um sol amarelo / E com cinco ou seis retas / É fácil fazer um castelo…”.

Ouça: https://youtu.be/sCGND4gpT8s?t=19

Que toda criança e jovem possa ser estimulados a fazerem uso das suas criatividades desde os primeiros dias de aulas, pegando retas e círculos e os transformando em outros mundos, quem sabe o mundo que se deseja para si.

Há um tempo na infância que a gente acorda para brincar e estudar. Ir à escola é uma das atividades mais prazerosas para a maioria das crianças. Elas esperam encontrar lá amiguinhos, professores atenciosos e amorosos, um lugar para brincar e estudar cheio de cores e com brinquedos e livros maravilhosos.

Infelizmente, o meu primeiro dia de aula não foi assim. Eu fui recebida por uma professora chata e que me trancou num banheiro escuro por quatro horas devido eu ter brigado com o meu amiguinho de sala de aula. Trago o medo do escuro até hoje e não consigo ficar em lugares sem luz.

Peguei medo àquela escola onde tinha uma professora maldosa que trancava criancinhas no banheiro só porque elas fizeram coisas erradas e talvez eu nem tivesse errado tanto assim para merecer um castigo tão doloroso. Toda criança briga com o amiguinho. Isso é normal no jardim de infância quando estamos aprendendo a compartilhar brinquedos e material escolar.

As aulas estão começando em vários lugares do Brasil e trago este texto para poder ajudar professores e pais a acolherem seus filhos nas escolas, principalmente aquelas crianças que estão indo pela primeira vez à sala de aula.

É preciso paciência e amor. Sem amor nada sai bem-feito. Sem amor tudo desanda, como diz a minha mamãe quando vai cozinhar uma comida. É preciso saber temperar e não há tempero melhor do que o amor.

Pois bem, acolher a criança na escola nos primeiros dias de aula não é tarefa fácil. Aquelas pequeninas no período da educação infantil que choram e fazem birra para não ficarem na sala de aula sozinhas devem ter o acompanhamento dos pais ou responsáveis por alguns dias até que se acostumem com aquele ambiente estranho e de pessoas estranhas.

Para a criancinha deixar o seu lar, os seus brinquedos e as pessoas que ama para ir ficar por horas num lugar estranho pode não ser agradável o quanto pensamos. É preciso prepará-la dias antes conversando sobre a necessidade de ir à escola, perguntando sobre o que quer ser quando crescer e que isso vai depender de como vai se sair nos estudos, incentivar desde cedo a criancinha a ouvir e brincar de ler livros mesmo que ela esteja na tenra idade, ainda.

Criar dentro de casa um ambiente que se pareça com uma escola, ou seja, colocando uma mesinha com uma lousa pequena de frente à parede da mesa para a criança ir fazendo os seus primeiros rabiscos e se acostumando com os objetos físicos de uma sala de aula. A conversa sempre é necessária para que ela passe a saber que logo chegará o dia que precisará ficar algumas horas na escola e fazer muitos amiguinhos.

As criancinhas que choram e fazem birra devem ser acolhidas com muito amor e paciência por parte da equipe escolar, mais particularmente, pelo professor. Este precisará demonstrar afeto e cuidados com os sentimentos e emoções da criança.

Nos primeiros dias de aulas, é bom que a criança traga para a escola um brinquedo que gosta, que se vista à vontade, que faça as refeições que faz em casa e que seja acolhida toda necessidade. Se a criancinha necessitar de algum acompanhamento especial por ser pessoa com deficiência física ou mental precisará sempre de um bom profissional por perto.

Também ter o cuidado com a criança que toma medicações controladas e com horário exato para tomar. Os pais devem ficar atentos e levarem essas medicações à escola orientando os professores e a equipe pedagógica da dosagem e dos horários dos medicamentos, pois eles são tão necessários ao corpo ou mente da criança, podendo ocorrer problemas sérios se esta não vier a tomar conforme prescrição médica.

Cabe a escola diminuir ao máximo o sofrimento que a criança sente ao deixar o ambiente acolhedor da sua casa para vir à sala de aula, um local que para ela é estranho.

Para isso é necessário que se faça uma extensão da casa da criança com a escola, ou seja, que se faça uma ponte ligando os dois prédios físicos de uma forma que o caminho se torne agradável e conhecido pela criança e que essa extensão também seja de pessoas queridas e que possam passar confiança e segurança para as criancinhas que chegam assustadas e sem saber direito o que estão fazendo ali.

A maioria das crianças que conheço e já vi em muitas escolas de educação infantil são levadas à força pelos pais, sem explicações, apenas que devem estudar se quiserem ser alguém na vida. É quase uma obrigação para essas crianças irem à escola, isso porque os pais não estão interessados no conhecimento que a criança vai receber em sala de aula, mas na Bolsa Família que vai receber no final do mês.

Não se deve fazer do hábito de ir à escola uma obrigação em momento algum. Deve ser algo prazeroso, algo que traz felicidade e alegria para a criança. O professor deve ser neste momento de acolhimento pai, mãe, avó, avô, músico, desenhista, poeta, amigo, médico, enfermeiro… enfim, todas as profissões possíveis e imagináveis para mostrar à criancinha que pode confiar nele. Que tudo de bom fará para que ela se sinta confortável.

Cantar com as crianças é uma boa alternativa, perguntar aos pais quais cantigas elas gostam de ouvir para dormir, também é bom saber. Criar um ambiente de paz e sossego mútuo para professores e crianças na sala de aula, onde elas possam se sentir como se estivessem em casa e poderem desfrutar daquele momento de forma que fiquem impressas em seus pequenos espíritos coisas bonitas para sempre. Desenhar, pintar, brincar de ciranda também é uma alternativa. Resgatar as brincadeiras antigas dos nossos avós ou bisavós.

Ler um livro para as crianças, passar filmes na televisão ou até mesmo permitir que elas brinquem com jogos eletrônicos educativos, pois quer queira quer não a tecnologia está batendo nas portas das escolas faz algum tempo e os professores precisam mudar as suas metodologias de ensino, pois a maioria das crianças com dois ou três anos de idade não vai querer ir à escola porque ficará longe do seu celular. Acredito até que o uso do celular em sala de aula para brincadeiras educativas possa ser permitido para que a criancinha sinta mais acolhimento.

Tudo o que possa transmitir conforto e confiança às crianças pode ser feito. Não estamos mais falando de uma escola com metodologias ultrapassadas aonde a criança chegava, sentava-se na sua carteira e começava a tirar a matéria do quadro-negro, somente escrevendo linhas e mais linhas mecanicamente.

A educação 4.0 mudou a forma de enxergarmos o ensino-aprendizagem. Novas ferramentas e recursos educativos são produzidos todos os dias para que a educação possa ser ensinada da forma mais lúdica e lógica possível. É preciso despertar a curiosidade e a admiração das crianças na sala de aula.

Fazer um momento em que todas as criancinhas juntas possam assistir a desenhos animados educativos com músicas, vozes de animais, heróis, príncipes e princesas, dragões, duendes etc.

Toda criança gosta de assistir esse tipo de filme. Mesmo aquela que ainda continuar chorando ou inquieta por alguns dias deverá receber atenção especial do professor, pois poderá estar passando por algum problema de emoção que não consegue dizer o que é para ninguém, nem mesmo para os pais que acham ser apenas falta de costume de ir à escola quando, na verdade, pode ser algo mais profundo que necessite de investigação de outro profissional.

Levar às crianças para um passeio pelo jardim da escola se esta tiver um, plantar com elas mudas de árvores, convidá-las para ficarem quietinhas ouvindo o som da natureza talvez possa acalmá-las um pouco. É claro que a maioria dessas crianças nos primeiros dias de aulas precisará da companhia dos pais, mas depois essas mesmas crianças perceberão que as outras conseguem ficar sozinhas na escola e passam a querer ficar sozinhas também começando a despertar a autonomia.

Com as crianças maiores e que já sabem ler e escrever, recomendo que os professores elaborem cartinhas de afeto diferentes para cada um dos seus alunos. Eu sempre fiz isso com os meus.

Cartinhas que dialoguem com a experiência de mundo, da comunidade, do lugar onde essas crianças residem e ao mesmo tempo sejam um convite para a busca do conhecimento. As cartinhas são uma forma de demonstrar carinho e atenção para com a criança, colocando-a dentro de um envelope com remetente e destinatário. Se o professor quiser inventar um remetente fictício também poderá fazer isso. Nas minhas cartas eu sempre era a Fadinha Carmelinda, uma fada de 3.537 anos que adorava crianças.

Eu me lembro bem que na volta das férias escolares quando estudava o ensino fundamental II, a professora mandava a gente escrever uma redação sobre as férias. Acho que isso ainda existe em algumas escolas do nosso país, e se o exercício for feito com um pouco de reflexão e criticidade por parte dos alunos exercitar a produção textual será maravilhoso como também pedir para que ele crie um gibi, um poema, uma carta ou outra forma de mostrar como foram as suas férias também será uma ideia brilhante.

Até mesmo nas escolas que dispõem de computadores, o professor pode solicitar uma pequena animação dos alunos contando dos melhores momentos das férias. Vai valer a pena! Todo exercício mesmo que seja dos tempos dos nossos avós sendo trabalhado com outra didática e novos recursos pode ser prazeroso para o aluno e para o professor.

Também é uma boa ideia ficar na porta da sala de aula e receber cada criança com um abraço forte dando-lhe um poema ou uma lembrancinha que ela possa guardar para lembrar do seu primeiro dia de aula. As crianças e os jovens gostam de poemas quando são estimulados desde a educação infantil com este gênero. E aqui entro nos jovens do ensino fundamental II que adoram poemas de amor quando estão começando a despertar para as primeiras paixões bobas da juventude.

Se a sua escola não tem brinquedos, não tem jardim, não tem computadores, professor não fique triste. Use da sua criatividade e com cartolinas e cola faça desenhos de bichinhos, árvores, sol, casas e outras coisas que gostar e cole nas paredes velhas da sua escola. Traga o jardim para dentro da sua sala de aula.

Coloque um tapete seu, sim, traga um da sua casa porque se for esperar pela secretaria de educação para comprar um nunca poderá se sentar com os seus alunos no chão num lugar confortável. Um tapete onde caiba todos os alunos e você, professor.

Faça sempre esta roda de conversa e use perguntas que incentivem a criatividade dos seus alunos. Faça-os pensar além do supérfluo, além do que eles conhecem, faça-os despertarem para a metafísica das coisas.

Eu sei que nesta altura do campeonato não dá tempo para leituras, mas se puder ler um livro do professor e filósofo Paulo Freire será muito bom para aprender a como acolher os seus alunos em sala de aula. Recomendo duas obras dele importantes “Pedagogia da esperança” e “Pedagogia da autonomia”. Tenha empatia pelos seus alunos, deixe-os serem autônomos e respeite os conhecimentos de mundos deles sempre apresentando uma didática que os façam refletir sobre o conhecimento de dentro e fora da escola.

Não existem dois mundos na educação das crianças e dos jovens. É preciso criar um só mundo quando esses alunos chegam na escola cheios de vontade de aprender algo que possa ajudá-los no bem-viver. Somente jogar conhecimento goela adentro vai ser cansativo e mesmice.

O bom é que o ensino-aprendizagem traga sempre um novo conhecimento que o aluno possa utilizar no seu dia a dia. Assim, ele saberá que o conhecimento é algo prático e necessário para o seu crescimento como cidadão e como aluno.

Gostaria, também, de pedir aos pais que conversassem com as suas crianças sobre o valor que tem um professor e do quanto ele necessita ser respeitado e amado. Que os pais possam mostrar às crianças da importância do professor para a sua vida estudantil e que todo ensino dado em sala de aula deve ser prestado atenção, falar com cordialidade com o mestre, respeitar os horários das aulas e o principal, não colar nas avaliações. Cada mestre é um ser que está ali para transmitir não só conhecimento, mas para ser amigo e até mesmo um confidente.

Que alunos cuidem dos seus materiais escolares, mas também cuidem das instalações físicas da escola e saibam que em tudo é preciso limites. A volta às aulas deve ser cheia de alegrias e por isso os alunos devem chegar motivados e com sorrisos nos rostos e cheios de vida para adquirirem mais conhecimentos durante o ano letivo que se inicia.

Assim, esses alunos devem abraçar os seus professores e os outros profissionais da escola demonstrando atenção para com eles fazendo perguntas sobre as suas férias, como se sentem, e o que podem fazer para melhorarem as suas aptidões estudantis e darem orgulhos aos seus professores.

Agora, vamos falar de acolher as crianças e os jovens que já conhecem a escola e estão cansados daquelas aulas monótonas que não ensinam quase nada para as suas vivências, que o professor não se preocupa em saber como foi o seu ontem, a sua noite de sono, como estão sendo os seus dias e como está se sentindo ali não vai despertar curiosidade em ninguém.

As crianças e os jovens estão cansados do ensino-aprendizagem que somente transmite conhecimento sem reflexão.

Um bom acolhimento é fazer com que a primeira semana de aulas possa ser diferente, ou seja, nada de matérias novas para tirar do quadro, mas filmes para serem assistidos e debatidos, palestras sobre assuntos do interesse dos seus alunos, declamação de poemas, competições de jogos educativos etc. Os alunos necessitam de motivações em sala de aula.

Conheço professores que bem as aulas não começaram e já estão passando testes e seminários, marcando datas de provas. Parece até que estão querendo testar as emoções dos seus alunos. Quando você recebe uma visita em sua casa vai logo mostrando para ela as coisas feias que existem nela ou as procura esconder?

As crianças estão cansadas de professores ranzinzas. Dê um chocolate para cada aluno seu no primeiro dia de aula acompanhado de um desenho ou de um gibi, quem sabe até mesmo de um cordel. Faça a diferença, professor. Seja a diferença para os seus alunos.

Seria maravilhoso se cada jovem nos primeiros dias de aulas recebesse um pequeno livreto de quadrinhas ou tercetos dedicados para eles por algum autor convidado da escola. Também seria uma grande ideia que cada jovem pudesse receber um poema minimalista falando da sua comunidade, da sua cultura, do seu povo.

Há infinitas ideias, professor, basta colocá-las em prática. O que não podemos é fazer dos primeiros dias de aulas algo monótono e cansativo para nós e para os nossos alunos. A melhor didática não é aquela que está nos livros de pedagogia, mas a que o senhor aprende em sala de aula através das suas vivências.

Outra ideia bastante interessante é fazer um mural de artes visuais dos alunos onde eles possam pintar o que quiserem ou quem sabe um mural de recados onde eles possam escrever sobre os seus sonhos, expectativas, experiências, rotinas do dia a dia, ou seja, onde eles possam desabafar as suas angústias e alegrias.

A gente não perde a autoridade quando compartilha com um aluno os nossos momentos, mas ganha-se um amigo. Quem sabe abraçar no acolhimento também sabe contar segredos que só as joaninhas ou os grilos conhecem de nós. Procure fazer momentos de humor com os seus alunos, professor, fazendo-os rir com anedotas e causos interessantes. Também é uma boa forma de despertar para o pensamento crítico.

A nossa educação brasileira anda doente, eu sei. É difícil ter empolgação com salários baixos e desvalorização da profissão, mas os alunos não têm culpa disso.

Nós, professores, ensinamos porque amamos. Poucos fazem da profissão de professor apenas um emprego.

Que possamos acolher os nossos alunos neste novo ano letivo de uma forma que eles se sintam felizes, motivados, curiosos e com vontade de aprenderem coisas novas porque sabemos que só a educação pode mudar o rumo desse país.

Quero aproveitar a oportunidade para pedir que professores, coordenadores, orientadores educacionais, merendeiras, serventes e outros profissionais também sejam bem acolhidos pelos diretores e secretarias de educação e que possa ser feito um trabalho de recepção carinhoso e cuidadoso com quem vai cuidar do futuro das nossas crianças.

Que esses professores que estão voltando das férias e os novatos possam sentir que a escola não é somente um lugar de trabalho, mas um lugar onde ele tem amigos e alunos que os amam independente da sua vida lá fora. Deixemos de fofocas e de intrigas porque lidamos com gente e essa gente brasileira está cansada de mendigar afeto e cuidado.

Chega a hora de aprendermos a valorizar a equipe escolar das nossas crianças e jovens, inclusive este recado vai para os pais e responsáveis que podem fazer um afago também aos nossos professores, mandando-lhes flores ou lembranças que marquem o momento do acolhimento. Afinal, amor nunca é demais e é sempre necessário demonstrar que se ama.

Muitos professores que estão voltando das férias continuarão com as mesmas turmas, logo já conhecem os seus alunos e pais, nada melhor do que uma reunião na primeira semana de aulas para conversarem sobre a comunidade e os problemas de dentro e fora da escola que terão de enfrentar assim como o acolhimento do professor que está ali em mais um ano letivo para não somente transmitir conhecimento para a sua criança, mas para ensiná-la a crescer internamente e externamente aprendendo a enfrentar os desafios do mundo lá fora.

Termino este meu acolhimento de hoje, sim, porque para mim hoje começam as aulas e que eu possa ter um ano letivo maravilhoso ao lado de todas as crianças e jovens do Brasil, com o poema do meu eterno e maravilhoso professor e filósofo Paulo Freire intitulado “A escola é” que nos diz

“E a escola será cada vez melhor / Na medida em que cada um se comporte / Como colega, amigo, irmão. / Nada de ‘ilha cercada de gente por todos os lados’ / Nada de conviver com as pessoas e depois, / Descobrir que não tem amizade a ninguém. / Nada de ser como tijolo que forma a parede, indiferente, frio, só.”

Então, professores, nada de ser tijolos, mas quem sabe flores para acolhermos as sementes que estão a chegar com o nosso afeto e cuidado que não aprendemos nos bancos das academias universitárias, mas nos rostinhos cheios de vontade de aprenderem e receberem um pouco de atenção e conhecimento da nossa parte.

Assim se faz a escola, ou seja, com professores cheios de vontade de ensinar e alunos que também estão cheios de vontade de aprender. E viva a educação brasileira porque acredito que, apesar de tudo, somos os melhores professores do mundo!

Autora: Rosângela Trajano

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