Sobre o ódio

O importante é que se consiga combater a retórica do ódio, cuja intenção inicial é eliminar simbolicamente o inimigo. Sem esse interdito, a retórica será substituída pela prática, pela ação eliminadora dos que se interpõem aos objetivos dos que têm sede de domínio e de poder.

A quem servem as manifestações de ódio, discriminações e preconceitos? Quem lucra com a guerra cultural? Será que as pessoas imaginam estarem auxiliando nas mudanças sociais, destilando ódio, manifestações racistas e preconceitos de gênero? Atitudes deste tipo assemelham-se às águas poluídas, que transitam pelos corredores do convívio social, produzindo doenças e destruições.

Não é produzindo discursos falsos e raivosos, detratando pessoas, desrespeitando os poderes constituídos da República, que a Democracia irá avançar. Ambas, República e Democracia precisam de pessoas envolvidas com sua afirmação e legitimidade, de modo que seja possível o convívio com as diferenças entre os protagonistas no exercício dos poderes, a partir dos parâmetros da justiça, fundamentos da liberdade ética.

O direito à crítica é fundamental e deve ser garantido, tanto quanto a liberdade de pensamento. O que não se pode confundir, no exercício da liberdade de pensamento e de expressão, é o uso de recursos violentos, traduzidos em despejo de impropérios, calúnias, difamações, chegando à elaboração de planos para eliminar adversários, uma vez que não houve êxito em vencê-los.

Qual é o limite do ódio? Da intolerância? Do preconceito? Tem limite tudo isso? Ou, chegou-se a um momento, cujo desejo de poder e de domínio tangencia o perigo vulcânico, cujas lavas queimam tudo ao redor, resultando em destruições?

Que resultará do discurso de ódio, pronunciado para mobilizar as massas, conduzidas como rebanho? Um país melhor? Uma pátria livre?  Ou, escolheu-se viver, como se a esfera pública fosse um grande ringue, em que se estuda o próximo assalto para aniquilar o adversário? Embora saiba-se que até mesmo o ringue tem suas regras e o juiz ali está para evitar excessos entre os lutadores, não permitindo aniquilamento final.

O importante é que se consiga combater a retórica do ódio, cuja intenção inicial é eliminar simbolicamente o inimigo. Sem esse interdito, a retórica será substituída pela prática, pela ação eliminadora dos que se interpõem aos objetivos dos que têm sede de domínio e de poder.

Será preciso analisar os acontecimentos com a serenidade, a lucidez e a justiça necessárias, para que se possa chegar a uma equilibrada avaliação dos personagens e de seus atos, que prejudicaram a Nação. Importa tomar decisões com base nos valores democráticos, garantidos pela Constituição.


Autora: Cecilia Pires. Escreveu e publicou no site “Questões e reflexões sobre o corpo humano”: www.neipies.com/questoes-e-reflexoes-sobre-o-corpo-feminino/

Edição: A. R.

Os animais e o meio ambiente

Distinguir é preciso, viver não é preciso.

A distinção que, ultimamente, tem ocupado minha mente, se dá entre o meio ambiente e os animais. A confusão entre os dois ocorre, até mesmo, em mentes brilhantes e sensibilidades apuradas como é o caso do Papa Francisco que, na encíclica Laudato Si’, fala em crise socioambiental, dando a entender que os animais são meio ambiente e que, portanto, são parte dos recursos naturais ao nosso dispor. Mesmo que o Papa diga que devemos ser responsáveis com o meio ambiente, pois dele dependemos, mesmo assim, a falta de distinção é altamente prejudicial aos animais que merecem um tratamento diferente do que é dispensado a uma pedra, uma estalactite, uma árvore, uma floresta ou a qualquer outro recurso natural.

Um pequeno erro no início de uma construção, diziam os filósofos medievais, redunda em um desastre no final. É preciso consertar na origem, no DNA da nossa inteligência, se almejamos uma prática coerente e correspondente que faça justiça aos animais.

O meio ambiente não se move, não anda, não voa, não corre, não brinca, não sofre e não se alegra. O meio ambiente não tem expectativas, não tem desejos e não sofre frustrações. Meio ambiente é a paisagem que vemos, cheiramos, tocamos, pisamos, transformamos e modificamos pela ação do trabalho. Meio ambiente é a natureza em estado puro, sem sangue. Meio ambiente são os rios, as florestas, as montanhas, as planícies, os minerais, os vegetais. Meio ambiente é a terra e tudo que ela encerra. O meio ambiente é o mundo das coisas e das paisagens.

Os animais, por sua vez, são a terra que anda, respira, tem interesses, sente frio, calor, sofre e se alegra. Os animais não são coisas. Os animais são alguém. Alguns, até, tem nome…Os animais não são recursos naturais, são seres que interagem com a terra, o ar, com o clima, com o meio ambiente, enfim. Os animais, pelo menos os mamíferos, aves e peixes, estão mais para pessoas do que para coisas e recursos ao dispor dos humanos.

Uma pedra não tem mundo e não tem interesse de estar onde está e não deseja estar em outro lugar, tampouco. Uma árvore mistura-se e confunde-se ao lugar em que suas raízes se instalam. Não importa qual seja esse lugar. Se não tiver sorte de estar em terra boa ou em meio ambiente agradável, não faz a menor diferença. Nenhuma árvore tem frustração por não estar num lugar melhor e em condições melhores para viver. A árvore é uma extensão do meio ambiente. A árvore é meio ambiente. Nisso em nada a diminui e nós, humanos éticos, devemos fazer de tudo para cuidá-la, protegê-la e preservá-la. É bom para o ecossistema e é bom para nós.


Agora, animal não. Animal é outra coisa. Animal é pulsão. Animal é coração. Animal é cérebro. Animal é pulmão. Animal é pernas. Animal é asas para voar. Animal é intestinos. Animal é medo. Animal é prazer. Animal é dor. Animal é festa. Animal é convívio. Animal é comunicação. Animal é interação. Animal é senciência. Animal é olho. Animal é ouvido. Animal é atenção. Animal é fuga. Animal é espera. Animal é ansiedade. Animal é indivíduo.

Animal é igual a humano. O humano somos animais. Humanos e animais não humanos somos indivíduos e valemos por nós mesmos individualmente e não como membros de uma espécie. Cada indivíduo tem dignidade e valor em si. Uma pessoa humana não deve ser meio para nada…. Então, por que engaiolá-los? Por que enjaulá-los? Por que causar tanta dor e sofrimento? E por que matá-los? Por quê? Por que? Por que?

Autor: Gilmar Zampieri. Também escreveu e publicou no site “O sentido da vida”: www.neipies.com/o-sentido-da-vida/

Edição: A. R.

Quanta verdade somos capazes de suportar?

Pergunto-me se, no fim das contas, a ignorância não seria mesmo uma bênção. O conhecimento liberta, mas também dilacera. Ele não vem apenas com asas, mas com espinhos.

Acordar dói. Mas dormir pode matar.

Quantos de nós, embrulhados no conforto pegajoso da ignorância, preferimos o abraço sufocante das mentiras ao grito áspero da verdade? Até quando vamos fingir que não vemos? Que não sabemos? Que não ouvimos os gemidos do mundo despedaçando-se à nossa volta?

Há uma violência brutal na lucidez. Ela rasga véus, incinera ídolos, expõe as costuras podres da realidade. Mas será que temos estômago para digerir o que descobrimos? Ou vamos, como crianças assustadas, cobrir os olhos e gritar até que o pesadelo passe?

A verdade não pede licença. Ela invade. Escancara. Arranca máscaras. E aí, quando nos vemos nus diante do espelho, resta a pergunta mais cruel: “E agora, o que você faz com isso?”

Alguns preferem a anestesia do “não sabia”, do “não foi assim”, do “isso não é comigo”. Mas a verdade não some só porque viramos as costas. Ela fica ali, latejando, como um dente cariado que recusamos a extrair. Até que um dia, a infecção se espalha.

E você? Quantos espelhos já quebrou para não encarar seu próprio rosto? Quantas vozes abafou para não ouvir o que não queria? Quantas vezes trocou a libertação dolorosa pela prisão aconchegante da mentira?

A ignorância é uma cela com paredes macias. Você até pode bater e achar que está livre—mas ainda é um prisioneiro.

E quando a verdade finalmente vier—e ela virá—você vai engolir em seco, fingir que sempre soube, ou vai ter coragem de assumir que preferia o escuro?

Porque a verdade não machuca. O que machuca é o golpe de descobrir que você mesmo ajudou a construir as correntes que agora lhe apertam o pulso.

Então, antes de perguntar “quanta verdade somos capazes de suportar?”, responda: quanto de mentira você ainda consegue carregar sem desmoronar?

Quão frustrante e angustiante é perceber que as pessoas à nossa volta estão adormecidas e não logramos despertá-las. Algumas porque não querem. Outras porque simplesmente não podem. Estão presas a uma espécie de hibernação existencial, atravessando a vida como sonâmbulos, sem notar as engrenagens ocultas que movem o mundo.

Sentimo-nos sozinhos nessa vigília incômoda. Como canta Renato Russo em Monte Castelo: “Estou acordado e todos dormem.” Mas será que vale a pena tentar despertá-los? E se, ao invés de gratidão, recebermos ódio?

Pergunto-me se, no fim das contas, a ignorância não seria mesmo uma bênção. O conhecimento liberta, mas também dilacera. Ele não vem apenas com asas, mas com espinhos. Quantas dores evitaríamos se simplesmente fechássemos os olhos? Mas, ao mesmo tempo, qual o preço de permanecer cego?

Se a verdade tem o poder de nos libertar, a ignorância nos acorrenta. Mas eis a grande questão: quanto de verdade somos realmente capazes de suportar?

Um doente terminal tem o direito de saber que está morrendo? Ou seria mais justo poupá-lo dessa verdade cruel? A ignorância não elimina o sofrimento—apenas posterga a preocupação. A dor vem de qualquer jeito. O que muda é se estamos prontos para enfrentá-la.

Somos como crianças que se esticam no banco traseiro do carro e dormem tranquilas, confiando cegamente na destreza do pai ao volante.

Eu mesmo já fui assim. Dormia sem medo em qualquer viagem—de carro, de ônibus, de avião. Até que, certa madrugada, enquanto cruzávamos a estrada entre o Rio e Brasília, a realidade me arrancou desse sono ingênuo. Um boi surgiu no meio da pista. Meu primo, ao volante, tentou desviar, e o carro acabou avançando mata adentro, parando a poucos metros de uma enorme pedra. Por um triz, não morremos ali. Desde então, nunca mais consegui dormir em viagem. Em vez de fechar os olhos e confiar, prefiro me manter desperto, atento à paisagem e aos perigos ocultos no caminho.

Alguns, mesmo quando sacudidos pela verdade, insistem em pedir “só mais cinco minutinhos.” E assim adiam o inevitável. Quando finalmente despertam, o dia já se foi. O ano passou. A década escorreu pelos dedos. E, sem perceber, dormiram a vida inteira.

Se ninguém acordar, quem avisará os demais passageiros do perigo iminente? Quem os preparará para enfrentar os desafios que o futuro impiedosamente trará?

Se a ignorância for uma bênção, então que eu carregue o peso da maldição do conhecimento. Prefiro a dor da verdade ao conforto da ilusão. Se for atingido, quero saber exatamente o que me atingiu e o que poderia ter feito para evitar. Não quero véus, eufemismos ou falsas seguranças.

Não me esconda nada. Deixe que eu mesmo decida como lidar com a verdade, por mais amarga que seja.

Mas antes de sair por aí despertando quem dorme, lembre-se: nem todo mundo quer acordar. E alguns não apenas resistirão—mas odiarão quem os arrancou do sono.

Pergunte-se: você está pronto para lidar com a ingratidão de quem preferiria continuar sonhando?

Autor: Hermes C. Fernandes (Trecho no meu novo livro “Pegos na Mentira”, disponível na A m a z o n). Também escreveu e publicou no site “Do que você jamais deveria se arrepender”: www.neipies.com/do-que-voce-jamais-deveria-se-arrepender/

Edição: A. R.

CARTA de Frei Betto aos Bispos católicos do Brasil

Escrevo porque me inquieta o retrocesso da Igreja Católica, a perda do profetismo de nossos pastores, o esvaziamento de nossas paróquias, essa nova geração de seminaristas e padres apegada à batina, aos símbolos religiosos, às imagens sacras. Sacerdotes próximos às classes média e rica, mas distante dos excluídos e vulneráveis, apegados ao conforto e à acumulação de bens.

Eminências: O catolicismo era no Brasil a confissão religiosa majoritária na década de 1950, abraçada por 93,5% da população (IBGE). No censo de 2010, declararam-se católicos 64,6% da população. Os evangélicos, 30%. Em 2030, segundo prognósticos, os católicos serão de 35 a 40% da população e os evangélicos, de 38 a 40%. Enquanto os católicos declinam 1 ponto percentual ao ano, os evangélicos crescem na mesma proporção.

Por que o catolicismo retrocede? São várias as razões. A hierarquia católica cometeu dois pecados capitais nos últimos 60 anos: fragilizou o apoio às Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), o movimento eclesial mais expressivo da história da Igreja no Brasil e de maior capilaridade nacional.

Mas o 1° pecado foi, após o golpe militar de 1964, levar a Ação Católica à agonia e morte. Onde se encontra hoje o laicato participativo, crítico, apostolicamente ativo entre operários, universitários e intelectuais? Aliás, nossas universidades católicas evangelizam? Em muitas delas se formaram notórios políticos corruptos e legitimadores da opressão social.

De fato, o clero sempre temeu o protagonismo dos leigos. Devem ser apenas cordeiros, cuja lã serve para ser tosquiada pelos pastores, como declarou o papa Inocêncio III.  Por que, em nossas missas dominicais em paróquias de classe média, os patrões comparecem, mas seus empregados (cozinheiras, faxineiras, porteiros de prédios, etc.) vão para a Igreja evangélica?

Diz-se que a Igreja Católica fez opção pelos pobres, e os pobres, pelas Igrejas evangélicas…

Aponto algumas causas da redução de nossa grei. Uma delas, com frequência denunciada pelo Papa Francisco, é o clericalismo. Vide uma missa dominical. Tudo centrado na figura do sacerdote.

Quando muito, um leigo ou leiga lê um dos textos litúrgicos. Os fiéis ignoram uns aos outros. No “abraço da paz” saúdam os vizinhos de banco sem sequer perguntar pelos nomes deles. Na hora da homilia, por vezes suportam a pregação aborrecida de um celebrante que nunca fez curso de oratória, não tem conteúdo (não lê e teve formação medíocre em Filosofia e Teologia) e adota um discurso moralista. Procura se salvar com evocações emotivas porque não sabe como abastecer “as razões de nossa esperança”.

Sei que a maioria dos senhores jamais participou de um culto evangélico. Nosso ecumenismo não ultrapassa os limites de algumas Igrejas protestantes históricas. O que é uma lástima.

Os seminaristas não são incentivados a abraçar o diálogo interreligioso e, em geral, têm visão preconceituosa das outras confissões religiosas. O que sabem de nossas religiões indígenas? Alguma vez foram a um terreiro de candomblé ou umbanda? Ou a um centro espírita? A maioria ignora as matrizes da religiosidade brasileira.

Assista vídeo Papa Francisco: https://youtu.be/4Lz5QtvNSYk?t=84

Se os senhores bispos fossem a um culto evangélico veriam os motivos do crescimento exponencial desse segmento cristão.

Há cultos que duram duas ou três horas sem aborrecer os fiéis, ao contrário de muitas de nossas missas. Sabem por quê? Porque os fiéis têm participação ativa. Dão testemunhos de vida, vídeos atrativos são exibidos, os músicos e cantores aprimoram seus talentos, há escolas bíblicas.

Os fiéis se conhecem pelo nome, o aniversário de cada um é comemorado em comunidade, há forte corrente de entreajuda (um dentista ou médico atende irmãos e irmãs). Ali as pessoas não são anônimas; ganham autoestima. Um cuida de arrumar emprego para o outro. Há entre eles forte vínculo afetivo. E a pauta de costumes leva-os a conhecer a prosperidade, pois abandonam os vícios, e assim aumentam a poupança familiar.

Não me sinto afinado com a teologia da maioria das Igrejas evangélicas, porque enfatizam mais o Antigo que o Novo Testamento; o diabo mais que Deus; o Deus da punição mais que o Deus do amor; o pecado mais que a graça. E muitas Igrejas estão politicamente alinhadas ao conservadorismo, à naturalização da desigualdade social, à exaltação das riquezas. Incutem nos fiéis a “servidão voluntária”. Fazem uma leitura equivocada da Bíblia ao retirar o texto do contexto, como também acontece entre nós, católicos. Porém, conseguem criar forte senso de pertença e comunidade, imprimindo sentido à vida de todos.

Não escrevo aos senhores para suscitar espírito de competição entre Igrejas. Temos muito a aprender com nossos irmãos evangélicos. Escrevo porque me inquieta o retrocesso da Igreja Católica, a perda do profetismo de nossos pastores, o esvaziamento de nossas paróquias, essa nova geração de seminaristas e padres apegada à batina, aos símbolos religiosos, às imagens sacras. Sacerdotes próximos às classes média e rica, mas distante dos excluídos e vulneráveis, apegados ao conforto e à acumulação de bens.

Escrevo porque sinto que Francisco, como João Batista, é um papa que clama no deserto…

Será que dentro da Igreja Católica ainda há salvação para o Evangelho de Jesus?

Deus nos encoraje e ilumine!

Autor: Frei Betto escritor, autor de “Jesus Rebelde” (Vozes), entre outros livros. Livraria virtual: freibetto.org Assine e receba todos os artigos do autor: mhgpal@gmail.com

Edição: A. R.

Cuidemo-nos! Adoecer também é um aprendizado!

Uma mancha em minha pele poderia ser indício de uma doença grave! Desde Platão, passando pelo cristianismo, as palavras são dotadas de grande poder. Cuidemo-nos! Adoecer também é um aprendizado!

Especificamente, algumas palavras, a exemplo da referida para qualificar uma hipótese de doença grave, que poderia destruir meu corpo, são carregadas de poder emocional e material. Em linguagem da ciência quântica, do século XXI, com a qual eu compactuo e reproduzo, as palavras têm energia. Eu Acredito!

Mesmo orientado a rejeitar e negar algumas palavras, me senti obrigado a procurar o Sistema Único de Saúde (SUS) para fazer um diagnóstico. Fui no Cais da Petrópolis e, após transcorridos seis meses, fui chamado no Cais da Vila Luiza (Passo Fundo- RS).

Vale registrar que na minha condição de professor da rede pública do estado, além do SUS, pago um plano de saúde (IPE), denominado de regime próprio, no qual está incluído atendimento de profissionais e instituições vinculadas com saúde/doença, mas que apresenta restrições de profissionais para o atendimento e realização de diagnósticos, no caso de doenças de pele (dermatologistas).

Com a lentidão, mais de doze meses esperando pelo diagnóstico do SUS e a pressão causada pela hipótese de gravidade da possível doença, concordei em pagar consulta particular.

A primeira consulta resultou no encaminhamento para nova consulta. O pagamento da nova consulta, resultou no encaminhamento para uma consulta, com um cirurgião. Marquei e paguei uma nova consulta que indicou encaminhamento para um exame cirúrgico, que apresentou, após repetição de exames, a hipótese com laudo positivo.

Com a hipótese laudada, fui “embretado” a aceitar uma nova cirurgia, altamente agressiva, para averiguar se a doença, além da pele, não estava alastrada em outros órgãos do meu “templo sagrado” (alguém está interessado em saber quanto eu paguei pela cirurgia?). Pois então…

Me senti sem opção, paguei, mesmo sendo um negacionista (em muitos aspectos da existência).

Admito, por exemplo, que sou um negacionista da epistemologia “cartesiana dualista materialista reducionista”, mas não tive convicção para negar a importância de um novo exame cirúrgico, que agrediu profundamente minha pele e sistema nervoso do meu braço, incluindo a extração das minhas glândulas linfáticas sentinelas, antecedidas pela introdução de fármacos radiológicos (por óbvio agressivos) de alto valor financeiro, situadas entre meu braço e minha caixa toráxica.

Por fim, cabe informar que a cirurgia, antecedida por uma anestesia geral, foi agressiva, maior do que estava registrada na minha imaginação, pois eliminou uma grande área da pele, com uma profundidade que atingiu terminações nervosas periféricas, bem como a destruição de glândulas sentinelas, localizadas entre o braço e a caixa toráxica.

Os exames realizados a partir da segunda intervenção cirúrgica, para a extração de glândula sentinela, comprovaram que a “hipótese da doença” roubou uma parte preciosa do meu “templo sagrado”, mas comprovou, também, que a referida não foi além da pele!

Cuidemo-nos! Adoecer também é um aprendizado!

Autor: Israel Kujawa. Também escreveu e publicou no site outras 40 reflexões, dentre as quais destacamos a primeira: “Cuidados com as relações e o comportamento humano”: www.neipies.com/cuidados-com-as-relacoes-e-comportamento-humano-israel-kujawa/

Edição: A. R.

Temos certeza de que aceitamos imigrantes tanto quanto nativos?

O ódio gratuito, planejado e produzido sobre pessoas que não se aceita, sempre esteve à disposição: de famílias a governos. Mas agora ficou pior, pois descobriram que o ódio, como produto, vende muito.  As grandes mídias descobriram que ódio vende!

Um dia, todos fomos imigrantes. Nós ou nossos pais, avós ou bisavós. Caminhamos por uma Terra que não é nossa. Ser imigrante, pode significar arrastar-se para fora de um país, aos pedaços, para se remontar em outro.

As linhas invisíveis que contornam os continentes, países ou mesmo cidades, em mapas que tanto orgulham as populações, já foram traços insignificantes para reinos e impérios.

O mundo está cheio de construções e colunas esplêndidas, em ruínas, mas que um dia foram a casa de Reis e Imperadores arrogantes; os que pensavam que o seu poder seria eterno. Nem Salomão aguentou muito tempo. A Rainha do Sul, a que Jesus se referiu¹ e que se cogita, teve um affair com o Rei, também desapareceu e dela quase ninguém se lembra.

Quando os governantes de plantão não leem a história por completo, ou nela não se fiam, estão condenados a repetir a sua pior parte. Seria interessante levar o Sr. Trump e sua corte até Roma.  De preferência ao Fórum Romano e suas ruínas, para que tivessem uma visão do que acontece quando reis pensaram ser deuses. Os restos das construções, que um dia foram magníficas, estão ali, à disposição da poeira e de suas mentes obscuras.  Poderão admirar o poder esfarelado quando só se pensa em seus intramuros.

Deveriam aprender com Nero, que saiu corrido do Império, perseguido e indo ao encontro de seu suicídio, porque o povo começou a detestá-lo.

Roma caiu por diversos motivos, mas um dos menos estudados foi a sua incapacidade de fazer alianças. O seu orgulho e a sua pretensa imortalidade, não impediram que os bárbaros ingressassem em suas legiões e a devorassem por dentro. Os inimigos das nações não vivem fora de seus muros. E imigrantes e escravos, novamente, serviram de sustentação aos delírios dos seus Imperadores.

Seria mais inteligente fazer um acordo com Átila, o huno, do que ter de enfrentá-lo e suportar a invasão da Itália, pois ali foram empurrados os mesmos bárbaros, por uma liderança incontestável e que desafiou todos os poderes na época. E o Império veio abaixo!

Acordos com pretensos invasores, alianças com reinos revoltosos, o fim da espúria escravidão, e tudo poderia prolongar a sua vida e manter Roma intocada por mais mil anos.

Mas no que seus Césares optaram?  A sua escolha foi pelo enfrentamento, a animosidade e o degredo a quem se opusesse. O poder traz consigo o hálito da eternidade.

Quando Tito e seu Pai, Vespasiano, em 71 DC, desfilaram em Roma com a mobília do Templo Judaico e o seu Candelabro, não imaginavam que logo à sua frente, o mesmo Império renegaria seus deuses inventados, como Jupiter, para se curvar diante de uma ‘seita’ inspirada em um tal Jesus² e que fora iniciada por pescadores iletrados, justamente na Jerusalém saqueada. Quem passar por Roma poderá ver o Arco do Triunfo, que ainda permanece de pé.  Mas o resto desabou.

Aliás, em Jerusalém, encontrava-se a maior tolerância de imigrantes que se tem notícia.  Temos uma ideia no livro de Atos,³ capítulo dois.

“E como os ouvimos falar em nossa própria língua materna, partos, medos e elamitas e os naturais da Mesopotâmia, Judéia, Capadócia, Ponto e Ásia; da Frígia e da Panfília, do Egito e das regiões da Líbia, nas imediações de Cirene, e romanos que aqui residem, tanto judeus como prosélitos, cretenses e arábios… Como os ouvimos falar?”

Não nos parece que o mundo inteiro estava ali representado?  Pois é, todos os países debaixo do céu…

Será que esta página do Evangelho foi rasgada pelos que odeiam imigrantes?

Paulo, agora convertido, foi pregar em Atenas (4).  Encontrou um altar que falava de um deus desconhecido, como que idolatrado por atenienses e estoicos. Ninguém o impediu; entrou e saiu.

Maria, levou a sua família que se iniciava para o Egito (5) e nada consta que foram detidos em sua passagem.

Faltou os povos do Egito Antigo gritarem: 

_Viva Maria imigrante!

Bem, nem a isso esta cristandade obsoleta de hoje respeitaria.

Será que não retornamos aos tempos de um deus desconhecido?

Os Impérios nunca cresceriam sem mão de obra barata, escrava ou servil de que dispunham. E contra estas mesmas gentes, sem demora, os poderosos locais sempre se levantaram diante de cada nova crise. A história tem memória.

Qual bíblia que os novos senhores do mundo estão lendo? Será mais uma inventada?  Ou leem somente passagens do seu agrado!  Mas afinal, não são todos cristãos estes donos dos novos tempos, mesmo que de mentirinha?

Não temos notícia de tanta rejeição a imigrantes quanto nesses três meses passados.  Em um piscar de olhos todos transformaram-se em criminosos?  Até dezembro, lá fora, limpavam latrinas e cortavam grama.  Na virada do ano foram cuspidos.

Ninguém resiste a fé humana e Roma sucumbiu ao seu tempo. Assim como haverá tempo para mais ruínas daqui em diante. As cusparadas que Jesus levou, ajudou a torná-lo maior: no mais completo, mais humano e no mais divino de todos os homens, em todos as épocas.  Ele aceitava Judeus e gentios, migrantes e nativos, confirmando mais tarde o que Paulo falou que “Deus não faz acepção de pessoas” (6). Pois de cobradores de impostos a prostitutas, Jesus aceitava a todos, moradores ou forasteiros, antecipando o próprio discurso de Paulo.

Os totalitarismos, geralmente fundamentados em certezas mofadas, quando não querem perder seus adeptos, criam um inimigo comum a ser derrotado.  Hitler reuniu quase um país inteiro, construindo a narrativa de ódio aos judeus. Recentemente, a ditadura Argentina elegeu as Malvinas como sendo a bandeira nacional a ser hasteada. Em ambos os casos, a morte certa; mesmo que aquela, em muitos milhões de mortos a mais que esta. Pelos nossos dias, a ciência e as vacinas tornaram-se os novos inimigos a serem vencidos. Muitos morrerão pela sua causa.

O ódio gratuito, planejado e produzido sobre pessoas que não se aceita, sempre esteve à disposição: de famílias a governos. Mas agora ficou pior, pois descobriram que o ódio, como produto, vende muito.  As grandes mídias descobriram que ódio vende!

Pensem! E muitos ‘iluminados’, precisando que parcelas da população permaneçam obtusas, elegeram o branco como a cor preferida, a imigração e a pobreza forasteira como contaminantes a serem expulsos.

É ódio de causa e efeito.

Mas o povo que consentir na mentira, terá de viver sob suas teias. A mentira precisa de reposições continuadas e diárias para se manter viva. É necessário mentir e mentir mil vezes, para quem sabe, tornar-se verdade. Segundo Goebbels, Ministro da Propaganda Nazista, ela se torna.

A simples verdade subsiste por si mesma, contudo.

Os imigrantes que vimos descer de aviões, recentemente, acorrentados, bem que nos lembram os antigos escravos de Roma. Chegando como restos de uma guerra romana, depois de haver lutado contra a Gália ou a Trácia, agora retornam rendidos e humilhados pelo capricho de um Imperador.

Na Alemanha, primeiro se atacou um inimigo imaginário, somente depois, muito depois, quando os amigos é que desapareciam a população pulou da cama. E, então, milhares emigraram. Os exemplos são quase infinitos.

Por quais razões se odeia tanto a imigração?

Fôssemos nós os imigrantes desse avião, que correntes gostaríamos de usar?

REFERÊNCIAS:

  1. Fala-se que era a Rainha de Sabá. Mateus 12:42
  2. Na versão de 1969, Almeida, revisada e corrigida, “um tal Jesus”. Atos 25:19
  3. Atos 2:9,10 e 11
  4. Atos 17:23
  5. Mateus 2:14
  6. Romanos 2:11
  7. Nota do autor: fundamentamos a nossa reflexão no Novo Testamento, tentando traduzir a tolerância por ele anunciada; onde cabem todas as raças, de patrícios a gentios. Os líderes e mandatários do mundo real, precisam provar, em ações, os reflexos de sua fé.  Ninguém é obrigado a acreditar na Bíblia.  Mas quem a levanta em suas mãos terá de sustentá-la. Caso contrário, teremos de chamá-los de difamadores das Escrituras e oportunistas da fé alheia.

Autor: Nelceu A. Zanatta. Também escreveu e publicou no site “Seremos todos imigrantes em Marte”?: www.neipies.com/seremos-todos-imigrantes-em-marte/

Edição: A. R.

Trabalho, consumismo e novos pobres

O modelo em curso, que poderia ser chamado de neoliberalismo, e que tem no deus mercado sua melhor expressão, é uma máquina que produz concentração de renda nas mãos de poucos, aumenta cada vez mais a pobreza de muitos e destrói a casa comum que é nosso planeta Terra.

Trabalho, consumismo e pobreza são conceitos que se cruzam e que, de certa forma, expressão das profundas contradições de uma sociedade marcada pela injustiça, pelas desigualdades e pelo descaso da vida humana. O trabalho é um conceito que acompanha a história humana, mas que na modernidade adquire centralidade nos estudos das diversas ciências sociais, econômicas, jurídicas e na própria filosofia.

O consumismo tornou-se o carro chefe da dinâmica social, econômica e cultural da sociedade contemporânea. Tudo gira em torno do consumismo: as pessoas trabalham para alimentar os desejos de consumo; as instituições educativas formatam seus alunos para ingressarem no mercado e fortalecer o consumismo, a dinâmica das cidades e dos governos encontram no consumismo o salvo conduto para estabelecer políticas, prioridades e centralidade no investimento dos recursos públicos; as famílias tem no consumismo sua atenção primordial que determina seu status social, suas prioridades e sua maior atenção; as crises climáticas e a devastação ambiental tem no consumismo sua principal causa da destruição dos biomas, dos recursos não renováveis e a ameaça da insustentabilidade do planeta.

A pobreza, por sua vez, é a marca mais perversa de uma sociedade injusta que venera o deus dinheiro e sacrifica as vidas humanas no altar do mercado. A marca da desigualdade expressada nos diversos níveis e modalidades de pobreza escancara o cinismo e a ausência de humanização de uma sociedade que culpa as vítimas por opções de modelos econômicos que ao invés de produzir civilidade produz a barbárie.

Em seu livro Trabajo, consumismo y nuevos pobres, Bauman (2000) faz uma instigante análise desse processo. Em seu primeiro capítulo investiga o surgimento e a assimilação da “ética do trabalho”. Para Bauman (2000, p.37-42) a ética do trabalho pode ser caracterizada por duas premissas explícitas e duas pressuposições tácitas.

A primeira premissa explícita diz que se você quer conseguir o necessário para viver e ser feliz, então deve fazer algo que os demais consideram valioso e digno de ser pago, pois se te dou algo, recebo algo em troca.

A segunda premissa diz que é ruim contentar-se com o que se tem, pois é moralmente danoso conformar-se com o que já se conseguiu; é ruim deixar de esforçar-se depois de ter alcançado uma suposta satisfação; não é adequado descansar, a não ser para recuperar as forças para seguir trabalhando, pois trabalhar é um valor em si mesmo e uma atividade nobre e hierarquizadora; trabalhar é bom; deixar de fazê-lo é ruim.

A primeira pressuposição tácita, que de uma certa maneira sustenta as premissas acima expostas, é de que a maioria das pessoas tem uma capacidade de trabalho que pode vender e pode ganhar sua vida oferecendo tal capacidade para ser recompensada em forma de salário. O trabalho é o estado normal dos seres humanos; anormal é não trabalhar. Isso significa que a maioria das pessoas, ao trabalharem, está cumprindo suas obrigações, e seria “injusto” deixar de fazer aquilo que se deveria fazer. A segunda pressuposição é de que só o trabalho, cujo valor é reconhecido pelos demais pelo fato de ser remunerado, tem um valor moral consagrado pela “ética do trabalho”.

A ética do trabalho continua Bauman (2000, p.18), serviu para difundir o hábito de tornar as pessoas produtivas, pois possibilita combater, destruir e erradicar os obstáculos que impedem o novo e esplêndido mundo que se pretendia construir na modernidade. “O trabalho dignifica o homem”, dizia uma encíclica papal; “o trabalho forja o caráter e produz a riqueza”, corroborava o senso comum.

Essa foi a crônica oficial que foi instaurada para construir a sociedade do progresso, da produtividade, do bom rendimento. Mas para isso era necessário disciplinar as pessoas, treiná-las e convencê-las de que a obediência era necessária para construir esse modelo societário. Era necessário instaurar uma instrução mecânica que pudesse habituar os trabalhadores a “obedecer sem pensar”, ou seja, seriam “pequenas engrenagens sem alma integradas a um mecanismo mais complexo”. Sendo assim, diz Bauman (2000, p.20-21), “a imposição da ética do trabalho implicava a renuncia à liberdade”, pois significava impor o controle e a subordinação ante uma vida que para os trabalhadores não era “nem nobre”, “nem ajustada a seus próprios princípios morais”.

A ética do trabalho representava a grande luta para vencer as correntes do obscurantismo, da ignorância, do velho sistema e as forças da natureza. A natureza devia ser conquistada e obrigada a servir os seres humanos; o trabalho seria o grande responsável por esse êxito e os inventores os protagonistas desse novo mundo. Por isso que todas as forças de resistência à “ética do trabalho” deveriam ser combatidas e silenciadas em prol do progresso e construção de um mundo produtivo e disciplinado. A ética do trabalho era ao mesmo tempo “uma visão construtiva” e “a fórmula para obter um trabalhador eficiente”.

Por isso era necessário realizar uma cruzada, uma guerra contra os “tradicionalismos” e todas as inclinações para o ócio ou a satisfação primária das necessidades. “Na guerra contra o ‘tradicionalismo’ dos pobres anteriores à época industrial”, diz Bauman (2000, p.26), “os inimigos declarados da ética do trabalho eram, ostensivamente, a modéstia das necessidades desses homens e a mediocridade de seus desejos”.

Na implantação e fixação da “ética do trabalho”, não é de estranhar que os mendigos, os indigentes, os deficientes, os incapazes e mesmos os velhos e enfermos são considerados os indesejados. Essa ideia de eliminar os desocupados é facilmente identificada, por exemplo, na obra La Idea de la pobreza, de Gertrude Himmelfarb (1988, p.193), quando diz: “Os mendigos, como os ratos, podiam efetivamente ser eliminados com esse método; ao menos podiam apartá-los de sua vista. Só fazia falta decidir-se a trata-los como ratos, partindo do suposto de que os pobres desleixados estão aqui só como uma moléstia que tem de ser limpada até por-lhe fim”. Por isso era necessário limitar a assistência, combater o ócio, tornar cada vez mais “desgraçada” a vida dos desocupados, para convencer os trabalhadores das fábricas que “a miséria fabril pareceria, em comparação [com a situação de vida dos miseráveis], um golpe de sorte ou uma benção” (BAUMAN, 2000, p.28).

Por isso era necessário criar estratégias que viessem diminuir a assistência, ou até proibi-la, para que não houvesse opção de escolha. “Para promover a ética do trabalho”, diz Bauman (2000, p.31), “se recitaram inúmeros sermões desde os púlpitos das igrejas, se escreveram dezenas de relatos moralizantes e se multiplicaram as escolas dominicais, destinadas a encher as mentes jovens com regras e valores adequados”. Não dar opção era a estratégia fundamental para que os “obreiros” se submetessem a ética do trabalho.

Buscar um emprego, submeter-se as suas regras, formar uma imagem idealizada de si mesmo, superar as imperfeições, achar um remédio para curar as enfermidades eram atividades que poderiam ser sintetizadas na ação de trabalhar. “Dar-lhes trabalho a todos, converter a todos em trabalhadores assalariados, era a fórmula para resolver os problemas que a sociedade pudera ter sofrido como consequência de sua imperfeição e imaturidade” (BAUMAN, 2000, p.33). Tanto o capitalismo quanto o comunismo colocaram no mundo do trabalho o preceito para o progresso da sociedade. O trabalho tornou-se, ao mesmo tempo, em ambas os “modelos societários”, o eixo da vida individual e a ordem social, assim como a garantia de sobrevivência para a sociedade em seu conjunto.

O trabalho e, principalmente, o tipo de trabalho, caracterizava o tipo de indivíduo: além de assegurar o sustento, o tipo de trabalho realizado definia o lugar que cada indivíduo ocupava na colocação social e avaliação individual.

A identidade de cada um se forjava a partir do tipo de trabalho que se exercia, a empresa que trabalhava ou o cargo que ocupava. Era o trabalho que definia os pares, a quem se poderia comparar e, principalmente, o tipo de vida que podia aspirar.

“A careira laboral”, diz Bauman (2000, p.34), “marcava o itinerário da vida e, retrospectivamente, oferecia o testemunho mais importante do êxito ou do fracasso de uma pessoa”. A carreira significava, paradoxalmente, a principal fonte de “confiança ou insegurança”, de “satisfação pessoal ou de autoreprovacão”, de “orgulho ou de vergonha”. “Em síntese”, diz Bauman (2000, p.35), “o trabalho era o principal ponto de referência, ao redor do qual se planejavam e ordenavam todas as outras atividades da vida”.

No âmbito da ordem social, o trabalho era o lugar mais importante para a integração social. Era no trabalho que se forjava o “caráter social” necessário para perpetuar “uma sociedade ordenada”. O “trabalho na fábrica” e o “serviço militar obrigatório” eram, para usar um conceito foucaltiano, a principal “instituição panóptica” da sociedade moderna. Os que não podiam trabalhar ou os que não possuíam emprego significavam uma ameaça, pois estariam fora do controle da ordem social.  “A gente sem emprego era gente sem patrão, gente fora de controle: nada os vigiava, supervisava nem submetia a uma rotina regular, reforçada por oportunas sanções” (BAUMAN, 2000, p.35).

Até mesmo o modelo de saúde do século XIX estava regrado pela capacidade do homem realizar o esforço físico requerido tanto para a fábrica como para o exército. A ordem social iniciada na ditadura mecânica da fábrica se prolongava na “família patriarcal forte e estável do homem empregado”. “Dentro da família”, diz Bauman (2000, p.36), “se esperava que os maridos/pais, cumprissem, entre suas mulheres e filhos, o mesmo papel de vigilância e disciplina que os capatazes de fábrica e os sargentos do exército exerciam sobre eles nas oficinas e quartéis”.

Por último, o trabalho foi apresentado como questão de sobrevivência e prosperidade da sociedade: o trabalho seria o grande responsável para a produção da riqueza, para o processo de transformação dos recursos naturais em bens e serviços para a população. “Em resumo”, corrobora Bauman (2000, p.37), “o trabalho ocupava uma posição central nos três níveis da sociedade moderna: o individual, o social e o referido ao sistema de produção de bens. Além disso, o trabalho atuava como eixo para unir esses três níveis e era fator principal para negociar, alcançar e preservar a comunicação entre eles”. 

A ética do trabalho colocava todos a abraçarem “voluntariamente”, com alegria e entusiasmo, o que surgia como necessidade inevitável.

No entanto, a ética do trabalho não teve seu pleno êxito, pois não foi inteiramente aceita, principalmente por parte dos novos trabalhadores que viam em sua condição a perda da liberdade. Por isso, na leitura de Bauman (2000, p.40) era necessário programar uma nova estratégia. Progressivamente houve um deslocamento da ética do trabalho para “os incentivos materiais do trabalho”, ou seja, “ganhar mais dinheiro”. A ética do trabalho foi sutilmente sendo substituída pela ideia de que ganhar mais seria uma forma de restaurar a dignidade humana perdida no desgaste da mão de obra industrial. Esse processo foi decisivo para desenvolver a moderna sociedade industrial. O ganhar mais poderia significar uma motivação autêntica para a liberdade.

Na visão de Bauman (2000, p.41) esse processo foi decisivo para a passagem posterior da “sociedade de produtores” para a “sociedade de consumidores”. Essa última transformação não foi unívoca e também não teve as mesmas consequências. Poderíamos, por exemplo, destacar a diferença entre o mundo capitalista e o mundo comunista: neste último, a apelação ao consumidor que se ocultava no produtor foi pouco sistemática, pouco convincente e carente de energia. “Por esta e outras razões”, diz Bauman (2000, p.41), “se aprofundou a diferença entre as versões da modernidade, e o crescimento do consumismo que transformou de forma decisiva a vida do ocidente atemorizou o regime comunista que, tomado por surpresa, incapaz de atualizar-se e mais disposto que nunca a reduzir suas perdas, teve que admitir sua inferioridade e declinou”.

A modernidade sólida, contudo, começa a sofrer mudanças a partir dos anos 1960 e 1970, quando começam a se enfraquecer as instituições, costumes e certos dogmas que forneciam as diretrizes para o indivíduo construir sua identidade, como as crenças religiosas, a família e a escola. Sobretudo após a queda do Muro de Berlim, em 1989, essa modernidade “sólida” estaria em desintegração e seria gradualmente substituída por uma modernidade “líquida”.

De acordo com Dalcin e Silva (2016), na modernidade dita líquida, os sólidos são derretidos, mas não emerge nada mais sólido em seu lugar. Esta mudança social e histórica assume assim uma condição de constante mudança, não tendo, portanto, previsão de término. Isso significa que nossas instituições, referências, estilos de vida e até mesmo crenças e convicções mudam antes de terem tempo de se solidificar em costumes e hábitos.

No entanto, Dalcin e Silva (2016) destacam que com as reformulações políticas e econômicas que surgiram com a globalização, também houve grandes transformações sociais. Os autores consideram que para Bauman (2000), as estruturas ou instituições vinculadas com o trabalho, à cultura e à educação, entre outras, que eram responsáveis pela produção da normatividade social se transformam em líquidas, e assim ficam a mercê tanto da responsabilidade, quanto da ação individual. Nesse sentido, é possível constatar que, de acordo com Bauman (2000), há neste período o deslocamento dos papéis sociais que antes eram da “ética do trabalho”, para a “estética do consumo”.  

Ou seja, a antiga confiança “sólida” num futuro perfeitamente arquitetado pela razão foi substituída pela incerteza. O futuro tornou-se nebuloso e indefinido. O sucesso, que antes era pautado por uma vida regrada e planejada aos costumes e normas sociais, agora pauta-se principalmente pela necessidade de reconhecimento social, guiado entre outras normas, pelo poder de consumo.

Nesse sentido, considerando os princípios da vida liquido moderna destacada por Bauman (2008), o consumo excessivo é sinal de sucesso, uma autoestrada que conduz ao aplauso público e à fama. “Possuir e consumir certos objetos e praticar determinados estilos de vida são a condição necessária para a felicidade” (2008, p.165). “Essa sociedade promete uma felicidade fácil que pode ser obtida por meios inteiramente não-heróicos e que portanto devem estar, tentadora e satisfatoriamente, ao alcance de todos” (2007, p.65). A sociedade líquido-moderna desaprova os ideais do longo prazo e da totalidade. O que está em jogo é a busca imediata pela satisfação individual, pelo glamour das conquistas pessoais, pela satisfação proporcionada pelo consumo.

Na modernidade sólida, as instituições eram firmes, existia a segurança no trabalho e um salário que permitia ao indivíduo viver com dignidade e planejar sua vida a partir de uma projeção longitudinal. Para Fávero e Consaltér (2019), esse modelo de homem e sociedade, tanto característico da modernidade sólida como da modernidade líquida, podem ser compreendidos e exemplificados através do que Sennet (2009), em sua obra A corrosão do caráter, utiliza nas figuras de Rico e Enrico, filho e pai, respectivamente, para dissertar acerca de dois distintos modelos de trabalhadores. O trabalhador fordista, burocratizado e rotinizado, representado por Enrico, planejava sua vida e suas metas tendo por referência um tempo linear, cumulativo e disciplinado. Suas expectativas profissionais e realização pessoal estão baseadas em metas a longo prazo. Por outro lado, Rico (seu filho), representa o típico trabalhador da era do capitalismo flexível: muda de endereço e de emprego frequentemente, não planeja suas metas a partir de expectativas de longo prazo e vive uma vida de incertezas na eloquente busca por uma rápida ascensão profissional e financeira. 

Rico representa um novo modelo de trabalhador o qual Dardot e Laval (2016) chamam de “sujeito empresarial”, “sujeito neoliberal” ou, simplesmente, “neossujeito”. Essa nova figura do sujeito opera uma unificação sem precedentes das formas plurais da subjetividade que a democracia liberal permitiu que se conservassem e das quais sabia aproveitar-se para perpetuar sua existência. Esse neossujeito tem total envolvimento com si mesmo. Dardot e Laval (2016, p.327) apontam que “a vontade de realização pessoal, o projeto que se quer levar a cabo, a motivação que anima o ‘colaborador’ da empresa, enfim, o desejocom todos os nomes que se queira dar a ele é o alvo do novo poder”.

O latente desejo de realização pessoal a qualquer custo motiva sua existência, suas ações e suas buscas. A pressa move esse desejo. Não há tempo a perder.

Para Sennett (2009), a própria estabilidade em um mesmo emprego abre espaço para múltiplas possibilidades ao longo da vida profissional. Nessa nova estrutura do mercado de trabalho, “um jovem americano com pelo menos dois anos de faculdade pode esperar mudar de emprego pelo menos onze vezes no curso do trabalho, e trocar sua aptidão básica pelo menos outras três durante os quarenta anos de trabalho” (Sennett, 2009, p.22).

Para explicar essas mudanças rápidas e significativas na vida das pessoas, típicas do que Bauman (2007) chama de “vida líquida”, Sennett (2009) reporta-se ao economista Bennett Harrison, o qual acredita que a origem dessa fome de mudança é o “capital impaciente”, ou seja, o desejo de retorno rápido. A ideia de sofrimento e resistência, representada na obra de Sennett (2009) pela figura de Enrico, que, pacientemente, economizou durante quinze anos para poder comprar sua casa própria, tornou-se, nas palavras de Bauman (2007, p.65), “ultrajante e repulsivo”.

Todas estas reflexões trazidas dos grandes pensadores contemporâneos como Sennett e Bauman, nos ajudam a perceber que se existe uma suposta crise no mundo do trabalho, que convive ao lado da opulência do consumismo e a pobreza não para de crescer no mundo, é porque continuamos a reproduzir um modelo de estrutura econômica e social, alimentada pelos processos educativos e pelo aparato ideológico das mídias, que não está preocupado com a vida humana e com a sustentabilidade do planeta. O modelo em curso, que poderia ser chamado de neoliberalismo, e que tem no deus mercado sua melhor expressão, é uma máquina que produz concentração de renda nas mãos de poucos, aumenta cada vez mais a pobreza de muitos e destrói a casa comum que é nosso planeta terra.

PS.: parte deste texto está no verbete “Modernidade Sólida” que escrevi com meu grande amigo Evandro Consaltér, e está publicado no Dicionário Crítico-Hermenêutico Zygmunt Bauman (Cassol; Manfio; Silva, 2021). Para os que tiverem interesse em acessar o qualificado dicionário, segue o link:

https://www.researchgate.net/publication/356290134_Dicionario_Critico-Hermeneutico_Zygmunt_Bauman

REFERÊNCIAS:

BAUMAN, Zygmunt. Modernidade e Ambivalência. Rio de Janeiro: Zahar, 1999.

BAUMAN, Zygmunt. Trabajo, consumismo e nuevos pobres. Trad. Victoria Boschiroli. Barcelona: Gedisa, 2000.

BAUMAN, Zygmunt. Modernidade Líquida.  Trad. Plínio Dentzien. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2001;

BAUMAN, Zygmunt. Vida Líquida. Trad. Carlos Alberto Medeiros. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2007;

BAUMAN, Zygmunt. Vida para o consumo. Trad. Carlos Alberto Medeiros. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2008;

CASSOL, Claudinei Vicente; MANFIO, João Nocodemos Matins; SILVA, Sidinei Pithan da (orgs.). Dicionário Crítico-Hermenêutico Zygmunt Bauman. Ijuí: editora Unijuí, 2021.

DALCIN, Larissa; SILVA, Sidinei Pithan Da. Bauman de uma sociedade sólido-moderna para uma sociedade líquido-moderna. Anais do Salão do Conhecimento: ciência alimentando o Brasil. Ijuí, 2016.

DARDOT, Pierre; LAVAL, Christian. A Nova Razão do Mundo: ensaio sobre a sociedade neoliberal. Trad. Mariana Echalar. São Paulo: Boitempo, 2016;

FÁVERO, Altair Alberto; CONSALTÉR, Evandro. Peregrino ou turista: análise de dois modelos de formação docente a partir da metáfora de Bauman. In: FÁVERO, A. A.; TONIETO, C.; CONSALTÉR, E. (orgs.). Leituras sobre Zygmunt Bauman e a educação. Curitiba: CRV, 2019, p.55-67.

SENNETT, Richard. A corrosão do caráter: as consequências pessoaisdo trabalho no novo capitalismo. Tradução Marcos Santarrita. – 14ª ed. – Rio de Janeiro: Record, 2009.

Autor: Altair Alberto Fávero

Edição: A. R.

Cultura

Chama-se cultura tudo o que é feito pelos homens, ou resulta do trabalho deles e de seus pensamentos.

Além dos seres vivos e da matéria cósmica, existem também coisas culturais, muitíssimo mais complicadas. Chama-se cultura tudo o que é feito pelos homens, ou resulta do trabalho deles e de seus pensamentos. Por exemplo, uma cadeira está na cara que é cultural porque foi feita por alguém. Mesmo o banquinho mais vagabundo, que mal se põe em pé, é uma coisa cultural. É cultura, também, porque feita pelos homens, uma galinha.

Sem a intervenção humana, que criou os bichos domésticos, as galinhas, as vacas, os porcos, os cabritos, as cabras não existiriam. Só haveria animais selvagens. A minhoca criada para produzir humo é cultural, eu compreendo. Mas a lombriga que você tem na barriga é apenas um ser biológico. Ou será ela também um ser cultural? Cultural não é, porque ninguém cria lombrigas. Elas é que se criam e se reproduzem nas suas tripas.

Uma casa qualquer, ainda que material, é claramente um produto cultural, porque é feita pelos homens. A mesma coisa pode-se dizer de um prato de sopa, de um picolé ou de um diário. Mas estas são coisas de cultura material, que se pode ver, medir, pesar.

Há, também, para complicar, as coisas da cultura imaterial, impropriamente chamadas de espiritual – muitíssimo mais complicadas. A fala, por exemplo, que se revela quando a gente conversa, e que existe independentemente de qualquer boca falante, é criação cultural. Aliás, a mais importante. Sem a fala, os homens seriam uns macacos, porque não poderiam se entender uns com os outros, para acumular conhecimentos e mudar o mundo como temos mudado.

A fala está aí, onde existe gente, para qualquer um aprender. Aprende-se, geralmente, a da mãe. Se ela é uma índia, aprende-se a falar a fala dos índios, dos xavantes, por exemplo. Se ela é uma carioca, professora, moradora da Tijuca, a gente aprende aquele português lá dos tijucanos. Mas se você trocar a filhinha da índia pela filha da professora, e criar, bem ali na praça Saens Peña, ela vai crescer como uma menina qualquer, tijucana, dali mesmo. E vice-versa, o mesmo ocorre se a filha da professora for levada para a tribo xavante: ela vai crescer lá, como uma xavantinha perfeita – falando a língua dos xavantes e xavanteando muito bem, sem nem saber que há tijucanos.

Além da fala, temos as crenças, as artes, que são criações culturais, porque inventadas pelos homens e transmitidas uns aos outros através de gerações. Elas se tornam visíveis, se manifestam, através de criações artísticas, ou de ritos e práticas – o batizado, o casamento, a missa –, em que a gente vê os conceitos e as ideias religiosas ou artísticas se realizarem.

Essa separação de coisas cósmicas, coisas vivas, coisas culturais, ajuda a gente de alguma forma? Sei não. Se não ajuda, diverte. É melhor que decorar um dicionário, ou aprender datas. Você não acha?

__________ RIBEIRO, Darcy. Noções de coisas. São Paulo: FTD, 1999, p. 34. Disponível em: http://www.projovemurbano.gov.br/userfiles/file/materialdidatico/educador/guias/GUIA_UF_I_FINAL_X1a_2.pdf. Acesso: 10 mai. 2013.

Sugestões de práticas de aprendizagem

Sugerimos algumas práticas de aprendizagem que abordem temáticas e habilidades trabalhadas pelo Componente Curricular Filosofia no Ensino Fundamental.

HABILIDADES

(EF09FL01PF01) Compreender o ser humano como ser individual, social e cultural que se modifica na sua ação; 

(EF09FL01PF02) Entender a cultura como ação humana

QUESTÕES PARA TRABALHAR COM ESTUDANTES:

A) A partir da leitura do texto, o que podemos considerar como Cultura?

B) Apresente três exemplos de manifestações que, de acordo com o texto, podem ser consideradas culturais.

C) Quais práticas culturais podem ser prejudiciais à comunidade ou ao próprio homem? Explique.

D) Segundo o texto, a fala é a mais importante criação cultural. Qual a relação entre a fala e a cultura?

E) Darcy Ribeiro foi sociólogo, antropólogo, educador, escritor e indigenista brasileiro, defensor da educação pública e de qualidade. Seus estudos são grandes referências para o entendimento da cultura indígena e para a formação do povo brasileiro. Faça uma pesquisa sobre a biografia de Darcy Ribeiro, anotando também algumas ideias e pensamentos deste importante brasileiro.

F) Assista aos Comentários sobre o Documentário Povo Brasileiro – Darcy Ribeiro: https://youtu.be/CqgKx5E-0tQ?t=318 Faça um breve comentário seu sobre esta construção cultural (mosaico) do nosso querido Brasil.

Quem paga o preço quando a religião vira arma de campanha?

Você acredita que há espaço para políticas religiosas específicas em um Estado laico?

Em meio a discursos sobre “unidade” no Café da Manhã Nacional de Oração, Donald Trump surpreendeu ao declarar a criação de um “gabinete da fé” na Casa Branca e uma força-tarefa liderada pela ex-procuradora Pam Bondi para combater o que chamou de “viés anticristão” no governo federal. A medida, segundo ele, visa “investigar violência e vandalismo anticristão” e “defender os direitos dos crentes”. Mas onde estão os exemplos concretos dessa perseguição?

Enquanto o governo Biden lançou planos para combater discurso antimuçulmano e antissemita, Trump mira seu discurso em um suposto “ataque aos cristãos” — baseando-se em retórica vaga e alinhando-se ao eleitorado evangélico, que representa 27% do eleitor republicano. A jogada parece clara: consolidar apoio antes das eleições, vendendo uma narrativa de perseguição religiosa sem provas.

E não para por aí: o ex-presidente, que afirma ter recebido “uma unção divina” após sobreviver a um atentado, nomeou a pastora Paula White — sua conselheira religiosa há anos — para comandar o gabinete. Será mera coincidência que ela seja uma figura polêmica, ligada à teologia da prosperidade e a escândalos financeiros?

A questão que ninguém pode ignorar:

A Primeira Emenda dos EUA proíbe o Estado de endossar religiões específicas. Ao criar uma força-tarefa exclusiva para “proteger cristãos”, Trump não só ignora a diversidade religiosa do país, mas risca a linha tênue entre Igreja e Estado. Será proteção legítima ou marketing político disfarçado de fé?

Enquanto isso, sua fala sobre “se livrar dos woke” revela o tom partidário e polarizador por trás do suposto apelo à unidade. Cristãos conservadores podem celebrar, mas a pergunta fica: quem paga o preço quando a religião vira arma de campanha?

Comente: Você acredita que há espaço para políticas religiosas específicas em um Estado laico?

Há prenúncios de que essa estratégia já esteja em andamento no Brasil? Já ouviu políticos da bancada evangélica falarem de “Cristofobia”?

Autor: Hermes C. Fernandes.  Reflexão escrita em fevereiro/2025.Também escreveu e publicou no site “Jesus não combina com preconceito”: www.neipies.com/esus-jesus-nao-combina-com-preconceito/

Edição: A. R.

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