Estamos descobrindo que Mayer e a Globo,
com seus sentimentos de poder total, têm muitas coisas em comum
(e não estou falando da relação com as mulheres,
mas das mais amplas relações humanas).
José Mayer frustrou muitos dos machos que o seguiam como inspiração, ao largar a nota em que admite que errou e que vinha errando há muito tempo com as mulheres.
Mayer confessou que era um assediador, mas arranjou um atenuante. É aí que ele pode ter frustrado os machos que o consideram o cara, o alfa a ser imitado. Mayer não só admitiu que era um predador, como veio com uma conversa sociológica.
Repercussões na própria Rede Globo em programa Vídeo Schow
A culpa seria dele e de toda uma geração que se sentia à vontade para assediar as mulheres do jeito que bem entendesse (ainda mais se fosse galã da Globo). Os machos que o admiram talvez não admitam, mas José Mayer acertou o diagnóstico. A nota é muito boa. Tão boa que fica muito acima da média em casos complicados como esse (se é autêntica é outra história).
Ele pede desculpas, confessa que sempre foi assim, anuncia que vai mudar e apela para que outros da sua geração também mudem. Só falta dizer que vai virar pastor. A nota tem até pretensões literárias.
Mas aí alguém pode estar pensando: eu avancei muitas vezes para além do razoável, mas nunca passei a mão nas partes íntimas de colegas de trabalho. Mayer passava. Deveria achar normal. Bonitão, insuportável, superior.
A tese de cientista social do assediador não o absolve, mas ameniza a própria culpa e talvez melhore sua situação no caso de um pedido de reparação da moça na Justiça. Mayer tenta se colocar como exemplar de uma manada. Ele é o que é porque integra uma coletividade de assediadores da mesma idade, com as mesmas cabeças atrasadas.
Pesquisei nas redes sociais sobre as repercussões e os comentários sobre o caso. Li até comentários de mulheres que parecem ver algum exagero no julgamento público, se não nesse caso, em muitos semelhantes. E muitos homens incomodados com a reação das artistas da Globo.
Elogiada por protagonizar e incentivar o debate de assuntos polêmicos em seu “Amor & Sexo”, na TV Globo, a apresentadora Fernanda Lima é uma das engajadas da campanha “Mexeu com uma, mexeu com todas”.
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Esses talvez não mudem, mas ele encerra a nota em tom de auto-ajuda: “O que posso assegurar é que o José Mayer, homem, ator, pai, filho, marido, colega que surge hoje é, sem dúvida, muito melhor”.
O que o episódio acaba por revelar é que não só os machos, mas também alguns atores do estilo de Mayer deveriam estar em desuso, num mundo em que se disseminam as agressões às mulheres, os casos de estupro e outras formas de crueldade e desrespeito, sem falar na homofobia.
Estamos descobrindo que Mayer, o canastrão, leva para seus personagens o que de fato é. E que ele e a Globo, com seus sentimentos de poder total, têm muitas coisas em comum (e não estou falando da relação com as mulheres, mas das mais amplas relações humanas). Com a diferença de que a Globo manipuladora nunca irá pedir desculpas.