“Ao saírem, encontraram um cireneu, (1) chamado Simão, a quem obrigaram a carregar-lhe a cruz“.
É Páscoa!
Passou rápido, não?
Os shoppings estarão lotados novamente; gente ansiosa por suas compras, correria para todos os tipos de pernas, gastos, consumo…
Provavelmente, muitos dos presentes que damos ou recebemos no ano passado, ainda estão guardados em um canto de nossos armários; não usados. Mas, agora, temos de dar e receber mais.
Os ovos de Páscoa ficaram menores, mais caros, menos saborosos. Seguimos a tradição, ano após ano e sabe-se lá quem inventou tudo isso. Com certeza, a maioria não tem a menor ideia.
A cada ano que nos foge, percebemos que as igrejas estão mais vazias, com exceção de um pedaço de interior que as mantém abertas. Por outro lado, imaginamos que a fé que se sobressai nesses dias, poderá ser lembrada na casa de cada um: sem igrejas, templos, sem ninguém por perto. Engano!
Percebe-se que quanto maior são os aparatos da Páscoa e quanto mais portentoso é o seu apelo, menos essência encontra-se na comemoração.
Há muito se perdeu o seu sentido real e hoje passamos pela sexta-feira e pelo domingo da ressurreição, com pouca celebração e muito açúcar. O que seria uma grande oportunidade para chamar à reflexão nesse período, investiu-se em festas aparatosas, ornamentadas, desprovidas de quaisquer sentidos do que ela realmente significa. Trocou-se a dor pungente de um sacrifício verdadeiro, talvez o único que possa ser incontestável, por um festival de guloseimas; são dias de falsos banquetes, exagerados, para tudo ser esquecido; já na segunda.
Uma lástima!
Após a ressureição de Cristo, para os que assim o creem, Jesus apareceu à casa de seus seguidores, e, para provar que realmente era ele, pediu algo para comer. Deram-lhe peixe assado e um favo de mel. (2)
Há muito se sabe que o mel é um dos alimentos mais alinhados com os tempos bíblicos. Você pode até permanecer indiferente; mas foi o que Jesus provou. Possivelmente, com suas próprias mãos. Inspirado em suas doces palavras?
Então temos o primeiro constrangimento. Em sua homenagem, neste domingo, poderíamos trocar o almoço fausto por uns pedaços de peixes, uma vez que foi o seu pedido, logo após o retorno do seu sacrifício. Sobremesa: mel. E pronto!
Mas quem se importa?
Em quase dois mil anos, a humanidade ainda permanece muito parecida com o seu tempo, quando Ele chamou os males do mundo e disse que tomaria para si todas as dores. A indiferença é contagiosa e Jesus a provou várias vezes.
Quanta teimosia por amor ao próximo!
No período em que se passou entre a sua morte e ressurreição, e o tempo que se chama hoje, foram-se quase 20 séculos, para vermos com nossos próprios olhos, como seu discípulo Tomé; a mesma incredulidade, a mesma dureza de coração, quase o mesmo desinteresse. Não gostamos de dividir o que temos, não gostamos dos que não tem, pouco compartilhamos. Se não mudamos nossa forma egocêntrica de conviver com o próximo, quanto mais morrermos por ele? Jamais!
Morrer pelos conhecidos é uma tarefa até compreensível. Mas pelo que não se conhece, impensável.
Foi o que Jesus fez!
Tanto que na promessa de sua execução, deu-se por todos: pelos pescadores que mal compreendiam a sua mensagem, pelos hipócritas de seu tempo e pelos de hoje, por incautos e sonegadores, por pobres e ricos. Por você e por mim. Quem acredita de verdade?
Ele mesmo falava: somos uma geração de incrédulos, homens de pequena fé. (3) Se podemos resumir a mensagem de sua vida e história, e sobre os seus ensinamentos, concluímos que a razão de toda a sua existência se resume numa só palavra: o outro.
Incomoda muito o seu discurso e o seu exemplo, sobretudo, perturbam algumas Igrejas que dizem segui-lo. Até é insuportável vermos as diferenças em seus seguidores, inseguros, de sua época, mas que mesmo assim o seguiam, com os messias que hoje vemos por toda a parte, gritando e pedindo graças, clamando por presença, por submissão aos seus cultos, e, claro, implorando dinheiro.
Fica constrangedor imaginar a presença de Jesus, em uma provável volta, novamente evidenciando a sua teimosia em querer salvar uma geração, que não se acha perdida. Se voltar, encontrará pouca fé por aqui. (4)
Pelo menos, que nessas Páscoas confusas, de tantos sabores e de tão pouco sentido, fique claro que ele já se ofereceu por todos: pelos que exploram, ofendem, discriminam, perseguem, e ainda pelos que percebendo a tudo, frente a crueldade de um mundo insensato… Silenciam.
Não se preocupe e não se cobre pelo tamanho de sua fé. Há um sacrifício já foi consumado pelo seu nome.
Jesus, desde sempre, conviveu com a apatia do mundo. Não será a sua ausência que o fará desistir. Até porque, na humilhação e na matança a que foi submetido, sequer os seus discípulos ficaram com ele.
Portanto, ao ouvir falar em empatia, não perca seu tempo procurando exemplos de obras e homens que a ensinam. Pois o maior gesto de empatia que alguém poderia deixar como modelo, Ele nos deixou.
Ahh!
Em se tratando de empatia, lembre-se que na madrugada deste domingo, há dois mil anos, ou aproximados, ao ressurgir dentre os mortos na porta do seu túmulo, poucos o procuraram. Talvez até estivesse um pouquinho frio ou nublado, mas ali estavam: Maria Madalena e a outra Maria. (5) Somente para lembrar, que é com empatia que se planta mais empatia.
Não precisamos de mais nada!
Neste e em todos os domingos, coloque-se no seu lugar e considere o seu gesto. Nem precisa acreditar, mas dê uma chance ao seu ego, por um domingo apenas, siga-o, pondo-se no lugar que quem você julga e precisa do seu perdão. A Páscoa tem muito a nos dizer sobre o outro, em aceitá-lo, e, como Simão o fez, carregar um pouco a sua cruz.
Se possível, feliz Páscoa!
Referências:
- Habitante de Cirene (África).
- Lucas 24:42
- Mateus, 8:26
- Lucas 18:8
- Mateus 28:1
Autor: Nelceu A. Zanatta. Também escreveu e publicou no site “O dia em que Deus se arrependeu de nós”: www.neipies.com/o-dia-em-que-deus-se-arrependeu-de-nos-sera-que-somos-o-erro-de-deus/
Edição: A. R.