Os confrontos entre prioritariamente
manter a produtividade ou proteger a
vida sugere a construção de novas narrativas.
A definição do que é uma narrativa se confunde com uma história, com uma fábula, com uma teoria. Um conjunto de sentidos, ideias verdades comportamentais, científicas ou religiosos, transmitidas por diversas linguagens são constituintes das inúmeras narrativas que compõem a história humana.
No livro 21 lições para o século 21, Yuval Noah Harari afirma que as três narrativas mais influentes do século XX, o socialismo, o fascismo e a democracia liberal, são insuficientes para descrever/explicar o mundo que estamos vivendo no século XXI.
A narrativa da democracia liberal que, em sintonia com alguns pensadores, se apresentou como definitiva na virada do século, entrou em crise na última década. A exaltação do individualismo antropocêntrico, centrado no produção e consumismo ilimitados, provocou transformações catastróficas na natureza, destruindo vidas humanas.
Um exemplo brasileiro recente é o rompimento das barragens de Mariana e de Brumadinho, responsável direta pela morte de centenas de pessoas. Outro exemplo ilustrativo, da crise que afetou a democracia liberal está vinculada com indicativos de aumento da pobreza e com o crescente do número de pessoas sem o básico para sobreviver.
Paradoxalmente a narrativa do desenvolvimento sem limites, do estado mínimo, da exploração da natureza, livre da restrição de leis ambientais, foi escolhido por meio do voto em países como nos Estados Unidos e no Brasil.
Ocorre que, em 2020, o mundo foi assolado por um vírus, o COVID-19, colocando na defensiva o discurso da produtividade, do corte e redução das despesas estatais, ressaltado a necessidade de defesa prioritária e manutenção da vida.
As estratégias para enfretamento dos altos níveis de desemprego anteriores a pandemia, precisarão ser alteradas, agregando as variáveis do salto exponencial na introdução das ferramentas virtuais e da inteligência artificial que substituirão a mão de obra humana.
O discurso em favor da produtividade, da manutenção do trabalho ilimitado e dos empregos, se confronta com a recomendação de que a melhor forma de enfrentar as ameaça de incontáveis mortes, incluindo a de nossos entes queridos, é o isolamento social, assegurando o básico para a vida humana, sem considerar as imposições do mercado produtivo.
O fato é que a humanidade, por meio da sua evolução tecnológica, produziu além do básico para todos os humanos. Os confrontos entre prioritariamente manter a produtividade ou proteger a vida sugere a construção de novas narrativas.
Diante da oportunidade de aprendermos com este vírus, revendo as imposições mercadológicas do consumismo ilimitado, para atender a produção e o desenvolvimento, sem considerar os níveis de destruição da natureza, nem a instrumentalização das pessoas, temos a privilegiada oportunidade de sermos sujeitos desta construção, assumindo uma concepção e consolidando novas narrativas.
“O coronavírus se apresenta, também, como uma possibilidade para evoluirmos, superando o pensamento antropocêntrico que posicionou o ser humano como se fosse o centro, com a falsa compreensão de si mesmo, do planeta terra e do universo”.