Arrisquei passar a mão na sua cabeça, ele só piscou. Na infância, havia sete gatos na nossa casa, então eu sabia como conseguir a simpatia do meu vizinho. Não alcançaríamos total sintonia. Eu vivia no presente, mas também no passado e no futuro. E ele, com certeza, só no presente. Fomos assim até a próxima estação.
Das seis horas da manhã às seis horas da tarde, as 12 horas no trem faziam com que eu descesse em todas as paradas. Alguns desembarcavam, outros embarcavam, mas quase todos desciam, menos o gato que havia no trem. Talvez fosse eu o único passageiro a fazer todo o trajeto Santa Maria – Passo Fundo e o gato o único a não descer nas inúmeras e pequenas estações.
No trajeto entre duas delas, fui ouvindo os acordes de um gaiteiro. Em uma das breves paradas, consegui comprar uma garrafa de cerveja não muito gelada. Foram 600 ml tomados no bico.
Em outra, um vizinho de banco me aconselhou a não descer, mas eu desci. Ainda bem, assim tenho o que contar.
Na lancheria da minúscula estação, havia algumas mesas de madeira, todas ocupadas. Só consegui comprar rapadura. Tinha cachaça, mas eu sabia que ela era bem mais forte que eu. Fumavam palheiro, a história que conto é antiga mesmo. Tinha dezenove anos e estava viajando para casa. Minha irmã festejava seus quinze anos de idade ou era seu baile de debutante, não me lembro.
Um dos fumantes, um de bigode, levantou-se cambaleando e cutucou com o cabo de um facão outro fumante, este sem bigode e com muita barba por fazer. Os dois saíram da lancheria e todos os seguimos. Pena que o trem apitou.
Pude ver que as bombachas e as botas de ambos eram parecidas. Vi porque baixei o olhar para ver dois facões no chão. O trem começou a se mover. Tive de correr. Da janela não consegui mais vê-los. Não sei se começariam uma dança ou uma luta. Achei que o primeiro a se levantar fazia-se de mais bêbado do que parecia estar. Sabia de uma recomendação: “Se for começar uma luta, se faça de muito bêbado. O adversário vai achar que será fácil”.
Meu vizinho de banco, agora, não era mais aquele que sugerira que eu não descesse. Era o gato, aquele que nunca descia nas estações. Cinza-escuro com manchas brancas, nem gordo nem magro, no peso. Ao me ver, não deu importância. Voltou a deitar a cabeça no banco. Parecia me espiar com seus belos olhos de gato.
Arrisquei passar a mão na sua cabeça, ele só piscou. Na infância, havia sete gatos na nossa casa, então eu sabia como conseguir a simpatia do meu vizinho. Não alcançaríamos total sintonia. Eu vivia no presente, mas também no passado e no futuro. E ele, com certeza, só no presente. Fomos assim até a próxima estação.
Convidei o gato para descer. Não quis. Fiz menção de levá-lo no colo, mesmo assim ele não quis. E isso que era uma tarde de sol, de céu sem nuvens. E não estava muito quente.
Havia ali alguns cavalos pastando. Consegui comprar uma garrafa de cerveja por preço menor que aquele pago pela anterior, tinha um casco para trocar. Não estava gelada, fazer o quê?
Acabei ajudando uma alegre família que ia para um casamento e levava a torta da festa. Depositada sobre um enorme tabuleiro quadrado, a torta não entrava pela porta. Finalmente, com o maquinista já cansado de tanto apitar, conseguimos passá-la por uma janela que abria de todo.
Alcancei meu banco com o trem já em movimento e fui tomando a cerveja no bico.
Com a mão livre, acariciava o gato; com os olhos, via passar pequenas lagoas, algumas ovelhas, casas de madeira sem muita pintura, árvores como cinamomos e outras que eu não sabia o nome. Também vacas que pareciam cochilar enquanto mastigavam.
Ter vivido muito tempo permitiu-me conhecer muitas pessoas diferentes, em idade, posição social, interesses, e nunca encontrei, com uma paradoxal exceção entre aqueles com maior formação académica, um efeito adverso causado pela melhor ou pior educação que podiam receber.
En principio porque no hay civilización, cultura o sociedad que no se haya ocupado de la trasmisión intergeneracional, que es la forma en que por excelencia podemos pensar a la educación.
No obstante ¿Por qué? ¿Por alguna forma de interés corporativo? ¿Porque se debe actuar con corrección política? ¿Por demagogia discursiva? Sin duda no, tampoco se trata de la idea ingenua de los que no entienden cómo funciona el mundo global, ni es la expresión interesada de quienes tienen alguna relación con los sistemas educativos.
Se trata simplemente de que el humano necesita para incorporarse al mundo, además de los imprescindibles cuidados maternos, de sistemas que complementen el cuidado biológico y emocional ampliándolos en escenarios exogámicos y expandiendo la actividad mental que le permite hacer desde las operaciones más básicas como leer el nombre de una calle, diferenciar un chaparrón de una tormenta, practicar una cirugía con un robot o gobernar un país.
Al albañil que levanta una pared, alguien, incluso una circunstancia observada, le enseñó que tanto de arena, tanto de cemento y los ladrillos encadenados de una cierta forma; el cirujano no nació sabiendo dónde hacer la incisión y qué hacer con un órgano, como al carpintero que corta una madera en ángulo de 45 grados alguien le explicó el porqué.
Si algo hemos logrado como civilización, con sus luces brillantes y sus sombras -que son oscuras y muchas-, es porque desarrollamos procesos complejos de transmisión cultural en los escenarios más diversos, inimaginables, creados específica o incidentalmente.
El haber vivido mucho tiempo me permitió conocer mucha gente diferente, en edades, condición social, intereses y nunca encontré, con una paradójica excepción entre los de mayor formación académica, un efecto adverso provocado por la educación mejor o peor que pudieron recibir.
De hecho, en una tapera en el campo, en una escuela rural, en un colegio comercial urbano, en una universidad, alguien se hizo cargo de una transmisión que logró que sus niños o jóvenes encuentren un rumbo, ponerlos en condición de tomar decisiones individuales que siempre son sociales, y puedan funcionar eficientemente en un mundo extremadamente complejo como el que nos toca habitar y en un país que suma complicación entorpecedora e innecesaria a la complejidad que resulta de la interdependencia, con hechos pasados o presentes y personas próximas o remotas, de todos los aspectos nuestra vida.
(VERSÃO EM PORTUGUÊS)
Por que temos que colocar a educação no centro?
El haber vivido mucho tiempo me permitió conocer mucha gente diferente, en edades, condición social, intereses y nunca encontré, con una paradójica excepción entre los de mayor formación académica, un efecto adverso provocado por la educación mejor o peor que pudieron recibir.
Em princípio porque não existe civilização, cultura ou sociedade que não tenha lidado com a transmissão intergeracional, que é a forma por excelência como podemos pensar a educação.
Porém, por quê? Por causa de alguma forma de interesse corporativo? Por que deveríamos agir com correção política? Por demagogia discursiva? Sem dúvida que não, não é a ideia ingênua de quem não entende como funciona o mundo global, nem é a expressão interessada de quem tem alguma relação com os sistemas educativos.
Simplesmente, para entrar no mundo, o ser humano necessita, além dos cuidados maternos essenciais, de sistemas que complementam os cuidados biológicos e emocionais, expandindo-os em cenários exógamos e ampliando a atividade mental que lhes permite realizar as operações mais básicas como como ler um livro, nomear uma rua, diferenciar uma chuva passageira de uma tempestade, realizar uma cirurgia com um robô ou governar um país.
Ao pedreiro que constrói um muro, alguém, mesmo uma circunstância observada, ensinou-lhe que tanta areia, tanto cimento e tijolos estão acorrentados de uma certa maneira; o cirurgião não nasceu sabendo onde fazer a incisão e o que fazer com um órgão, como o carpinteiro que corta madeira num ângulo de 45 graus, alguém explicou o porquê.
Se alcançamos algo como civilização, com suas luzes brilhantes e suas sombras – que são escuras e muitas –, é porque desenvolvemos processos complexos de transmissão cultural nos mais diversos e inimagináveis cenários, criados específica ou incidentalmente.
Ter vivido muito tempo permitiu-me conhecer muitas pessoas diferentes, em idade, posição social, interesses, e nunca encontrei, com uma paradoxal exceção entre aqueles com maior formação académica, um efeito adverso causado pela melhor ou pior educação que podiam receber.
De fato, num ranchinho no campo, numa escola rural, numa escola comercial urbana, numa universidade, alguém se encarregou de uma transmissão que conseguiu ajudar os seus filhos ou jovens a encontrar um rumo, colocá-los em condições de tomar decisões individuais que são sempre sociais e podem funcionar eficientemente num mundo extremamente complexo como o que vivemos e num país que acrescenta complicações dificultadoras e desnecessárias à complexidade que resulta da interdependência, com acontecimentos passados ou presentes e pessoas próximos ou remotas, de todos os aspectos da nossa vida.
Autor: Eduardo Corbo Zabatel.Ensayista, Psicólogo, Profesor de Historia, Magister en Ciencias Sociales. Mora em Buenos Ayres e está começando a ocupar a sua coluna neste site com esta publicação. Já publicou no site “Temos de nos ocupar em desconstruir a estupidez”: https://www.neipies.com/temos-que-nos-ocupar-em-desconstruir-a-estupidez/
Neste país de cultura de preconceitos onde se avolumam as ofensas de todas as naturezas, o crime de etarismo se faz presente. É intolerável o descarte da pessoa idosa Precisamos encetar um movimento da sociedade civil, pois a pessoa Idosa por si só não terá a força necessária para impor as políticas públicas necessárias por uma existência digna.
A leitura de “O velho e o mar” me ajudou entender as enchentes de maio. Escrito, em 1951, Ernest Hemingway mostra a luta de um velho pescador em busca da pesca. Ele apanha o maior peixe de todos os tempos. Luta contra força dele, é arrastado pelas águas. O velho continua na luta, vence e mata o peixe de 700 quilos. Ao tentar trazê-lo à margem, os tubarões avançam e o destroçam. Ele chega à praia apenas com a espinha.
O velho é reconhecido pelos pescadores e ajudado. Lembrei-me dos velhos de agora, lutando contra as águas barrentas e volumosas de maio de 2024. Velho, idoso, velha, idosa…. Pessoas Idosas….que domaram o Tempo, o frio e o albergue improvisado. Aos pedaços, venceram. Foram vitoriosos, sobreviveram, porque houve solidariedade, como foi o conforto dos amigos pescadores ao velho pescador.
O conforto recebido pelas pessoas idosas desalojadas foi a quentinha doada, e às vezes o velho custo salvo ao seu lado.
Os governos não os alertaram no momento adequado, nada fizeram antes para que o infortúnio não acontecesse. São os tubarões devoradores.
Depois da luta contra as águas, a busca dos albergues, as esperas sem fim por abrigos adequados, veio o “amargo regresso”.
O “amargo regresso”
Em 1978, o filme “O amargo regresso” deu a Jon Voight e Jane Fonda o Oscar de melhor ator e atriz. O filme começa com um jogo de sinuca (a imagem não é fortuita) e os “aleijados” pelas granadas jogam e falam dos infortúnios da Guerra do Vietnam. Em 2024, em junho, começa aqui o “amargo regresso” com a busca dos “desalojados” por suas casas, várias delas levadas pelas águas, outras danificadas, sujas de lama e nenhum objeto a ser salvo, esperando limpeza.
Além das Memórias que as águas sujas e turbulentas levaram para não se sabe aonde, havia o vazio: vazio da casa, vazio nas almas, o boteco da esquina também vazio. Nem jogo de carta, pois a mesa do jogo de damas da Praça as águas levaram. E me assomam perguntas: quem sabe quantos idosos acamados existem morando com suas famílias? Quem sabe quantos voltaram para morar sozinhos? Quantos foram ou são deixados em “geriatrias” que não passam de depósitos de velhos?
Registre-se: o regresso de um pobre à favela é diferente daquele idoso da classe média.
Entrar num bairro destroçado, com entulhos tomando ruas, pessoas labutando pela limpeza é uma cena de guerra também como as lembranças vistas naquele filme.
Este “amargo regresso” é viver os traumas, a saúde mental abalada, o vazio existencial. Muitas pessoas não resistem. Se uma senhora de 94 e um senhor de 100 anos.- como me contaram.- vão “começar tudo de novo” é uma brecha para construir os “caminhos da reconstrução”. É um raio de luz na fria capital. E uma mudança de mentalidade da sociedade, sempre tão difícil de acontecer, seria um luar nesta noite fria.
Perdi tudo, e agora?
Os autores que, em 2023, produziram o livro “Metamorfose da vida”, volume 1, conseguiram naquele momento dar aos leitores elementos essenciais e básicos sobre o “envelhecer”, sabendo das suas lacunas. Faltaram temas a tratar, como não se analisou a desgraça da Covid 19 sobre o mundo dos idosos. Só não sabiam, apesar de seus estudos e lides, o quanto ainda havia por ser feito.
Começou-se a planejar, entre eles e outros, o segundo volume, e surpreendidos pelas enchentes de maio, com a visível falta de preparo para lidar com as Pessoas Idosas, alguns daqueles resolveram lançar um livro de bolso “Perdi tudo, e agora”.
No mínimo já se teve o impacto da agilidade da resposta ao infortúnio. Quem leu o pequeno volume e retornou garante diz que foi um aprendizado. Dentre estes, destaco a falta de políticas dos poderes públicos. Vamos aos fatos.
No dia 06 de julho de 2024, no Xalé da Praça XV, ocorreu lançamento do livro “Perdi tudo, e agora”?
Seguem registros.
Ausência de políticas públicas
A capital Porto Alegre, com o maior contingente de 60+ do país e com altos índices de longevidade, conheceu o desconhecido: o problema da falta de trato com a pessoa idosa. E isto que estamos falando da capital do “turismo de saúde” desde abril de 2003, quando um Manifesto foi lançado. Serviços de excelência em sua rede hospitalar de atendimento de alta complexidade, recebendo pacientes do Estado e fora dele, muitas vezes de outros países, dado aos tratamentos de alta especialidade. A catástrofe, porém, desnudou um lado precário e desdenhado: a atenção à pessoa idosa.
Ao estourar a catástrofe, somos colhidos pela falta de quase tudo em relação à pessoa idosa. Evacuações e salvamentos amadores, é certo que, com coragem e abnegação, servidores públicos e voluntários foram heróis. Porém, ficou evidente a falta de preparo da cidade e das pessoas para as intercorrências climáticas e os cuidados com idosos.
O mais chocante é que, no site da Prefeitura, há apenas uma página de “Atendimento ao Idoso”, sem quaisquer responsáveis, sem fone, sem whatsapp, sem e-mails!
Criou-se uma narrativa que, no episódio que vivemos e vamos viver por muito tempo, não há responsáveis e culpados. Há responsáveis. Não temos quaisquer políticas de atenção à pessoa idosa nem na capital nem no Estado. Logo, os gestores são sim os culpados.
Em Porto Alegre, no quesito de “Atenção ao Idoso”, como qualquer outro, os atuais gestores fazem de tudo para esconder fatos e omissões, omitem e mentem, falsificam dados.
Já nos setores privados, como as casas geriátricas, de repouso, hotelaria para idosos também não tinham o devido preparo, deixando pessoas idosas sem água, sem banho, sem se prepararem com geradores de energia pela falta dela. Sem luz à noite gerava-se um caos, colocando pessoas idosas em risco.
Somos levados a pensar na importância da criação de protocolos específicos de prevenção, preparação a resgates. Devem partir do Corpo de Bombeiros e da Defesa Civil, para então oferecer capacitação à sociedade, para os “bombeiros civis”, corpos de voluntários, cuidadores, parentes. Urge a criação de políticas e programas mais eficazes, incluindo a prevenção de acidentes, especialmente quedas e o desenvolvimento de produtos específicos para idosos, seja no cotidiano, mas em especial em situação de risco.
Em Porto Alegre, ficou evidenciado que as edificações antigas não têm condições adequadas para resgates de emergência, sobretudo no Centro Histórico, onde temos o maior contingente de pessoas acima de 60 anos.
O que despontou foi a solidariedade de todos os cantos, com seu voluntariado, este mesmo que criou um abrigo para as pessoas idosas. A Prefeitura não tomou qualquer cuidado ou atenção, deixando idosos, doentes, “acamados” largados em alojamentos com colchões rente ao chão, impedindo muitos de se levantarem sem uma mão solidária ajudando.
Disto decorre o repensar, a articulação da sociedade civil, capaz de, pela reflexão e ação, erguer políticas públicas, essenciais para uma existência digna aos idosos.
Legislações existem em todos os níveis, formalmente temos os conselhos que são afrontados pelos executivos. Isto nos deve levar a buscar os órgãos de controle e fiscalização para que sejam efetivos e respeitados.
O velho e a enchente
Ainda não fomos capazes de fazer as necessárias reflexões sobre a pessoa Idosa e a covid, deve ficar para o 3° volume do Livro “Metamorfose da vida”, pois o tempo nos cobrou falar das enchentes.
E neste país de cultura de preconceitos onde se avolumam as ofensas de todas as naturezas, o crime de etarismo se faz presente. É intolerável o descarte da pessoa idosa Precisamos encetar um movimento da sociedade civil, pois a pessoa Idosa por si só não terá a força necessária para impor as políticas públicas necessárias por uma existência digna. Assim, sejamos nós a partir de agora a faísca para o necessário movimento de efetivar os direitos das Pessoas Idosas.
Os livros mencionados nesta publicação podem ser solicitados pelo whatsapp 51.999335309. Serão enviados pelos correios.
Autor: Adeli Sell, professor, escritor, bacharel em Direito. Também escreveu e publicou no site outras 13 reflexões, dentre as quais “Caminhos da reconstrução”: https://www.neipies.com/caminhos-da-reconstrucao/
Gilberto Cunha é o quiropata literário que ajusta e realinha as memórias da cidade, dando forma e sentido a histórias que poderiam ser esquecidas.
Na quietude das manhãs de domingo, enquanto o mundo se despreguiça das travessuras da noite, um colunista de jornal prepara-se para sua rotina singular. Ele, um artesão de palavras, sabe que sua coluna semanal transcende a mera “sopa de letras”; é a coluna vertebral da cultura de sua cidade, sustentando histórias que desafiam a gravidade do cotidiano. Cada palavra que escolhe é um ajuste quiroprático, alinhando medos e expectativas até que a confiança surja plena. Essas histórias são sopros de vida nos espaços intersticiais entre L2 e L4, onde o possível e o impossível se encontram e se reconciliam.
Ao escrever sobre dois colegas da Academia Passo-Fundense de Letras (APL), ele observa a dança das vértebras transformando-se em um balé de superação. As vidas de Welci Nascimento e Daniel Viuniski, colunas vertebrais que enfrentaram escoliose e lordose, agora se endireitam com a força de seus feitos.
A coluna semanal do Cientista Gilberto Cunha no jornal “O Nacional” é uma espinha dorsal que sustenta a memória viva de Passo Fundo.
Cada palavra escolhida por ele carrega algo íntimo e profundo, um toque de alquimia que transforma o banal em essencial. Neste sábado, 6 de julho de 2024, ele desvela a homenagem da APL a duas pessoas cujas trajetórias são vértebras firmes na espinha dorsal cultural da cidade: Welci Nascimento e Daniel Viuniski.
Gilberto Cunha é o quiropata literário que ajusta e realinha as memórias da cidade, dando forma e sentido a histórias que poderiam ser esquecidas. Sua coluna não é apenas um espaço de opinião e informação, mas uma artéria vital que bombeia inspiração e resiliência, reconfigurando trajetórias e criando uma sinfonia vertebral onde antes havia desarmonia, uma verdadeira “esculhambose” (híbrido de lordose com escoliose).
Mais que um simples texto semanal, a coluna de Gilberto é a espinha dorsal de Passo Fundo, um monumento de palavras que mantém viva a chama da memória e da cultura. Assim, a coluna no jornal “O Nacional” se mantém ereta, robusta, sustentando histórias que, como uma coluna vertebral bem ajustada, permitem que a vida siga em frente com mais leveza e menos dor. Ao homenagear a Academia Passo-Fundense de Letras por lançar mais luz na direção de Welci Nascimento e Daniel Viuniski, ele reafirma o poder da escrita de sustentar, inspirar e iluminar nossos caminhos.
Estas propostas pedagógicas servem para atividades pedagógicas das séries finais do Ensino Fundamental ou de turmas do Ensino Médio.
Um dos propósitos do site é realizar publicações sobre práticas educativas que apresentem diferentes metodologias e reflitam aprendizagens feitas por professores e professoras e pelos estudantes. Neste caso específico, trataremos de roteiro com conteúdo de apoio que conecta Filosofia e Cultura Digital no combate ao Bullying e Cyberbullying. Trata-se de uma oportunidade para gerar percepções valiosas e promover mudanças positivas na forma como interagimos com os outros e nos comportamos no mundo digital.
Estas propostas pedagógicas servem para atividades pedagógicas das séries finais do Ensino Fundamental ou de turmas do Ensino Médio.
Sugestões de Habilidades a serem consideradas:
(EF08FL01PF04) Analisar e compreender a relação dos jovens com as mídias, grupos sociais;
(EF08FL02PF02) Reconhecer e valorizar situações morais e éticas presentes nas relações do homem em sociedade, para melhor pensar e criar saídas para problemas cotidianos;
(EF08FL04PF05) Formular hipóteses, apropriar-se da argumentação, saber ouvir outras possibilidades argumentativas e assumir uma postura dialógica na análise de temas éticos;
(EF09FL02PF01) Respeitar a diversidade e agir por uma sociedade não violenta;
(EF09FL04PF02) Analisar temas e problemas que envolvem a vida cotidiana do adolescente.
Objetivos:
Esta proposta de trabalho objetiva avaliar como a filosofia pode abordar o bullying de maneira significativa explorando as raízes éticas, morais e sociais desse fenômeno, além de buscar interfaces com a Cultura Digital, a fim de combater o Bullying e o Cyberbullying.
A natureza do Bullying na Era Digital em comunidades de investigação
Investigação sobre as diferentes formas de bullying (cyberbullying) e suas ramificações psicológicas, sociais e éticas.
A origem da palavra
Bully = palavra em inglês que pode ser traduzida por brigão, valentão e agressor.
Bullying = palavra em inglês que pode ser traduzido por intimidar ou amedrontar.
Cyber = é o diminutivo da palavra cybernetic, que em português significa alguma coisa ou algum local que possui uma grande concentração de tecnologia avançada, em especial computadores, internet etc.
Cyber + Bullying = Cyberbullying = Implicância, discriminação e agressões feitas através de meios de alta tecnologia ou internet, como por exemplo, através das redes sociais.
Colocando a mão na massa
Trabalhar com os estudantes o passo a passo de pesquisa em fontes confiáveis.
Sugestão de tema para trabalhar em grupos: identificar os principais contextos onde o bullying (cyberbullying) ocorre, como por exemplo, nas escolas, grupos de amigos, redes sociais, jogos multiplayer, etc.
Na sala de aula!
Sugestões para apresentar os dados após pesquisa:
Jamboard / PADLET / Apresentação colaborativa no Google
A Ética na Era Digital
Criar uma WORDCLOUD com os estudantes a partir das reflexões realizadas em aula.
Precisamos discutir conceitos filosóficos como identidade digital, comunicação mediada por computador e a natureza da realidade online!
Investigar as questões éticas relacionadas ao comportamento online, como anonimato, privacidade, liberdade de expressão e responsabilidade digital.
Examinar como os valores éticos tradicionais se aplicam ou precisam ser adaptados aos mais diferentes ambientes.
Pedir para os estudantes identificarem comportamentos que eles identificam como antiéticas.
Pode ser de forma individual ou uma atividade colaborativa com os pais.
Abra uma discussão em sala de aula para os alunos exporem os achados a partir do seu histórico de navegação.
Liberdade de expressão X Fake News: qual a relação com o Bullying?
Usando a criatividade!!! Vamos produzir um jogo com os alunos na Sala Maker ou no computador, utilizando o Canva ou outros recursos!
JOGO “Truth or Tale” (Verdade ou Ficção)
Objetivo do jogo: O objetivo do jogo é educar os participantes sobre a diferença entre notícias verdadeiras e falsas, bem como promover uma discussão saudável sobre liberdade de expressão e responsabilidade na disseminação de informações.
Materiais Necessários: Cartas com manchetes de notícias reais e fictícias. Um tabuleiro para marcar o progresso. Peças para cada jogador. Um cronômetro. Um conjunto de regras claras e concisas.
Como Jogar:
-Os jogadores se sentam ao redor do tabuleiro.
– Cada jogador recebe uma peça e coloca no ponto de partida.
– Um jogador começa virando uma carta que contém uma manchete de notícia, lendo-a em voz alta para todos.
– Os outros jogadores têm um tempo limitado para decidir se a manchete é verdadeira ou falsa. Eles discutem e depois escrevem suas respostas.
– Uma vez que o tempo acabou, as respostas são reveladas e a verdadeira natureza da manchete é discutida.
– Se um jogador acertar, ele avança uma casa no tabuleiro. Se errar, fica onde está.
– O próximo jogador faz o mesmo, e o jogo continua até que todos tenham tido a oportunidade de jogar várias vezes.
– O jogador que alcançar a linha de chegada primeiro ganha.
Variantes: – Adicione cartas de desafio que exijam que os jogadores justifiquem suas respostas com evidências. – Introduza cartas que não apenas apresentem manchetes, mas também fontes e argumentos usados para apoiar ou refutar as manchetes. – Incentive a discussão após cada rodada para explorar mais a fundo a diferença entre liberdade de expressão e a responsabilidade na disseminação de informações.
Pontos de Discussão:
– O que diferencia uma notícia verdadeira de uma falsa?
– Quais são as responsabilidades dos consumidores de mídia ao compartilhar informações?
– Como podemos discernir a veracidade das informações em um mundo onde as Fake News são abundantes?
– Qual é o papel das plataformas de mídia social na propagação de informações falsas?
– Até que ponto a liberdade de expressão deve ser protegida, mesmo quando se trata de informações erradas ou enganosas?
Cultura Digital e a filosofia: sugerindo temas
A relação entre a filosofia e a cultura digital é fascinante e complexa. A filosofia tem sido fundamental para entendermos as implicações éticas, sociais, políticas e epistemológicas da era digital. Por sua vez, a Cultura Digital participa da aproximação desses conceitos.
A filosofia moral e ética tem um papel crucial na discussão sobre o comportamento online, como privacidade, segurança cibernética, liberdade de expressão, e o impacto das tecnologias digitais na sociedade, bem como, suas implicações com a cultura do Bullying.
A filosofia da tecnologia investiga a natureza das tecnologias e seu papel na vida humana, questionando como as tecnologias digitais moldam nossa percepção do mundo, nossa identidade, nossas relações sociais e nosso modo de pensar. Questões sobre a confiabilidade da informação, a validade das fontes online e a natureza do conhecimento em um mundo conectado são cada vez mais relevantes.
A ascensão da inteligência artificial e da robótica levantam questões filosóficas profundas sobre a natureza da mente, da consciência, da inteligência, validade e autonomia das IAs. Como a Filosofia explora conceitos como dados, informação e conhecimento, especialmente em um contexto digital. A mídia digital levanta questões sobre representação, autenticidade e poder. A filosofia investiga como as tecnologias de comunicação digital influenciam a percepção pública, a cultura e a política. Em suma, a filosofia desempenha um papel vital na análise crítica da cultura digital, ajudando-nos a compreender as implicações profundas das tecnologias digitais em nossas vidas individuais e em nossa sociedade como um todo.
Trabalhando a Cultura digital e a filosofia em sala de aula
Estudo de casos reais de cyberbullying e suas implicações éticas e filosóficas com pesquisas online.
Círculos de Discussão: Organize círculos de discussão regulares onde os alunos possam falar abertamente sobre suas experiências com o bullying, compartilhar histórias e discutir estratégias para lidar com isso.
Palestras e Visitas de Especialistas: Convide palestrantes ou especialistas em bullying para falar com os alunos sobre o impacto do bullying e estratégias para preveni-lo e combatê-lo.
Programas de Mentoria: Estabeleça programas de mentoria entre alunos mais velhos e mais novos para promover um ambiente de apoio e amizade na escola e de forma digital, onde os alunos se sintam seguros para pedir ajuda se estiverem sendo intimidados.
Treinamento em Habilidades Sociais e Resolução de Conflitos: Ofereça atividades que ajudem os alunos a desenvolver habilidades sociais, como comunicação eficaz, empatia e resolução de conflitos, para que possam lidar melhor com situações de bullying.
Debates Éticos sobre Tecnologia: Escolha um tópico relevante, como privacidade online, inteligência artificial, ou o impacto das redes sociais na sociedade, e organize um debate em sala de aula. Divida os alunos em grupos e peça que pesquisem diferentes perspectivas filosóficas sobre o tema. Eles podem apresentar argumentos éticos a favor e contra, e discutir as implicações dessas tecnologias em nossa vida cotidiana.
Análise de Filmes ou Séries: Exiba filmes ou séries que abordem questões éticas relacionadas à tecnologia, como “Black Mirror” ou “Her”. Também, questões diretamente ligadas ao Bullying como “Extraordinário” ou “Te pego lá fora”. Após a exibição, promova uma discussão em sala de aula sobre os dilemas morais apresentados e como eles se relacionam com os princípios filosóficos estudados.
Projeto de Ética em Tecnologia: Divida os alunos em grupos e peça que criem um projeto sobre ética em tecnologia. Eles podem escolher um tema específico, como o uso de algoritmos de recomendação em plataformas de mídia social, e desenvolver uma apresentação que analise o impacto ético dessa tecnologia, propondo possíveis soluções ou diretrizes éticas. Simulações Éticas: Crie simulações de situações éticas envolvendo tecnologia. Por exemplo, você pode apresentar um cenário em que os alunos são responsáveis por tomar decisões sobre o desenvolvimento de uma nova tecnologia controversa, e depois discutir as implicações éticas de suas escolhas.
Conscientização e Prevenção do Bullying
Desenvolver estratégias para prevenir o bullying (cyberbullying), incluindo educação digital (netiqueta), promoção de empatia pessoal e online criando ambientes sociais e digitais mais seguros e inclusivos a partir da Escola. Promover a conscientização sobre os impactos psicológicos e sociais negativos do bullying e fornecer recursos para as vítimas.
O que podemos fazer?
Campanha de conscientização na escola
Elaboração de materiais gráficos de conscientização para a campanha da escola. Sugestão: usar o CANVA Elaboração de vídeos. Sugestão: usar o CapCut Refletir sobre onde rodar a campanha: blog de conscientização; redes sociais da escola; meios de comunicação da comunidade.
Teatro e Dramatização
Criar, junto com os alunos, esquetes envolvendo situações de bullying, que possam ser encenadas e apresentadas não apenas em sala de aula, como também para toda a escola. Essa atividade pode ser desenvolvida junto com o professor de Língua Portuguesa e Arte, uma vez que envolve a preparação do roteiro, cenário, figurino. Promover a encenação de situações de bullying e conflito em sala de aula. Essa ação ajuda os alunos a entender melhor o impacto das ações deles e dos outros. Na sequência podem ser introduzidas discussões sobre como as situações poderiam ter sido resolvidas de forma mais positiva. Essa atividade pode ser um trabalho integrado com o professor de Artes. Dica: A atividade pode ser filmada e então, trabalhar ferramentas de gravação e edição de vídeo, como CAPCUT.
Jogos on-line ou desenvolvimento de jogos nos Espaços Maker de aprendizagem. (O jogo on-line pode ser desenvolvido em softwares como o Scratch, OctoStudio e WordWall)
Redação Criativa: Peça aos alunos que criem poesias ou histórias que promovam a conscientização sobre o bullying e incentivem a empatia e o respeito. Dica: Fazer a produção textual de modo colaborativo do google docs.
Como podemos avaliar?
A avaliação pode ser realizada por meio de participação em debates, apresentações individuais ou em grupo, produção de ensaios ou relatórios sobre temas relacionados ao bullying e suas implicações filosóficas, bem como pela participação e contribuição nos projetos ou campanhas anti-bullying desenvolvidos. Essa ideia pode servir como base para envolver os alunos em reflexões profundas sobre o bullying, não apenas como um problema social, mas também como um desafio filosófico, ético e digital que exige uma resposta ponderada e fundamentada.
Autor: Rodrigo Gomes Rodrigues. Professor de Filosofia da Rede Municipal/ Coordenador do Componente Curricular de Cultura Digital na Secretaria Municipal de Educação de Passo Fundo.
A escola não é uma empresa nem a educação um bem do capital. Policiais militares não são educadores e nunca estiveram no rol de profissionais autorizados a exercer esta função pública tão relevante. A autoria pedagógica do professor é decisiva para pensar as mudanças na educação e na escola.
As reformas empresariais da educação avançam em vários estados brasileiros em duas perspectivas concomitantes: privatização da educação básica e militarização. Estados como Paraná, São Paulo e Brasília são as mais expressivas evidências do momento.
Está em curso a implementação de um sistema de desfinanciamento gradual do sistema escolar estatal e fortalece-se o mercado educacional na direção da extinção do sistema público da educação. Trata-se de um programa conservador (da direita) que quer privatizar tudo e eliminar ao máximo o Estado.
O que está em jogo aqui é a ganância interminável de um tipo de capitalismo que deseja transformar tudo em mercadoria vendável. Isso passa a valer, inclusive, para a Educação, a Saúde e a Previdência, ou seja, as áreas que o avanço democrático do último século tinha definido como dimensões da vida a qual todos têm que ter acesso independente da renda familiar eventual. (Autor: Jessé Souza) Leia mais:www.neipies.com/a-privatizacao-da-educacao/
Para o especialista e estudioso do tema, professor Luiz Carlos de Freitas (Unicamp), esta ação visa facilitar o cumprimento do programa libertariano:
a) permitir maximizar o controle sobre o conteúdo e forma das escolas colocando-as nas mãos de agentes ideologicamente seguros (empresas, incluindo as confessionais ligadas às religiões), maximizando dessa forma o controle ideológico sobre a escola; e
b) também permite criar um patamar de operação para as escolas privadas que aumente as margens de lucro e o interesse pela exploração econômica da educação.
Desde o início do século XXI vêm crescendo e se intensificando as tendências de críticas à escola e, principalmente, à escola pública e aos educadores. As razões são variadas, mas uma se sobrepõe: expansão sem precedentes de uma “indústria global da educação”, fortemente calcada no digital, com ofertas privadas, mas interessada sobretudo na produção de conteúdo, materiais e instrumentos de gestão para a educação pública.
Chistian laval, autor de A escola não é uma empresa: o neo-liberalismo em ataque ao ensino público, afirma que a evolução mercantil do serviço educativo não se explica somente pelo aspecto ideológico. Ela se inscreve no processo em curso de liberalização das trocas e no desenvolvimento das novas tecnologias de informação e comunicação em escala mundial. A tendência do período é colocar em competição mais direta os sistemas educativos nacionais, em um mercado global. Nesta perspectiva, a instituição escolar estatal seria enviada para o lixo da história.
Por mais que alguns pais e mesmo professores acreditem em um mundo competitivo, os estudantes e jovens também precisam ser competitivos, é preciso ter responsabilidade e reconhecer que haverá consequências não somente ao acesso no direito à educação pública, a aprendizagem e desenvolvimento integral do estudante, mas na saúde mental de estudantes perdedores e ganhadores. Não podemos colocar nossas juventudes em jaulas de competitividade.
Vivemos em uma constante competição, que separa o mundo entre “ganhadores” e “perdedores” que esconde privilégios e vantagens. Esta corrida por desempenho e status social transforma o colega em um adversário e provoca enorme frustração e sofrimento quando não se transforma em um dos poucos vencedores.
Outra grande consequência é o aumento da ansiedade, depressão e mesmo a escalada de casos de suicídio entre crianças e jovens, conforme diversos estudos rigorosos realizados no mundo todo e mesmo no Brasil.
Diversas são as causas para toda esta angústia estudantil e juvenil, como as crises econômicas, climáticas, uso excessivo de celulares (geração smartphone), jogos, autodiagnósticos simplistas, não sendo necessário a educação meritocrática e de desempenho agravar ainda as preocupações estudantis como seu presente e futuro.
A privatização e a militarização agravam este cenário para a grande maioria de estudantes matriculados (86%) na educação básica que possuem apenas uma oportunidade: a escola pública de qualidade e necessariamente democrática.
Preocupados, mais de uma centena de entidades da sociedade civil e acadêmica se manifestaram publicamente contra o Programa de Militarização das escolas públicos, alertando e argumento para os graves danos à educação, tais como:
– “Por sua natureza disciplinar voltada para a promoção da obediência à hierarquia ancorada em bases militares, a militarização fere princípios constitucionais do ensino, como a liberdade de aprender e ensinar, o pluralismo de ideias, a valorização de profissionais da educação e a gestão democrática (Constituição Federal, art. 206, incisos II, III, V e VI); fere o direito à liberdade, ao respeito e à dignidade de crianças e adolescentes (Estatuto da Criança e do Adolescente, art. 15, 16 e 18-A); e o respeito à identidade e à diversidade individual e coletiva da juventude (Estatuto da Juventude, art. 2º, inciso VI)”, entre outras normativas;
– Os programas de militarização, em todos os entes federativos, não estão amparados em nenhuma das diretrizes, objetivos, metas e estratégias de implementação inscritas no Plano Nacional de Educação (Lei n. 13.005/2014);
– Policiais militares não são educadores, não estão no rol de profissionais autorizados pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (art. 61) a atuar na gestão das escolas ou em qualquer outra função típica dos trabalhadores da educação. Escolas militarizadas, também, violam liberdades de expressão, de organização e de associação sindical dos profissionais da educação, aumentando o fenômeno de autocensura e censura de professores;
– As escolas militarizadas não são mais seguras, ampliam violações de direitos e violências; há diversas denúncias de situações de assédios moral e sexual e abusos físicos e psicológicos contra estudantes praticada por agentes militares;
– O modelo militarizado não contribui para o desenvolvimento integral dos estudantes, seu preparo para o exercício da cidadania e para a promoção de sua autonomia e emancipação;
– Os programas de militarização ampliam as desigualdades educacionais, introduzindo desigualdades no financiamento internas às redes de educação e mecanismos de exclusão de estudantes em maior vulnerabilidade socioeconômica, com deficiência, com distorção idade-série, dificuldades de aprendizagem e de se adequarem às normas e padrões;
– Escolas militarizadas reforçam os estereótipos em relação aos papéis masculinos e femininos na sociedade, que limitam a liberdade dos indivíduos, coíbem a expressão da diversidade de gênero e sexualidade e a demonstração de afetos, principalmente de jovens LGBTQIAPN+.
Camila Rocha, pesquisadora da USP, em recente artigo “Tarcísio e Nunes querem educação para a ditadura”, em vez de ordem e progresso, o futuro com escolas militarizadas promete retrocesso e ditadura, ou seja, é para preparar um novo ataque à democracia e ao estado democrático de direito.
Afirma a pesquisadora que “violações de direitos humanos ocorridos nas escolas militarizadas já foram denunciadas à ONU. No entanto, em meio a omissão do governo federal e do STF sobre a flagrante inconstitucionalidade de tal “modelo escolar’, governos estaduais (como São Paulo) e Assembleias Legislativas em vários e insistem em aprovar e implementar escolas militarizadas.
Neste contexto, é necessário reafirmar a escola como um espaço público comum da educação.
Para o educador e pensador António Nóvoa (Universidade Nova de Lisboa), esse espaço público comum só terá sentido no cenário de uma forte participação social, com capacidade de deliberação e exercício de cidadania. Não se trata, apenas, de consultar, mas de organizar processos de decisão sobre as políticas de educação.
Em outra perspectiva e concepção, um grupo de pesquisadores, pesquisadoras, professores e professoras, estudantes e gestores, especialistas e investigadores, reunidos na Unicamp em junho do corrente ano, por ocasião da realização do IX Simpósio Internacional de Estudos e de Pesquisas do Grupo Paidéia, publicaram a Carta de Campinas de 2024, onde nos reafirmam um horizonte para o debate sobre a educação e escolarização no Brasil.
Destacamos, a seguir, alguns posicionamentos expressos na Carta de Campinas que se contrapõem ao modelo escolar privatista e militarizado defendendo uma concepção histórica e republicana da educação não como propriedade individual, mas como pertencente, por essência, à comunidade e à sociedade (Pólis). Os participantes do Simpósio expressam na Carta que:
– Reafirmamos o pleno e irrevogável compromisso com a Educação pública, laica, universal, gratuita e obrigatória, tal como determina nossa Constituição Federal, quando prescreve que a “educação é direito subjetivo e social, dever do Estado e das famílias”, em suas diversas e autônomas formações sociais, institucionais e culturais ( Brasil, CF, Art. 205, 1988);
– Reiteramos o reconhecimento pleno da concepção de Educação como direito e do direito à Educação, sempre compreendida como prática social, cultural, antropológica e histórica, como processo de hominização e de humanização;
– Manifestamos veemente protesto e repúdio ao processo de privatização da gestão escolar pública, pelo Estado do Paraná, e pela concepção perversa de inserção de tecnologias digitais na educação, em detrimento da autonomia dos docentes e dos gestores, legitimamente formados para realizar o ensino e a docência nas escolas, na produção de sua autônoma, livre e criativa atuação na educação escolar, como se anuncia nas políticas estaduais paulistas;
– Repudiamos, também, a proposição das Escolas Cívico-Militares que tem sido lamentavelmente continuada no atual governo como forma de enquadramento militarizado das crianças e dos jovens das periferias urbanas e sociais, com a falsa ideologia da formação disciplinarista da ordem;
– Declaramos plena adesão à concepção de Educação Integral, sobre uma concepção omnilateral, de totalidade e de conjunto, para a formação escolar e educacional.
– defendemos a retomada da concepção de Currículo como a formação para a vida, democrática e humanizadora, em grupos e na sociedade, para a apropriação polifônica da cultura e da vida política, coletiva e comum, para a geração da qualidade social da Educação Pública, com a Filosofia, a Sociologia, a Arte, a Cultura Popular, a Educação Física, a Educação de Jovens, Adultos e Idosos ao longo da vida, a Educação do Campo a partir de suas características e de sua autonomia, a Educação nas Aldeias e Quilombos, a formação autônoma nos núcleos culturais ribeirinhos e nos espaços resilientes, com a Educação Inclusiva efetiva, a defesa da formação para a pesquisa e para a Educação Socioambiental e Sustentável.
Sim, percebam que são projetos de sociedade, de educação e de escola em disputa, com perspectivas, concepções e fins bem diferentes. Um à serviço da reprodução e da acumulação do capital, da riqueza e das oportunidades para poucos bilionários planetários, o outro na defesa da educação pública, democrática e cidadã para a grande maioria da população. Faça sua escolha e lute. Numa ditadura não teremos escolhas e a luta será muito mais árdua!
As árvores são crianças abandonadas que não sabem onde se amparar da chuva, do sol e da maldade humana. Estão adoecendo e morrendo de tristezas as mais diversas porque perderam a briga para o concreto faz alguns anos.Quero ser a voz das árvores neste pequeno ensaio.
Quero ser a voz das árvores neste pequeno ensaio onde penso chamar a atenção de quem ainda tem tempo para ler um texto que pode falar apenas simplicidades, mas que pede socorro pelas árvores da minha cidade e do mundo inteiro porque o passarinho que sou virou árvore antes do poema do meu querido Manoel de Barros que nos diz
“Um passarinho pediu a meu irmão para ser uma árvore. / Meu irmão aceitou de ser a árvore daquele passarinho. / No estágio de ser essa árvore, meu irmão aprendeu de sol, / de céu e de lua mais do que na escola…”
Que muitas crianças possam aprender e exercitar ser uma árvore por um instante na vida, sentindo as dores da faculdade de uma existência que parece ter deixado de ser boniteza num mundo de concreto feito de cimento, areia e pedras. As árvores são crianças abandonadas que não sabem onde se amparar da chuva, do sol e da maldade humana. Estão adoecendo e morrendo de tristezas as mais diversas porque perderam a briga para o concreto faz alguns anos.
A beleza dos canteiros de uma cidade está nas suas árvores com galhos enormes espalhados pelos quatro cantos de uma avenida dando-nos sombra e frescor com o vento nas suas folhas. Eu que amo as árvores sei bem do que é abraçar uma delas e receber um acalanto na alma daquelas que pouco recebem de nós e nos dão tantas coisas boas.
As árvores deveriam ser imortais e nunca derrubadas pelos homens. As crianças precisam aprender desde cedo a respeitarem as árvores assim como idosos e adultos. Outro dia, eu vi uma mulher grávida quase dar à luz a uma criança embaixo de uma velha árvore na periferia da minha cidade. Nas periferias é onde a vida acontece de verdade, leitor lindo.
Fico me questionando por que algumas pessoas ainda insistem em dizer que as árvores sujam as ruas e atrapalham o trânsito nas grandes cidades se elas chegaram primeiro, a história é meio parecida com a colonização do nosso país, pois os indígenas estavam aqui bem antes dos portugueses, mas isso é outra história que quero contar outro dia.
Hoje quero falar para vocês de que os homens estão ficando malucos com essa ideia de desenvolvimento, inteligência artificial, smartphones e compras pela internet.
Vi uma pessoa comprar uma plantinha num site até fofinho, mas planta a gente consegue em qualquer canteiro, não é mesmo? Pois acreditem isso não acontece mais. Os canteiros estão deixando de existir. Nos lugares das árvores placas de sinalizações, postes de iluminação pública ou radares de segurança e outras bugigangas que os homens inventam para prejudicar a si próprios.
Se quisermos ter uma plantinha dentro de casa teremos que ir a um site e comprarmos porque elas já não estão mais onde deveriam estar: espalhadas pela cidade. Nos seus lugares estradas de concreto, edifícios enormes, supermercados e até mesmo escolas para crianças derrubam árvores para construírem seus prédios.
O mundo virou um concreto e o verde já não está mais no seu lugar. Se você olhar atentamente verá poucas ou nenhuma árvore na sua cidade caso more numa metrópole. Os homens esqueceram que o verde da natureza nos traz ar puro e é necessário para a vida humana, trocando-o por concreto.
Eles dizem que é preciso desenvolver as cidades, que é preciso acompanhar o mundo contemporâneo, que é necessário se igualar as grandes megalópoles. Ora, ora, e o nosso desenvolvimento sustentável? Fica somente no papel, leitor. Na hora de construir um prédio de vinte ou trinta andares aquelas cinco lindas árvores são esquecidas no que diz respeito aos seus benefícios para os pulmões dos engenheiros e pedreiros. Elas são derrubadas violentamente por grandes carros que parecem mais umas geringonças de fazer medo a qualquer criança.
Já teve um tempo que quis nascer árvore, mas hoje teria medo, muito medo. Os homens estão fazendo com as árvores o mesmo que o prefeito da província romana da Judeia, Pôncio Pilatos, fez com Jesus Cristo, ou seja, forçando-as a pagarem um pecado que nunca cometeram. Estou cansada demais para continuar a minha luta pelas árvores e seus encantos, pelos seus mundos imaginários que nos mostram o quanto é lindo ver o desenho de uma criança brincando debaixo de uma delas.
Estamos trocando as nossas árvores por concreto porque somos humanos demasiados humanos ratificando o que diz o livro do grande filósofo Nietzsche, ou seja, a ausência da liberdade, as ações humanas são contingentes e precisas num mundo de caos e político masoquista.
A liberdade das árvores de poderem reivindicar os seus direitos; os homens têm sido meio animais cheios de instintos regidos por uma coisa chamada: desenvolvimento. As árvores estão com taquicardia, com ansiedade, com depressão e todos os problemas mentais que um ser vivo pode ter neste último grande século em que estamos vivendo porque temem os malditos corações dos homens de paletó e gravata.
Eu queria mesmo era que as árvores deixassem de ser generosas e fizessem uma revolução no mundo inteiro saindo em passeatas pelas ruas das cidades dizendo aos homens más que eles precisam delas, que elas são indispensáveis à vida. Deus criou a árvore da vida, quem foi lá e a derrubou? O homem pecador. O homem cruel. Certamente um homem que queria o desenvolvimento do seu lugar de moradia.
Na minha cidade todos os dias árvores são derrubadas para serem construídos prédios, viadutos, estacionamentos, shopping centers e ninguém diz nada. Todos ficam calados com medo de serem expulsos do paraíso do concreto onde atrás dos muros que se escondem têm uma vida pacata. Não precisam brigar por sombra ou água fresca porque compram com o dinheiro se possível até mesmo a vida imagine uma árvore. Isso é coisa de gente que não tem com o que se preocupar ficar brigando por uma árvore.
Porque toda árvore que é derrubada nas cidades grandes é para o bem do seu povo, alegam as autoridades. Só que elas não sabem que o bem do povo é conservar o verde das florestas e saber conviver com a natureza e os prédios num lugar só. Acho que ninguém ousa perguntar se é preciso mesmo derrubar árvores para construir um shopping em uma dessas reuniões chiques de engenheiros e empresários. Quem vai perder tempo com uma arvorezinha qualquer? Elas não são nada para esses homens loucos por dinheiro e mentirosos ao ponto de dizerem que praticam o desenvolvimento sustentável.
Eu conheço bem as árvores. Sou amiga íntima de várias delas, principalmente as das periferias da minha cidade, as que ninguém dá nada por elas, aquelas que o povo tem mania de colocar entulhos e lixos nos seus troncos e a prefeitura com raiva prefere derrubar a árvore para impedir que essas coisas aconteçam. As árvores estão com medo de continuarem sendo elas mesmas, e já começam a se vestirem de monstros para assustarem esses homens ambiciosos que só pensam em dinheiro.
Nos livros didáticos das crianças a gente vê muito desenho de árvore, mas quantas delas não foram necessárias serem derrubadas para a fabricação do papel daquele livro? Que adianta insistir com as crianças de que a natureza é linda se já não damos o verdadeiro exemplo para elas de cuidado e respeito com as árvores ao nosso redor? As árvores vão morrer de infarto qualquer dia desses porque seus corações não resistirão a maldade humana.
Num lugarzinho serrano do meu Estado foram derrubadas várias árvores para a construção de um hotel. Eu fiquei bastante triste quando soube disso e fui lá, fiz um trabalho com as crianças sobre as árvores onde elas brincavam e que tinham sido derrubadas para a construção do tal hotel, mas elas foram enganadas pelos seus pais e responsáveis que lhes disseram que no hotel teriam parquinho de diversões, piscinas e áreas de lazer para elas se divertirem à vontade. Já viu criança pobre entrar em hotel de luxo?
Mentem para as crianças, mentem para os idosos, mentem para a sociedade e assim vão derrubando as nossas árvores para construírem seus prédios com muros altos e portarias cheias de seguranças onde ninguém se aproxima sem se identificar. Nem as árvores são bem-vindas em alguns desses prédios, pois elas sujam muito com as suas folhas e será preciso contratar um jardineiro para cuidar delas, um gasto desnecessário para muitos moradores.
As árvores perderam a batalha contra o concreto até nas cidades pequenas. A grama de um estádio de futebol moderno é sintética e não real como a grama do campinho do bairro de dona Maria. O verde perdeu a sua audácia, a sua estada, o seu oceano, a sua Terra e a sua dignidade. E quando se perde a dignidade não nos resta mais nada a não ser morrermos para o mundo. Nos silenciar e deixar que as coisas aconteçam conforme a necessidade dos homens que controlam as armas nucleares capazes de fazer deixar de nascer plantas e gente em lugares aonde elas chegarem por vários anos.
Estamos todos mortos, principalmente as árvores. Delas vão sobrar alguns poucos desenhos de crianças que ainda podem brincar com elas na casa dos avós que não as derrubaram para acimentar o quintal de casa e assim ficar mais fácil a limpeza. Até os avós estão usando cimento no lugar de grama nas suas casinhas de sapê.
Para encerrar este pequeno ensaio um pouco tristonha, mas sabendo que a minha luta pela vida das árvores continua ainda mais forte deixo vocês com o poema de António Gedeão que nos diz
“…As árvores, não. / Solitárias, as árvores, exauram terra e sol silenciosamente. / Não pensam, não suspiram, não se queixam. /Estendem os braços como se implorassem; / com o vento soltam ais como se suspirassem; / e gemem, mas a queixa não é sua…”
Ao contrário do que diz o poema de António Gedeão eu acredito que a queixa das árvores é o silêncio de estar presente num mundo que era seus e hoje pertence ao concreto dos homens ambiciosos que só pensam em construir prédios e fazer estradas para irem onde nunca saberão.
Um dos propósitos do site é realizar publicações sobre práticas educativas que apresentem diferentes metodologias e reflitam aprendizagens feitas por professores e professoras e pelos estudantes. Neste caso específico, trataremos de uma prática leitora com estudantes de sétimos anos do Ensino Fundamental.
A EMEF Zeferino Demétrio Costi, em Passo Fundo, RS, desenvolve, em 2024, um projeto de leitura chamado “Ler um livro é ler o mundo”. Quinzenalmente, um período é dedicado à leitura por todos os estudantes e professores da escola. Nessa experiência leitora, surgiu a obra “O livro dos pontos de vista”, do autor Ricardo Azevedo, para a realização de uma atividade interdisciplinar. Foi realizada uma leitura compartilhada com a turma, utilizando também períodos de Filosofia e de Língua Portuguesa. A leitura necessitou de vários períodos para ser finalizada, fazendo-se leitura de um personagem por período (são 8 personagens no livro).
Chamou-nos atenção o livro tratar de pontos de vista, que nada mais são do que vistas do diferentes pontos. Cada sujeito, cada personagem, manifesta sua opinião a partir de seu contexto, de suas vivências e de suas percepções sobre a realidade, como é o caso desta história onde os personagens compartilham o mesmo lugar, mas veem o mesmo e também aos demais de maneira muito diferente.
Como ilustra a poesia abaixo, cada um tem seu ponto de vista.
Pontinho de vista (Pedro Bandeira)
Eu sou pequeno, me dizem, e eu fico muito zangado. Tenho de olhar todo mundo com o queixo levantado.
Mas, se formiga falasse e me visse lá do chão, ia dizer, com certeza: — Minha nossa, que grandão!
Em seguida, a professora de Língua Portuguesa fez uma discussão sobre os diferentes pontos de vista de cada personagem da obra que habitavam uma casa e seu entorno, um jardim: mãe, pai, filho e quatro animais de estimação: um cachorro, um gato, um sapo e uma tartaruga.
O autor descreveu, de maneira genial, as percepções do ambiente e das relações vividas pelos personagens.
Em grupos, definiu-se por um trabalho de sistematização da obra através da confecção de uma pizza literária. Criou-se o grupo dos personagens humanos, dos personagens animais, do cenário da história e dos relatos da história.
A construção da pizza, como um dos resultados finais do processo, é representada pelos diferentes pedaços da mesma, como trabalho de cada grupo.
Aprendizagens
Para a professora de Língua Portuguesa, Ângela da Fontoura, “a ideia de “montar” uma pizza literária foi uma forma diferenciada de estimular realização da leitura e sem aquela tradicional cobrança da síntese da obra. A metodologia da leitura compartilhada oportunizou uma discussão a respeito da visão de cada personagem em relação aos demais. Instante também do compartilhamento das impressões e vivências pessoais atreladas ao texto. Foi também o momento da argumentação: a discussão com outros leitores enriquece a capacidade argumentativa e desenvolve as habilidades da oralidade, como também o respeito à opinião do outro.
Durante a leitura, foi preciso anotar as possíveis palavras desconhecidas, já que a prática leitora permite o contato com novas palavras. É o enriquecimento vocabular estimulado pela leitura. A atividade de montagem da pizza desenvolvida em grupo estimula a integração de vivências e de saberes.
Diante das etapas vivenciadas nas atividades, foi possível perceber que, como os personagens, nós também temos percepções diferentes diante de um mesmo contexto. Embora pensamos diversamente, podemos conviver de forma harmônica e respeitosa. Também percebemos quão chato seria se pensássemos e agíssemos da mesma forma. O que nos enriquece como humanos é exatamente a nossa forma individual de pensar e agir.
Sugestões de aplicabilidade
Imaginamos que essa experiência de uma prática leitora possa inspirar outros colegas professores e professoras para realização de leituras de obras compartilhadas entre diferentes Componentes Curriculares ou mesmo diferentes áreas de conhecimento, gerando conhecimentos interdisciplinares e complementares, bem como diversificando metodologias de ensino e aprendizagem, tão necessárias para ressignificar a educação no contexto atual.
Pensemos e perguntemo-nos: é assim, mas poderia ser de outra forma? É assim, mas e se fosse de outra forma?
A estupidez, “notável falta de jeito para entender as coisas”, quando é um traço individual incomoda, mas quando faz parte da cultura de uma época é perigosa porque a naturalização irresponsável de tudo é o passo anterior ao autoritarismo e à aniquilação do pensamento.
Quase tudo no mundo que habitamos conduz-nos, empurra-nos sem resistência para formas de vida superficiais, para uma banalidade que inunda quase todos os níveis da nossa vida cotidiana, mesmo a das pessoas com níveis de formação sofisticados; sutilmente incutida na nossa vida de relacionamento, na educação, na política, na construção de representações do mundo, do outro ou da família.
Exercitamos formas utilitárias e rápidas de dar ação rápida, impensada e não criativa a qualquer situação que nos obrigue a pensar sobre por que fazemos o que fazemos, ou a rever as razões do nosso comportamento; Por esse caminho, passamos a qualificar como genialidade aquilo que nada mais é do que imbecilidade, a aderir alegremente a julgamentos de valores baseados em opiniões formadas levianamente.
Muitas vezes trata-se de microbesteiras, de simplificações, de repetições de lugares-comuns, da criação de uma forma de estar no mundo sem nos perguntarmos se essa forma é a única, se não existem outras, se respondem a que em algum momento, quando tivemos sonhos, pensamos no nosso pouco sentido existencial.
Temos uma tendência alarmante de aceitar como boa qualquer opinião coberta de dados e, não de acordo com isso, reproduzimo-la criando um emaranhado desordenado de ideias, sentimentos, opiniões, falsidades entre as quais às vezes escorrega uma meia verdade; não temos interesse em duvidar ou verificar nada. Em vez disso, repetimos, degradamos ideias, sentimentos, cultivamos um interesse pelos nossos semelhantes que é testado na primeira adversidade: o outro não responde o que esperamos ou não o faz imediatamente, ou o faz com nuances quando olhamos para uma resposta monolítica.
Somos fascinados pelas redes, verdadeiros esgotos do que é execrável num mundo criado ad hoc, em que, por exemplo, a sexualização da vida cotidiana vestida de transgressão engraçada causa estragos, especialmente entre os mais jovens que confundem a vida sexual com pornografia, que até uma criança acessa facilmente ou que nos invade compulsivamente.
Temos que fazer uma tarefa simples, mas chata: pensar contra o bom senso e até contra nós mesmos, em linguagem pugilística, colocar-nos como o outro contra as cordas, fazer o mesmo com o outro e perguntar e nos perguntar repetidas vezes por que, em relação a tudo aceitamos como evidente, ao que normalizamos.
Façamos isso repetidas vezes até que estejamos honestamente convencidos de que atingimos um ponto de convicção que admite dúvida razoável; não nos contentarmos com uma explicação que sabemos ser inconsistente e que, no entanto, aceitamos.
Pensemos e perguntemo-nos: é assim, mas poderia ser de outra forma? É assim, mas e se fosse de outra forma? E não importa que não tenhamos clareza sobre esse outro caminho ou maneira, mas que abramos espaço para a possibilidade de que isso possa acontecer.
Autor: Eduardo Corbo Zabatel. Ensayista, Psicólogo, Profesor de Historia, Magister en Ciencias Sociales. Mora em Buenos Ayres e está começando a ocupar a sua coluna neste site com esta publicação. Bem-vindo!
… a alegria está sempre ameaçada… para desgraça e ensinamento dos homens, a peste acordaria os seus ratos e os mandaria morrer numa cidade feliz.
Camus, A Peste, 1999, p. 269
O título faz uma afirmação [ainda que sem ponto final]. Constata que interrogações já não são tão comuns; adota o lado de quem as entende relevantes; formula um juízo indicativo de sua carência… e, ainda mais, que esta talvez seja a razão da sua própria irrelevância… viciosamente falando: a falta de interrogações leva à irrelevância da interrogação! [com uma exclamativa]. Está expressa a situação? [numa interrogativa].
A questão levanta a hipótese de vivermos um tempo no qual se evita ao máximo a interrogação e a reflexão anda escassa, senão ausente. E isso ocorre não porque teria havido um atrofiamento cerebral em consequência do uso excessivo de telas e algoritmos – ou talvez sim, por este motivo –, mas de cerco ao espírito, que passa a se proteger assentado em certezas e em tudo quanto for absolutamente absoluto e definitivamente pronto, dando vazão a fundamentalismos de todo tipo. Ainda haveria espaço para a vida do espírito? Eis a questão, melhor formulada.
A interrogação poderia ser não mais do que um simples sinal gráfico de pontuação, como qualquer outro. Mas, ela é muito mais. É uma questão [que é bem mais que uma pergunta], que denota uma dúvida, ainda mais, uma busca, na expectativa de resposta. Estaria na sua origem a palavra “quaestio”, já que seria uma figuração de sua primeira e última letras compostas “q” e “o”, que virou o “q” sobre o “o”: ? – assim, ou de ponta cabeça, como no espanhol, posto ao início e no final da frase interrogativa.
Victor Klemperer, que se dedicou a estudar a linguagem do Terceiro Reich (LTI – Língua Tertii Imperii) (2009), mostra a análise de um filólogo que, tendo vivido o período, procurou entender como a linguagem foi usada para a manipulação ideológica pelos nazistas. Ele defende a tese de que a consolidação do nazismo foi acompanhada de sua dominação da linguagem que conseguiu permear o meio intelectual e popular: “o nazismo se embrenhou na carne e no sangue das massas por meio das palavras, expressões e frases que foram impostas pela repetição milhares de vezes, e foram aceitas inconscientes e mecanicamente” (2009, p. 55).
Ele mostra o uso de certos termos pelo nazismo. É o caso do termo “liquidar” (liquidiert). Oriundo do campo dos negócios, com sentido de fechar, finalizar, transposto para o campo militar, acaba por “reificar” o inimigo, já que “liquidar” estava associado a eliminar os inimigos como coisas, bens materiais. Outro aspecto para o qual chama a atenção é o dar ordens, comandar, que era entendido como determinação superior inquestionável a ser cumprida cegamente (blindlings) transformando subordinados em automatizados, máquinas de cumprir ordens, acionados com sincronização (gliechshalten).
O filólogo também faz a análise do uso de siglas, muito comuns na linguagem nazista. Isso ocorre, por exemplo, com a sigla “SS”, com mostra no capítulo 11, intitulado “Limites mal definidos”, onde diz que “SS é, ao mesmo tempo, imagem e sinal gráfico abstrato, é transposição da fronteira para o lado pictórico, é retrocesso ao aspecto visual dos hieróglifos” (2009, p. 129).
Este mesmo capítulo é concluído com algo que tem relação direta com o que estamos tratando aqui. Diz: “Também neste caso os limites se confundem, surgem insegurança, hesitação e dúvida. Ponto de visa de Montaigne: Que sais-je, o que sei? Ponto de visa de Renan: o ponto de interrogação é o mais importante de todos os sinais de pontuação. É a posição de extremo antagonismo à teimosia e à autoconfiança nazistas” (2009, p. 131).
E, logo em seguida, arremata: “O pêndulo da humanidade oscila entre ambos os extremos, procurando o ponto de equilíbrio. Antes de Hitler e durante o período de Hitler afirmou-se inúmeras vezes que todo progresso se deve aos obstinados e todos os empecilhos se devem aos simpatizantes do ponto de interrogação. Não se pode afirmar isso com certeza. Mas se pode afirmar, com certeza, que mãos sujas de sangue são sempre de obstinados” (2009, p. 132).
O capítulo seguinte, 12, trata exatamente de “pontuação”, sendo que é nele que vai comentar como a linguagem nazista usa “ad nauseam” as “aspas irônicas” [não é o caso do uso de aspas que estamos fazendo agora] como recurso para fazer referência nada neutra a um adversário a ser rebaixado. Um recurso, aliás, ainda muito usual na chamada guerra cultural e nos discursos de ódio em nossos dias.
Uma das características do modo fascista de vida – tão comumente semelhante ao modo neoliberal de vida – foi caracterizado por Theodor Adorno como “ausência de consciência” (2003, p. 121) e de “consciência coisificada” (Verdinglichung) (p. 130). Ele também usa outras expressões, entre elas: “índole dos algozes” (p. 124), ideal da “severidade”, “véu da técnica” (p. 132), naturalização do “ser-assim” (p. 132), indiferença e falta de empatia (p. 134), individualismo (p. 134), neutralidade (p. 136) e “assassinos de gabinete” (p. 137). É exatamente em Educação após Auschwitz (publicado em 1967), onde diz que “a barbárie encontra-se no próprio princípio civilizatório” (2003, p. 120) e que “a barbárie continuará existindo enquanto persistirem no que tem de fundamental as condições que geram esta regressão” (2003, p. 119). Outro crítico, Walter Benjamin, na VII das teses Sobre o Conceito de História (1940) diz que“Nunca há um documento de cultura que não seja, ao mesmo tempo, um documento da barbárie” (2005, p. 70). Diagnóstico feito… na ausência da interrogação está a morte da consciência, da reflexão, da crítica… barbárie! Alertas potentes, nem sempre escutados.
Hannah Arendt também já tinha percebido a corrosão da consciência como parte da experiência nazista no livro-reportagem sobre o julgamentode Eichmann em Jerusalém (1999). Ela classificou o que assistia numa expressão que ficou famosa e polêmica: a “banalidade do mal”. Ela mostrou como a ausência do espírito reflexivo leva à resposta burocratizada e funcionalizada que, na verdade, busca “resolver problemas de consciência” invertendo a posição da vítima e do algoz, transformando o segundo na primeira: “em vez de dizer ‘que coisas terríveis eu fiz com as pessoas!’, os assassinos poderiam dizer ‘que coisas horríveis eu tive que fazer na execução dos meus deveres, como essa tarefa pesa sobre os meus ombros’” (1999, p. 122). A rigor, transforma algozes em heróis!
Outro diagnóstico vem de Dardot e Laval, em A Nova Razão do Mundo (2016), que mostra o “sujeito neoliberal”, a “subjetividade empresarial”, caracterizada como uma “subjetivação pelo excesso de si em si ou, ainda, pela superação indefinida de si” (2016, p. 357). Uma subjetividade cheia de si, mas ao mesmo tempo sempre insatisfeita, visto ter um gozo que está “além de si sempre repelido”. Um sujeito que precisa estar o tempo todo fazendo coisas, competindo com os outros – aliás não há outros, há outros coisificados, instrumentalizados – num realismo raso que nunca pode ir além do si mesmo, por si e para si mesmo, numa rotina do mesmo, a todo o tempo. Nada há fora da disputa e da competição, da acumulação, da eficiência, expressão e garantia de sucesso, de “realização”, que nunca pode parar e sequer perguntar pelos meios e menos ainda pelos fins implicados no “desempenho”. Tudo isso reduz a subjetividade à apreensão factual, quando não a dispensa, reproduzindo-se em “pós-verdades”, e “slogans”, estereótipos simplistas, que desestimulam (para ser mais exato, interceptam) todo tipo de parada, de silêncio, de sono, de ponderação, de hesitação, de introspecção, de reflexão… é o império do “doers” – parar é um risco pois pode alimentar o desejo de não seguir… e não dá para aceitar que há limites!
Adorno indica a superação destas condições pela formação da consciência para a reflexão e a autorreflexão crítica e para a resistência (2003, p. 122), já que, o “único poder efetivo contra o princípio de Auschwitz seria a autonomia, para usar a expressão kantiana; o poder para a reflexão, a autodeterminação, a não participação” (2003, p. 125). Sugestão dada… recolocar estas exigências na mesa.
Em Ensinando a Transgredir, bell hooks pede que todos/as: “[…] abram a cabeça e o coração para conhecer o que está além das fronteiras do aceitável, para pensar e repensar, para criar novas visões, celebro um ensino que permita as transgressões – um movimento contra as fronteiras e para além delas. É esse movimento que transforma educação na prática da liberdade” (2013, p. 24).
Há caminhos… mas inacessíveis sem frear a “locomotiva”… há um trabalho ético, político e pedagógico urgente… recuperar o lugar e o tempo da interrogação…
Referências citadas
ADORNO, Theodor W. Educação após Auschwitz. In: Educação e Emancipação. 3. ed. Trad. Wolfgang Leo Maar. São Paulo: Paz e Terra, 2003. p. 119-138.
BENJAMIN, Walter. Sobre o Conceito de História. In: LÖWY, Michael. Walter Benjamin:aviso de incêndio. Uma leitura das teses Sobre o Conceito de História. Trad. W. N. Caldeira Brandt [Tradução das teses por J. M. Gagnebin e M. L. Müller]. São Paulo: Boitempo, 2005.
CAMUS, Albert. A Peste. Trad. Valerie Rumjanek. Rio de Janeiro: Record, 1999.
DARDOT, Pierre; LAVAL, Christian. A Nova Razão do Mundo: ensaio sobre a sociedade neoliberal. São Paulo: Boitempo, 2016.
HOOKS, bell. Ensinando a Transgredir:a educação como prática da liberdade. Trad. M. B. Cipolla. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2013.
KLEMPERER,Victor. LTI: a linguagem do Terceiro Reich. Trad. Miriam B. P. Oelsner. Rio de Janeiro: Contraponto, 2009.
Autor: Paulo César Carbonari.Doutor em filosofia (Unisinos), militante de direitos humanos (MNDH/CDHPF), educador social. Também escreveu e publicou no site “O pensamento tornou-se cego”: https://www.neipies.com/o-pensamento-tornou-se-cego/