Pedagogia: por glamour ou por amor?

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Defender a educação como direito fundamental se faz no dia a dia e na compreensão de que cada ser envolvido no processo de aprendizagem está atravessado por contextos e questões que precisam ser considerados, por vulnerabilidades e precarizações dirigidas. Não é somente uma questão de querer.

Eu não comecei na Pedagogia amando o curso, pelo contrário, a decisão em cursar no primeiro momento foi pura e concretamente influenciada pelo fato de no ano anterior, ter ouvido falar que o salário de uma Pedagoga seria de 3 mil reais. Foi isso: uma menina do interior sonhando em cursar faculdade que ouviu que talvez pudesse receber uma quantia que jamais fez parte da renda da sua família.

Essa é a minha história inicial com a Pedagogia, pouco glamourosa, tampouco com pretensão de vocação mas carregado da realidade que vivia. É mais ou menos esse o sonho do pobre, uma ousadia em querer estar na academia mas nunca esquecendo do que a vida toda está presente: saco vazio não para em pé, tampouco estuda.

Me apaixonei pela Pedagogia tardiamente e acho que foi um processo de descoberta e encantamento bonito de quem começa a entender que tem voz e pode dizê-la no mundo. Acho que isso foi uma das coisas que me transformou imensamente: ser escutada e, no acolhimento da palavra, poder me fazer cidadã nesse mundo.

A minha língua pouco formal – e com poucas travas em alguns momentos – me fez ter a possibilidade de questionar o que antes era pouco nítido pra mim. De cara, já um outro fato: eu não cabia numa pedagogia de hierarquias, numa cultura escolar que não compreende o exercício da palavra, da escuta e da acolhida como fundamentais para qualquer processo educativo e, assim, nascia também alguém apaixonada pela Pedagogia Social.

Nesses anos passei por escolas, ONGs, comunidades, clínicas, prefeituras e prisões. E em cada lugar me construía um pouco mais gente. Acho que, também, um pouco mais escutadora e admiradora da vida de cada pessoa junto a possibilidade de ouvi-las ou, como disse Edivânia (uma Pedagoga social por quem tenho profunda admiração), de “pisar o solo sagrado do outro”.

Há dias que me sinto uma fraude de Pedagoga, dias que se Paulo Freire me visse só ia baixar a cabeça e a balançar negativa e levemente enquanto coçava sua barba branca e me julgava interiormente. E isso é parte do processo eu acho, poder me olhar e ver o quanto ainda preciso aprender e melhorar, dar-me conta das contradições que ainda estão presentes e como construo caminho em busca de superá-las.

Carrego essa a certeza que a Pedagogia não é neutra e, se a concebo assim, é por perceber os constantes ataques que sofre a educação pública.

Precarizar a educação é um projeto político muito bem situado e com intenções bastante nítidas e da educação infantil ao ensino superior, muitas vezes, o que está em jogo é o poder.

Defender a educação como direito fundamental se faz no dia a dia e na compreensão de que cada ser envolvido no processo de aprendizagem está atravessado por contextos e questões que precisam ser considerados, por vulnerabilidades e precarizações dirigidas. Não é somente uma questão de querer.

Digo com convicção que todo processo de aprendizagem não é neutro porque tento estar constantemente no furacão da práxis. De agir, refletir, avaliar, transformar. E que, para isso acontecer, preciso estar totalmente presente, atenta e sensível com o que bell hooks chama de abertura radical, essa “disposição para explorar diferentes perspectivas e mudar a mente conforme novas ideias são apresentadas”.

Muito cedo na pedagogia assumi esse compromisso político com a educação (de vários modos e em diferentes instâncias) e que depois percebi que sempre atravessou minha vida e permitiu que eu me sonhasse acadêmica e formada.

Sonhar é alimento para criança curiosa transformar o mundo.

Tenho sonhado e esperançado muitos mundos com crianças, jovens, adultos, comunidades, prisões.

De um continente a outro, da sala com estrutura de aço e cimento à sombra das mangueiras: piso firme mas gentil em todo solo e peço licença para construir junto.

Viva a Pedagogia Libertadora!

Fotos: Divulgação/arquivo pessoal

Autora: Helena Schimitz. Também escreveu e publicou no site “Escrever para quê (em): https://www.neipies.com/escrever-para-que-em/

Edição: A. R.

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