Entre abril e maio de 2017,
foram registradas mais de 1 milhão
de menções virtuais ao suicídio.

 

O município de Passo Fundo tem mais do que o dobro de suicídio da média nacional, que é de 5 suicídios para cada 100 mil habitantes (2013). A capital do Planalto Médio está entre as cidades brasileiras com o maior número de suicídio, 12 para cada 100 mil habitantes, configurando entre as 20 cidades do país com maior incidência dessa ação. Os dados foram apresentados em uma roda de conversa na Universidade de Passo Fundo (UPF), na quarta-feira, 12 de setembro, com o tema “Suicídio.com – autoextermínio na era da internet”, com a participação das professoras da UPF Dra. Ciomara Benincá e Dra. Bibiana de Paula Friderichs, e da mestranda em Psicologia Maria Eugênia Benincá. A atividade integra a programação do comitê municipal de ações sobre o Setembro Amarelo, do qual a UPF faz parte.

Entre abril e maio de 2017, foram registradas mais de 1 milhão de menções virtuais ao suicídio, sendo 94,2% no Twitter, 5% no Facebook, 0,4% no Youtube e 0,4% no Instagram, conforme pesquisa da iniciativa Comunica que Muda, da agência de comunicação Nova/sb. Os estados que registraram mais menções foram: Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais, Pará, Rio Grande do Sul e Santa Catarina, conforme informações apresentadas durante o evento.

O suicídio de jovens de 15 a 29 anos de idade já é a 2ª principal causa de morte no mundo. E esses jovens são os que mais acessam a internet, de acordo com o Comitê Gestor da Internet (CGI) no Brasil. Por esse motivo, é necessário discutir e refletir sobre o “Suicídio.com”. “A ideia do Setembro Amarelo e dessa conversa sobre ‘Suicídio.com’, que é aberta a toda a comunidade, alunos do ensino médio e comunidade acadêmica, é falar de um fenômeno muito grave e que vem se tornando cada vez mais comum: os anúncios de suicídio pela internet e o estímulo que se faz na internet para que as pessoas venham a atentar contra a própria vida. A ideia é provocar a discussão e a reflexão para que cada um de nós possa combater esse tipo de crime”, destacou a coordenadora do projeto de extensão da UPF “Clínica de estudos, prevenção, intervenção e acompanhamento à violência” (Cepavi), doutora em Psicologia, professora Ciomara Benincá.

A professora Bibiana, diretora da Faculdade de Artes e Comunicação (FAC) e que tem pesquisas vinculadas à cibercultura, ressaltou que é preciso entender e saber usar a tecnologia. “O suicídio sempre existiu, antes mesmo da chegada da tecnologia. A internet não aumenta o suicídio, mas impacta os rituais, os caminhos que envolvem as questões de morte e de luto. A internet é um espaço perigoso, mas sem volta. Ninguém vai deixar de usar celulares e computadores, mas é preciso olhar para ela com cuidado, porque ela elimina os rituais que temos no cotidiano real, as fronteiras, as regras sociais, o certo e o errado. Precisamos reentender esses rituais”, comentou Bibiana.

 

Passo Fundo está entre as cidades com maior número de suicídio

Os dados não param por aí. A cada 40 segundos uma pessoa comete suicídio no mundo. Ou seja, 804 mil pessoas cometem suicídio anualmente, uma taxa de 11,4 mortes para cada grupo de 100 mil habitantes, conforme a Organização Mundial de Saúde (OMS 2016). As taxas de suicídio nas faixas etárias de 15 a 24 anos e acima de 60 anos são consideradas as que mais crescem.

Das 20 cidades brasileiras onde o número de suicídio é mais elevado, 11 são gaúchas. No Rio Grande do Sul, entre os anos 2000 e 2016, o índice foi de 10,1 para 10,4 para cada 100 mil habitantes, sendo que o índice nacional é de 5 para cada 100 mil habitantes. Passo Fundo está entre as cidades onde esse índice tem as taxas mais elevadas. A capital do Planalto Médio registrou 12 para cada 100 mil habitantes. Em 2016, Passo Fundo teve 28 casos de suicídio, em 2017, o número subiu para 30, e em 2018, até o momento, já são 14 casos. “Para o tamanho da cidade, é muita coisa. E a perspectiva é negra. Provavelmente vamos fechar o ano com números tão assustadores quanto nos anos anteriores. E é isso que move eventos como esse. Discutir e pensar estratégias de prevenção. Temos uma grande responsabilidade em desenvolver políticas de prevenção contra o suicídio”, enfatizou a professora Ciomara Benincá.

Os motivos para esse grave cenário ainda não estão bem esclarecidos. “Cogita-se questões que têm a ver com agrotóxicos fosforados orgânicos, mais presentes na região da indústria fumageira. Se cogita questões de ordem genética, mas no Rio Grande do Sul, o que mais conseguimos entender é em virtude das questões étnicas e culturais, envolvendo a rigidez de valores, de honra e dignidade do gaúcho, que não lida muito bem com as frustrações, porque acha que tem que dar conta de tudo. Essas são questões que mais têm se apontado para entender o alto número de suicídios no Rio Grande do Sul”, comentou Ciomara.

A professora observa que o suicídio é o “estopim” de uma série de fatores agravados e que passam pela ordem social, biológica e até econômica. “Muitas vezes, o suicídio é visto como se fosse motivado por uma única causa e isso é um engano. Os eventos acontecem ao longo da vida do sujeito, motivo pelo qual ele dá muitos sinais. A ideia é discutir quais são esses sinais para poder evitar e prevenir o suicídio”, salienta ela.

 

Acolhimento e compreensão

De acordo com Ciomara, a família tem um papel importante e deve acolher e compreender as pessoas que estão passando por uma situação difícil. “Nada de dizer que o sujeito não valoriza a vida ou não tem Deus no coração. Ele tem que ser acolhido sem julgamento. A ideia é dizer ‘se você está passando por uma situação muito difícil, uma dor intensa, me diga qual é que eu vou te ajudar a enfrentar’”, ressalta.

O segundo passo é procurar ajuda profissional. “É preciso procurar ajuda médica, por meio de psiquiatras, clínicos gerais e até um psicólogo, que farão o encaminhamento adequado nessas questões. Numa situação de desespero, existe um telefone disponível 24 horas por dia, todos os dias do ano, gratuito, para o qual as pessoas podem ligar e desabafar, para poder passar pelo momento de crise, sem tomar o ato impulsivo de atentar contra a própria vida. É só ligar para o 188, para o Centro de Valorização da Vida (CVV)”, salientou a professora.

 

Sobre o Setembro Amarelo

A UPF faz parte de uma grande articulação institucional que preparou uma série de ações relacionadas ao Setembro Amarelo, mês dedicado a debater o tema do suicídio. Em Passo Fundo, um comitê foi montado para pensar essas ações. Promovida pela Prefeitura de Passo Fundo, em parceria com a UPF, o Hospital da Cidade, o Hospital Psiquiátrico Bezerra de Menezes, a IMED, a Universidade Federal Fronteira Sul (UFFS), a Associação Psiquiátrica do Planalto Gaúcho (APPG), o Núcleo de Apoio à Vida de Passo Fundo (Navipaf) e a Coordenadoria da Juventude, a campanha vem sendo realizada desde o ano passado.

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