Nelso dos Santos mora e atua no município de Nonoai, interior do RS. Nelso tem uma trajetória que conjuga atuação profissional como professor em sala de aula e atuação social, a partir de lutas sindicais e partidárias, buscando melhorias sociais para a comunidade.
De fala mansa, Nelso dos Santos transpõe seus conhecimentos para a sabedoria, que adquiriu depois de muitas experiências coletivas e muita disposição pelo trabalho social. Sereno, mas firme e convicto em seus ideais, é uma referência para muitos e muitas de seus pares, professores e professoras que, no Estado do RS, vivem tempos difíceis por falta de reconhecimento e valorização profissional.
Entrevistar professor Nelso é reafirmar os compromissos que a educação exerce junto às comunidades de nosso estado. Nelso representa uma geração de professores e professoras que souberam interpretar a importância da educação como ferramenta de transformação social.SITE NEIPIES: Como, quando e porquê decidiu empreender sua vida como professor? Quais foram suas motivações?
NELSO DOS SANTOS: No início, tudo parecia muito caótico e confuso. Recém havia concluído o 2º Grau na CNEC, em NonoaI, e não tinha clareza do rumo a seguir.
Sou o mais jovem de cinco irmãos de uma família de pequenos agricultores. Desde muito cedo meus pais me incentivaram a estudar. Embora também trabalhasse na terra e compreendesse bem a importância e o sacrifício do pequeno agricultor, dividir uma colônia de terra em três irmãos não me parecia razoável.
Em meados de 1982 recebi o convite para substituir dois professores em duas escolas isoladas no interior do então distrito de Rio dos Índios. Uma delas, multisseriada, anos iniciais, e a outra, na comunidade onde eu morava com ensino fundamental incompleto, hoje desativada. Nesta última, trabalhei com as disciplinas de Língua Portuguesa, Educação Artística, Educação Física e Ensino Religioso para 5ª e 6ª séries onde também fui diretor, posteriormente. Lembro que as condições de trabalho, material didático e a estrutura física destas escolas eram precárias.
A gente precisava improvisar em quase tudo. Nesta época, Rio dos Índios contava com trinta escolas – muitas brizoletas – e só havia ensino fundamental completo na sede distrital – Escola Estadual Romano Padoan.
Eu tinha pouco mais de dezoito anos e liderava o grupo de jovens da PJ na minha comunidade – Bom Retiro – o JUCC. A PJ era muito bem estruturada e em cada comunidade, à época, havia um bom grupo de jovens.
Contávamos com o apoio e a assessoria dos Irmãos Maristas que por muitos anos trabalharam em Nonoai. Queria muito prestar vestibular, mas só fui receber meu primeiro salário como professor, alguns meses depois de iniciado o trabalho. Ainda naquele ano (1982) houve eleição municipal e a primeira para governador já no final da Ditadura Militar. Como eu era apenas contratado e por não admitir cerceamento de opinião política, fui demitido junto com outros professores. Porém, em função da mobilização e do vínculo construído junto àquela comunidade fui recontratado no início do ano seguinte.
Foi aí então que comecei a entender melhor o meu papel, a importância do professor e da educação numa comunidade interiorana, onde viviam mais de cento e cinquenta famílias. No nosso pequeno grupo de professores, todos jovens, tínhamos sonhos e histórias em comum.
Em poucos anos, com o apoio dos pais e estudantes, aquela escola havia sido transformada. Em 1984, finalmente, pude começar minha primeira graduação em Chapecó-SC, onde também militei no movimento estudantil. Aqui já não tinha mais dúvidas de que este era o caminho: a educação como profissão e compromisso com a vida. Permaneci por dez anos consecutivos na rede municipal exercendo diferentes funções até 1992, quando em definitivo, assumi a rede pública estadual permanecendo até hoje.
SITE NEIPIES: A política, como busca do bem comum, sempre cruzou a sua vida. Como conciliastes a profissão docente com a política? Qual é a importância de professores e professoras politizados?
NELSO DOS SANTOS: A política, na verdade, veio como consequência dos compromissos que fui assumindo ao longo da militância social ainda na juventude. Em 1986 fomos encorajados a participar do debate sobre o processo constituinte em nossa Diocese e isso nos permitiu atuar depois em outras frentes, espaços de lutas e participação além da PJ: oposição sindical STR e a luta pela terra, sendo que Nonoai tem uma grande história relacionada à origem do MST no RS, assim como a própria fundação do Sindicato dos Servidores Públicos Municipais em 1990.
A luta sindical, nesse período, foi marcada por grandes mobilizações que visavam a garantia de direitos que ainda eram negados aos trabalhadores do serviço público municipal. Foi a partir desse engajamento social que inicia a minha participação no campo da política partidária.
Em 1996, fui eleito vereador pelo Partido dos Trabalhadores-PT.
Desde muito cedo, portanto, compreendi que precisamos ter posição e lado na história. Não existe neutralidade. Assumir um posicionamento tem custo e risco, mas é imprescindível. É na política que as grandes decisões são tomadas em todos os níveis de governança. Posso ser apático à política, não participar, ficar indiferente a tudo, mas não me livrarei jamais das suas consequências. Pois ela impacta decisiva e diretamente as nossas vidas.
Vivíamos um momento de ascensão, de fortes mobilizações regionais e aquilo tudo contribuiu significativamente com a vitória de um projeto de governo democrático e popular no Rio Grande do Sul em 1988 e, mais tarde, à Presidência da República em 2002. Com o grupo de apoio que construímos, conseguíamos conciliar nosso trabalho no magistério e a atividade parlamentar. Em 2005 optei pela licença do magistério para exercer o mandato de vice-prefeito até 2008.
Atualmente, concilio o mandato de vereador com o trabalho administrativo na escola. Entendo que a interação, a liberdade de organização e expressão em todos os espaços é fundamental. Mas ela requer muita responsabilidade, coerência, exemplo e disciplina, sobretudo. Não dá pra levar de qualquer jeito.
É preciso, paciência, prudência, fazer o bom debate, sem perder o foco e ter presente que o mandato é passageiro, que vivemos do nosso trabalho e não da política. Terminado o mandato, a vida profissional segue. Daí a importância da nossa profissão. O mandato precisa estar a serviço da comunidade, não o contrário.
SITE NEIPIES: Conte-nos como é hoje ser vereador e professor, servindo sua comunidade de Nonoai?
NELSO DOS SANTOS: É uma bela oportunidade, um espaço conquistado coletivamente onde é possível dar visibilidade às angústias, aos apelos e as demandas dos mais variados segmentos sociais.
Embora tenha sido eleito dialogando mais diretamente com as questões sociais, educação e agroecologia, a função e o papel do vereador é muito ampla. Você se depara na Câmara com uma série de rituais, burocracia, demandas acumuladas, contradições, reinvindicações antigas não ou mal resolvidas, leis que não são cumpridas, sem nexo, e no dia a dia sempre vão surgindo novas demandas. Cabe ao vereador, portanto, cobrar, propor, representar, fiscalizar e denunciar, quando necessário, e é nessa perspectiva que atuamos.
O fato de ser professor permite e contribui, no campo político, para a construção de um olhar atento e sensível sobre as diferentes interfaces que permeiam a vida em sociedade.
SITE NEIPIES: Que boas lembranças o senhor carrega do período em que exerceu a função de Coordenador Pedagógico na Coordenadoria Regional de Educação de Passo Fundo? Que políticas educacionais marcaram o RS naquela época?
NELSO DOS SANTOS: O período ali vivenciado, de fato, foi muito valioso e um grande desafio. Recentemente havia concluído o mandato de vice-prefeito que me permitiu coordenar em nível local a implementação de uma série de programas e políticas na área educacional e agricultura familiar. Todavia, conhecer e trabalhar com colegas, equipes diretivas e lideranças de 120 escolas distribuídas entre os trinta munícipios que integram a 7ª CRE foi algo extraordinário.
A complexidade das tarefas e a infinidade de programas e demandas cotidianas a responder, se apresentam como uma importante lacuna a ser superada. Todavia, aos poucos, fomos conquistando confiança, construindo novas relações de amizade e respeito que até hoje me orgulham muito.
Foi um tempo de intensa mobilização pela reestruturação curricular do ensino médio e pelos processos de formação que realizamos em grupos de escola em todas as regiões. Os conflitos afloravam em acalorados debates, mas não fugíamos deles. Estudávamos muito e esperança não faltava. Tínhamos um projeto e perspectivas de futuro com os processos formativos, com a valorização da carreira, do concurso, das promoções e da modernização das nossas escolas.
Lembro-me do Mais Educação, do Proemi, Pronatec, do Pacto pelo Ensino Médio entre outros programas federais que ajudamos a desenvolver neste período, marcas profundas que permanecem vivas em nossas escolas. Mesmo com todas as limitações e contradições, as políticas e programas desenvolvidas naquele momento fizeram toda a diferença em nossas vidas profissionais, escolas e comunidades. Lamentavelmente, não tiveram continuidade no período seguinte.
Tão significativa e marcante foi à questão curricular do ensino médio no Rio Grande do Sul entre 2011 a 2014 que nos motivamos a resgatá-la como tema da dissertação de mestrado concluída e aprovada pela UFFS – Chapecó/SC em 2017: “Implementação do Ensino Médio Politécnico no Rio Grande do Sul: concepções, desenvolvimento e Gestão.” Guardo boas lembranças deste período e quiçá, possamos, em breve, retomar as nossas mobilizações e acender outra vez a centelha da esperança que mantínhamos viva naquele momento.
SITE NEIPIES: A educação está passando por profundas mudanças, através da Nova BNCC e da reforma do Novo Ensino Médio. Como o senhor vê estas mudanças?
NELSO DOS SANTOS: Sempre me questionei porque alguns têm uma educação integral, de qualidade social, que trabalha e aprofunda o tempo todo o que de melhor nossa civilização acumulou e construiu ao longo da história em termos de conhecimentos gerais à luz da ciência, da cultura, do mundo do trabalho e das diferentes tecnologias. Enquanto a absoluta maioria dos nossos jovens precisam conciliar seus estudos com a questão do trabalho na perspectiva primeira da sua própria sobrevivência.
A “simples” ampliação e permanência do jovem no ensino médio na rede pública de ensino do RS a partir de 2012, como sabemos, de 800 para 1000 horas foi e tem sido uma equação bem difícil.
Mais do que inovar o currículo, é preciso, de fato, torná-lo, atraente, dinâmico sob todos os aspectos, que possibilite de fato aprendizagens significativas para os jovens, que amplie seus horizontes, que sinalize para um projeto de vida em sociedade, onde ele seja protagonista das suas escolhas.
Contudo, precisamos pensar nas condições reais, nos meios para que possamos, na prática, tornar tudo isso uma realidade possível no chão da escola. A experiência de EMTI feita pela Escola Maria Dulcina em 2019, como escola indicada pela 7ª CRE, ficou aquém das expectativas, pois a promessa de suporte técnico, pedagógico e estrutural, praticamente em nada se materializou, em que pese não tenha faltado recursos para a alimentação dos estudantes.
Precisaremos rever ainda uma série de questões que passam pelo espaço físico, pela formação dos professores, funcionários, recursos para manutenção, material didático e novas tecnologias, recuperação dos salários e valorização da carreira, pela questão de direitos que nos foram subtraídos recentemente, entre outras. Sem dúvidas, a nova tarefa será desafiadora.
Embora as condições socioeconômicas e a brutal desigualdade que vivenciamos hoje sejam o principal entrave para a permanência dos nossos jovens da escola, isso não pode ser motivo para desistirmos do sonho e do projeto de construirmos uma escola pública boa e uma educação de qualidade social que inclua a todos (as) e faça a diferença na vida dos nossos jovens e adolescentes.
SITE NEIPIES: A BNCC propõe a flexibilização curricular e o protagonismo juvenil como estratégias para atrair e vincular os jovens com a escola para o término do Ensino Médio, a partir de 2022. O que a comunidade Escolar Maria Dulcina, uma das maiores escolas da região próxima de Passo Fundo, espera das mudanças que vem sendo anunciadas?
NELSO DOS SANTOS: Desde 1989, a Escola Maria Dulcina oferta ensino médio nos três turnos além da EJA a partir de 2003. Para milhares de jovens esta escola tem sido à porta de entrada e de acesso a uma oportunidade no mundo da vida e do trabalho. Possui uma estrutura invejável sob todos os aspectos construída ao longo das últimas décadas mantendo cerca de 1000 estudantes matriculados atualmente.
A construção da EJA e a implementação do Ensino Médio Politécnico foram experiências marcantes para a escola que, articuladas com programas nacionais como o Proemi, Mais educação e o Pacto pelo Ensino Médio, dinamizaram e potencializaram o currículo escolar, tornando-se referências de bons exemplos que deram certo e fizeram a diferença na vida de tantos estudantes e professores.
Conhecendo o grupo de professores, o acúmulo de experiências nos seus 91 anos de história, somados ao compromisso e participação da comunidade no cotidiano da escolar, acredito que se houver suporte técnico, financeiro e pedagógico, além de respeito e valorização dos profissionais, as mudanças anunciadas podem sim fazer a diferença no atual contexto de crises e incertezas.
Todavia, um dos grandes problemas que enfrentamos em nível de estado e de país, é que a maioria dos programas sociais e/ou educacionais não tem continuidade com a alternância de governo, especialmente no Rio Grande do Sul que até então nunca reelegeu governador desde a primeira eleição pós-período ditatorial.
SITE NEIPIES: Uma das ações recentes do governo Estadual do RS é fechamento de turmas EJA (Educação de Jovens e Adultos). Como esta ação está afetando Nonoai e as cidades próximas?
NELSO DOS SANTOS: A Educação de Jovens e Adultos – EJA está presente na Escola Maria Dulcina desde 2003. Foi ainda no contexto da Constituinte Escolar, à época no Governo Olívio Dutra (1999/2002) que construímos esta modalidade de ensino na escola começando pelos anos iniciais e depois consolidamos a proposta até o Ensino Médio.
Nestes dezoito anos mais de oitocentos jovens e adultos da cidade, interior de Nonoai, comunidade indígena e munícipios vizinhos puderam concluir o ensino médio através da EJA/Emadu.
O nosso município oferece matrícula no ensino fundamental e a Escola Maria Dulcina no Ensino Médio. São mais de quarenta estudantes matriculados na T8 e T9 em 2021, sendo que outros 28 jovens aguardam autorização de abertura da T7 para efetivar matrícula e iniciar seus estudos. A demanda continua grande, mas a escola dispõe de estrutura física e humana para atendê-la. Aguarda apenas a autorização para as novas matrículas.
Nonoai tem recebido nos últimos meses dezenas de migrantes que procuram trabalho nos frigoríficos na região e, também por isso, se justifica a continuidade desta modalidade de ensino.
Por isso, enquanto vereador, também tenho cobrado dos órgãos oficiais e competentes ações efetivas no sentido de impedir que a EJA seja extinta até o final deste ano letivo na escola, bem como em toda a rede pública de ensino do RS. Isso representaria um enorme prejuízo e um grande retrocesso à comunidade escolar.
Trata-se de uma ação política nefasta do Governo Leite (PSDB) que tem a ver com a lógica perversa do Estado Mínimo, onde as questões sociais e a educação em particular, tem sido relegada em segundo plano. Cortar, enxugar, privatizar, municipalizar e extinguir, tem sido verbos prioritários que este governo sabe conjugar e articular em favor do Mercado, a quem serve e representa com maestria.
SITE NEIPIES: Os professores e professoras do magistério estadual vivem dias difíceis no que tange à valorização profissional e financeira e ao reconhecimento do trabalho docente. Com a pandemia, o trabalho dos professores ficou mais difícil ainda, quando estes, a partir de suas casas, garantem o estudo remoto durante a pandemia. Como o senhor percebe os professores e professoras diante deste contexto?
NELSO DOS SANTOS: Há seis anos consecutivos, lamentavelmente, nos encontramos com salários congelados. O custo da cesta básica vem aumentando constantemente também nas pequenas cidades, e o cenário com que nos deparamos enquanto categoria, a partir do início da pandemia, sobretudo, é muito preocupante. É desolador em muitos aspectos, pra dizer como.
Olhando a partir do setor administrativo da escola onde atuo, sinto também a angústia dos colegas professores que precisaram no curto prazo se reinventar, se reorganizar para enfrentar os novos tempos e desafios da profissão em plena pandemia.
Foi preciso conciliar a luta cotidiana em defesa da saúde, da vida, da sobrevivência, e focar no atendimento aos estudantes de forma remota como continua sendo feito em 2021. Mesmo diante de tanto esforço, não faltaram, ao longo de 2020, crítica ao funcionalismo em geral, no sentido de desqualificar e por em xeque o trabalho desenvolvido.
Não há dúvida de que além da pressão, da angústia, aumentou também, neste período, a demanda de trabalho dos professores e equipes diretivas que a partir da escola, de forma presencial, continuam garantindo suporte aos pais e alunos, face à todas as fragilidades decorrentes do contexto atual.
O cansaço é visível. Muitos adoeceram e outros, inclusive, perderam familiares para a Covid19. Embora acredite que nada substitui a presença e a interação direta professor/aluno em sala de aula, creio sim, que a coragem, o desejo de acertar e a capacidade de resiliência em tempos de incerteza e dor, podem potencializar a construção de novos e múltiplos saberes.
SITE NEIPIES: Qual é, hoje o papel e a função de um Sindicato como o CPERS na representação e na luta dos professores/as pela manutenção de direitos?
NELSO DOS SANTOS: Um sindicato como uma entidade de classe ou uma ferramenta a serviço de uma determinada categoria profissional, para defendê-la de forma mais eficiente, precisa em primeira mão estar sempre “afiado”, como nos ensinava o saudoso amigo e Dep. Federal Adão Preto-PT/RS. A ferrugem impede que a ferramenta corte e o roçado renda.
Partindo desta pequena metáfora, acredito que renovação sindical no CPERS está mais que na hora de acontecer. A oxigenação é necessária, e apesar do momento difícil de pandemia, haveremos de mobilizar um grande número de colegas em torno do processo eleitoral que se avizinha.
Além da luta em defesa da urgente reposição salarial, da luta para impedir ainda mais retrocessos às nossas categorias (magistério e servidores de escola), acredito que outra tarefa urgente e necessária para o próximo período seja mobilizar e investir mais na formação sindical, na organização de base a partir das escolas, ampliando o número de associados e construindo novas lideranças.
Precisamos, acima de tudo, defender com clareza a necessidade e a importância de construirmos um novo projeto de educação e de humanidade, inclusivo e transformador. Por fim, acredito que uma direção, por mais segura que esteja, por prudência, não poderia e não poderá tomar decisões extremamente difíceis e comprometedoras sem ouvir as bases da categoria, mesmo que o processo possa ser mais penoso e demorado.
SITE NEIPIES: Na sua visão e na sua sabedoria, o que estamos aprendendo, como sociedade, a partir da pandemia?
NELSO DOS SANTOS: Primeiro, estamos confirmando que a história de fato se repete. A civilização ocidental, sobretudo, de onde temos mais conhecimento, já viveu em diferentes momentos situações semelhantes. A peste negra e a gripe espanhola são dois exemplos para serem reestudados.
Em que contextos estas pandemias ocorreram? Que consequências trouxeram para a humanidade? Que mudanças culturais, políticas e econômicas provocaram? E assim poderíamos já escrever para as futuras gerações como enfrentamos a pandemia do Novo Coronavírus: as contradições do nosso tempo, as questões ideológicas em disputa, o negacionismo científico.
É nessa direção que Boaventura de Souza Santos nos ensina: “estamos impondo a vida humana à Terra. “O vírus nos diz: ‘se os humanos continuarem a destruir o planeta da forma como estão destruindo, não é [apenas] esta pandemia, são muitas outras que virão.” Em outra análise, afirma se tratar de uma reação do planeta frente às ações violentas e egoístas, pautadas pela lógica do consumo desenfreado, ambição e ignorância.
O momento atual é oportuno para a reflexão, para conhecer a nós mesmos, nossas potências e fragilidades. Precisamos aprender a valorizar e defender as nossas conquistas no campo das políticas públicas hoje consolidadas a exemplo do SUS, a valorizar o poder da ação consciente e coletiva em favor da vida.
SITE NEIPIES: Uma mensagem aos que leram até aqui.
NELSO DOS SANTOS:Mesmo diante da tragédia humana, como nos ensina Mia Couto, “é preciso falar de esperança todos os dias só para que ninguém esqueça que ela existe.” Externo aqui minha solidariedade às famílias de tantas vítimas.
Basta de negacionismo! Não podemos permitir que a dor do outro, o sofrimento e a morte sejam banalizados e naturalizados entre nós. Este genocídio precisa ter fim. O SUS é nosso, a ciência e as nossas instituições de pesquisa, bem como os profissionais da saúde precisam ser respeitados e valorizados. Vacina para todos e auxílio emergencial decente para socorrer que mais precisa. A vida acima de tudo! Abraço à todos! (Nelso dos Santos, Professor e Vereador (PT), Mestre em Educação – UFFS/Chapecó.)
Autor: Nei Alberto Pies
Edição: Alex Rosset