Não cometemos crime ao lutar por nossos direitos,
como muitos desejam supor. Sem medos, caminhamos pacificamente,
segurando bem firme as nossas armas: nossa voz e nossas bandeiras.
Aprendemos, faz bom tempo, que quem luta, também educa.
E que se “educar é nossa vida, lutar é nossa atitude”.

Era uma tarde de muito calor. Milhares de professores, embalados por sua cidadania, caminhavam pelas ruas da capital Porto Alegre. Um suave aceno embalava as suas utopias. Uma senhora, de um edifício bem alto, na Borges de Medeiros, ninava as suas esperanças, embalando um lenço verde. O lenço era verde e verde é de esperança. E aquela senhora reconheceu que aquela multidão era movida por uma causa: a educação pública e de qualidade para todos.

(Esta é uma das memórias das tantas lutas que insiste em povoar a minha mente que me leva às lutas por mais respeito, dignidade e agora, por salários mais valorizados e pagos em dia.)

Não cometemos crime ao lutar por nossos direitos, como muitos desejam supor. Sem medos, caminhamos pacificamente, segurando bem firme as nossas armas: nossa voz e nossas bandeiras.

Aprendemos, faz bom tempo, que quem luta, também educa. E que se “educar é nossa vida, lutar é nossa atitude”.

O sol escaldante e reluzente da capital, naquele dia, nos fez lembrar do educador Rubem Alves, que certo dia resolveu perguntar-se e responder-se:

“o que é que se encontra no início? O jardim ou o jardineiro? É o jardineiro. Havendo um jardineiro, mais cedo ou mais tarde um jardim aparecerá. Mas, havendo um jardim sem jardineiro, mais cedo ou mais tarde ele desaparecerá. O que é um jardineiro? Uma pessoa cujo pensamento está cheio de jardins”.

Se pudéssemos conversar com a senhora do lenço verde, da Borges de Medeiros, e com todos os que nos acenam (dos mais diferentes jeitos), diríamos a estes que os professores e professoras semeiam, todos os dias, um jardim de esperanças em suas salas de aula.

Que todos os dias, enfrentam o seu ofício não só pelo salário, mas como uma missão de contribuir para com a humanidade, através da educação. Que todos os dias correm riscos de vida, pela vida de outras pessoas, por causa da violência que já chegou às nossas escolas. Que seus dias tem sido castigados, semelhante ao castigo que o sol impõe às plantas do jardim, no rigor dos nossos verões.

A secretária de finanças da CNTE, Rosilene Corrêa Lima, alerta: “Brasil é um dos países que pouco investe em educação, portanto pouco valoriza os trabalhadores em educação. Aquilo que a gente não valoriza, a gente tende a agredir”. Rosilene acrescenta: “Se você tem uma sociedade violenta, infelizmente você terá uma escola sofrendo dessa violência. A escola não fabrica violência, ela é vítima da violência”. A reportagem foi exibida no programa Fantástico, no dia 27 de agosto de 2017.

Nós somos jardineiros e fazemos a luta a partir de nossa dignidade. Somos referência para muitos jovens, porque ainda não deixamos de semear em suas vidas (e em seus corações) a ideia de que a vida é um jardim, que precisa ser cultivado, regado e cuidado. As flores precisam de carinho. Os seres humanos, de reconhecimento.

Os vegetais precisam de sol, os alunos precisam de horizontes. As plantas precisam de terra, adubo e água. Os seres humanos precisam de estímulos, zelo e cuidados.

O que é um jardineiro? Uma pessoa cujo pensamento está cheio de jardins. O que faz um jardim são os pensamentos do jardineiro. O que faz um povo são os pensamentos daqueles que o compõem. (Rubem Alves)

Logo a gente que cuida de jardins, não é bem cuidado. O nosso clamor é por reconhecimento. Por sabermos da importância dos jardins, exigimos que os governos façam sua parte para engrandecer e embelezar o jardim das nossas vidas, e o jardim das vidas daqueles e daquelas que cuidamos com o maior carinho. Lidamos com vidas e temos dignidade.

Sabemos, por consequência, quanto nos custa ensinar, mas não reclamamos deste preço. Como amamos a nossa profissão, resolvemos pedir que nos reconheçam como gente, e como profissionais da educação, com os nossos salários em dia.

Sabemos que o sol tende a nos castigar com o avanço do verão. Mas também sabemos que este mesmo sol brilha para todos e é fonte inesgotável para gerar vida, capaz de conduzir novos horizontes.

 

Violência nas escolas é violência da sociedade

O Brasil ainda não lidou com o legado da escravidão e isso influencia a violência da sociedade brasileira até hoje. É o que nos explica Glenda Mezaroba, mestre e doutora em Ciência Política, nesse vídeo.

Vídeo produzido pelos alunos da Universidade Federal do Vale do São Francisco (UNIVASF), do curso de Ciências Sociais – Licenciatura/Campus Juazeiro-BA, como avaliação da disciplina Metodologia de Projetos e Intervenção Social, ministrada pela professora Paula Galrão, realizada com os alunos da 2ª série do ensino médio do Colégio Padre Luiz Cassiano, Petrolina-PE. Em setembro de 2013.

 

Violência na escola – Diga não!

Em uma palestra sobre inclusão social e justiça, Djamila trata de questões como o direito à voz em uma sociedade que se silencia frente às desigualdades. Mestre em Filosofia Política pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), secretária-adjunta da Secretaria de Direitos Humanos e Cidadania de São Paulo e colunista da revista Carta Capital, Djamila é conhecida pela militância nos movimentos negro e feminista.

Para além das violências cotidianas vivenciadas pelos professores, vivemos agora a violência de não recebermos o nosso merecido salário. Quem trabalha, precisa receber. Os professores do RS recebem salários atrasados e parcelados há mais de dois anos.

No horizonte do sol, arriscamos paralisar as aulas, pois aprendemos que aqueles que nada arriscam nada podem conquistar. E para a senhora do lenço verde, pedimos que não canse de nos acenar, pois a vida e a luta é esperança. Seu gesto, com certeza, estimulará muitos outros a nos acenar.

 

Magistério: uma categoria que está adoecendo

O professor é uma peça-chave na educação do país e, se houver o intuito de dar prioridade à educação é urgente e necessário valorizar o professor em termos de salário, de condições de trabalho, além do reconhecimento social da importância da profissão.

Conforme dados da Organização Internacional do Trabalho (OIT), profissões como médicas e professor estão entre as mais desgastantes gerando uma alta incidência de licença por afastamento. Em Passo Fundo o cenário não é diferente, sendo que no que diz respeito aos professores da rede municipal de ensino um levantamento realizado pelo setor de biometria do município aponta que mais de 70% dos professores que se afastaram por motivo de doença acreditam o afastamento tem relação direta com o trabalho.

No funcionalismo de Passo Fundo a Secretaria Municipal de Educação representa 47% dos servidores afastados. Uma vez que é a maior secretaria, registra o maior índice de afastamentos por licença saúde.  No topo dos afastamentos estão as doenças de CID M, que são as doenças do sistema osteomuscular e do tecido conjuntivo. Em segundo lugar as patologias de CID F, que sãos os transtornos mentais e comportamentais, seguidos das doenças respiratórias e de gravidez.

Foto: Ingra Costa e Silva

De acordo com a professora de Educação Infantil e dirigente do CMP Sindicato, Regina Costa dos Santos, com o passar dos anos a profissão foi assumindo uma demanda social, que foi se associando a sua função de planejar e orientar alunos os alunos.

“O acúmulo de funções é algo que atinge diretamente a saúde do professor, tanto da mente quanto do corpo. Se a gente for ver nas salas de aula do município, são superlotadas!

Professores que alfabetizam de 25 a 28 alunos, muitas vezes numa estrutura precária que sequer conta com quadro branco, onde o pincel desliza exigindo menos da mão e do punho, e ainda conta com o quadro negro que usa o giz, que influencia diretamente no número de doenças respiratórias por exemplo”, comenta.

Para o psicólogo do setor de Biometria da Prefeitura Municipal de Passo Fundo, Mario Junges, para que se resolva a situação do grande número de professores afastados é necessário fazer uma contextualização. Saber quem são os servidores, como funcionam suas relações de trabalhador, relação professor aluno, sua frequência, para posteriormente chegar aos números e identificar quais são os problemas, como podem dar conta e quais as maneiras de diminuir estes números.

Mario lembra que quando se adoece dentro do trabalho, não significa que somente o trabalho seja o gerador da patologia. “É preciso levar em consideração o ser humano como um todo, suas relações familiares, relações sócio econômicas e culturais, sua história de vida até chegar na Prefeitura, ” explica o psicólogo.

Segundo Regina a dinâmica da escola não possibilita que o professor tenha um tempo para relaxar entre um período e outro, por exemplo, medida que aliviaria a tensão e interferiria diretamente na saúde do professor. “São coisas simples e na perspectiva da prevenção, como um tablado para que o professor de baixa estatura não force muito braços e costas, que previnem a doença dos professores. Não é preciso esperar o profissional adoecer”, alerta.

Prevenção

O núcleo de Biometria da Prefeitura desenvolve um projeto multidisciplinar de Gestão em Saúde Ocupacional de Professores que conta com enfermeira do trabalho, médica do trabalho, psicólogos e assistente social. Através deste projeto a biometria passa a ingressar os espaços escolares e analisar, junto ao profissional, onde estão os problemas para assim resolver os índices de absenteísmo. O psicólogo Mário ressalta a importância de os professores procurarem o núcleo antes de adoecer, pois é preciso ter tempo para agir antes que o adoecimento ocorra.

Regina lembra que valorizar o professor financeira e psicologicamente significa contribuir com a sua saúde e consequentemente um melhor atendimento por parte do atendimento deste profissional. “A gente precisa que o poder público tenha essa interpretação. Em tempo de campanha muitas promessas surgem, mas precisamos avançar em políticas públicas de qualidade de educação, porque da forma como está hoje não está respondendo como deveria”, confessa a professora que ainda confidencia que espera que a sociedade possa contribuir na luta por melhores condições de trabalho e por um salário digno para estes profissionais.

Conforme a professora Regina, o CMP Sindicato vem pensando e realizando diversas discussões em diferentes espaços, como o Conselho de Representantes Sindicais, projeto Saberes em Ciranda, Congresso, Núcleo de Biometria… buscando contatos de parcerias e experiências de outros sindicatos, que possam contribuir na busca de alternativas para melhorar a qualidade de vida e trabalho do magistério. “Acreditamos que o desgaste ocasionado durante os anos dedicados à docência são as principias causas do adoecimento da categoria”, confessa.

 

Discutir a temática é importante

Não é de agora que a profissão docente ocupa os primeiros lugares do ranking de profissionais que adoecem em virtude do trabalho. Seja pela falta de estrutura das escolas ou pela desvalorização da categoria, milhares de professores se afastam das salas de aula todos os dias no país. Buscando debater os desafios impostos aos professores em um período político, social e econômico de muita turbulência o CMP Sindicato promoveu na última semana o IV Congresso dos Professores Municipais.

Com o tema “Professor: resistência, democracia e saúde” a atividade teve como objetivo contribuir com análise frente aos inúmeros, ataques aos direitos já constituídos da classe trabalhadora e o aumento significativo de adoecimento da categoria.

A atividade foi dividida em duas mesas temáticas, sendo que uma delas tratou dos ataques à classe trabalhadora e os Impactos na vida funcional dos professores, enquanto a outra trouxe para debate a saúde do professor e contou com nomes de peso, como o presidente da Confederação Nacional de Trabalhadores da Educação Heleno Araújo, o professor da UPF Dr. Claúdio Wagner, o dirigente do SINPRO Cássio Bessa e o representante do Sintrajufe Neri Nunes Cavalheiro.

Na mesa temática que tratou da saúde do professor Cláudio Wagner e Cássio Bessa trouxeram presente a ampliação no papel profissional do professor, que exige novas competências e acrescendo responsabilidades aos profissionais, bem como sobrecarga de trabalho. Com isso a categoria se tornou uma das mais doentes, com altos índices de stress, Síndrome de Burnout, Distúrbios Psiquiátricos Menores e até sintomas de depressão.

O professor Cássio Bessa ressaltou que os índices podem ser considerados altos se comparados a resultados encontrados em outros estudos, quer seja com professores, com outros grupos de trabalhadores ou com a população em geral, e trouxe os dados resultantes de pesquisas realizadas pelo Sinpro que trazem presente o afastamento dos professores do trabalho em virtude dos acúmulos da profissão.

“Nos últimos dez anos investigamos o que leva os professores a se afastarem do local de trabalho e as conclusões se repetem. Na nossa categoria existe prevalência do stress, da depressão, resultantes do acúmulo de tarefas e da pressão extrema e por isso é fundamental não somente buscar o tratamento das patologias que levam ao afastamento, mas também discutir como podemos prevenir”, explicou.

O médico e professor da UPF Cláudio Wagner destacou a importância de espaços de formação e aprendizado como o Congresso dos Professores Municipais.

Em sua fala Cláudio destacou a importância de o professor lidar com stress, já que nem todo o stress é patológico. “Quando não é patológico, o stress move o indivíduo ao crescimento e ao desenvolvimento e por isso é essencial aprender a aceitar esse stress, embora ele possa ser incomodo. É importante cuidar de si mesmo, fazer nada ou desenvolver um hobby, pois assim o professor vai reestruturar sua energia psíquica e se sentir mais pronto e preparado para lidar com as demandas de uma escola”, disse o médico ao encerrar a sua fala com uma apresentação musical. 

A dirigente do CMP Sindicato Regina Costa dos Santos pontua que a discussão é necessária e que a temática do Congresso é pertinente para o momento. Lembra que os professores municipais participaram massivamente das discussões e mobilizações realizadas no município em um momento histórico decisivo.

“Frente ao cenário nós não poderíamos discutir outros temas que não estes. Mais que aprofundar e discutir estes assuntos, essa é a oportunidade de reunir toda a categoria para traçar indicativos claros de como a categoria deve encarar o que vem por aí não só a nível federal, mas também estadual e municipal. Assim é possível reivindicar ao poder público que se possa avançar em questões voltadas às condições de trabalho, à pauta de reivindicações da categoria e ao adoecimento do professor”, encerrou.

 

Créditos das fotos e matéria Magistério: uma categoria que está adoecendo: Ingra Costa e Silva

 

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