Símbolos Religiosos, Laicidade e Intolerância Religiosa no Brasil

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O direito ao uso dos símbolos religiosos
pela pluralidade religiosa, sem recorrer ao
fundamentalismo, pode ser uma ação de política pública.


Como já debatemos nesta coluna, o Brasil tem sérios problemas no tocante em assumir uma posição clara e objetiva acerca da laicidade. Avançamos significativamente na liberdade de culto e de ter ou não uma religião ou religiosidade. Entretanto, o Estado e outras repartições públicas não tratam de forma igualitária as instituições religiosas.

As políticas públicas adotadas de interesses às entidades confessionais beneficiam claramente setores evangélicos e católicos. Tais privilégios podem ser percebidos por meios do tratamento dos símbolos religiosos em espaços públicos.

Antes de falarmos da relação entre símbolos religiosos, laicidade e intolerância religiosa, cabe perguntar: o que são símbolos religiosos?

Cada religião tem seus símbolos. Elementos que expressam o significado a sua fé, cosmovisão, normas, tradições, rituais, esperança, natureza e relação com o mundo. Normalmente os fiéis utilizam os símbolos por entenderem que são meios poderosos para alcançar seus desejos ou reforço de suas vinculações religiosas.

Historicamente o Brasil priorizou a agenda católica no campo político e cultural. Os símbolos católicos reforçavam a ideia que ser brasileiro é também ser católico. Houve financiamento de construção de imagens em espaço públicos, uso de crucifixos em espaços de deliberações politicas, distribuição de bíblias nas escolas, dentre outras iniciativas.

A partir dos anos 1990, com o crescimento dos evangélicos, o Brasil não é mais um país de hegemonia católica e, sim, de pluralismo de expressões cristãs, e os símbolos religiosos pentecostais e neopentecostais são valorizados e financiados pelo Estado. Roupas, templos, bíblias, panfletos, cruz, são utilizados e incentivados como meios religiosos necessários para a vida em sociedade.

Outros exemplos que demostram que símbolos católicos e evangélicos são beneficiados em relação a outros são os crucifixos que permanecem em Câmara dos Deputados e de Vereadores no Brasil. Muitas ações já foram movidas por setores da sociedade civil argumentando que a lógica laica de uma democracia como é a brasileira não pode permitir em uma repartição públicas um único símbolo religioso. Argumentação aponta que as decisões discutidas e deliberadas não podem sofrer interferência direta ou indireta de qualquer confissão religiosa. No entanto, algumas decisões judiciais julgam pertinentes a presença dos crucifixos nas repartições públicas supracitadas. Alegam que o Brasil culturalmente é cristão e que a presença de elementos religiosos em espaços públicos significa o direito pleno do exercício da liberdade religiosa.

O mesmo nem sempre acontece com os símbolos ligados às religiões de matriz africana. Ao falar das oferendas, vestimentas, danças, objetos, comidas, e outros utensílios sempre são associados a questão demoníacas, erradas, desviantes e imorais.

Historicamente, não foram poucos as ações que proibiram terreiros de candomblé ou umbanda (e setores do espiritismo) de praticarem seus rituais em espaços públicos ou usos de seus elementos. Atualmente, fieis afro-brasileiros tem evitado usar o branco nas sextas-feiras e saírem as ruas com medo de serem mortos, ridicularizados ou espancados. Não podemos esquecer que o grupo religioso que mais sofre intolerância religiosa são as religiões de matriz africanas. Seus templos são invadidos e destruídos. Lamentável isto.

O que defendemos é uma democracia que reconheça em termos práticas o direito do outro utilizar seus símbolos religiosos em um contexto que a laicidade é respeitada. O direito ao uso dos símbolos religiosos pela pluralidade religiosa, sem recorrer ao fundamentalismo, pode ser uma ação de política pública. Expressar por meio de elementos religiosos o que aquela experiência de fé significa e o que trouxe para sua vida é natural e fundamental em algumas situações.


Apresentamos aqui uma série de vídeos que podem ser assistidos, tanto para aulas quanto para aprofundamento de conhecimentos, sobre a importância dos símbolos religiosos para as diferentes tradições religiosas. Estes vídeos foram recomendados pelo professor Valdecir João Bianchi, da rede estadual e particular em Passo Fundo, RS.

Série:  “O que é um símbolo religioso” caracterização e implicações

Parte 1 – https://www.youtube.com/watch?v=uyYe1GyEjzg
Parte 2 – https://www.youtube.com/watch?v=aaw3M4yIkhE
Parte 3 – https://www.youtube.com/watch?v=isYGm79aMBg

Imagens e símbolos religiosos – Pe. Fábio de Melo – https://www.youtube.com/watch?v=yRvb-RabqaQ




Sugestões de uma prática pedagógica

Colaboração do professor Alex Rosset

Esta atividade pode ser aplicada a estudantes de Oitavos Anos do Ensino Fundamental ou em turmas do Ensino Médio.

No Oitavo Ano, Unidade temática: Crenças religiosas e filosofias de vida, Objetos de Conhecimento: Doutrinas religiosas/Crenças, filosofias de vida e esfera pública. Habilidades: EF08ER03RS-03) Conhecer e descrever em que se constitui o sincretismo religioso e as formas de manifestações nas Tradições Religiosas. (EF08ER03RS-04) Observar e comparar como elementos de uma Tradição Religiosa são ressignificados em outra, através do Sincretismo. (Ex.: Nossa Senhora dos Navegantes e Iemanjá).

Para aprofundar conhecimentos:

  1. É possível imaginar, no Brasil, como seria uma democracia e uma pluralidade religiosa?
  2. Qual é a posição do religioso Fábio de Mello sobre adoração de imagens (vídeo https://www.youtube.com/watch?v=yRvb-RabqaQ)
  3. Qual é o problema de um país manter ou retirar símbolos religiosos de lugares ou repartições públicas? (Veja no vídeo  https://www.youtube.com/watch?v=isYGm79aMBg)
  4. O Brasil se constitui culturalmente a partir do sincretismo religioso. Pesquise sobre isso e faça síntese.
  5. Após leitura do texto e acesso aos vídeos, qual é o seu posicionamento pessoal sobre o uso de símbolos religiosos em lugares públicos?



Autor: Marcos Vinicius de Freitas Reis, professor da Universidade Federal do Amapá (UNIFAP) do Curso de Graduação em Relações Internacionais. Possui graduação em História pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU) e mestrado em Ciência Política pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCAR). Doutor em Sociologia pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Docente do Curso de Pós-Graduação em História Social pela UNIFAP, Docente do Curso de Pós-Graduação em Ensino de História (PROFHISTORIA). Membro do Observatório da Democracia da Universidade Federal do Amapá. Docente do Curso de Especialização em Estudos Culturais e Políticas Públicas da UNIFAP.  Líder do Centro de Estudos de Religião, Religiosidades e Políticas Públicas (CEPRES-UNIFAP/CNPq). Interesse em temas de pesquisa: Religião e Políticas Públicas. E-mail para contato: marcosvinicius5@yahoo.com.br

2 COMENTÁRIOS

  1. A SOCIEDADE NÃO PODE SER EXCLUIDA

    MUDANÇAS CLIMÁTICAS – QUANTO TEMPO AINDA TEMOS ?

    Da fase de discussão do enfrentamento da problemática das Mudanças Climáticas apenas por iniciados, percebe-se, hoje, que, em bem pouco tempo, chegamos à realidade inevitável do pleno enfrentamento dos seus efeitos.

    Infelizmente dispendemos um bom tempo no contexto do “fazendo parte do problema”, deixando para um plano complementar a etapa de “propor e implementar soluções” (preventivas e de adaptação).

    Durante todo este período não demos a devida atenção de preparar a sociedade para aquilo que ela iria enfrentar, bem como o preço, nada reduzido. que terá de assumir de modo a poder contribuir / participar das ações que deverão ser implementadas pelo Poder Público (federal, estadual e municipal).

    Na realidade, desde 2010, no caso do Espírito Santo, já tínhamos em plena vigência a lei 9531 (Política Estadual de Mudanças Climáticas) que definia exatamente os encaminhamentos para a formulação das ações a serem implementadas, mas que, entretanto, 14 anos depois. ainda não foi plenamente regulamentada.

    Uma das consequências da existência da referida lei foi, basicamente em 2023, a estruturação do Plano Estadual (Capixaba) de Mudanças Climáticas do Estado do Espírito Santo, bem como do Plano Municipal de Mudanças Climáticas do Município de Vitória (este ainda não concluído), instrumentos importantes para a preservação ambiental e, sobretudo, o bem estar da população.

    Porém, e isso parece ser uma premissa muito clara, por melhor que sejam tais planos, se torna imperiosa a necessidade de ter a participação / envolvimento da sociedade no sentido de garantir o sucesso dos mesmos.

    Ou seja, há que se promover (com a urgência devida) a realização de Audiências Públicas onde o Poder Público (estadual e municipal) apresente / debata com a sociedade as ações inseridas nos Planos, seus efeitos e custos, bem como as mesmas serão (ou já foram) implementadas.

    Não seguir este caminho será assumir o peso inevitável da cobrança de responsabilidade decorrente desta potencial omissão.

    Roosevelt Fernandes, M. Sc.
    Engenheiro Ambiental
    Ex conselheiro do CONAMA, CONSEMA, CERH, Fórum Capixaba de Mudanças Climáticas e COMDEMA / Vitória
    roosevelt.consultoria@outlook.com

  2. Muito oportuna a reflexão provocada pelo texto. Excelente material para Sr utilizado na aulas do ER. Parabéns pela proposta pedagógica.

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