Lixo no chão

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O simples exemplo de jogar ou não o lixo no chão me faz refletir, inclusive, sobre a importância de uma boa educação.

Uma vez eu aprendi na escola que a ética pode ser compreendida como aquilo que você faz quando ninguém está vendo, lá se encontra o seu verdadeiro eu. Há muita gente mal-intencionada por trás das máscaras e há pessoas que não usam máscaras, mas, são mal-intencionadas também.

Não, eu não prefiro nenhuma das duas, por mais que a última pelo menos não minta para você, e isso pode machucar menos, além de deixar um aviso claro que diz: quem sabe seja melhor você se afastar!

É o que penso toda a vez que me deparo com um infeliz ser humano jogando lixo no chão, assim, na cara dura e despreocupada, na minha frente. Eles são das mais variadas idades, gênero e personalidade. Há também aqueles que se auto enganam acreditando que o toco de cigarro que eles estão prestes a jogar no chão é uma folha orgânica, o mesmo vale para o chiclé.

Eu ainda não apanhei, mas, acredito ser uma questão de tempo. Isso porque a minha cara de desprezo por esses atos é incontrolável, aliás, todas as minhas expressões são (e eu nem deveria estar dizendo isso por aqui). A verdade é que depois de perceber que eu olhava torto, eu resolvi passar a fazer isso de modo proposital.

Antes, é claro, eu avalio o porte físico da pessoa, e se eu calcular que consigo correr, então, eu olho torto, com um simples objetivo de identificar se aquela pessoa tem o mínimo de compreensão que na sociedade em que ela está inserida, aquilo não é uma boa ação.

Em outras palavras, eu quero fazê-la refletir que aquilo não está certo sem palavra alguma, apenas olhando feio (pensando bem, acho que isso eu herdei de meu pai, ele nem me chamava quando eu estava saindo da linha, bastava um olhar).

E ao fazer isso, eu também pretendo fazer com que aquela pessoa se sinta envergonhada, pois, assim eu realmente acredito que ela não vai esquecer tão cedo (por mais que exista algumas pessoas que nem com isso se importem, mas, vale a tentativa!). Ah! Eu também já pensei em chamar a pessoa, pegar o lixo e dizer: olha, você deixou cair, é seu neh?!. Isso seria engraçado, mas, meu medo de apanhar cresce substancialmente, então, acho melhor não. Eu também já pensei em chamar a pessoa de porca, assim, no ato. Mas, talvez ela se ofenda com a verdade (quem nunca neh?!). E além do mais, eu considero que os porcos não são tão porcos, então, talvez, antes de fazer isso eu deveria encontrar um adjetivo mais adequado e também, aumentar os meus treinos de corrida…

O simples exemplo de jogar ou não o lixo no chão me faz refletir, inclusive, sobre a importância de uma boa educação.

Não me refiro àquela modalidade que educa por meio da punição, a qual estamos acostumados, diga-se de passagem. Que estipula regras que se não cumpridas, você será punido. Isso realmente funciona, e tem sua importância em um amplo contexto social, mas, não chega nem perto de onde deveria chegar.

Essa forma de “educar” inclusive subestima e bloqueia a inteligência e curiosidade das pessoas. Diga a um ser humano que ele não pode jogar lixo no chão, apenas. Diga a um ser humano que ele não pode jogar lixo no chão, caso contrário ele será multado.

Explique a um ser humano a importância de deixar uma cidade limpa. Argumente que uma estética agradável comprovadamente deixa a gente mais feliz, uma cidade mais limpa também deixa a gente mais saudável, pela menor probabilidade de proliferação de vetores de doenças, diga a ele que isso beneficiará a ele e também a quem ele ama.

Qual dessas opções você acredita que vai fazer com que uma pessoa compreenda a importância de não jogar o lixo no chão? E não jogue?

O problema da educação acontece quando a gente ensina com palavras vazias, ou seja, sem saber o porquê ensina. Ouso dizer que muitos educadores não sabem responder o porquê exatamente não é certo jogar o lixo no chão, porque foram educados desse modo, a obedecer a regras com medo das punições e inclusive, ameaçados quando questionavam o porquê, desde crianças.

Sabe, a ética Kantiana nos faz refletir justamente sobre isso. Ela nos incentiva a pensar no problema que causaríamos caso replicássemos as nossas ações não tão adequadas. Aplicando na prática seria o mesmo que pensar o que aconteceria, se todo mundo resolvesse jogar um papel de bala na rua toda vez que saísse de casa. Bom, se isso causaria um problema para todos nós, então, não é correto fazê-lo.

Kant ainda vai classificar as ações humanas, dividindo-as em três principais categorias, a saber:

As ações contrárias ao dever: que basicamente seria jogar o lixo no chão, visto que agora compreendemos a importância de não fazer isso para todos nós.

As ações conforme o dever: que basicamente seria aquele ser humano que não joga lixo no chão pois sente vergonha do que os outros iriam pensar (mas, isso não garante que ele não vai jogar quando ninguém estiver olhando). Ou quando a gente coloca o sinto de segurança apenas para passar na polícia rodoviária (achando que tá arrasando engambelando os policiais), sem entender que aquele apetrecho serve para salvar a própria vida.

E as ações por dever: que basicamente é o ato de não jogar o lixo no chão por compreender a importância que isso possui na vida de todos nós. Independente se alguém está olhando ou não.

Se todos nós compreendêssemos a importância de agir por dever, as detenções estariam com poucas vagas preenchidas. E tudo começa com um lixo no chão, ou melhor tudo começa com a educação.

Assista: Por que não jogar lixo no chão?#Ticolicos|EP11

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P.S: Casualmente, um dia após eu concluir este texto, estava caminhando, quando passei ao lado de uma pequena menina e sua mãe. No mesmo momento que passava por elas, ela parou no meio da calçada e disse: Olha, mãe! Um lixo no chão, isso não pode acontecer, neh! E sua mãe respondeu encantada, é verdade filha! Mais encantada fiquei eu de encontrar tamanha indignação em um toquinho de gente. Amigos, ainda há esperança! E mesmo sem conhecer aquela garotinha, deixo aqui a minha admiração por ela.

Autora: Ana P. Scheffer

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