Infere-se que a valorização da herança africana no Brasil é essencial para a constituição cultural do país, mas é impedida pelo medo do desconhecido.
Ocupamos esta coluna para compartilhar, refletir e contribuir com o debate que foi tema de Redação do Enem 2024 “Desafios para valorização da herança africana no Brasil”. Convidamos leitores e leitoras para apreciar o texto da estudante Pâmela da Silva Silva, do Colégio Tiradentes da Brigada Militar de Passo Fundo, no qual ela comenta facetas demandadas por repertórios e argumentos que demonstram o quão é rica e diversificada a herança africana, porém desconhecida e desvalorizada. A escolha de seus repertórios para defender sua tese demonstra exemplos práticos e históricos usando a própria literatura como principal referência.
Boa leitura!
Segue o texto.
“Machado de Assis, renomado autor brasileiro, sempre foi negro, porém, só passou a ser reconhecido como afrodescendente após pesquisas acadêmicas comprovarem que ele teve sua ascendência africana ocultada devido à cultura eurocêntrica do século XIX. Esse fato representa um grande avanço no reconhecimento do legado cultural africano na composição da identidade brasileira, dado que esse grupo é responsável por boa parte da multiplicidade cultural que compõe o Brasil. Contudo, a valorização dessa herança ainda é impedida pela mentalidade social que teme o diferente, sendo fundamental combater esse quadro.
Em primeiro plano, é imperativo compreender que os costumes africanos são parte integrante e indissociável da cultura brasileira atual, sendo impossível negar a sua importância. Nesse contexto, nota-se que, desde a introdução dos primeiros escravizados africanos no território que hoje é o Brasil, em meados do século XVI, os hábitos culturais desse povo trazido se fundiram com os costumes dos que aqui já habitavam, dando origem a manifestações que permanecem na sociedade brasileira até hoje, como a capoeira, as religiões de matriz africana (por exemplo, a Umbanda e o Candomblé), o Samba (reconhecido como o ritmo identitário brasileiro, cuja percussão é de origem africana), entre outras milhares de influências da África no Brasil. Desse modo, é inadmissível a desvalorização da herança africana, visto que ela compõe o que é “ser brasileiro”, sendo necessário reconhecê-la e valorizá-la.
Entretanto, ainda há uma parcela da população que não valoriza a cultura africana, pois diverge do referencial eurocêntrico (baseado na Europa) de normalidade, temendo o que lhes é desconhecido. Sob essa ótica, a autora iraniana Tahereh Mafi, em sua obra “Liberta-me”, escreve que as pessoas, muitas vezes, preferem o temor do que lhes é familiar a enfrentar algo que elas não conhecem.
De modo análogo, percebe-se que as pessoas que não respeitam as culturas africanas possuem o comportamento descrito por Tahereh: se afastam, menosprezam, ridicularizam, desprezam – seja por palavras, por ações ou por postagens – aquilo que lhes é “estranho” e “anormal”, só por terem medo do que não conhecem, fazendo-se pertinente mitigar esse cenário.
Diante do exposto, infere-se que a valorização da herança africana no Brasil é essencial para a constituição cultural do país, mas é impedida pelo medo do desconhecido. Portanto, cabe ao Estado, por meio do Ministério da Cultura, promover exposições, palestras, saraus, workshops e outras atividades culturais que visem ampliar o conhecimento da população sobre a cultura africana e seus legados no Brasil, para que, ao conhecerem essas manifestações, não as temam mais. Dessa forma, o Brasil não terá mais heranças desvalorizadas nem ascendências apagadas, fazendo com que casos como o de Machado de Assis não ocorram novamente”.
Foto estudante Pâmela da Silva Silva
Leia também reflexão de estudante Caroline Gobet Barbosa www.neipies.com/querida-alma/
Convidada: Deise Bressan, Graduada em Letras e suas Respectivas Literaturas pela UNIVALI – Itajaí SC. Pós graduada em Teoria da Literatura e Produções Textuais pela Faculdade FOCUS – Paraná. Professora de Língua Portuguesa e Redação Ensino Médio.
Edição: A. R.
É um prazer contribuir com o teu site, Nei Alberto Pies. Nossos estudantes precisam criar o hábito da leitura e da escrita pois só assim terão acesso a outras culturas, valores, crenças e hábitos da sociedade. Conte comigo.
Como é prazeroso ler algo tão importante para a nossa cultura, escrito por uma estudante do Ensino Médio, mostra que a nossa função: a de ensinar não é vã e que pode dar bons frutos, o que nos enche de orgulho. Parabéns para a Pâmela e parabéns para nós também.
Que legal iniciar esta parceria contigo através desta coluna no site. Assim, através do teu trabalho e fomento à escrita, poderemos disponibilizar aos leitores e leitoras boas reflexões de autoria de estudantes da educação básica. Obrigado pela confiança, professora Deise Bressan.