Pais jardineiros ou carpinteiros: quais são vocês?

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Cheguei à centésima postagem neste site. Que as águas do meu rio possam chegar até você, querido leitor, e dizer obrigada mais uma vez pelo seu carinho. Sem você não faria sentido escrever todos os fins de semana para um site tão maravilhoso o quanto o de Nei Alberto Pies! Este texto é sobre um dos temas que gosto de escrever: nossas queridas crianças.

Quero começar o texto de hoje com uns versos do poema da nossa querida escritora Ruth Rocha intitulado “Os direitos da criança” que nos diz “Toda criança no mundo / Deve ser bem protegida / Contra os rigores do tempo / Contra os rigores da vida.” A proteção, o amor e o cuidado devem estar sempre nos olhos e nos braços de quem cuida de uma criança.

Não se educa com rigor e sim com amor, não se impõe com autoridade, mas se pede com carinho.

Toda criança quer ser amada e respeitada. Muitas vezes amamos tanto que não sabemos dizer não para elas e acabamos as “mimamos” ao nosso modo, e que bom que ainda existem pais assim que deixam os seus filhos correrem, pularem, brincarem na areia, subirem em árvores e contarem as estrelas. Estamos perdendo este encantamento do mundo natural ao nosso redor e as nossas crianças estão ficando robotizadas presas em telas de aparelhos celulares.

Elas já não têm mais tempo para olhar à natureza ao seu redor. Faz tempo que não vejo um menino ou menina brincando com a lua e as estrelas, querendo ser astronauta para chegar até o planeta Marte ou desbravar a nossa galáxia como um bom homem ou mulher espacial. Não, elas não olham mais para cima e nem para os lados. Elas olham tão somente para baixo onde se encontra uma tela azul que prejudica a visão e o pensamento cognitivo. É triste isso, mas é a nossa verdade.

Alguns pais, preocupados e assustados, lotam os consultórios psicológicos atrás de respostas. Outros, aqueles que chamo de tiranos, tiram os celulares das mãos dos filhos para que nunca mais fiquem com notas vermelhas no boletim escolar, como se isso fosse resolver um problema sério de leitura e contagem no ensino fundamental um e dois. Muitas crianças ainda estão aprendendo a serem disciplinadas e a descobrirem novas coisas, pois o novo atrai e encanta. Sempre foi isso e continuará sendo conosco e com as nossas crianças esse encantamento do novo e talvez por isso elas exagerem tanto no tempo em que ficam atrás da tela do celular.

Estamos realmente preocupados com as nossas crianças? Permitimos que ajam do jeito que quiserem e tenham autonomia para decidir sobre as suas vidas? Sim, porque não é bom que ditamos isso e aquilo para que a criança faça sem darmos um pouco de espaço para ela decidir e escolher o que é melhor para si. A criança precisa poder pensar, refletir, criticar e opinar sobre o que estamos lhe propondo. Faz parte do bem-viver e do seu amadurecimento.

Nas minhas andanças pelo Brasil a fora ainda encontro pais preocupados com o amadurecimento do espírito das suas crianças, aqueles que podem ser chamados de “pais jardineiros”, ou seja, os que cuidam e respeitam a essência da criança. Os que sabem que um ser pequenino ainda em formação não vai compreender muita coisa desse mundo caótico e irresponsável no qual as colocamos. A partir do momento que queimamos e desmatamos as nossas florestas, matamos animais em extinção e proclamamos ódio na Internet deixamos de ser responsáveis para com a humanidade.

Cuidar e amar andam juntos. É preciso saber que aquela criança não está preparada para ouvir gritos, pois os seus ouvidos ainda em formação podem chegar a doer, que o seu espírito não compreende certas ordens que lhes damos porque para elas o mundo é uma brincadeira e tudo serve como brinquedo. Por que crianças quando pegam lápis de colorir saem riscando as paredes e tudo o que encontram pela frente? Elas estão brincando com os lápis. Não têm ideia de que não podem riscar as paredes e que não podem se pintar de tinta. Elas não entendem bem o nosso “não pode fazer isso” e quando repetimos muitas vezes essa expressão para elas começam a nos repetir como se fossem pequenos robôs. Que triste é uma criança que só sabe perguntar “não, mamãe?”, assustada com a repreensão ou o castigo que virá se contrariar as ordens recebidas.

Os “pais jardineiros” estão sempre felizes e são como verdadeiros jardineiros a cuidarem de um jardim frágil e cheio de botões prontos para desabrocharem a qualquer momento. Se não souberem cuidar direitinho as flores vão murchar e até podem fingir-se de mortas só para nos deixar atordoados, contrariados e preocupados ou podem morrer verdadeiramente com a falta de cuidados.

As nossas crianças querem amor e cuidados para sempre. Até nós, adultos e velhos, precisamos disso. Quando somos tratados como flores por jardineiros queridos acreditamos mais na gente, confiamos mais nas pessoas ao nosso redor e não sofremos tanto com as nossas perdas porque sabemos que o jardineiro logo chegará para cuidar de qualquer mal que nos fizerem.

Os pais jardineiros respeitam a essência da criança, o ser da criança que chega vazio ao mundo e vai aos poucos sendo preparado para receber amor e cuidado nos primeiros anos de vida e só depois conhecer outras coisas ao seu redor. São os primeiros dias do bebê que precisa de cuidados especiais e sentir-se amado e protegido nos braços da mãe.

Os pais jardineiros simplesmente amam.

Eles não exigem que as crianças se comportem e se vistam como desejam. Tudo é combinado. Em tudo existe um diálogo aberto e as crianças têm o direito de opinar e tirar as suas dúvidas. Nada é colocado à força no pensamento da criança ou desce goela abaixo sem antes ela mastigar. Esses pais sabem como ninguém que é preciso respeitar a autonomia da criança não educando todas do mesmo jeito, mas sabendo que cada uma delas é dotada de uma essência diferente, de uma subjetividade própria de um ser único no universo.

Durante a infância somos sempre incompreendidos pelos adultos.

Não conseguem descobrir os motivos dos nossos choros e medos. Permitem que as pragas e o sol quente queimem e destruam as nossas folhas e flores sem se darem ao trabalho de sentirem as nossas dores. Esse é um pai jardineiro despreparado. Precisa ainda fazer um curso para cuidar bem das suas flores, mas apesar de tudo sabe que elas, as flores, são frágeis e necessitam dele.

Existem pais jardineiros que não conseguem organizar as suas vidas e deixam as suas crianças ao Deus dará. Elas perdem a hora das refeições, não fazem a lição de casa e vão dormir tarde demais. Eles sabem que as crianças estão felizes e isso é o que importa. Tudo bem, tudo bem, são pais que cuidam e amam, porém todo cuidado e todo amor devem ter limites. A criança não pode sair por aí gritando com todo mundo pelas ruas ou xingando o seu amiguinho.

Os pais jardineiros sabem contar histórias bonitas. Muitos inventam as suas próprias histórias e isso é lindo. Conseguem fazer das lembranças das suas infâncias histórias bonitas para as crianças ouvirem e pedirem para repetir até se cansarem e adormecerem. Esses pais sabem que as histórias contadas não devem amedrontar ou serem moralistas. Elas devem simplesmente distrair os espíritos das crianças para que possam dormir bem e ter lindos sonhos. A interpretação e a compreensão da história ouvida deve ser deixada a critério da criança e não ensiná-la o que é o bem ou o mal como se fôssemos donos da verdade.

Não queira ser um pai jardineiro trazendo para casa brinquedos caros e roupas de grife. As crianças gostam da simplicidade. Se elas forem acostumadas a um mundo que mais tarde você não poderá oferecer para elas a dor será maior. Ofereça apenas o que está ao seu alcance. Procure sempre fazer brinquedos com produtos recicláveis e mostre para a sua criança a importância de cuidar do mundo e da natureza.

Quando possível leve a sua criança para brincar num parque, se sujar na areia e abraçar as árvores. O contato com a natureza faz com que as crianças cresçam mais saudáveis e responsáveis pelo meio ambiente.

Ser um pai jardineiro é cuidar de um jeito bem especial permitindo que a criança participe das decisões da família. Sim, afinal ela é um membro importante da casa e muitas das decisões tomadas afetará a sua rotina. Ela precisa saber por exemplo, por que não pode mais brincar na rua com os amiguinhos e por que a vovó foi morar tão longe. Essas informações devem ser verdadeiras e sinceras. Ou a criança perderá a confiança naqueles que tanto ama.

Na minha criancice a creche era chamada jardim de infância. E eu estudei num jardim.

Depois de grande fiquei a me perguntar por que o nome jardim se não éramos flores e se não tinham flores naquela escolinha de paredes feias e quase sem ventilação dentro dela. Não tinha sequer um vaso de flores em cima do birô da professora, e por isso eu não tinha vontade de ir para o jardim. Sim, eu não sentia vontade de ir para aquele lugar onde eu ficava longe dos meus brinquedos e da minha família amada. Mas, eu amava a minha professora e os meus amigos.

Hoje, descobri que o meu jardim de infância era chamado assim porque nós éramos como flores e precisávamos de cuidados especiais para não crescermos assustados com os problemas do mundo. Infelizmente apesar de todo o cuidado da minha professora, apesar do seu carinho que sempre ficou demonstrado nas brincadeiras e músicas que cantávamos eu cresci assustada com aquelas paredes feias do prédio onde funcionava o meu jardim de infância. Era tudo muito feio e o que havia de boniteza era a gente e a professora. Eu nem dava por isso, pois nunca me achei uma criança bonita, contudo achava os meus amiguinhos belos com os seus sorrisos e sapatos de couro a correrem pelo corredor do nosso jardim de infância.

O meu jardim de infância marcou a minha vida de várias formas, uma delas é a de que existem lugares feios, mas rodeados por uma gente bonita e alegre que só precisa de um incentivo ou empurrão para realizarem os seus sonhos. Assim, aconteceu comigo.

O meu jardim de infância tinha paredes mal pintadas e um banheiro escuro, com pouca iluminação na sala de aula e uma área com areia para a gente brincar sem sequer um balanço ou escorrego. Foi ali onde eu aprendi que precisaria lutar muito para vencer na vida e realizar os meus sonhos de menina de periferia que sonhava em ser uma princesa e a minha mamãe dizia que eu seria o que quisesse porque ela cuidava de mim como se cuida do botão de uma flor.

Creio que as creches, este nome feio e sem graça, deveriam voltar a ser chamadas de jardim de infância, porém com prédios bonitos e cheios de flores humanas e verdadeiras dentro deles. No jardim de infância eu aprendi a compartilhar o meu lanche com o amiguinho e a ter menos medo de tudo o que estava perto de mim.

Eu fui uma flor assustada com quase tudo, mas cresci entendendo que amar ao outro era a única forma que encontraria para curar os meus medos. A minha mãe jardineira fiel cuidava de um jardim com apenas uma flor que vez ou outra se despetalava toda e murchava assim do nada, mas a minha jardineira tinha a sabedoria de adubar com cuidado e diálogo o seu jardim e eu, a flor que a preocupava, com o seu amor cresci pronta para enfrentar um mundo competitivo e desafiador.

Não fui colocada numa redoma. Precisei enfrentar o sol, os perigos das pragas e as tempestades. A mamãe dizia que era preciso conhecer as intempéries do mundo desde a tenra idade.

Os pais jardineiros conhecem as necessidades das suas crianças e respeitam o ser e o não-ser de cada uma delas. Eles esperam pelo devir dos seus filhos com grande paciência. Esse devir-criança acontece a cada amanhecer e nos surpreende com as descobertas e mudanças apresentadas por elas nas suas perguntas e comentários. O existir é tão somente está aqui neste lugar, mas o devir é algo que se movimenta e alimenta a criança de esperança para um crescer potente e fazendo do existencialismo experiência única.

Falamos aqui do existencialismo de Sartre que investiga o ser e o nada, com categorias filosóficas que atendem ao pensar crítico e reflexivo da criança com uma consciência de si dotada de imagens que se formam a partir das suas experiências, sendo agentes das suas vidas e merecedoras de atenção e cuidados comprometidos com o respeito a este ser que desabrocha em cada olhar e palavra aprendida ou com o nada que se forma a partir do que interroga um ser vazio, mas pronto para receber as ideias que o mundo lhe apresenta e processá-las no seu pensamento crítico e reflexivo.

Enquanto os pais jardineiros amam e cuidam das suas flores do jeito que são temos outros tipos de pais que se preocupam em fazer com que os seus filhos sejam parecidos com eles ou pelo menos tentam lapidá-los ao seu benquerer que são os “pais carpinteiros”. Os pais carpinteiros se preocupam em moldar as suas crianças para ficarem parecidas com aquilo que querem ou com o que acham melhor para eles.

Acredito que pelas revoluções que o mundo contemporâneo nos apresenta todos os dias e pelas exigências que nos são impostas cada vez mais, há uma tendência a encontrarmos mais pais carpinteiros atualmente do que jardineiros. Isso porque vivemos num mundo competitivo, num mundo onde as flores não devem ser apenas belas, mas devem ir em busca dos seus sonhos e brigar por eles com todas as suas forças, muitas vezes sendo antiético e infringindo regas e normas.

Os pais carpinteiros também amam e cuidam das suas crianças.

O único problema é que eles querem que elas sejam iguais ao que eles desejam. E as crianças como já disse são autônomas. O ser da criança em formação decide o que vai absorver para o seu amadurecimento e o que vai descartar.

As crianças com pais carpinteiros tendem a crescer preocupadas em grandes conquistas. Muitas vezes essas exigências acabam prejudicando o desenvolvimento emocional da criança. Só para citar um exemplo, conheço um pai carpinteiro que tem apenas um filho e o ama por demais. Pelo seu filho, é capaz de tudo.

No entanto, o seu filho não alcançou êxito na seleção para uma escola técnica federal da minha cidade e este foi proibido de brincar com os seus amigos e ficar dentro de casa apenas estudando. O garoto se distanciou por completo dos seus amiguinhos e não tinha mais vida própria. Cresceu assustado. Tornou-se um adolescente com medo de participar de exames de seleção e entrevistas pelo fracasso que sofreu na adolescência. Entrou em depressão e só se curou depois de alguns anos.

Esse pai carpinteiro queria que o seu filho obtivesse êxito na vida acadêmica conforme ele sempre sonhou, mas a criança não estava preparada para tal êxito e frustrou toda educação que o pai lhe deu sendo reprovado numa seleção em que o pai tinha a certeza de que ele seria aprovado por ter educado o filho nos melhores colégios da região.

Alguns pais carpinteiros acabam criando um mundo niilista para os seus filhos, ou seja, desprovido de qualquer crença porque estão assustados com tantas cobranças e as crianças acabam não acreditando mais em nada quando começam a ver as suas derrotas e fracassos. Se sentem menos do que os outros. Sentem tristeza e abandono por parte dos pais que se enraivam com eles porque não atendem as suas expectativas.

Não podemos exigir que os nossos filhos conquistem as mesmas vitórias que conquistamos quando jovens, pois as coisas mudaram, tudo está diferente, o mundo globalizado exige que as crianças cresçam muito rapidamente e passem a exercer responsabilidades para as quais não estão preparadas.

As cobranças que fazemos o tempo todo para as nossas crianças, os desafios que as damos, são coisas difíceis de serem processadas nos seus pequenos espíritos. Elas não sabem lidar com um mundo onde é preciso ser o melhor em tudo para ganhar o seu amor, pai ou mãe.

Sim, não demonstrem que amam ou seus filhos apenas nas vitórias.

Eles precisam de amor em todos os momentos e mais ainda quando perdem algo ou não são considerados suficientemente bons para exercer uma atividade. Deixe que eles decidam o que querem fazer. Tenho uma amiga que cuida do seu sobrinho que tocava piano muito bem, mas de uma hora para outra motivado pelos amigos decidiu jogar futebol. Todos na família acharam legal e o incentivaram, mas ele não é um bom jogador e sabe disso. Chega em casa frustrado sempre que tem um jogo e a família está deixando que ele perceba isso e decida fazer outra coisa.

Ninguém pode ser igual a nós, e não podemos exigir que os nossos filhos sejam parecidos conosco ou ficaremos ansiosos e decepcionados quando eles tomarem outros caminhos. É por isso que muitos jovens se tornam rebeldes. A rebeldia é mais do que tudo um grito de alerta para os pais que querem moldá-los do jeito que pensam. As crianças sabem o que é melhor para elas quando vão se tornando maiorzinhas. E o que é melhor para as nossas crianças é um mundo cheio de felicidade, esperança e amor.

Não adianta o seu filho ser o campeão sempre e não ser feliz.

Conheço uma criança que já ganhou várias medalhas na natação e nem por isso se sente feliz diante dos amigos. É tímida, assustada, medrosa e cheia de problemas emocionais. Desde bem pequenina foi incentivada para vencer os seus adversários e quando não vencia os pais não a abraçavam com o riso da vitória. Ela sempre sentiu isso e me falou “gosto quando meus pais me abraçam sorrindo quando ganho, pois quando perco eles nem vem pra junto de mim”. Foi o que ela me disse e talvez seja o que ela sente.

Os pais carpinteiros estão muito preocupados com o futuro dos seus filhos. Eles querem que as crianças cresçam rápido para lhes mostrarem os seus talentos. Parece que as crianças se tornam troféus para esses pais que saem mostrando as fotos dos filhos com os pescoços cheios de medalhas. Não obstante, aquele que não consegue êxito em quase nada é esquecido, fica no canto da parede sozinho e triste por não receber a atenção que tanto necessita.

Alguns pais têm vergonha de falar dos fracassos dos seus filhos. Claro que nenhuma criança pode ser considerada fracassada só porque não se sai bem na matemática ou na leitura. Cada um de nós é dotados de uma essência que nos forma e nos constitui como seres materiais e espirituais ligados um ao outro que precisam estar em completa harmonia. Não é o caso de a criança campeã ser feliz ou o caso da criança que não se sai bem na escola ser triste o tempo todo, somos nós que exigimos que elas se sintam assim.

Já perceberam isso? Somos nós que ditamos o que as nossas crianças devem sentir. Nós, os seus tiranos, os pais carpinteiros que queremos que elas sejam a nossa semelhança quando nunca nos preocupamos no que os nossos pais queriam verdadeiramente de nós que crescemos felizes e livres para fazermos as nossas escolhas.

Só para citar mais um exemplo, outro dia conversando com um amigo advogado ele me disse que o pai sempre quis que ele estudasse direito, mas a sua paixão era letras. E fez o vestibular escondido do pai. Na hora do resultado o pai soube da escolha contrária ao seu desejo e ficou um bom tempo sem falar com ele. O meu amigo sentia-se feliz e realizado no seu curso de letras, o pai seguia enraivado. Depois do pai morto, o meu amigo disse que sentiu algo estranho por não ter realizado o sonho do pai e foi fazer uma faculdade de direito só para agradá-lo na vida eterna.

São essas expectativas que criamos e introjetamos nas crianças que trazem traumas e dificuldades para um viver pleno na idade adulta. O meu amigo só veio sentir-se bem depois de fazer o curso de direito que o pai tanto desejou. Não devemos exigir nada dos nossos filhos. Deixemos que eles decidam o que querem ser quando se tornarem adultos. Deixemos que eles sigam os seus próprios caminhos.

Não é à toa que vemos tantos filhos de médicos e juízes seguindo a mesma profissão dos pais. Muitas vezes é amor e escolha mesmo, mas algumas vezes é imposição dos pais. Você vai dar continuidade ao meu nome. É assim que se colocam os pais carpinteiros.

Nem todos são assim, mas a grande maioria. Isso era muito visto antigamente quando os filhos seguiam sempre as mesmas profissões dos pais, hoje as coisas já estão mudando porque já não existe mais tantas cobranças e que bom que está havendo mudanças porque devemos seguir o caminho para o qual temos amor e assim possamos nos dedicar aos nossos estudos e trabalho com os cuidados devidos e necessários.

Acredito que depois de ter falado um pouco de pais jardineiros e pais carpinteiros vocês tenham entendido a diferença. E que não sejamos nem muito uns nem muito outros, mas um pouco de cada um. Não culpemos os pais jardineiros por amarem demais as suas crianças e permitirem que eles se sujem na areia do parquinho, assim como não culpemos os pais carpinteiros por quererem moldar as suas crianças.

A verdade é que o amor e o cuidado são os mais importantes em qualquer formação da criança. Que a criança possa ter autonomia para decidir o que é melhor para si e possa sempre ser ouvida. O que importa nessa vida competitiva é ser uma flor pronta para as perdas e as vitórias. Que percamos as folhas no outono e as achemos na primavera sempre uma por vez.

Finalizo o texto de hoje com uns versos do poema de Rosana Rios intitulado “Guarda-chuvas” que nos diz “Tenho quatro guarda-chuvas / todos os quatro com defeito; / Um emperra quando abre, / outro não fecha direito.” Não importa quantas crianças nós cuidamos e damos amor, e se todas elas estão florescendo felizes e autônomas ou se estamos moldando-as para que cresçam do nosso jeito.

Deixemos as nossas crianças crescerem como os guarda-chuvas de Rios todos com defeitos ou não, o importante é que os amemos como são e não como desejaríamos que fossem, afinal a chuva sabe como cair na terra.

NOTA: com este ensaio chego ao meu post de número 100 no site de www.neipies.com

Coloco-me como uma colaboradora secular que em cinco anos conseguiu escrever sobre muitas coisas legais, pois no meu meio século de existência conheci árvores que me inspiraram a viver por milênios e vivo a procurar o elixir da longa vida. Eu só tenho a agradecer ao Nei Alberto Pies e aos seus leitores que também são meus pelo carinho de sempre. Comecei escrevendo histórias para crianças, depois sobre educação, meio ambiente, filosofia, sociologia e atualmente escrevo sobre filosofia da infância.

Que esta parceria linda possa continuar por muito tempo e que em breve eu complete o meu texto de número 1000 porque é o meu número da sorte. Grata a todos pelas leituras!

A vida é como um texto que a gente nunca termina de escrever e o ponto final para mim é apenas para dizer a você, querido leitor, que estou indo apreciar o mar, mas logo, estarei de volta cheia de meninos e meninas, árvores, salas de aulas, filosofias e literatura para deixar este mundo mais belo através de uma história que se conta em forma de ensaio literário. Hoje eu quero ser a sua contadora de histórias secular. Amanhã talvez a milenar se continuar com a saúde e a disposição que tenho hoje para escrever rodeada pelo meu cajueiro e pelo meio rio Potengi que vem desaguar quase nos meus pés.

Que as águas do meu rio possam chegar até você, querido leitor, e dizer obrigada mais uma vez pelo seu carinho. Sem você não faria sentido escrever todos os fins de semana para um site tão maravilhoso o quanto o de Nei Alberto Pies!

Autora: Rosângela Trajano

Edição: Alexsandro Rosset

5 COMENTÁRIOS

  1. Parabéns, Rosangela Trajano. Li com muita facilidade, aproveitando cada parágrafo, cada colocação bem feita que você fez. Texto esclarecedor, a respeito da difícil arte de educar. Achei muito interessante quando você citou que os pais atuais , dessas crianças da época globalizada, não se importaram com o que seus pais pensavam ou sentiam, com relação às suas escolhas. Por quê não permitem aos seus filhos esse direito de escolha, tão saudável? Aplausos! Assma Gabriela

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