Luciana Marinho Albrecht é natural da capital Porto Alegre e mora há mais de uma década em Passo Fundo, RS.
Como escritora e contadora de histórias, tem uma atuação e presença importante no mundo cultural e educacional de nossa cidade e na região norte do RS.
Participa de grupos literários, escreve livros, ama literatura e gosta de incentivar iniciativas de outras pessoas, especialmente as mulheres, no protagonismo da escrita e da produção literária, pesquisadora nas áreas de esclarecimento e combate ao bullying e educação para paz.
Conheçamos Luciana Marinho Albrecht por ela mesma.
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SITE NEIPIES: Quando, como e porque você se envolveu com literatura?
Luciana Marinho Albrecht: Acredito não poder traçar uma linha do tempo muito precisa, pois a literatura é minha amiga íntima desde a infância. Era uma criança curiosa, questionadora e inquieta, características que ainda me acompanham na vida adulta, e a literatura me ajudava a encontrar respostas que eu queria muito a respeito da vida, do mundo, a viajar sem sair do lugar, a acalmar a alma.
Como sou filha de professores tive o privilégio de ter um acesso facilitado aos livros. Minha mãe, professora de português foi sempre minha maior incentivadora de leituras e de escrita, uma vez que meu sonho de infância sempre foi ser escritora. Porém na minha época de juventude a escrita era vista mais como um hobby ou uma profissão acessória de jornalistas, advogados e outras profissões mais “badaladas”, então a princípio pensei em cursar jornalismo, plano que foi cancelado após uma gravidez precoce, aos 18 anos.
Pelos caminhos da vida e da necessidade de sustento acabei cursando uma faculdade bem diferente e de forma tardia, a de Administração de empresa, já aos 26 anos e exercendo uma profissão mais técnica por muitos anos.
A literatura e a escrita, porém, nunca me abandonaram, segui estudando de forma auto didata, escrevendo e planejando novos rumos. Aos 39 anos me lancei de forma profissional e independente na literatura infantil com a obra A Estrela Pequenina, ilustrada por Giovani Rodrigues, atualmente em segunda edição. O livro e o meu trabalho foram tão bem acolhidos pelo público, por professores e escolas, que dois anos depois lancei O Procura Encrenca, também infantil, ilustrado por Raíssa Bulhões e não parei mais, tem muita novidade ainda por vir.
SITE NEIPIES: Nasceste e te criaste em Porto Alegre, nossa capital. A capital tem oportunidades artísticas, literárias e culturais bem intensas e diversificadas. Como foi chegar a Passo Fundo? Qual é a diferença cultural mais marcante em relação à Porto Alegre?
Luciana Marinho Albrecht: Sim, é verdade, faz quinze anos que larguei minha terra natal e aqui cheguei. Mesmo não trabalhando com literatura diretamente nos anos em que morei em Porto Alegre, sempre tive muita ligação com a arte de um modo geral, estudei teatro por dois anos e sempre participei de saraus, exposições, etc. Minha adaptação aqui foi difícil, preciso ser sincera, Passo Fundo na época tinha um ritmo bem diferente.
Há quinze anos atrás tudo fechava ao meio dia, não existiam parques, praças, espaços públicos de lazer e cultura de qualidade e o shopping ainda estava se desenvolvendo, o passo-fundense era um pouco reservado, principalmente com gente de fora e eu chegava aqui com um filho pequeno, um segundo casamento, não foi fácil. Mas por outro lado fui bem acolhida, fiz grandes amizades, fui me informando sobre os espaços culturais e fiz parte do movimento escoteiro que ajudou demais a decisão de firmar residência aqui, e foi maravilhoso e espantoso ver o crescimento e o desenvolvimento da cidade, sobretudo nos últimos 8, 9 anos. A acolhida que a comunidade escolar teve para com minhas obras jamais esquecerei.
SITE NEIPIES: O que mais realiza e te desafia como escritora de literatura infantil?
Luciana Marinho Albrecht: Cada olhar de criança e mesmo por parte dos adultos cheio de encantamento, com aquele brilho de quem vê algo especial no livro ou na contação de história me realiza. Quando as pessoas me reportam suas experiências, sentimentos, sensações com meus livros, histórias, textos ou poesias isso me faz querer continuar nessa estrada literária.
Os desafios para quem vive de arte, de literatura e da educação são vários e um tanto dolorosos, pois passam pela falta de investimento público, atualmente um desmonte das conquistas históricas dos artistas e dos educadores, por uma certa desvalorização de uma parte da sociedade que ainda não vê a arte e a literatura como profissões. Especificamente na literatura infantil o que mais me desafia é desmistificar que essa vertente literária é “menor” ou “mais fácil”, estar sempre evoluindo nos textos que levo para as crianças é uma forma de respeitá-las em sua intelectualidade, em suas potências e capacidades leitoras.
SITE NEIPIES: Qual é a relação que deveríamos construir entre educação e literatura?
Luciana Marinho Albrecht: Estamos em um mundo extremamente digital, líquido (como diria certo sociólogo e filósofo). Nunca se teve tanto acesso à informação, textos, notícias, opiniões como agora. Porém se escreve mal, se interpreta pior ainda.
A literatura é um elemento essencial na construção do pensamento crítico, da capacidade interpretativa, vejo que educação e literatura devem andar juntas, aliadas na construção do sujeito social, das liberdades individuais plenas, pois um povo que acredita em tudo que lê, sem criticar, sem refletir, sem duvidar é facilmente manipulado e escravizado. De um modo geral, nós escritores temos um grande respeito pelos professores, nossa luta é similar, e nosso trabalho muito intimamente ligado às escolas, à juventude, mais ainda escritores de literatura infantil, como é o meu caso. Não há porque não desenvolver uma relação construtiva, de parceria.
SITE NEIPIES: Do que é que falam teus dois livros: “A estrela pequenina” e o “Procura Encrenca”?
Luciana Marinho Albrecht: De uma forma geral, em meus livros para infância procuro sempre abordar pontos que são sensíveis a minha própria criança interior que são, a inclusão, o respeito às diferenças, os ritmos pessoais, o amor próprio e ao outro, a questão anti-bullying também está presente. A Estrela Pequenina é sobre uma estrela que não conseguia brilhar, vivia triste e preocupada, mas ao longo da história descobrirá o que precisa para resolver essa questão, é um conto poético sobre alegria e amizade. O Procura Encrenca é a história de Danilo, um menino travesso, que precisa entender algumas questões sobre si e sobre respeito ao próximo e essa obra trás uma surpresa divertida, um breve questionário interativo, divertido, tipo o que atualmente chamam de quiz, para que a criança possa refletir depois da história, essa parte do livro foi desenvolvida em parceria com a psicóloga Jamile Kerber.
SITE NEIPIES: Como é ser artista neste momento histórico?
Luciana Marinho Albrecht: A poesia, a música, a arte em geral têm sido oásis nesse deserto pandêmico, um alento para as angústias e para solidão, mas o momento também é de reflexão, de luta, de pedirmos uma certa valorização do nosso trabalho, que muitas vezes é visto pela sociedade como um bico, ou um dom, algo que deva ser oferecido gratuitamente e não é o caso. O artista, seja ele escritor, pintor, ator, etc, é alguém que se dedica a um ofício, vive dele e espera um retorno seja financeiro, seja no sentido de uma valorização. É um diálogo que precisamos ter.
SITE NEIPIES: Qual é a importância dos grupos de literatura e de poetas, dos quais você participa?
Luciana Marinho Albrecht: Comecei minha trajetória na literatura de forma muito individual, até solitária eu diria (risos), foi uma grata surpresa ser convidada, após 4 anos de estrada literária, pela Sociedade dos Poetas Vivos, através do escritor e professor Aleixo da Rosa e quase um ano depois para o Mulherio das Letras, que inclusive foi uma indicação do escritor Pablo Morenno. Nesses grupos tive a oportunidade de compartilhar textos, experiências, aprendizados, conhecer pessoas incríveis, sem falar na rede de conexões de trabalho e oportunidades artísticas, é gratificante.
SITE NEIPIES: Como a Pandemia atingiu teu trabalho artístico e cultural? O que estás aprendendo com o isolamento físico e social, imposto a todos nós para a preservação de vidas?
Luciana Marinho Albrecht: Foi um verdadeiro tsunami (risos)! Acredito que não só para mim, mas para todos. Meu trabalho era quase que 100% presencial, muito ligado às escolas, aos eventos literários, no RS e no Brasil, parou tudo. Tudo mesmo, escolas fechadas, eventos cancelados, tive que me adaptar às tecnologias rapidamente. Uma coisa positiva disso tudo foi a criação do meu canal no Youtube O Mil e uma Histórias, que foi a forma que encontrei de me manter ativa, fazendo o que amo e ainda apoiar de forma gratuita e abrangente as professoras e professores e pais que me solicitavam alternativas educativas, lúdicas e com qualidade literária para interagir com as crianças nesse momento delicado.
SITE NEIPIES: Achas que a maioria das pessoas está se tornando melhor com o advento da Pandemia? Sairemos melhores seres humanos?
Luciana Marinho Albrecht: Penso que o momento está atuando como uma espécie de “adubo” ou “fermento” para o que cada um tem no coração. A situação política do nosso país é caótica e removeu algumas máscaras sociais, revelando faces sombrias da sociedade, faces de preconceito, racismo, violência, misoginia, infelizmente. Sou de natureza otimista e espero que haja uma reflexão a ser feita nisso tudo, que nos sirva de aprendizado e crescimento espiritual e moral.
SITE NEIPIES: Quais são seus projetos para o futuro próximo?
Luciana Marinho Albrecht: São tantos!(Risos) Reflexo da mente inquieta. (Risos) Mas o mais recente e já em andamento é a elaboração do meu projeto, Uma apoia a outra com a obra Confidências da Noite – poemas, sonhos e delírios, premiado pelo Funcultura Passo Fundo. O projeto prevê o lançamento do meu primeiro livro de poesias adulto, Confidências da Noite, voltado a uma temática intimista, um olhar feminino e que apoia o projeto social Uma Apoia a Outra (projeto de minha autoria) que consiste em destinar uma parte da venda do livro à instituições de amparo à mulher em situação de risco e vulnerabilidade e na realização de oficinas e saraus literários voltados ao público feminino. Estou feliz por este livro e projeto terem saído da gaveta, ansiosa por ver o resultado. O livro será ilustrado pela artista Giúlia Cittolin e os textos revisados pela Daniela Sinigaglia. Além desta obra estou preparando um novo livro para o público infantil, mas este ainda vou deixar um mistério. (risos)
SITE NEIPIES: Que mensagem gostarias de deixar aos leitores do site, em especial os que se envolvem com cultura, literatura e educação?
Luciana Marinho Albrecht: Sempre é tempo de ler, de questionar, de produzir, de amar. Aproveito para deixar uma singela sugestão, em versos de minha autoria.
“Se meus ouvidos surdos, foram capazes de ouvir.
Uma mente fechada é capaz de questionar, duvidar.
De se abrir, e aprender.
Evoluímos!
Eu nessas linhas te proponho,
Ousadia!
Feche agora, sem receio,
A tela desse navegador,
E sem pudor,
Vá ler um livro!”
(Luciana Marinho)
Amo teus textos. Parabéns pela força dando vida intensa a muitos que andam devagar!
Obrigada pela partilha do espaço, pelo convite e parabéns por esta importante porta aberta ao diálogo e à educação.