O Carnaval tem um histórico riquíssimo na Capital gaúcha. Vamos relembrar com alguns detalhes para falar da tristeza que se abateu sobre nós em 2025.
Estamos falando do Carnaval de Porto Alegre, a capital do Rio Grande do Sul: sem sons, sem fantasias, ruas vazias e violência. Cidade que já teve a terceira população do país, o Estado que era o terceiro mais rico, que tinha encantadores carnavais de rua e de salão.
Em 1956, Athos Damasceno já nos trazia o vigor das artes e da cultura local, com seu festejado livro: Palco, Salão e Picadeiro em Porto Alegre no Século XIX.
O Carnaval tem um histórico riquíssimo na capital gaúcha. Vamos relembrar com alguns detalhes para falar da tristeza que se abateu sobre nós em 2025.
Ele é originário do Entrudo, que passou por épocas de liberação e proibição. Por volta do ano de 1870, o Entrudo cai em desuso pelo surgimento das Sociedades (Esmeralda e Venezianos) que mudam e dominam o carnaval até mais ou menos 1900.
Para quem tiver interesse maior é só pesquisar no livro “Fragmentos Históricos do Carnaval de Porto Alegre”.
Acesse aqui: https://cphpoa.wordpress.com/2019/05/06/981/
Era o Carnaval do povão de Porto Alegre, surgido nos bairros pobres como o Areal da Baronesa e Colônia Africana. Eram redutos de população negra.
Eram tempos áureos das brincadeiras. Era nas ruas da periferia e nos salões como se vê na foto de 1930 que as coisas aconteciam.
As transformações
Uma característica do Carnaval de Porto Alegre foram os Blocos Humorísticos.
As Bandas, hoje quase sumidas, tiveram seu apogeu entre os anos 1970 e 1980. Algumas delas foram a DK, Saldanha Marinho, Medianeira, Por Causas de Quê, Área da Baronesa, JB, Filhos da Candinha, Comigo Ninguém Pode, IAPI, etc.…
Até há tentativas de sua volta, como vi com a Banda DK.
Hoje dia se fala em Muambas, algo muito particular do carnaval de Porto Alegre com ensaios dos blocos e escolas feitos como uma prévia para o desfile oficial.
Os negros tiveram este papel inicial do Carnaval de periferia e rua. Já os nossos povos originários estavam representados por outras etnias nas Tribos – Arachaneses, Os Aymorés, Os Bororós, Os Caetés, Os Charruas, Os Navajos, Os Potiguares, Os Tapajós,
Aqui não vamos nos deter sobre as diferenças de tribos, escolas, como nem analisar o carnaval de rua e de salão, mas temos que salientar nunca fez feito em nada em se tratando de carnaval.
Os desfiles mais famosos eram aqueles da Santana, imaginem a Pepsi era patrocinadora, na Avenida Borges de Medeiros, na Perimetral e na Augusto de Carvalho sempre no Centro da cidade.
Carnaval expulso e jogado ao Porto Seco
Chamam-no de Complexo Cultural Porto Seco, mas não passa de um lugar ermo, com galpões para as escolas, mas sem arquibancadas, com gastos sem fim a cada ano para fazer um evento longe do povo.
O Porto Seco fica a 22 km do Centro. Imaginem o pessoal da Restinga que tem duas escolas de Samba fazendo uma viagem de mais de 50 km.
Os desfiles das escolas de samba no Complexo Cultural do Porto Seco estão marcados para os dias 14 e 15 de março, sexta-feira e sábado. Ou seja, fora dos festejos nacionais do nosso carnaval.
Nem na Cidade Baixa, onde nos últimos anos, surgiram blocos e grupos de carnaval, outros pelo centro e pela Orla, como em outros locais, não tem carnaval, teve violência.
Por uma pressão do Ministério Público, a Prefeitura decidiu proibir qualquer desfile no bairro boêmio da Cidade Baixa em 2025.
Já não bastasse estarmos vivendo a terceira onda de calor de 38° na cidade, veio a violência policial gratuita contra pessoas nas ruas.
Sem qualquer diálogo, não havia desfile, eram pessoas curtindo o seu tempo livre nas calçadas bebendo, é certo que às vezes extrapolando para as ruas.
No entanto, a Brigada Militar que deveria civilizadamente manter a ordem fez ataques com cavalos, cassetes, batendo nas pessoas.
Um espetáculo horroroso para uma cidade que era acostumada a vivenciar suas alegrias.
De nada neste Carnaval se parece com o esplendor de seu passado, das passeatas e das caminhadas, em especial aqueles de milhares de pessoas que vieram para cá em todas as edições do Fórum Social Mundial.
Da alegria da Borges de Medeiros, foto da Memória CP, jornal da capital, ao que podemos ver em seguida, numa foto que recebi de um morador de um prédio. É a violência contra uma mulher.
Tempos sombrios
“Vivemos tempos sombrios, onde as piores pessoas perderam o medo e as melhores a esperança” – (Hannah Arendt)
Da famosa filósofa alemã também é a expressão “banalidade do mal”. Eis que neste ano em Porto Alegre adentramos o calor infernal do verão com a violência ímpar do Estado, gratuita, abalando o processo civilizatório.
Sempre se falou da briosa Brigada Militar. Isto é, uma força honrada, digna.
Nos dias de hoje, a semelhança com a PM do Rio e de São Paulo é grande.
Porto Alegre viveu o terror policial na desocupação dos Lanceiros Negros numa fria noite de inverno. E o local não serve para nada desde então, só vejo ratazanas a circular.
Em outubro de 2023, houve um bestial ataque a ocupantes de um espaço na Cidade Baixa. A ordem era: “botem para quebrar, botem tudo abaixo”.
Nos dias de hoje, vídeos são feitos na hora. Tudo se vê, nada ou quase nada se perde. Foi o caso da violência do Carnaval que não existiu em Porto Alegre.
Temo pela Humanidade!
Autor: Adeli Sell é professor, escritor e bacharel em Direito. Também escreveu e publicou no site “Os gaúchos”: www.neipies.com/os-gauchos/
Edição: A. R.