A virtude moral pode ser ensinada e a síntese de toda virtude
moral é fazer ao outro o que gostaria que o outro me fizesse.
Não ensinar e não aprender esse princípio de eticidade
pode ter alto custo, inclusive, monetariamente.
De que adianta ao homem ganhar o mundo inteiro se vier perder sua alma? Essa interrogação, feita por Jesus, não deve ser estranha aos pais que amam seus filhos e aos professores que amam seus alunos. Ou será que os pais não mais se preocupam com a vida ética dos filhos? E, os professores, será que só se preocupam com as habilidades técnicas dos seus alunos? Duvido.
Os pais e os professores se preocupam com a vida ética sim, até mais do que com a vida bem-sucedida profissionalmente. Cuidado, não há contradição entre ser bem-sucedido eticamente e ser bom, virtuoso e honrado. E se tiver que optar entre as duas, não tenha dúvida, de nada vale ter tudo se vier a perder a alma, outro nome para a honra.
Uma vida honrada demora uma vida para ser construída e um instante para ser destruída. E não é só para políticos tradicionais e grandes empresários que vale essa regra. Vale para qualquer vivente, mas tem afetado, sobremaneira, os “famosos” da sociedade do espetáculo.
Uma vida digna e honrada, vivida no anonimato, tem muito menos chance de ser destruída, por razões óbvias e, a mais evidente, pelo reduzido arco de relações em que orbita. Ser “famoso” e importante é uma faca de dois gumes. Sobretudo se a fama for seu ofício e ganha pão.
Há algum tempo o jornalista William Wacck, um bem preparado âncora da maior empresa brasileira de comunicação, famoso e respeitado no meio, deixou escapar, em frente às câmaras, fora do ar, mas que algum tempo depois vazou na internet, uma frase racista do tipo: “só podia ser negro mesmo”. Conheceu o inferno, caiu na desgraça e foi demitido. A demissão lhe rendeu milhões. Mas de que vale ganhar mundos e fundos se vier a perder a honra? Sim, ser racista é ser antiético e, mesmo que não leve para a prisão, faz cair na desgraça aos olhos dos outros, que é a maior das prisões.
Mais recentemente, “famosos” youtubers e atores “globais” caíram na mesma desgraça de ordem ética, perdendo patrocinadores e deixando de participar em eventos, não por falta de habilidades técnicas, mas por falta de educação ética. Sim, ser ético vai muito além do não roubar e não matar e pode ser ensinado.
Comportamentos racistas, machistas, homofóbicos, xenófobos e especistas são sinais de atraso e perversão de ordem moral e má formação de caráter. Pais e professores necessitam ter isso em conta.
Isso coloca uma pergunta constrangedora para todas as famílias e para as escolas. Qual é o conceito de vida bem-sucedida que estamos ensinando para os filhos e estudantes?
Um racista e machista, que não é fruto do acaso, ele aprendeu ser, é tão corrompido como qualquer corrupto. A corrupção é todo ato de desvirtuação da natureza boa de algo, pervertendo-a e tornando-a má. E toda tentativa de rebaixamento do outro, como é o caso do racismo e machismo, é uma perversão de si. O racista é, tal como o ressentido, aquele que toma veneno esperando que o outro morra.
Sim, o racismo é um veneno moral para quem o pratica, diminuindo o sujeito quem ue tenta diminuir o outro. O inferior e o diminuído num ato antiético é o próprio sujeito da ação e não a vítima.
Em outras palavras, o antiético faz mal à saúde moral e mental de quem pratica. O sofrimento é duplo, portanto, de quem pratica e de quem sofre a prática.
Assim, já não basta dizer para os filhos que não devem roubar e matar. Há outras formas de comportamento ético que podem nos levar à condenação e à desgraça, mas que podem ser evitadas se elevarmos a exigência de ordem moral ao limite máximo que nos torna, minimamente, civilizados e nos mantém longe dos seguidores dos homens das cavernas que insistem em achar normal uma moral regressiva e bárbara.
Bárbaro não é aquele que está fora da minha cultura, que não fala a minha língua, que vem de fora, que é migrante e que não confessa as minhas crenças. Bárbaro é o que exclui o outro, o que diminui o outro, o que causa sofrimento ao outro. E o seu contrário, o civilizado e o ético, é aquele que se abre para a hospitalidade que é a medida da eticidade.
A virtude moral pode ser ensinada e a síntese de toda virtude moral é fazer ao outro o que gostaria que o outro me fizesse. Não ensinar e não aprender esse princípio de eticidade pode ter alto custo, inclusive, monetariamente.
Gilmar Zampieri tem agora também o seu blog, onde edita textos que são utilizados em suas aulas no ensino superior. Confira aqui.