A educação deve preparar pessoas para competir na sociedade do mercado ou deve formar seres humanos completos? Deve doutrinar ou educar para a autonomia?
A centralidade da educação se faz sentir em todos os lugares. Basta abrir um jornal, participar de eventos acadêmicos, escutar discursos políticos em época de campanha eleitoral, visitar uma livraria ou conversar com pessoas comuns sobre os problemas cotidianos para que, de forma espontânea, o tema da educação apareça.
Talvez essa centralidade não seja uma marca exclusiva do nosso tempo. Em outras épocas, a educação também foi protagonista das atenções de diversas civilizações. A Paidéia,na experiência educacional grega, a Humanitas, na experiência pedagógica latina, e a Büldung,na tradição educacional alemã, são algumas das tantas manifestações do quanto a educação foi palco de grandes debates em todas as épocas.
No entanto, em nossa cultura atual, a educação figura como sendo ao mesmo tempo causa e possibilidade de superação dos principais problemas que afligem a sociedade contemporânea.
Muitos atribuem à ausência, deficiência ou má qualidade educacional a causa dos problemas que perturbam e dificultam o desenvolvimento de uma sociedade mais decente para se viver; outros acreditam que a construção de uma sociedade mais justa depende da capacidade de se educar as futuras gerações. Muito embora sejam aparentemente divergentes, as duas posições convergem na medida em que estabelecem que não é possível projetar um futuro melhor sem que haja uma aposta incisiva no processo educativo.
Em seu belo livro O valor de educar, o filósofo e educador espanhol Fernando Savater diz que “em qualquer educação, por pior que seja, há suficientes aspectos positivos para despertar em quem a recebeu o desejo de fazer melhor com aqueles pelos quais depois será responsável” (2000, p. 17). Tal perspectiva nos tutela o desafio de pensar e estruturar processos educativos para que as futuras gerações possam ser melhores do que a nossa geração ou a geração que nos precedeu.Mas como realizar tal façanha? De que forma é possível pensar e projetar um processo educativo que seja suficientemente eficaz para dar conta das crises e demandas educacionais atuais?
A educação deve preparar pessoas para competir na sociedade do mercado ou deve formar seres humanos completos? Deve doutrinar ou educar para a autonomia? Deve concentrar as suas energias no repasse de informações e na instrução eficiente ou no árduo e complexo processo de produção de conhecimentos e na construção de cidadãos? Deve preparar para um emprego ou preparar para a vida? Deve manter uma “neutralidade aparente” diante da pluralidade de opções ideológicas, religiosas, políticas e tantas outras formas de vida ou deve inserir-se no debate sobre o preferível e propor modos de vida mais confiáveis?
O próprio Savater (2000, pp. 18-19), no livro acima citado, amplia o leque de questões sobre essa problemática da seguinte maneira: é obrigatório educar todo mundo da mesma maneira, ou deve haver tipos diferentes de educação, conforme a clientela a que tais tipos sejam destinados?
A obrigação de educar é assunto público ou questão privada? Por que há de ser obrigatório educar? E quem educa o educador? São questões que dizem respeito a todos nós e por isso precisamos pensar juntos.
Da capacidade que temos para responder ou pensar sobre tais questões, desenha-se o tipo de educação que estamos realizando e projetando para a formação das futuras gerações.
Seria contraditório projetar uma sociedade mais solidária e menos corrupta, se continuarmos investindo tacitamente num modelo de educação que prima pela competição e pela lógica do dinheiro; não podemos esperar por uma sociedade mais justa e responsável, se continuarmos apostando numa prática educativa excludente e autoritária; não podemos sonhar com uma educação de qualidade para nossos filhos, se os professores continuarem tendo péssimos salários e uma formação cada vez mais medíocre; não podemos acreditar na sustentabilidade do planeta, se continuarmos com um modelo de educação que estimula e consolida o consumismo e o acúmulo irresponsável de produtos descartáveis que aumentam as montanhas de lixo, poluem as águas e estão acabando com o planeta.
Para enfrentar tudo isso, é necessário pensar projetos de formação que visem construir espaços de reflexão permanente sobre as próprias práticas dos professores que estão no cotidiano da escola enfrentando a árdua e imprescindível tarefa de educar. O livro Educar o educador (FÁVERO e TONIETO, 2010) tem a pretensão de contribuir com reflexões sobre algumas temáticas inerentes a formação continuada.
Assista à vídeo de Altair Fávero e Carina Tonieto: Educar o educador
Referências:
FÁVERO, Altair Alberto; TONIETO, Carina. Educar o Educador: reflexões sobre formação docente. Campinas: Mercado de Letras, 2010.
SAVATER, Fernando. O valor de Educar. São Paulo: Martins Fontes, 2000.
Autor: Dr. Altair Alberto Fávero
Edição: Alex Rosset