A nova geração de idosos é de dar inveja em muito jovem!
Eles fazem academia, viajam, vão a bailes, se reúnem para confraternizar,
para fazer ações sociais… Conheça as transformações que estão
acontecendo na forma de se lidar com o envelhecer

 

O que significa ser velho? É a idade que completamos depois de fazer muitos aniversários? Ou é um estado de espírito que faz com que tenhamos menos disposição? Será que a gente fica velho quando não dá mais pra esconder as rugas e os cabelos brancos? Ou isso não tem nada a ver com a velhice? Segundo a legislação brasileira, a idade de 60 anos é o marco para a identificação de uma pessoa idosa. Mas, segundo o Doutorando em Filosofia e Professor do Instituto Superior de Filosofia Berthier (IFIBE), Iltomar Siviero, para considerar uma pessoa como idosa é preciso levar em conta sua idade e suas condições de vida, pois ambos elementos estão interligados. “Com o avanço da idade surgem, naturalmente, os declínios típicos das transformações físicas, mentais e sociais. Pessoas em condições de vida precária tendem a ter esses fenômenos presentes ainda mais cedo do que a idade mínima estabelecida para o reconhecimento do ser idoso”, destaca.

Iltomar Siviero
Doutorado em Filosofia
Professor de Filosofia no Instituto Superior de Filosofia Berthier (Ifibe)

Segundo ele, as condições de vida são importantes porque interferem no envelhecimento tardio e até em evitar que certas doenças e demências se manifestem. Mas, por melhor que sejam as condições de vida, elas não atrasam os anos e, com o avanço da idade surgem, gradualmente, dificuldades e lentidão física, afetando diversos órgãos que desafiam as pessoas a buscar novos interesses e formas de relacionamento, impactando, de algum modo, na dimensão pessoal, social e mental/espiritual.

Apesar do ônus que acompanha o avanço da idade, os “novos velhos”, de quem queremos falar, tem aproveitado essa fase da vida de uma forma diferente – pois a forma de envelhecer se transformou e, nos últimos anos, passamos a ter uma preocupação maior com envelhecimento humano. Um bom exemplo dessa preocupação é o programa Maturidade Ativa, criado pelo Sesc, em 2003. Ele tem como objetivo promover a qualidade de vida e o envelhecimento ativo de pessoas com idades a partir de 60 anos (em 2019, será a partir dos 50 anos!). No programa, os participantes se reúnem para conviver, se divertir, confraternizar, aprender, desenvolver seus potenciais, além de realizar trabalhos comunitários e solidários. Esse é um movimento social, que tem por missão construir um novo significado para o envelhecimento, que valoriza o papel do idoso na sociedade contemporânea e estimula a realização de trabalhos comunitários, assim como a prática da responsabilidade social individual.

Em Carazinho, a Maturidade Ativa tem hoje 168 participantes em seu grupo. Eles se reúnem em todas as segundas-feiras para reuniões de continuidade – e seguem cheios de atividades durante a semana. Eles participam de palestras, bate-papos educativos e oficinas (de canastra, bocha, dança e cambio!). O grupo também é presença confirmada nas apresentações culturais promovidas pelo Sesc, como shows e teatros. Como se isso já não fosse o bastante, eles ainda fazem passeios turísticos em grupo e viajam pelo Rio Grande do Sul para visitar outros grupos de Maturidade Ativa. A próxima viagem da agenda é para Erechim, no dia 25 de outubro, para participar do Baile da Primavera.

Segundo o Facilitador da Maturidade Ativa do Sesc Carazinho, Guilherme Augusto Ferreira, os participantes do grupo são muito ativos e querem participar de todas as atividades promovidas. “Muitas vezes nos surpreendemos com a participação deles. Às vezes está um temporal, achamos que ninguém virá na reunião e logo mais de 100 pessoas chegam. Nós ficamos muito felizes de ver que eles têm um envelhecimento tão ativo”, ressalta.

Uma das integrantes do grupo, Dona Dalila, não deixa de participar de nenhuma atividade. Aos 94 anos, ela vem com seu andador e é presença confirmada nos eventos da Maturidade Ativa. “Ela e todas as pessoas que participam do grupo são um grande exemplo para nós. O nosso objetivo é promover a qualidade de vida aos idosos, junto a um envelhecimento ativo. Eles se reúnem para se divertir, confraternizar, realizar trabalhos comunitários e, cada vez, mais valorizar o papel do idoso na sociedade”, enfatiza.

 

O grupo também realiza diferentes ações sociais. No mês de setembro, em parceria com o projeto Brasil Sem Frestas, de Passo Fundo, realizou uma ação para revestir internamente a moradia de uma família carente de Carazinho, em que caixas de leite foram utilizadas para proteger a casa das intempéries do tempo. Os idosos ajudaram e se emocionaram com a história da família.

Como lidar com o envelhecer?

Envelhecer é algo natural e intransferível, que, inevitavelmente, acontecerá com todos nós com o passar de cada dia. Porém, aprender a envelhecer é algo cultural. Segundo Iltomar, para que possamos ter uma relação melhor com a velhice, não podemos ser logrados pelos anos e nos depararmos com ela somente na fase tardia, mas ao longo da vida. “Inserir o envelhecimento humano como uma diretriz e componente curricular nos sistemas de ensino é um dever que precisa ser implementado, a exemplo de portarias publicadas em períodos recentes sobre outros temas ausentes (educação em direitos humanos, educação ambiental e educação para as relações étnico-raciais)”, sugere.

Quando aprendemos a lidar com o envelhecer, não é difícil passar dos 100 anos e ainda manter o bom humor. Assim é a Esther Sauner Barrozo, que completou 102 anos! A família conta que em todos os dias ela acorda feliz, sempre com vontade de fazer alguma coisa! “Atualmente ela cuida da sua saúde e alimentação. De vez em quando até faz uns pontinhos de crochê e está sempre querendo plantar e cuidar das flores do seu jardim. Tem sempre alguém por perto: as filhas e as cuidadoras que se revezam para estar com ela 24h por dia. Ela ama a todas e quer bem as pessoas que lhe ajudam no seu cotidiano”, conta a família.

Esther tem 7 filhas e 2 filhos, 18 netos, 4 bisnetos e 2 tataranetos. A família é grande e está sempre presente em sua vida. “É um convívio intenso! Além da família, ela também recebe muitas visitas de amigos e vizinhas que gostam de visita-la, afinal, ela é um exemplo de vida!”. Para chegar até essa idade com tanta alegria, não tem segredo! Esther sempre levou a vida de forma muito tranquila. Sempre manteve a alimentação saudável e fazia caminhadas diárias. Os trabalhos em crochê eram feitos com frequência até os 101 anos. Além disso, o bom humor sempre foi (e continua sendo) uma constante em sua vida!

É preciso pensar no futuro

Na segunda metade do século XX, aconteceu um crescimento populacional gigantesco, tanto em âmbito mundial, quanto nacional. No intervalo do século passado, de 1900 a 2000, passamos de 1,5 bilhão para 6 bilhões de pessoas no mundo. E a população brasileira passou de 17,3 milhões para 169,8 milhões, sendo que o período de maior crescimento foi pós-guerra, entre 1950 e 1970, que resultam num volume elevado de idosos/as no século XXI, considerando que hoje no Brasil, segundo dados do IBGE, somos 207,7 milhões de pessoas (Senso 2016).

Com o crescimento populacional, consequentemente, cresceu o número de idosos. Em 1940 essa população representava 4,1% do total, e em 2016 a porcentagem aumentou para 14%. A expectativa de vida mudou de 43,3 anos de idade em 1940 para 72,5 em 2007 e 75,2 em 2017; estima-se que em 2050 teremos um número bem mais elevado de idosos do que jovens, pois, comparando aos anos de 1980, em que tínhamos 10 idosos para cada 100 jovens, em 2050 teremos 172 idosos para cada 100 jovens. “Face a esse contexto, grosso modo, listamos que tem crescido o interesse por estudos e pesquisas, necessidade de maior investimento público, maior oferta de serviços e lazer da iniciativa privada, preocupações e impactos no âmbito da família que passa a ser a primeira atingida por essa realidade. Mas a realidade gritante dos descasos e falta de uma política pública séria e contextualizada vai tornando o envelhecimento, lamentavelmente, como um peso e um problema diante da necessidade de gastos com saúde e previdência, em especial. Bastaria olhar as estimativas e pensar políticas de médios e longo prazo, que extrapolem medidas paliativas de um projeto de governo. Precisa-se de um projeto público que leve a sério essa realidade”, alerta o Professor.

Breve história do envelhecer em Passo Fundo: memória, testemunhos e crônicas

O livro, publicado pela Editora IFIBE (selo SALUZ), teve como organizadores: Iltomar Siviero e Agostinho Both. Ele retrata a rica trajetória do caminho percorrido por jovens, adultos e idosos em vista da atenção à condição humana da velhice de muitas pessoas de Passo Fundo, mostrando os grandes feitos do passado e do presente, abrangendo o período de 1989 a 2017. Os textos foram produzidos por diversos autores, representantes das instituições envolvidas na organização de ações em favor dos idosos da cidade e região. Além de uma possibilidade para angariar maior conhecimento sobre as iniciativas em favor do envelhecimento humano em Passo Fundo, também subsidia interessados em dar passos na direção da criação e oferta de oportunidade para o convívio social em vista da promoção e resgate da cidadania das pessoas idosas.

Crédito fotos: Felipe Granville/divulgação Sesc Carazinho.
Matéria originalmente publicada na Revista impressa Contato Vip, Ano XXV, número 286, Outubro 2018. Conheça mais aqui.

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