O aparente susto do tema para os alunos do ENEM
representa pouco frente às dificuldades que os surdos passam
em seu processo educacional. O silêncio, como um menino,
bate à porta das escolas e universidades.
Quer aprender e ser apreendido.

 

Mudara-me para um novo apartamento. Numa manhã, um menino vizinho bateu à minha porta. Abri e lhe disse “bom dia”. Me respondeu com silêncio. Ele era surdo, e eu não nada sabia de LIBRAS. Foi desconcertante.

Desconforto semelhante devem ter tido os participantes do ENEM na tarde do último domingo, ante o tema “desafios para a formação educacional para surdos no Brasil”.

Um susto para quem esperava escrever sobre homofobia, corrupção, ou sobre a censura à arte, mas nada de inédito para quem acompanha os temas sociais do exame nos últimos anos: 2015, foram as mulheres; 2016, pessoas que sofrem com a intolerância religiosa e racismo.

 

Em entrevista à reportagem do em.com.br, o professor Carlos Cristian conta que nasceu surdo e dá aulas de Libras há quase 7 anos. Para ele, a escolha desse tema é uma vitória para a comunidade surda.
Veja mais aqui.

“Especialistas” das redes sociais atiraram pedras sob o argumento de não ser relevante. Enganam-se. Uma rápida pesquisa no Google nos faz descobrir que há 360 milhões de deficientes auditivos no mundo e, segundo o Censo 2010, são 9,7 milhões no Brasil, quase 5% da população.

Talvez a única crítica foi a delimitação exagerada do tema: não a inclusão social em si, mas a inclusão educacional. Quase debate de especialistas. Mas o problema é importante, sim.

No Brasil, os surdos só começaram a ter acesso à educação com Dom Pedro II, que criou a primeira escola de educação de meninos surdos, em 26 de setembro de 1857, no Rio de Janeiro. Observe-se que apenas em 2002, pela Lei n° 10.436, a língua de LIBRAS foi reconhecida como meio legal de comunicação e expressão. Do mesmo modo, a Constituição de 1988, nos artigos 205 e 208, e a Lei de Diretrizes e Bases, nos artigos 4ª, 58, 59 e 60, garantem às pessoas surdas o direito de igualdade de oportunidade no processo educativo.

Todo esse suporte legal, contudo, não tem garantido aos surdos sua devida inclusão. Há poucas escolas e universidades com intérpretes e, quando existem devem atender a várias turmas. A situação piora em seminários, congressos e conferências. Isso sem contar que, em muitas instituições, os surdos são segregados das turmas regulares.

O aparente susto do tema para os alunos do ENEM representa pouco frente às dificuldades que os surdos passam em seu processo educacional. O silêncio, como um menino, bate à porta das escolas e universidades. Quer aprender e ser apreendido.

“Desafios para a formação educacional dos surdos no Brasil”, tema da redação do ENEM 2017 dividiu opiniões entre alunos e professores de todo Brasil. Confira reportagem.

Professores analisam o polêmico tema da redação

 

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