Como confessou Quintana: “Meu saco de ilusões, bem cheio tive-o. Com ele ia subindo a ladeira da vida. E, no entretanto, após cada ilusão perdida… Que extraordinária sensação de alívio…”
Todos temos dentro de nós um vidente com “bola de cristal” que erra muito. O futuro ilusoriamente imaginado não acontece. Essa é que é a verdade.
Talvez, parte dele, sim, mas nunca “ipsis litteris”.
Em relação a trabalho, emprego, profissão, vivemos um luto pela perda do imaginado. É o que vejo nos alunos de medicina. Na minha época, entrávamos na faculdade inspirados por um médico que nos atendeu. Para mim, foi marcante meu pediatra, Dr. Telmo Ilha.
Ultimamente, os alunos têm se inspirado não só nos seus médicos, mas também em seriados. Na faculdade, vão percebendo a realidade. No início, tendem a comparar a medicina imaginada com a real. Depois, param de comparar. Só existe, de fato, a medicina real.
E então vem a fase de adaptação ao mundo como ele é e a busca de gratificações que ele pode nos oferecer. Ao natural, os alunos tendem a procurar uma especialidade médica que combine com seu talento e que lhe proporcione momentos de “flow”. Por talento refiro-me à facilidade para aprender, e “flow” significa ficar tão absorvido pela atividade que há momentos nela que não se percebe o passar do tempo.
Na medicina, na psicologia, e creio que em todas as profissões, aliviar o sofrimento de uma pessoa é extremamente gratificante. Um advogado pode fazer isso, um engenheiro, um veterinário, um empresário. Essa é a grande gratificação que o mundo profissional real nos oferece.
Nossas relações amorosas também. Creio já passou a fase do “príncipe encantado”, da “deusa”. Todos estamos mais realistas. Sabemos que um pouco de paixão se faz necessário e é bom. Paixão demais significa que se perdeu o pé da realidade. Com a convivência, vamos nos adaptando e vendo o que um pode oferecer para o outro.
Os pais, em geral, criam expectativas exageradas, ilusões em relação aos filhos. É bom que desde cedo desistam de planejar como será a vida deles. Ajudá-los a ter uma infância feliz, uma adolescência segura, a desenvolver as qualidades humanas que podem ter, uma educação ampla, isso sim.
Enfim, o mundo adulto andará melhor se livre do “peso” das ilusões.
Quando os “Barcos ancorados”, obra de Edoardo de Martino (1871) exposta no Instituto Moreira Salles, entrarem no mar, os ventos, felizmente, assoprarão para bem longe as ilusões dos marinheiros.
Como confessou Quintana: “Meu saco de ilusões, bem cheio tive-o. Com ele ia subindo a ladeira da vida. E, no entretanto, após cada ilusão perdida… Que extraordinária sensação de alívio…”
Autor: Jorge A. Salton. Autor da crônica “A culpa não serve para nada”: https://www.neipies.com/a-culpa-nao-serve-para-nada/
Edição: A. R.