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Origami

 

 

Frágil origami. Talvez seja também como a música,
que se mostra encantadora e surpreendente no sutil
e imprevisível intervalo das notas, fronteira do improviso,
da brincadeira e da liberdade.

 

Havia um origami de elefante caído no meio-fio, perto de uma lixeira. Parei, olhando-o detidamente.

O papel estava manchado de batom. Aliás, marca de um beijo vermelho.

Peguei-o, percebendo que fora feito num papel de carta. Uma carta de amor, escrita numa caligrafia fina e nervosa, talvez de mulher.

O texto, absolutamente desencontrado, revelava o desespero de um amor irrealizado, de uma paixão que irrompera forte, destruída pelo tempo, pela falta de sentido da vida. Larguei o origami no chão, abandonando-o à própria sorte.

Fui-me com a certeza de que a vida, a nossa vida, lembra um origami, revelando em suas dobras, verdades e não verdades, ilusões, sonhos, esperanças e fracassos, tornando a visão linear impossível para quem quer que seja.

Os espaços abruptamente interrompidos, as dobraduras e as ousadas alternâncias geométricas dizem muito daquilo que somos, levando-me à crença de que a existência, de fato, é um origami…

Frágil origami.

Talvez seja também como a música, que se mostra encantadora e surpreendente no sutil e imprevisível intervalo das notas, fronteira do improviso, da brincadeira e da liberdade.

 

Em defesa da igualdade de oportunidades (ao invés de: Em defesa dos ricos)

 

Muitos tratam como crime a atitude de quem luta por causas humanitárias,
quando estas exigem mudanças na estrutura e organização da sociedade.
A compaixão e o amor são compromissos fundamentais para a construção de uma sociedade mais humanizada, inclusiva e promotora da vida.

Sou leitor e assinante do Jornal Zero Hora há mais de dez anos. Sempre fui um leitor crítico à sua linha editorial, mas nunca imaginei ser “enquadrado” por um de seus colaboradores.
A mídia tradicional é expert em manipulações e tendências para manter o “status quo”, ou o “modus operandi” de uma sociedade dividida em classes sociais.
Veja o que um dos colaboradores do Zero Hora escreveu em coluna com o título: “Em defesa dos ricos”.

“Você é da elite? Claro que é, ou não estaria lendo este jornal. No mínimo, pertence à elite cultural. Mas não vai reconhecer, não é? Se reconhecer, será em voz baixa, pedirá para eu não contar aos outros”.

Na sequência, o colunista faz sua defesa dos ricos: “pegue uma cidade como Porto Alegre. Há vários lugares aprazíveis em Porto Alegre, há tanta coisa boa a se fazer na cidade. Mas não se faz, porque essa é uma cidade que se empobreceu ao desprezar suas elites”.

Defendendo prioridades na segurança como uma forma de manter as elites convivendo e consumido no país e não fora dele, Coimbra sentencia: “consumindo aqui, e não lá, as mal amadas elites garantirão emprego para os pobres e arrecadação de impostos para que o governo preste serviço aos pobres. Quer dizer: as elites vão trabalhar para os pobres”.

Leia coluna completa aqui.

Seguem minhas reações, depois de um período de ruminação. (Ruminar é o ato que o boi faz depois de sua refeição, deitando-se à sombra de uma árvore para degustar e mastigar novamente o alimento ingerido, para uma melhor digestão).

Não sou parte da elite, nem cultural e nem econômica. Não quero fazer parte de elite nenhuma. Quero construir uma sociedade que produza meios e condições para que todos “tenham vida em abundância”, como já está escrito nas sagradas escrituras cristãs. O problema que esta “abundância generalizada” é para uma minoria, um pequeno grupo social, uma pequena elite que sempre dominou os meios políticos, culturais e econômicos para manter seus privilégios, em detrimento da exploração dos demais.

Nós podemos construir uma sociedade sem este abismo colossal que divide os poucos que possuem quase tudo e os muitos que não possuem quase nada. Nosso Brasil, por sua privilegiada riqueza natural, tem condições de produzir alimentos, bens materiais e culturais que permitam a todos uma vida bonita, sem sofrimentos e que contemple os direitos humanos fundamentais.

Em outro artigo já publicado, Pobreza e compaixão, defendemos que a compaixão (tomada como compromisso com a superação da miséria humana) é o sentido maior na defesa dos pobres: “não os defendemos por serem bons ou anjos, mas porque são frutos de uma sociedade desigual, que não sabe e não quer lidar com eles”.

Uma sociedade que gera fome, violência e desigualdades não pode se autodenominar democrática. A democracia pressupõe maior igualdade de condições para a maioria da população. Democracia e miséria são incompatíveis, já ensina Betinho (Herbert de Souza).

“Democracia é oportunizar a todos o mesmo ponto de partida. Quanto ao ponto de chegada, depende de cada um”. (Fernando Sabino)

Alimentar o discurso de ódio e de separação das pessoas em ricos e pobres não é a saída para a crise econômica, política e cultural na qual se encontra o nosso país. A solidariedade é o maior valor humano, quando for capaz de operar mudanças significativas que promovam a vida e a dignidade.

Como já ensinou Betinho (Herbert de Souza): “O Brasil tem fome de ética e passa fome em consequência da falta de ética na política”.

O número de pessoas vivendo na pobreza no Brasil deverá aumentar entre 2,5 milhões e 3,6 milhões até o fim de 2017, afirmou um estudo inédito do Banco Mundial. Veja mais aqui.

Ao invés de ódio e rancor de classes, divulgo e procuro viver compaixão. Poucos vivem a compaixão.

Muitos perderam a sensibilidade, o que os impossibilita de viver a caridade e o amor ao próximo. Outros preferem atribuir aos pobres a culpa pela sua situação de miséria e vulnerabilidade. Outros discursam democracia, não perguntando se esta propicia as mesmas condições e oportunidades a todos, como ponto de partida. Porque o ponto de chegada depende de cada um de nós. Muitos tratam como crime a atitude de quem luta por causas humanitárias, quando estas exigem mudanças na estrutura e organização da sociedade.

O amor na sala de aula: depoimento de uma professora

Este depoimento é para lembrar a você, querido professor,
que sem amor nada conseguimos em sala de aula.
Educamos alunos preparados para concursos e o mercado,
mas nunca preparados para a vida.

Quando fui professora do terceiro ano do ensino fundamental I na Escola Municipal Sérgio de Oliveira Aguiar no município de Extremoz, Rio Grande do Norte, a minha turma era composta por quatorze crianças entre os seis e oito anos de idade. Eram quatro meninas e dez meninos.

No dia anterior ao meu primeiro dia de aula pintei a sala de cor branca e colei figuras feitas de EVA nas paredes. Limpei as janelas e o piso da sala.

Coloquei uma toalha e um vaso com flores em cima da mesa. Lembro-me de que o filósofo Michel de Montaigne fala que uma sala de aula deve ser acolhedora e ter janelas e vasos com flores. Escolhi livros na biblioteca e criei um cantinho para a leitura. Estava quase preparada para receber os meus alunos! Quase por quê? Porque eu me sentia ansiosa para ver aqueles rostinhos olhando para mim, eu não sabia como seria recebida pelas crianças.

Finalmente, o dia amanheceu e cheguei à sala de aula. Recebi os meus alunos com um sorriso no rosto e mais espantada do que eu estavam eles com a decoração da sala. Todos disseram um uníssono “Uau”. Os dias foram se passando e a gente aprendendo a conviver uns com os outros. A gente pintava, brincava, cantava, corria e estudava.

Os alunos disseram-me que antes ninguém brincava com eles em sala de aula, que a professora só fazia ensinar a matéria e pronto. Ela nunca nos contava uma história, disse um deles. O outro reclamou ainda “ela nunca brincou com a gente”. Pedi para que desenhassem eles brincando e falaram-me que não sabiam desenhar.

Eu disse que todo mundo sabe desenhar. Não existe desenho feio ou bonito. E os convenci a desenharem as suas brincadeiras”.

Um dos desenhos era um menino brincando de empinar papagaio. Os dias passaram-se e na semana seguinte eu os ensinei a fazer um papagaio. Começava assim as nossas aulas de artes.

Um dia, o Gabriel adoeceu na sala de aula e mandei chamar a sua mãe. Enquanto eu cuidava dele com carinho a mãe, brutalmente, entrou na sala e o levou para casa. Naquela tarde tive uma conversa com os meus alunos e eles me disseram que sentiam falta de abraços, de ouvir historinhas e de brincarem com os pais em casa.

Pensei: meus alunos estão precisando de amor e não somente aprenderem a fazer continhas. Acho que vou ensinar os dois para eles”.

Mas como ensinar o amor às crianças? Amando-as. Fazendo-as sentirem-se amadas. E foi o que eu fiz.

Que ser humano queremos ajudar a formar e como envolver a todos (ou muitos)  para que se incluam no projeto educativo proposto? A afetividade, impregnada pelo testemunho,  carrega os valores universais do respeito à alteridade, da solidariedade, da gratuidade, do cuidado do patrimônio social, do empenho pessoal pela justiça social.

Educação e relações de afetividade

No outro dia, cheguei na sala de aula com a ideia de criarmos um desenho animado onde todos participariam com as suas vozes e eu faria um bonequinho para cada um.

O nosso filminho se chamaria simplesmente “Meninos da praia”. As meninas não gostaram da ideia do nome do filme, porque eu só falava dos meninos, mas eu disse para elas que aquele nome acolhia a todos era apenas um jeito que escolhi de falar. Mas, preferi mudar o nome do filminho para “Crianças da praia”. E assim agradei a todos. Nós éramos democráticos. Tudo era submetido à votação.

Dessa forma começou o meu ensino com o amor e nunca mais parei de dá amor aos meus alunos. Eu levava flores para eles, criei o grupo de monitores que ajudavam àqueles que precisavam de reforço nos estudos, antes de terminar as nossas aulas cada um me dava um abraço de despedida e ensinei-lhes a desenhar.

A hora do desenho era a que eles mais gostavam, pois eu sempre dizia que cada pessoa desenha do seu jeito e levava desenhos de artistas do mundo inteiro para eles verem e se entusiasmarem.

Nunca apliquei avaliações com os meus alunos. Eles não precisavam ser avaliados. Sabiam produzir textos como nunca vi na minha vida, faziam poesias que era uma beleza e desenhavam príncipes, princesas e fadas como ninguém.

Eu nunca tive jeito para desenhos realistas, mas uma vez inventei de desenhar cada um deles. E eles gostaram da brincadeira de serem desenhados. Fizemos uma exposição na feira de ciências com os nossos desenhos que foi um sucesso.

Este depoimento é para lembrar a você, querido professor, que sem amor nada conseguimos em sala de aula. Educamos alunos preparados para concursos e o mercado, mas nunca preparados para a vida.

O amor em sala de aula é bastante importante.

A aprendizagem de uma criança acontece quando há desejo de aprender. Quando a família não vê o processo de aprendizagem como algo importante e a escola não faz investimento nesse aluno, fica difícil despertar nas crianças o desejo pelo saber, pois se todos desistiram dela porque ela não desistiria?

Educação e afeto – Ana M. Detoni

Os meus alunos faziam bagunça como todos os outros, mas a um simples gesto de emoção meu e eles silenciavam. A minha escola era pequena e muito simples, mas era o que eu tinha. Ensinei filosofia e inglês aos meus alunos mesmo sem constar da grade curricular. Queria que eles soubessem como enfrentar a vida quando adultos.

Eu me preocupava com os sentimentos dos meus alunos e quando eles mentiam para mim ficava triste. A mentira surgia sempre quando eles faltavam à aula.

O aluno Guilherme faltava bastante e os seus amiguinhos diziam que ele ficava brincando na rua quando não vinha à escola. No outro dia tive uma conversa franca com Guilherme e ele me falou que gostava de brincar na rua. Então, disse a ele que a partir daquele dia a gente ia correr na praia todas as sextas-feiras. A escola se localiza numa praia. Ele ficou feliz com a notícia e nunca mais faltou à aula.

A introdução da filosofia se deu quando um dos alunos veio me perguntar por que iriam pintar o muro da escola. Eu respondi que o muro estava com lodo. Ele me perguntou “O que é o lodo?, Por que nasce o lodo?” Eu vi que aquele porquê levaria a outros porquês e dei uma aula sobre o lodo. Foi linda a nossa aula! Surgiram as mais diferentes perguntas sobre o lodo! E nunca mais paramos de filosofar.

Eu tinha o Dudu, o Cadu e o Edu. Cada um com o seu jeito meigo de ser. O menino Edu gostava de continhas e produzia bastantes historinhas com apenas sete anos de idade. Era um grupinho fechado o dos Eduardos. Eles gostavam de brincar entre si.

O amor que eu dava aos meus alunos nunca era demais. Eu tinha o cuidado de levar chocolates para cada um deles, de repetir a explicação da atividade e fazia atividades individuais em seus cadernos todos os finais de aulas.

Eu tinha a missão de escrever quatorze tarefas distintas para cada um dos meus alunos todos os dias. As tarefas eram elaboradas de acordo com o desenvolvimento cognitivo de cada um.

Um dia, o aluno Igor me trouxe, de casa, um livro enorme de contos de fadas para que eu lesse para eles. Eu li o conto dos Três Porquinhos que marcou a nossa turma. Passaram a somente querer ouvir esse conto. Acho que eu imitava as vozes dos porquinhos de um jeito engraçado. Antes de começar as nossas aulas nós rezávamos um Pai Nosso e agradecíamos a Deus por estarmos ali. A música que nos marcou foi “Era uma vez” que cantávamos todos os dias.

Hoje faz onze anos que fui professora daquela turminha. E ontem recebi uma ligação de Guilherme que conta agora dezessete anos. Ele me disse que estava com um problema sério e que só tinha a mim para pedir ajuda. Por que eu, Guilherme? Porque a senhora foi a única pessoa que me amou nessa vida. O problema de Guilherme era coisa de adolescente, ainda bem. E lá fui eu dormir chorando, emocionada. O meu menino cresceu, pensei!

Na edição 300 da revista NOVA ESCOLA, convidamos o professor e filósofo Mario Sergio Cortella para ser entrevistado por três educadores da rede pública de ensino. Nesse vídeo, Cortella explica o papel da afetividade e vínculo com o professor para a aprendizagem do aluno.

Zeca Camargo participa da primeira conferência da Jornada

 

Jornalista e escritor integra o debate da conferência
“Literatura e imagem: além dos limites do real”,
na noite do dia 3 de outubro, na 16ª Jornada Nacional de Literatura

 

“Eu tenho certeza de que as conversas que lá tivermos vão ser capazes de nos jogar muito além dos limites do real”. Essa é a expectativa do jornalista e escritor Zeca Camargo sobre a sua participação na 16ª Jornada Nacional de Literatura de Passo Fundo/RS.

Zeca apresentará, durante a Jornada, suas percepções em relação a “Literatura e imagem: além dos limites do real”. Esse será o tema central da primeira conferência da Jornada, na noite do dia 3 de outubro, no Espaço Suassuna, ao lado dos também escritores Pedro Gabriel, Rafael Coutinho e Roger Mello.

As múltiplas possibilidades da leitura, em especial a leitura da imagem, estarão entre os grandes debates da Jornada. Para Zeca, a leitura é sempre um ponto de partida. E, segundo ele, têm, no seu infinito, um poder limitado: seu domínio é o das palavras.

Somos nós que, como leitores, criamos o resto – um novo real, se preferir, a partir daquele que elas (as palavras) nos oferecem. Se a literatura que temos diante de nós parte do real ou de um universo completamente imaginado, não importa. Somos capazes de desenvolver muitas realidades além dela”, observa o escritor.

Entre as obras indicadas de Zeca para a Jornada, estão: “1000 lugares fantásticos no Brasil”; “Isso aqui é seu Novos olhares”; e “De A-ha a U2”. O escritor comenta como começou a escrever livros.

Jornalista tem que gostar de escrever, né? Mesmo na televisão, fazer uma reportagem envolve a criação de um texto. A prática só aumentou essa relação. Os primeiros livros que escrevi eram, na verdade, grandes reportagens – e eu trouxe um pouco disso para as crônicas e para as tentativas de ficção que tenho feito. É um ‘ofício’, como a gente brinca, um desdobramento natural da nossa maneira de observar o mundo”, revela o jornalista.

Dieta mental

A comunicação e a literatura têm uma relação muito próxima. Zeca comenta que, quando a discussão sobre ‘como escrever melhor’ surge com os seus alunos de jornalismo, sua resposta é simples: “Lendo mais!

Nossa dieta mental do dia a dia envolve sempre algum texto – do jornalismo à crônica, passando, claro, pelo whatsapp…

Mas é na literatura que refinamos nossa comunicação – se não para diretamente crescermos na nossa conversa e no nosso pensamento, ao menos para abrirmos nosso leque de assuntos e temas. Uma coisa alimenta a outra”, destaca Zeca.

Iniciou no jornalismo em dezembro de 1987. Já trabalhou no jornal Folha de S. Paulo, nas emissoras MTV, TV Cultura, e Globo. Inspirado pelas reportagens no Fantástico, Zeca Camargo já escreveu seis livros e, agora, lança a coleção Eu ando pelo mundo. Confira a entrevista e embarque nesse bate papo! Programa Sala de Visita, Livraria Cultura.

Encontrar textos sedutores é a maior dificuldade para formar leitores. Segundo o jornalista e escritor, as leituras “obrigatórias” muitas vezes assustam crianças e adolescentes. O importante é não desistir. “É preciso paciência e perseverança na maioria das vezes. Mas, encontrando um bom texto, acessível e fascinante, já ganhamos esse desafio. Eu sempre procuro escrever cada parágrafo como se fosse um capítulo das ‘Mil e uma noites’: o leitor tem que ter a curiosidade de querer saber onde aquela história vai levá-lo”, comenta o escritor.

 

Inspirações

Vários autores inspiram ou inspiraram Zeca durante a vida dele. O jornalista revela que a primeira paixão foi Agatha Christie, “porta de entrada” para os livros.

“Antes era uma paixão casual – como quando eu encontrava um primeiro capítulo que começava: ‘Era no tempo do rei’… (“Memórias de um sargento de Milícias”, de Manuel Antônio de Almeida)”, relembra o escritor.

Mas, conforme ele, os gostos mudam. “Já me apaixonei por narrativas de autores indianos, como Salman Rushdie e Rohinton Mistry. Já tive minha fase Patricia Highsmith. Hoje, leio qualquer coisa que Edward St. Albin escrever – e sempre releio um Eça de Queiroz de vez em quando… Mas um autor que nunca deixa de me encantar é Ian McEwan – pela maneira como escreve, pela estrutura que dá às suas histórias e pela maneira com que sempre nos surpreende”, pontua Zeca.

 

Expectativa para a Jornada

As Jornadas Literárias acontecem há 36 anos. Nesta edição, uma das homenageadas é Clarice Lispector, uma das grandes escritoras brasileiras. Clarice também é muito especial para Zeca Camargo, que relembrou algumas obras marcantes da autora, como “O ovo e a galinha” (conto de “A legião estrangeira”) e “A paixão segundo GH”. “Pelas sensações que ela sempre me provocou, fico extremamente feliz de participar de uma Jornada que a homenageia entre nomes tão fortes da literatura brasileira”, comentou Zeca.

Sobre a Jornada, o jornalista afirmou que é um encontro de uma força enorme para o universo dos livros no Brasil.

“Fiquei bem feliz com o convite para participar dessa edição. Eu tenho certeza de que as conversas que lá tivermos vão ser capazes de nos jogar muito além dos limites do real”, finalizou o escritor.

 

Jornada Nacional de Literatura de Passo Fundo

A 16ª Jornada Nacional de Literatura e a 8ª Jornadinha Nacional de Literatura são promovidas pela Universidade de Passo Fundo (UPF) e pela Prefeitura de Passo Fundo. Os eventos contam com os patrocínios do Banrisul, da Corsan, da Ambev, da Companhia Zaffari & Bourbon,  da Ipiranga, da Panvel, da SulGás, da Triway e da TechDEC; com o apoio cultural da BSBIOS e do Sesi; patrocínio promocional da Capes, da Fapergs, da Italac e da Oniz; com a parceria cultural do Sesc; financiamento do Governo do Estado – Secretaria da Cultura – Pró-cultura RS LIC e realização do Ministério da Cultura.

Zeca Camargo enfatizou que a Jornada é um encontro de uma força enorme para o universo dos livros no Brasil. Inscrições para a Jornada estão abertas até 1º de outubro

Malas

Mundo, mundo,
Vasto mundo de Passo Fundo!
Tantas falas de malas!
Tantas malas!
Tantos malas!

Malas com dólares,
Mau agouro;
Malas de ouro,
Ali Babá dos tesouros!
Malas com Reais,
Jamais tanto se viu
Como pode!
Onde o bode?
Mala preta,
Pimenta malagueta.

Upa-upa, gaúcho!
De mala e cuia
Troteias na garupa
Do pingo xucro
Indo à bruta luta
Da guerra perdida
Nas lidas da vida.

E agora, Tatu?
Mala sem alça,
Arrastas as malas de pano
Às malas da memória
Para contar a história
Da guerra inglória
Do gaúcho que não morreu

Pedro de Malas Artes,
Bem-aventurado da prosa,
Carregas nas histórias risórias
As falas das gentes
Malas postais calientes
Marcadas pela esperança
Do grande Rio Grande.

Jeca-Tatu, Blau, eu e tu
Sepé Tiaraju, Tatu-Guaçu
Embalamos malas
Poetizar é preciso
Carregar malas também
Ah, como é vasto o mundo das malas!
Vai além de Passo Fundo!
E como espantam o mundo!

Caíram todas as máscaras

A regra é esta: foi-se embora o capital social que
algumas grandes empresas tentavam preservar.
A reputação, os compromissos sociais, a imagem externa,
os vínculos duradouros com as comunidades, nada disso interessa mais.

 

Teve um tempo em que grandes empresas eram sustentadas pela reputação institucional construída por décadas. Agora, o que importa é o resultado imediato às custas do marketing de ocasião.

A reputação, os compromissos sociais, a imagem externa, os vínculos duradouros com as comunidades, nada disso interessa mais. O que interessa é vender o produto. Mesmo que tenha soda cáustica, pelos de rato, pedaços de unhas e restos de propinas.

Degradou-se o esforço construído também por profissionais que se dedicavam a fortalecer marcas associadas a compromissos humanistas e à diversidade.
A reputação é algo vago, cada vez mais distante para os empresários brasileiros e em especial para seus herdeiros pragmáticos.

Obter resultados de curto prazo para os acionistas é a tática da sobrevivência, no ambiente pós-golpe de devastação da democracia e da economia. A estratégia vai até amanhã.

Foi-se o tempo em que boa parte dos empresários gostava de parecer alguma coisa que não era, em meio a projetos grandiosos e sinceros. Mas na maioria dos casos caiu a máscara.

O grande empresário brasileiro é, na média, um reacionário enrustido finalmente exposto pelo golpe. Um ultraconservador, muitas vezes até simpatizante de Bolsonaro, que ainda tentava se vender como um moderado liberal.

Há exceções? Claro, mas não vamos refletir sobre exceções que ainda resistem. A regra é esta: foi-se embora o capital social que algumas grandes empresas tentavam preservar.

A vantagem disso tudo é que o desmonte de compromissos pulverizou também algumas farsas construídas mais recentemente nos anos 90 da redemocratização, em todas as áreas, inclusive na grande imprensa.

Em outro artigo, Moisés Mendes descreve que há um contingente considerável de brasileiros ameaçando deixar o país: “A classe média atordoada se imagina na Austrália, na Nova Zelândia, na Espanha, até na Grécia em crise. Mas nunca no Peru, na Bolívia, no Chile, muito menos na Argentina. O sonho do brasileiro da classe média que deseja ir embora, e mais ameaça do que vai, nunca passa por paisagens latinas. Ir embora significa fugir pra longe”.

Veja mais.

 

O educador como agricultor

Ensinar sem conhecer quem são os alunos
seria o mesmo que o agricultor lançar a semente
em qualquer solo, sem conhecê-lo e tratá-lo corretamente.
Contudo, o gosto pela lida, baseado no amor zeloso e simples,
faz toda a diferença no exercício diário de qualquer profissão.

  

Como podemos observar, a profissão do agricultor não é nada fácil. Está sempre sujeito a riscos. Da preparação do solo até a comercialização dos grãos enfrenta muitos obstáculos, dos quais alguns dependem da solução de sua própria ação e outros obstáculos não.

O planejamento de sua ação, ancorado em sua destreza para se antecipar aos fatos e escolher as melhores alternativas fortalecem suas capacidades de solução contra as intempéries naturais e econômicas.

Mas, em que sentido a profissão do agricultor auxilia para pensar metaforicamente o papel do educador e a profissão de professor?

Se olharmos com atenção as etapas que constituem o trabalho do agricultor, caracterizando-o enquanto tal, é possível observar que muitos fatores independem de sua ação: forças da natureza, estradas apropriadas para o transporte, silos adequados para o armazenamento e humores do mercado internacional. Claro, ele pode interferir para acelerar o reparo das estradas, por exemplo, mas tal reparo depende em última instância da decisão do poder público.

Contudo, há muita coisa que está ao alcance de sua ação, sendo isso precisamente o que interessa a Dewey. A ação bem sucedida do agricultor depende do cumprimento de várias etapas: capacidade de previsão, observação cuidadosa, consideração meticulosa das condições existentes, estabelecimento do plano de ação e escolha certa entre alternativas possíveis.

O autor resume o núcleo da ação do agricultor do seguinte modo: “Seu propósito é simplesmente prever as consequências de suas energias relacionadas com as coisas que estão à sua volta, uma previsão empregada para dirigir seus movimentos no dia a dia”.

O resultado mais eficiente do emprego de suas energias depende do conhecimento maior das coisas e, ao mesmo tempo, do planejamento adequado de sua ação.

Algo semelhante acontece com o educador, seja pai ou professor. Ser bem sucedido no que faz depende do conhecimento de todas as etapas do processo educativo, respeitando-as em seus pequenos detalhes.

Há, como na ação do agricultor, um conjunto de fatores que independem da vontade do educador e que pesam decisivamente no desempenho de sua ação. As forças do ambiente externo, natural ou social, interferem na relação que o professor mantém com seus alunos, dentro da sala de aula. Poderá dar melhor aula, enriquecendo a experiência formativa de seus alunos, se o ambiente lhe for favorável.

“Muitos, como eu, nasceram e viveram a infância na roça. Eu sinto orgulho de ser um filho da roça, porque a vida no “interior” me ensinou valores muitíssimo finos e refinados. Na companhia de árvores frutíferas, animais, nascentes, riachos e lavouras, as pessoas que lá residem formam verdadeira comunidade. Comunidade quer dizer comunhão, integração, relação. Esta comunhão se perdeu na vida urbana atribulada e estressante. Todo o tempo na cidade tem que ser um tempo ocupado. Não temos mais tempo para curtir o próprio ritmo (do tempo).

Vida na roça

A escola pode estar mal construída, em local de difícil acesso, com telhado quebrado e com falta de material. Pode ter o espaço de sala de aula muito pequeno, não conseguindo abrigar confortavelmente o número excessivo de alunos.

Além disso, pode contar com pais e diretores que se interessam pouco pelo processo pedagógico em si, entregando literalmente filhos e alunos ao professor. Há, ainda, o problema da gestão pública dos recursos destinados à educação: o governo, além de ter destinado pouca verba, torna-se ineficiente e corrupto para fazer chega-la a tempo na escola.

Com todas estas condições desfavoráveis, o professor fica obviamente prejudicado no exercício de sua profissão, contando ainda mais com o fato de não receber remuneração justa pelo seu trabalho.

Mas, como na ação do agricultor, há um conjunto de coisas que dependem do próprio professor. Em primeiro lugar, cabe a ele e a mais ninguém, selecionar de maneira mais adequada possível, o conteúdo a ser tratado. A escolha do conteúdo precisa levar em conta as condições existentes, das quais o perfil dos alunos é decisivo.

Ensinar sem conhecer quem são os alunos seria o mesmo que o agricultor lançar a semente em qualquer solo, sem conhecê-lo e tratá-lo corretamente. Daí a importância sobre a observação cuidadosa das condições culturais dos alunos; saber de onde provém; qual é seu contexto social e familiar; o que sabem ou não sabem, tudo isso é muito importante para a organização do ensino.

Além do bom domínio de conteúdo e do conhecimento dos alunos, a postura do professor é determinante para que o processo pedagógico seja bem sucedido. Do mesmo modo que o agricultor não pode estabelecer um ideal de cultivo ignorando as condições existentes, o professor não pode querer simplesmente impor seus próprios fins como objetivos adequados ao desenvolvimento dos alunos.

Respeitar a condição cultural do aluno, tomando como ponto de partida a capacidade de fazer suas próprias experiências é um princípio pedagógico indispensável para que o professor possa ser bem sucedido em sua tarefa de ensinar as novas gerações.

Se o agricultor desenvolve em cada safra as mesmas atividades, mas nunca repetindo-as da mesma maneira, o professor recebe a cada ano alunos diferentes, sem repetir literalmente o mesmo conteúdo e procedimento.

Cada safra representa um novo ambiente, assim como cada turma significa, para o professor, um novo desafio, exigindo-lhe novo recomeço. Mesmo experiente e vacinado na lida, sabe que vai correr risco de não se fazer entender diante da nova turma.

Assim como o bom agricultor, que não se deixa orientar somente pela rentabilidade de seu negócio, mas, ao contrário, zela diariamente pelo crescimento das plantas, o professor demonstra todo seu amor à educação, cuidando cotidianamente de seus alunos.

Assim com o agricultor que espera boa safra e boa cotação de preço para seus produtos, também o professor espera colher os frutos formativos de seu trabalho, sendo remunerado de maneira justa.

Nem uma e nem outra profissão é um mar de rosas, pois, como vimos, estão rodeadas de obstáculos e dificuldades.

O sucesso do professor depende, primeiramente, do mesmo modo que o sucesso do agricultor, de sua capacidade de distinguir entre o que depende e não depende de sua própria ação. Isso ele precisa ter como pano de fundo para poder planejar adequadamente sua ação, prevendo suas possíveis consequências, para escolher da melhor forma entre as alternativas disponíveis.

Contudo, o gosto pela lida, baseado no amor zeloso e simples, faz toda a diferença no exercício diário de qualquer profissão.

Sociedade desconstrutiva

Dostoiévski já dizia: Se Deus não existe, tudo é permitido.
Somos produto de uma mentalidade que caminha em desconstrução.

 

A polêmica exposição patrocinada pelo Santander Cultural, em espaço nobre em nossa capital, é apenas a ponta de um iceberg de uma sociedade em busca da desconstrução.

O desrespeito e ultraje à fé cristã e católica, em tom abusivo, numa apologia e incentivo à pedofilia, zoofilia e orgias sexuais são batizadas de cultura contemporânea e pluralista, sob o pretexto da defesa dos direitos de opção sexual.

A exposição “artística”, agressiva e enfadonha, fere diversos artigos da Constituição Brasileira. Chamam de arte a deturpação da sociedade.

O que torna preocupante é que isso não é apenas um fato isolado, mas reflexo de uma mentalidade e organização global, onde se quer abolir a ética, a moral, a família e a fé, em nome da liberdade e do pensamento pós-moderno.

Para destruir a sociedade, tem que se desumanizar o homem, maculando sua essência mais genuína. A ideologia do gênero, propagada como um bem e antídoto é o veneno de nosso século. É rebeldia da criatura contra o Criador.

Se defendemos a família tradicional, composta de um varão e de uma mulher, com seus filhos gerados desse amor abençoado, estaremos hoje sendo acusados de homofóbicos.

Se nas escolas defendemos o dia dos pais e das mães, estaremos sendo preconceituosos e unilaterais.

Se pregamos nas igrejas a existência única de dois gêneros, como Deus fez e a ciência comprova, somos acusados de discriminatórios, retrógados, fora da modernidade e dos direitos alheios. Os programas educacionais promovidos e exigidos pelo MEC nas escolas, divulgando a ilusória ideologia do gênero, são abusivos e ferem o pudor e o respeito ético, na mais tenra idade.

 

Reações, polêmicas e ponderações

Jones Rossi é editor do Ideias em texto “Seis coisas sobre a exposição no Santander Cultural” enfrenta a polêmica e faz importantes ponderações como esta:

“O boicote promovido por grupos religiosos e civis contra o Santander tem toda a validade e mostra a maturidade de uma democracia na qual as pessoas podem se manifestar pelo que acreditam. Além disso, o Santander, por sua vez, tinha a possibilidade plena de continuar com a exposição, se assim quisesse. Já contra a censura promovida pelo Estado não há nada a ser feito.  Existe outro ponto que diferencia a censura do boicote. Quando o estado censura, é arbitrário. Quando qualquer grupo promove um boicote, sabe que pode dar errado, não existe garantia prévia de que o boicote funcionará. Há vários exemplos do lado oposto ter se movimentado e ter sido bem-sucedido no contra-ataque”.
Veja mais aqui.

 

 Nota da Arquidiocese de Porto Alegre sobre a exposição Santander

“É urgente combater o preconceito e a discriminação em todas as suas manifestações. Nesse sentido, em nome da pluralidade e do respeito às minorias, temos assistido ataques discriminatórios à cultura judaico-cristã que contribuiu na formação cultural do ocidente. Eliminar as dificuldades jamais pode significar desrespeitar o outro e suas crenças, especialmente porque, ao se tratar do imaginário simbólico da fé, entra-se num campo delicado de significados e sentidos que a ninguém é dado o direito de desprezar. Em tempos de terrorismo e intolerância, não se constroem pontes com agressão e desrespeito pelo o que é mais íntimo e sagrado no outro: sua fé e seu corpo”.
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Professor Salah H. Khaled Júnior defende que fechamento da exposição foi criminalização

“Não vejo sequer fumaça de incitação à violência ou preconceito deliberado contra outro grupo social ou religião na mostra, muito menos de criação de uma exposição ou obra de arte especificamente com tais intenções. Fora desse limite, estamos diante de tentativas de imposição da moral de um grupo ou pessoa aos demais. Há precedentes históricos. Já queimamos bruxaslivros e histórias em quadrinhos. Talvez não tenhamos avançado tanto quanto se supunha”.
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Em nome da liberdade de opção sexual, se fere as crianças na sua genuína alma infantil, criando feridas indeléveis, de uma sociedade que caminha para a morte.

Os que se rebelam dessa falsa pedagogia, podem ser até condenados, como provavelmente, agora nessa minha posição.

Perdemos infelizmente a linha divisória, porque abolimos quem a faz: Deus.

Dostoiévski já dizia: Se Deus não existe, tudo é permitido. Somos produto de uma mentalidade que caminha em desconstrução.

Estado laico, promotor de conhecimento das diferentes religiões

 

A religião tem um peso relevante neste contexto
em que duelam a democracia e o fundamentalismo
no Brasil contemporâneo.

Todo conhecimento gera compromisso. Em virtude do conhecimento que adquiri na práxis (teoria e prática) em relação à disciplina do Ensino Religioso há mais de 10 anos, sinto dever (ético) de me manifestar sobre os modelos de ensino religioso que o nosso STF (Supremo Tribunal Federal) está decidindo: não-confessional ou confessional.

Sou professor de ensino religioso, formado no paradigma do diálogo inter-religioso.

O Ensino Religioso é parte da formação integral do ser humano e integra os saberes necessários para a compreensão do mundo e das vivências humanas. Não há como desconsiderar a influência e a importância dos saberes religiosos na concepção de ser humano, mundo e sociedade. A busca de sentido para a existência, sejamos religiosos ou não, perpassa a vida de todo ser humano.

A liberdade religiosa, materializada pelo estudo e conhecimento das diferentes matrizes religiosas, é o que preconiza a legislação vigente que, por ora, os ministros poderão alterar. O Ensino Religioso ministrado nas escolas públicas hoje não é mais catequese, não é aula de religião e muito menos lugar para rezar e orar. O Ensino Religioso é a oportunidade de conhecimento das diferentes religiões com o intuito de respeitar e reconhecer as diferentes crenças e práticas religiosas que coexistem na sociedade.

O que prevê a atual legislação brasileira sobre o ensino religioso nas escolas.

 

Em 2015 escrevi: “Nem padre, nem pastor ou líder religioso, sou professor! Como líder religioso, falaria apenas a partir de uma religião. Como professor, posso apresentar o conhecimento acumulado de várias religiões, sem comparar e desmerecer uma em detrimento de outra. É direito dos alunos o conhecimento das diferentes religiões. É seu direito também o conhecimento dos fundamentos de cada e de todas as tradições religiosas. Conhecer as manifestações do sagrado e do transcendente nas diferentes religiões ou tradições religiosas tem o propósito de aprender a respeitá-las”.

Dois professores de ensino religioso em Passo Fundo, RS, discutem, em programa do CMP Sindicato, a importância do ensino religioso nas escolas de educação básica.

A escola não discute e nem questiona fé e religião. Fé e religião são prerrogativas de ordem íntima, pessoal, individual e de livre decisão de cada um. A Escola oportuniza conhecimentos e entendimentos das diferentes práticas religiosas.

Defendo a Escola laica, mas não a Escola atéia ou uma Escola que desconsidera a riqueza e a diversidade dos conhecimentos historicamente acumulados pelas grandes tradições religiosas. Laicidade, para mim, é justamente a possibilidade de trabalhar os conhecimentos religiosos de maneira “desapegada” da fé e das religiões. Onde, justamente, podemos também estudar, observar e considerar os fundamentos dos que não tem fé (ateus e agnósticos).

Como não há neutralidade na educação, aprendi que os diferentes conhecimentos religiosos constroem bases para a vivência da espiritualidade humana, que pressupõe a ideia do CUIDADO: consigo mesmo, com os outros, com a natureza e com o transcendente.

A transmissão de valores e religiosidade da família para os filhos. Como trabalhar a inter-religiosidade no contexto escolar? Como a espiritualidade pode ser trabalhada na universidade?

O Estado do Rio Grande do Sul é um dos poucos estados brasileiros que estendeu a obrigatoriedade da oferta do ensino religioso também ao ensino médio, através de legislação própria, facultativo aos alunos participarem ou não das aulas. A partir de 2017, a Secretaria Estadual de Educação, sabiamente, retoma o Ensino Religioso na grade curricular, ofertando dois períodos no 1º ano do Ensino Médio, justamente para permitir aos alunos e professores um melhor aprofundamento e uma “amarração dos conhecimentos” já trabalhados durante os anos iniciais e finais do ensino fundamental.

Acredito, por fim, que a possibilidade de termos de volta às nossas escolas o ensino religioso confessional beneficiará, infelizmente, a onda conservadora e fundamentalista de entender o ser humano, o mundo e a sociedade que está tentando impor-se ao Brasil.

Sou pela diversidade! A diversidade das culturas, das crenças e das diferentes maneiras de viver e ser pode ter espaço nas escolas públicas de nosso país. Antes tarde que seja tarde, a sociedade precisa definir se o futuro será democrático ou fundamentalista. A religião tem um peso relevante neste contexto em que duelam democracia e fundamentalismo!

Estamos falando sobre estupro, mas vocês estão ouvindo?

 

No país são 130 estupros que acontecem por dia.
Isso significa que quatro em cada dez mulheres
que você conhece já foram estupradas.
E esses números podem ser ainda maiores, uma vez que a
maioria das mulheres que passa por essa situação horrível não faz a denúncia.

 

Num período em que as mulheres estão cada vez mais empoderadas para denunciar casos de estupro, o Brasil contabiliza cerca de 50 mil por ano, sendo que 10 mil destes são estupros coletivos, ainda é necessário encarar um sistema e uma Justiça machista que ainda acreditam que o estupro só acontece após a penetração. Vale lembrar que a nossa lei foi alterada em 2009 e que de acordo com o Código Penal Brasileiro estupro é constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso.

A Lei 12.015 de 2009 extinguiu o crime de atentado violento ao pudor e incluiu essa conduta em estupro. Sendo assim, qualquer ato com sentido sexual praticado com alguém sem seu consentimento, até mesmo um toque íntimo, é considerado estupro pela lei.

No início do mês um cidadão ejaculou no pescoço de uma mulher dentro de um coletivo urbano na cidade do Rio de Janeiro. Liberado pelo juiz que alegou que o homem não teria causado nenhum constrangimento à vítima, ele repetiu o ato no dia seguinte, com outra moça, em outro coletivo urbano. Este senhor já tinha quinze passagens pela polícia por motivos, senão iguais, semelhantes.

No país são 130 estupros que acontecem por dia. Isso significa que quatro em cada dez mulheres que você conhece já foram estupradas. E esses números podem ser ainda maiores, uma vez que a maioria das mulheres que passa por essa situação horrível não faz a denúncia. Seja por vergonha, pela falta de preparo da rede de acolhimento da mulher vítima de violência ou pelo medo dos julgamentos, a maioria não denuncia porque a sociedade impõe que a culpa foi dela que estava no lugar escuro, que andou com as pessoas erradas, que usava roupa muito curta.

Todo dia, de uma forma tão frequente, acabamos naturalizando todo tipo de barbaridade que a sociedade nos submete. E aí, você ia querer ser mulher numa sociedade como esta?

Todo mundo quer ser mulher?

 

 Sua culpa é ser mulher.

Seu fardo é ser mulher e viver numa sociedade machista que naturaliza a cultura do estupro a ponto de permitir que alguém interprete que receber uma ejaculada no pescoço, sem consentir, não causou constrangimento.

É ter que aguentar playboy na balada achando que pode enfiar a mão dentro do teu vestido, sem o teu consentimento, porque você “já estava bêbada mesmo”. É ter que aguentar cara tirando o pinto para fora da calça e esfregando em ti dentro do metrô. É ter que acelerar o passo toda vez que vê um estranho andando atrás de ti na rua e não tem mais ninguém naquele lugar.

E isso acontece pelo simples fato de que os homens acreditam que podem fazer o que bem entenderem conosco. Quando falamos de estupro temos que ter claro que não estamos falando de sexo: estamos falando de poder. Estamos falando de violência.

Quando um homem estupra uma mulher, nada mais é do que essa pessoa acreditando que os seus desejos, o que ele quer, são mais importantes do que o que a mulher quer. Ele se considera superior e por isso pode “fazer a escolha por ela”.

O que chamamos de cultura do estupro só é possível
por estarmos inseridos em um contexto com profunda desigualdade entre
os gêneros, a desumanização das mulheres e a objetificação de seus
corpos. Isso não é minha opinião, mas os fatos que a sociedade nos
confirma diariamente quando, por exemplo, dizemos que a culpa é dela
porque estava lá.

Por todas elas: contra a cultura do estupro

 

Isso é o machismo, que a gente tanto fala, posto em prática.

E a gente fala sim, faz textão, faz vídeo, denuncia, coloca o dedo na ferida do patriarcado.

Porque não são só os índices que aumentaram: o que aumentou foi a nossa coragem de falar sobre o assunto e mudar a realidade.

Não vamos mais nos calar!

Vamos falar de estupro, de aborto e de todos os assuntos que estejam ligados à vida (ou à causa da morte) de milhares de mulheres e vamos apontar sim, o dedo na cara de quem não respeita os nossos direitos individuais.

Mas e você: está pronto para nos ouvir?

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