Está em curso no Brasil um movimento de afirmação da não-política. A não-política caracteriza-se como alternativa à política, com o uso de métodos de racionalidade burocrática, através da mera aplicação das leis e regulamentos, como solução para os problemas do coletividade. A quem interessa a desconstituição da pólis e da política? Se as decisões não forem tomadas pela pólis, na res-pública, serão tomadas por quem?
A democracia, “embora frágil, complexa e cheia de contradições, combina a participação direta com a representação e, sendo assim, não é perfeita e não segue lógica da racionalidade burocrática”. Ocorre que, neste último período, recente e conturbado, a política esteve ausente deste país; as grandes decisões foram emperradas por imbróglios jurídico-burocráticos, gerando estagnação econômica, além de uma grande paralisação das forças vivas e ativas da sociedade. Sofremos, em meio a crises de toda a espécie, a crise da política, representada pela desconfiança generalizada em quem a exerce.
Quando estudei filosofia, aprendi, dentre muitos outros ensinamentos, que o ser humano é um animal político (Aristóteles). É um animal político porque precisa de coisas e precisa dos outros para completar suas carências e imperfeições. Para o sábio grego, o lugar para a realização desta dimensão humana é a pólis (cidade), a partir do uso da razão e dos argumentos.
A política deve ser exercida pelos mandatários, eleitos para tal (poder de sufrágio, garantido pela Constituição Federal), na forma da democracia representativa e pelo povo, na democracia direta (todo o Poder emana do povo e em seu nome será exercido). A política, definitivamente, no meu entender, deve ocupar seu lugar: não pode ficar refém do mercado (economia) e tampouco refém apenas da racionalidade burocrática, operada unicamente por alguns representantes do Poder Judiciário brasileiro. Atente-se que o papel do Poder Judiciário é importante, mas é outro.
Este movimento da não-política, perigoso demais, foi evidenciado nas últimas manifestações realizadas no país no dia 13 de março de 2016. O seu perigo iminente e incessante é sufocar a participação popular organizada, criminalizar os movimentos sociais e ridicularizar e debochar de todos os políticos em atividade neste país, indistintamente, inclusive daqueles que são sérios e que fazem da atividade política um serviço à sociedade, como na pólis grega.
O movimento supra citado, ainda operante no Brasil, sofre importante derrota com a corajosa decisão do ex-presidente Lula assumir novos protagonismos na política brasileira. Lula, com corajosa decisão de integrar o governo Dilma vira uma página para abrir outras. O que virá depois ainda não sabemos, mas o fato é que a seara da política sobreviveu neste país e que o caminho para a solução dos problemas da coletividade passarão, necessariamente, pelo exercício permanente das escolhas democráticas que envolvem os distintos interesses de uma sociedade heterogênea como a nossa. Lula, como a maioria dos brasileiros, sabe que é preciso conciliar interesses internos, promover a soberania política e econômica, respeitar as leis deste país e promover um conjunto de iniciativas que tirem o Brasil da imobilidade política e econômica.
A força política de Lula ainda inspira e move milhões de brasileiros. Leonardo Boff, teólogo, há dias atrás, manifestou, em carta, que Lula deveria mesmo ser ministro. Assim escreveu, dentre outros argumentos: “o interesse da nação está acima de sua trajetória política pessoal. Com você na condução da negociação política, estaremos seguros de que aí estará alguém que, com autoridade e força de convencimento, ajudará a conduzir a uma solução política e social que salve a nossa frágil democracia e garanta a continuidade das medidas sociais humanizadoras”.
Mesmo os que não gostam de Lula reconhecem inegável habilidade através da qual Lula conduziu este país. É seguramente um dos líderes mais inteligentes e astutos do país e do mundo. Quando aceita ser ministro de Dilma, em meio a uma séria crise política e institucional, sem nenhuma garantia de que não será preso (foro privilegiado não significa necessariamente escapar da prisão) ou mesmo de que o Governo que irá compor não sofra um processo de impeachment (embora inexistam provas contra a Presidente, se obtida a maioria dos votos do Congresso o impedimento poderá ocorrer), consegue realocar os cenários das decisões políticas: da circunscrição de um magistrado para um governo eleito democraticamente, ou seja, coloca a política no lugar da política.
Tenho consciência de que ele, sozinho, não devolverá ao país o verdadeiro significado de democracia: poder do povo. Na defesa da política e da democracia, milhares e milhões irão somar-se a Lula novamente. Luiz Inácio Lula da Silva, cidadão brasileiro e ex-presidente da República que acaba de ser ministro no governo da Presidenta Dilma em seu segundo mandato, recoloca no Brasil, o lugar da política.
O que está em jogo no Brasil é muito sério, pois ao golpear a democracia e o Estado de Direito, querem acabar na força e na marra (aos atropelos do devido processo legal e formal) com o governo da Presidenta Dilma. A classe média, aliada a poderosas redes de comunicação, a partidos de oposição e a uma parcela do Judiciário tenta reescrever a história com um novo e derradeiro golpe à democracia. Em Poeminha do Contra, Mário Quintana novamente nos inspira: “todos estes que estão aí, atravancando (nossos caminhos democráticos)/eles passarão. Nós passarinhos!”