Se nós professores e professoras não tomarmos nas mãos nossa profissão, não nos ocuparmos dela, não lutarmos por ela estaremos fadados à eucaliptos. Bonitos, enfileirados e prontos para o corte.
Hoje poderia ser um dia como qualquer outro, mas não é. Hoje foi um daqueles dias que mexe com a gente. As notícias de ataque da autoridade à carreira profissional e os sinais de desvalorização aos professores trazem tristeza, frustração e indignação.
Ao mesmo tempo, recebo no corredor um desenho de um aluno-educando. Aluno-educando pois está em virtuoso processo de “o sem luz” para o processo do “educere” trazer a luz. Ele me fez refletir o quanto faz um professor, a responsabilidade que nos cabe e a vastidão do que operamos.
Pisar e frequentar o chão da sala de aula de uma escola pública de educação básica é para poucos. Um reino a parte. Neste micro espaço de metros quadrados vive gente, vivem sonhos, vive o futuro.
Minha mente fervilhava entre uma aula e outra, uma explicação e outra, uma avaliação para encaminhar, uma turma e outra… e eu pensava no ser professor.
Rubens Alves tem um texto curto mas muito significativo. Fala do professor-eucalipto e do educador-jequitibá. Eucalipto e Jequitibá não é tudo árvore? Tem diferença?
Professor-eucalipto aquele das cifras, enfileirados em posição de sentido, padronizados. Preparados para o corte. São entidades descartáveis, sai um já cresce depressa o outro. Substitui. Se analisa o custo. Educador envolve vocação, envolve dedicação amorosa (não estou falando que amor paga conta) envolve grande esperança.
O educador-jequitibá tem personalidade, tem alma, que sente o que ninguém sentiu. É artesanal, é unico, tem paixões, visões, tem liberdade. O que aconteceu com ele? Existirá o nicho ecológico que torna possível sua existência? Será que alguém lhe concede a palavra?
Estão lentamente derrubando a floresta, derrubando árvores e, em seu lugar, querem eucaliptos.
Pois no final da manhã me vem o Pedro com essa chave do céu e me trouxe um alento. Ele me entrega um desenho e me faz perceber que é preciso vir de dentro.
Se nós professores não tomarmos nas mãos nossa profissão, não nos ocuparmos dela, não lutarmos por ela estaremos fadados à eucaliptos. Bonitos, enfileirados e prontos para o corte.
O VIII Congresso dos Professores Municipais de Passo Fundo ocorrerá no dia 30 de agosto, no Centro de Eventos do Campus I da Universidade de Passo Fundo (UPF). O tema desta edição será “Magistério: uma carreira em extinção?”.
No turno da manhã, o horário será das 8h às 11h30min e terá como palestrantes a Vereadora Professora Regina Costa dos Santos e o psicanalista Dr. Francisco dos Santos Filho. ⏰ No turno da tarde, o horário será das 13h15min às 17h30min e terá como palestrantes um representante do Sindicato dos Professores Municipais de Santa Maria e o professor Dr. Altair Alberto Fávero. Ambos os turnos contarão com a mediação do professor Nei Alberto Pies.
Pré-Congresso 2023!
“Magistério: uma carreira em extinção?”. O tema do VIII Congresso dos Professores Municipais foi debatido na noite desta quarta-feira (16) durante o Pré-Congresso, ocorrido na sede do CMP Sindicato, que contou com a participação do advogado da entidade, Dr. Henrique Cullmann.
No encontro, os professores puderam discutir questões de valorização dos educadores, como a Lei do Piso Nacional do Magistério, além de refletir sobre as causas da desvalorização, ocasionada pelos constantes ataques sofridos pela educação.
Um dos principais assuntos debatidos foi a atual reforma administrativa proposta pela administração municipal ao legislativo, que impacta negativamente os docentes no seu plano de carreira, como no caso das progressões dos futuros professores. O Sindicato prontamente posiciona-se contrário ao projeto e informa que tomará ações de defesa dos direitos dos nossos educadores.
Autora: Márcia Carbonari, professora da educação básica, formada em história.
Que ao pátio de nossos primeiros anos possamos retornar, não importando agora por quais hinos cantar. Pensando no IE (Instituto Educacional de Passo Fundo), salvando todos, salvei a mim mesmo.
Como foi difícil deixar o IE.* Não havia mais nada para fazer ali. No entanto, queria morar em suas salas, levar minhas coisas para viver em seus corredores, poder escolher uma sala como dormitório. Um corredor para cada dia, uma classe para cada noite. Mas não era mais possível, as aulas terminaram, os degraus do Curso Ginasial se encerravam e o que me restava… talvez fugir. Embora fugindo, arrastei os atores, todos comigo.
Meus passos em direção à praça em logo frente foram trôpegos, sem vontade, desde que recebi meu boletim de aprovação. Fui aprovado com ressalvas e vários conselhos. A matemática teimava em me enganar. A química, em me trair. Saí contrariado porque o motivo de minha vida em seus 19 anos estava por se extinguir na escola, pelo menos naquela hora. Um banco de praça me serviu de companhia, enquanto eu olhava para trás e via as últimas janelas do IE sendo fechadas. O prédio se trancando e eu prisioneiro em uma praça.
Em seu pátio estávamos todos em fila, a fila diária, por ordem de altura e que nos ensinou, pelo resto de nossas vidas, o tamanho do nosso próximo mais próximo e que na vida haveria espera para quase tudo.
E então… entrávamos para as salas de aulas pelos fundos. Do enorme átrio em que se edificavam a ordem das coisas em nosso mundo, subíamos para as salas, andar por andar, passando pelos rígidos olhares dos professores, pelas escadas de degraus curtos, entre risos miúdos e pequenas censuras.
Salve Instituto, sempre impoluto… já havíamos cantado. Parte do Evangelho já havíamos lido, então, estávamos prontos para nosso recomeço diário.
Assim era o universo para nossas mentes, em uma Passo Fundo de muitas casas, e de 6 prédios apenas, de calçadas enormes, de uma Escola imponente que se opunha nossas alturas, nós adolescentes em profusão, espantados com a obra colossal do IE, das construções em sua volta e da arte expressa em suas colunas.
Este mundo era grandioso demais para que deixássemos de frequentar, somente porque os anos do ginásio sumiam de nossa frente. O último dia, no prédio, foi assim mesmo. Um misto de desespero pela página que se virava, um pouco de alívio pela pressão por liberdade, um sossego mental em não ter de entoar orações e hinos, agora não mais todos os dias. E sem saber, claro, que depois sentiríamos sua falta por anos e anos…
E o banco da praça da avenida me acolheu, quando olhei pela última vez a escadaria, uma entrada proibida, onde raramente se tinha acesso. Talvez por se tratar de degraus de professores, direção, autoridades, que poderiam até se confundir com alguns pais reclamando por seus filhos reprovados, saindo dali lendo seus boletins recheados de insuficiências, mesmo com promessas para um próximo ano melhor, a repetir, que seja.
Sim, a entrada era proibida, apenas alguns degraus, era a entrada triunfal. Mas quem sentia falta? Os fundos da escola foram exatamente o rascunho de uma vida de independência que estava se avizinhando, sem os mesmos colegas, pena, os pilares de nossa infância, sem os professores amarrados aos seus credos, sem a ordem litúrgica, diária, cruel e tão indispensável para aqueles dias.
Ficaram para trás os tambores da banda organizada, impecável. Que sempre nos remetia a uma cidade americana, sim, nós, que até nos uniformes nos espelhávamos um pouco no país dos fundadores. As fotos dos alunos dispersos pela sua secretaria e um pátio onde o centro do mundo ecoava, a família de fato, nos olhares e intenções, nos amigos e nos pequenos desafetos, nosso começo de caminhada, nossos primeiros valores.
O IE foi tudo para uma geração, mais. Foi a formação de todos os valores que trouxemos pela vida, para o bem ou para menos que isso. As filas aquarteladas nos lembravam que a vida fora de seu pátio nos exigiria paciência, respeito. A educação, com seu rigor e sua ética como que se nos falava em tempos menos nobres pela frente. O horror de um boletim manchado muito nos dizia sobre os méritos a enfrentar, sobre a vontade contínua em aprender, ou então, as nuvens da reprovação. Não teríamos sempre, afinal, notas ou céus azuis pela frente.
De nossas amizades, aprendemos que os fundamentos de nossa existência estavam nos primeiros anos neste Ginásio. Foi ali que o concreto em nossas construções foi derramado e sobre ele é que desenhamos a forma de nossas carreiras, conquistas e demais ilusões, agora na distância dos que partiram ou na rotina dos que ficaram. A riqueza ou a escassez de cada um, pode ter sido lançada nestes dias e, mesmo aos mais céticos, nestes anos ingênuos e de descobertas impressionantes, ali mesmo foi onde encontramos o sentido para toda a vida.
Quanto mais seguimos adiante, parece que mais nos aproximamos do pátio de nossa adolescência. Nossas vidas têm poucas escolhas quando se trata de memórias cristalizadas, que jamais nos deixarão. Mesmo contra nossa vontade, será para o pátio de nossa escola que apoiaremos nossos melhores dias, sem percebermos, em dias e anos, nessa edificação que não paramos de construir e a que chamamos de tempo.
No banco solitário da praça em frente, perguntava às pedras que serviam de álibis, como viver agora, sem a sisudez do Prof. Arno, o rigor do ‘Casquinha’, sem a sinceridade do Norton, sem a ajuda cartesiana do professor Renato, sem as travessuras do Fausto…sem tantos, tantos e tantos a citar.
Preciso voltar nem que seja para dizer bom dia, a quem estiver por perto. Para assistir ao menos a uma nova aula, enfadonha e essencial, para expiar pelas janelas do IE e descobrir como andavam as pessoas pela praça, estas mesmas que pertenciam ao outro lado do mundo. Sem os sinos, que não sei de onde anunciavam o meio-dia. E preciso de mais. Das manhãs de geada, das salas frias do ‘redondão’, das aulas intermináveis no laboratório, do curioso e inquieto Jacob.
Ver os amigos em uma partida de vôlei, a paciência da Prof. Ana Maria, o Prof. Osvaldo Reis, a querida Bere, o rigor do início de carreira do Gilles, a inteligência da Prof. Lourdes. E o bumbo da banda sendo tocado e trocado pelo Kiko Paiva? Preciso rever as milhares de partículas de lembranças deixadas para trás. O Foguinho, o Cláudio Nelson, meu Deus, quantos!
E o que lembrar da Walkíria, inesquecível, como esquecer, impossível! Um anjo que se disfarçou de aluna para não impressionar com sua beleza, arrebatando em vida os que a cercavam. Ela mesma que esquecia suas asas em casa para não nos machucar.
E o que falar das tardes frias nas escadas do IE, vitimados por um vento implacável que soprava pelo Boqueirão, do salão aos fundos do pátio em que se ensaiava o teatro e as gincanas das turmas, suas cadeiras em madeira, como se ali fosse um cinema local.
E o que dizer sobre os desfiles de 7 de setembro, as fileiras impecáveis de uniformes pela Av. Brasil… os nervos expostos nos dias que antecediam as provas, os primeiros amigos…os primeiros namoros… as primeiras perdas.
E o que mais lembrar do prédio no antigo internato. Ali mesmo, o Daniel e eu, os dois últimos internados, desta vez por opção.
Recentemente, quando a Vila Elisabeth veio abaixo, a casa dos Reitores, algumas fissuras sob o nosso chão, onde pisávamos sobre os primeiros sonhos, ficaram expostas. O barulho infernal das máquinas destruindo o que foi o nosso palco, operavam como que arrancassem um pedaço de nossas memórias. Quantos reitores que ali moraram e partiram não juraram vingança!
Mas, enfim, fiz um acordo de saída, na praça mesmo. Não volto não. Ninguém estará lá. Falava-se que novos tempos viriam, um novo segundo grau… então acabou.
Se não é mais possível caminhar em seu entorno, resolvi levar todos comigo, para sempre, pelos anos, até o fim. Os que me enfeitiçaram pela educação e ainda os alquimistas de 18 anos que, comigo, achavam que poderiam salvar o mundo. Pensando no IE, salvando todos, salvei a mim mesmo.
Que ao pátio de nossos primeiros anos possamos retornar, não importando agora por quais hinos cantar. Na memória de seu espaço, aprendemos ali, na razão daqueles dias, a vida em seu despertar, sendo todos nós filhos das manhãs longas e frias de Passo Fundo, que aos poucos diminuíam aos nossos olhos, agora crescidos e tão melancólicos.
* Instituto Educacional de Passo Fundo, Escola Metodista centenária, que formou centenas e centenas de alunos na cidade e região.
Vamos sendo conduzidos pelo vento das descobertas e das confirmações, como gaiolas abertas, que nos permitem cair no vazio das incertezas, que só a leitura e a escritura proporcionam, e voar para longe, num voo desconcertante e belo, de imensa liberdade, mesmo na rigidez das cores de chumbo e do cheiro acre da prisão.
Considerando que o papel da educação no sistema prisional seja o de exclusivamente ajudar a pessoa privada de liberdade a desenvolver habilidades e capacidades para estar em melhores condições de conquistar as oportunidades socialmente criadas ao ser inserida novamente na sociedade, iniciamos, há algum tempo, numa unidade prisional de Canoas, no RS, uma prática que denominamos oficinas de criação textual. Tais práticas ensejam, através um recorte de habilidade e ousadia – a Escrita, a construção de instrumentos para que as condições anteriormente citadas sejam otimizadas.
Sob outra perspectiva, no entanto, para além desse objetivo (constitutivo inclusive de leis e portarias), nosso olhar repousa sobre a pessoa e não sobre um número ou uma categoria, como muitas vezes o/a privadao/a de liberdade é referido/a.
Se, de um lado, o homem ou a mulher privados e privadas de liberdade tendem a ser sumariamente obscurecidos e obscurecidas por instâncias sociais as quais geralmente só tem olhos para os fatos imediatamente compatibilizados com seus interesses e para experiências adjacentes, de outro, podemos dizer que, de nossa experiência dialógica com os privados de liberdade, em que “promover, defender, amar e servir a vida” (Pastoral Carcerária da Igreja Católica – Missão) se concretiza como objetivo primeiro, surge a inquietação proveniente de nosso comprometimento com tais pessoas. Tal comprometimento não se limita à “visita”, uma vez que nosso compromisso também se alinha com as questões que envolvem as causas e as consequências das realidades prisionais.
Dessa forma, buscaram-se estratégias para desenvolver as Oficinas que levassem os participantes a construírem-se ou (re)construírem-se por meio, primeiramente, do desejo de se tornarem visíveis para a sociedade. Buscamos com que propostas emancipadoras para práticas de leitura e escritura se constituíssem em criadoras de horizontes, que intencionassem o mundo, o interrogassem e levassem a construir percepções e concepções de novas realidades possíveis para eles próprios.
Neste sentido, nosso eixo calcou-se nos princípios da Educação Popular, os quais se materializam, dentre outras trilhas, como resistência ao imediatamente visível, pela busca do que está “por trás”, lá onde se podem politizar as relações sociais (Brandão, 1984), moldando respeito pelo individual e pelo coletivo, podendo, inclusive, a partir daí, protagonizarem-se, os privados de liberdade, numa transformação de si e (por que não?) do circundante.
Assim, se considerarmos que o confinamento propende à anulação e à invisibilidade da pessoa, uma proposta de desenvolvimento para práticas de leitura e escritura só nos pode levar a pensamentos como:
é necessária a busca de resgate da identidade da pessoa confinada;
a identidade da pessoa remete à sedimentação de sua dignidade que cremos muitas vezes perdida no confinamento;
a dignidade humana é direito de todas as pessoas, garantida constitucionalmente;
segundo especialistas, a escrita, com suas narrativas, (não necessariamente a escrita “certa”, pois não se trata de aulas!) auxilia no processo emancipatório do ser humano em que ele constroi redes de esperança para si, em primeiro lugar para, depois, ajudar a construir para outros;
a necessidade de promover a inclusão da pessoa não-alfabetizado e dos idosos e idosas.
Assim, podemos dizer que, longe de ser uma proposta articulada e acabada, estamos sempre, a cada encontro, permitindo que visões de mundo e intuições sejam nossas “ferramentas de oficina”. E vamos sendo conduzidos pelo vento das descobertas e das confirmações, como gaiolas abertas, que nos permitem cair no vazio das incertezas, que só a leitura e a escritura proporcionam, e voar para longe, num voo desconcertante e belo, de imensa liberdade, mesmo na rigidez das cores de chumbo e do cheiro acre da prisão.
O digital pode ser útil para manter os laços, mas as tecnologias nunca substituirão o encontro humano que permeia a escola, os educadores e os estudantes. Precisamos usar a tecnologia como meio para nossos fins e não sermos usados e manipulados pelas tecnologias e pelas redes sociais.
Trata-se de um alerta, principalmente, sobre o uso excessivo, intensivo e como as ferramentas tecnológicas estão fazendo parte do cotidiano da sala de aula. O relatório reconhece a importância das tecnologias, porém aponta algumas ressalvas.
Destaca que as evidências sólidas e imparciais do impacto da tecnologia educacional são escassas e que existem poucas evidências robustas do valor agregado da tecnologia digital na educação.
Alerta que boa parte das evidências são produzidas pelos que estão tentando vendê-las e que a tecnologia pode ser uma salvação para a educação de milhões, mas exclui muito mais pessoas.
Ainda segundo o documento, a tecnologia acessível e o design universal criaram oportunidades para estudantes com deficiências. Evidencia que o ensino on-line evitou o colapso da educação durante o fechamento das escolas na pandemia da covid-19 e o direito à educação, cada vez mais, é sinônimo de direito à conectividade adequada.
No entanto, há desigualdade no acesso, e a tecnologia digital aumentou de forma dramática o acesso a recursos de ensino e aprendizagem, no entanto, a tecnologia deveria se concentrar em resultados de aprendizagem, e não em contribuições digitais, ressalta.
Os especialistas chamam a atenção, também, para situações identificadas, apontando que o ritmo acelerado das mudanças na tecnologia tem pressionado os sistemas de ensino a se adaptarem seguidamente.
Muitos estudantes, aponta a Unesco, não têm as oportunidades para usar tecnologias digitais em práticas escolares e os professores, muitas vezes, se sentem despreparados e pouco seguros para dar aulas usando tecnologia e conteúdo digital é produzido por grupos dominantes, o que afeta quem o acessa.
Identificou-se que quase 90% do conteúdo disponível em repositórios de educação superior com coleções de recursos de educação aberta foram criados na Europa e na América do Norte e 92% do conteúdo da biblioteca global OER Commons está em inglês. Há uma hegemonia das ferramentas, conteúdos e da epistemologia do Norte sobre a do Sul.
Educação superior
A educação superior é o setor que está adotando tecnologias digitais mais rápido e o que mais está sendo transformado por ela.
Havia mais de 220 milhões de estudantes frequentando cursos abertos on-line e massivos em 2021.
Mas as plataformas digitais ameaçam o papel das universidades e representam desafios regulatórios e éticos, por exemplo, com relação a promoções exclusivas de assinaturas, além de dados de estudantes e funcionários.
A expansão do Ensino Superior (ES) no Brasil no período de 1991 até 2021 foi 475%, sendo 619% no ensino superior privado e, 245% no ensino público.
Atualmente, a expansão no ES somente se mantém impulsionada pela EaD, que cresce no segmento privado, cujos ingressantes superam as matriculados nos cursos presenciais.
Licenciaturas
Os cursos relacionados à formação docente em Educação a Distância (EaD), como Pedagogia e Licenciaturas, apresentaram um crescimento de 109,4% de concluintes na rede privada, no período de 2010 e 2020.
No mesmo período, diminuíram os concluintes na modalidade presencial, em ambas redes (pública e privada), sendo a queda na rede privada é bem maior.
Nas licenciaturas, especialmente Pedagogia, 61,1% dos formandos são em EaD, enquanto nos demais cursos são 24,6%.
Deste cenário emerge uma questão central: qual é a qualidade desta formação de nossos docentes responsáveis pela alfabetização das crianças brasileiras?
“A revolução digital possui um potencial imensurável, mas, assim como foram feitas advertências sobre como ela deve ser regulamentada na sociedade, atenção semelhante deve ser dada à maneira como ela é usada na educação”, destaca Audrey Azoulay, diretor Geral da Unesco.
“Seu uso deve ser para experiências aprimoradas de aprendizado e para o bem-estar de alunos e professores, não em seu detrimento. As conexões on-line não substituem a interação humana.”
A problemática da excessiva burocracia na educação, sobretudo a partir dos tempos da pandemia, vem sendo discutido por este site faz um bom tempo. Mas uma postagem, em rede social, do professor e educador brasileiro Celso Vasconcellos, reproduzindo texto de nossa autoria, nos faz aprofundar mais o tema, pois chamou atenção para a seguinte questão: a burocracia é um fim em si mesma ou um meio de registrar a atividade docente? Leia mais:https://www.neipies.com/estao-matando-a-essencia-da-educacao/
Tecnologia na educação
O relatório termina destacando que o papel da tecnologia na educação vem provocando um intenso debate há muito tempo.
Este debate foi ampliado pelo fechamento de escolas durante a covid-19 e pelo surgimento da inteligência artificial generativa, mas questiona: a tecnologia democratiza o conhecimento ou ameaça a democracia ao permitir que alguns poucos selecionados controlem as informações?
Ela oferece oportunidades ilimitadas ou leva a um futuro sem retorno e dependente da tecnologia? Ela promove a igualdade ou agrava a desigualdade? Ela deve ser usada no ensino de crianças pequenas ou representa um risco para o seu desenvolvimento?
Estudos e pesquisas no campo da educação já apontam riscos e excessos do grande “mercada global da educação” em continuar expandindo esta lógica de educação por meio de plataformas digitais.
Os professores António Nóvoa e Yara Cristina Alvim apresentam uma forte crítica a três ilusões perigosas empoderadas a partir da educação virtual na pandemia:
a ilusão de que a educação está em todos os lugares e em todos os tempos, e que acontece “naturalmente” num conjunto de ambientes, sobretudo familiares e virtuais;
a ilusão de que a escola, como ambiente físico, acabou e, a partir de agora, a educação terá lugar sobretudo “a distância”, com recurso a diferentes “orientadores” ou “facilitadores” das aprendizagens;
a ilusão de que a pedagogia, como conhecimento especializado dos professores, será substituída pelas tecnologias, “dopadas pela inteligência artificial”.
Em alternativa às pressões do mercado da educação e a essas “ilusões”, salientam que a educação implica sempre uma intencionalidade, obriga a um esforço de construção, de criação e de composição das condições, dos ambientes e dos processos propícios ao estudo e ao trabalho dos alunos.
É esse esforço que define o papel dos professores na construção de um espaço público comum da educação e na criação de novos ambientes escolares, promovendo uma pedagogia do encontro entre estudantes e educadores.
A técnica, em geral, não é boa nem má, nem neutra, nem necessária, nem invencível. É uma dimensão, recortada da mente humana, de um devir coletivo heterogêneo e complexo na “cidade do mundo”.
O que determina seu sentido e benefício é o uso e o fim que nós, seres humanos, lhe atribuirmos. Quanto mais reconhecermos isto, mais nos aproximaremos do advento de uma tecnodemocracia.
Transformação do mundo
Pierre Lévy, filósofo e sociólogo francês, alerta e questiona que na era do planeta unificado, dos conflitos mundializados, do tempo acelerado, da informação desdobrada, das mídias triunfantes e da tecnologia multiforme e onipresente, quem não sente que é preciso repensar os objetivos e os meios da ação política?
A integração plena das escolhas técnicas no processo social, educacional e democrático é um elemento chave da necessária mutação política.
Lévy afirma que nos tempos atuais a técnica é uma das dimensões fundamentais onde está em jogo a transformação do mundo humano por ele mesmo.
A incidência cada vez mais impregnante das realidades tecnoeconômicas sobre todos os aspectos da vida social, inclusive da educação, e também os deslocamentos menos visíveis que ocorrem na esfera intelectual, obrigam-nos a reconhecer a técnica como um dos mais importantes temas filosóficos e políticos de nosso tempo.
Na escala da vida humana, estes agenciamentos sociotécnicos constituem um fundo sobre o qual se sucedem os acontecimentos políticos, militares e científicos mais importantes.
Essência da técnica
Outro filósofo, o alemão Martin Heidegger, também tratou do tema no texto A questão da Técnica, em 1959.
Já naquela época afirmava que a técnica não é a mesma coisa que a essência da técnica, pois a essência da técnica também não é de modo algum algo técnico. Alertava que, por todos os lados, permaneceremos sem liberdade, atados a ela.
Mas de modo mais triste estamos entregues à técnica quando a consideramos como algo neutro, pois essa representação, à qual hoje em dia se adora prestar homenagem, nos torna complemente cegos perante a essência da técnica.
Dizia Heidegger que a essência da liberdade, originariamente, não está ordenada segundo a vontade ou apenas segundo a causalidade do querer humano.
A liberdade está num parentesco mais próximo e mais íntimo com o acontecimento do desabrigar, isto é, do conhecimento da verdade.
A ameaça dos humanos não vem primeiramente das máquinas e aparelhos da técnica, cujo efeito pode causar a morte. A autêntica ameaça já atacou o homem na sua essência, sentencia Heidegger.
Retornando a relação da educação com as técnicas, é preciso dizer que as tecnologias, por si só, não educam ninguém. No entanto, as questões tecnológicas não são apenas tecnológicas, são pedagógicas e são políticas.
Nesta perspectiva, cabe renovar o questionamento que fez Gert Biesta: “chegou a hora de desistir da escola moderna, e das suas promessas, entregando-a nas mãos da Pearson, da Google e de outros capitalistas educacionais, ou devemos tentar uma vez mais e, nesse caso, o que devemos fazer?”.
As ilusões da “casa” (ensino domiciliar) e das “tecnologias” alimentam-se mutuamente e transportam uma terceira ilusão: com recurso ao digital e graças a um acompanhamento por parte dos pais, ou de algum “tutor”, as aprendizagens aconteceriam de modo natural ou espontâneo. É uma ilusão perigosa e errada.
Num dos grandes livros da pedagogia contemporânea, La Mystification Pédagogique, Bernard Charlot explica que “a educação não se pode fazer por simples imersão da criança no meio social”, pois é necessária “uma mediação entre a criança e os modelos sociais”.
É preciso repensar a escola enquanto um espaço público comum e professores construtores deste espaço. São eles que, em proximidade com as famílias, os poderes locais, as entidades públicas e privadas, podem construir as condições para uma capilaridade educativa baseada no comum e na convivialidade.
Aprender e estudar em comum é a melhor forma de promover uma vida em comum, uma sociedade convivial.
A educação precisa caminhar junto com a ciência e a tecnologia.
A pedagogia é sempre uma relação humana.
O digital pode ser útil para manter os laços, mas as tecnologias nunca substituirão o encontro humano que permeia a escola, os educadores e os estudantes. Precisamos usar a tecnologia como meio para nossos fins e não sermos usados e manipulados pelas tecnologias e pelas redes sociais.
Os estúpidos poderão se encarregar de conduzir a humanidade ao caos, não sem antes levar consigo as memórias e a impotência dos que são/foram vencidos pelo embestamento ético e estético.
A força da frase de Walter Benjamin (acima) dispensaria qualquer comentário, pois já se insinua advertida de análises obsequiosas. Considero, por oportuno, que podemos e devemos atualizá-la. Tomarei por pena um dos modos possíveis de interpretação, alargada na direção das vidas desperdiçadas.
Vidas desperdiçadas: o que seriam vidas desperdiçadas? Sem a pretensão de criar uma categoria ou domesticar palavras com vistas a estabelecer uma definição teórica, apresento alguns contextos existenciais que seriam, a meu ver, de vidas desperdiçadas.
A primeira delas, as vidas que não são passíveis de luto. Poderíamos dizer, as vidas que não são choradas porque nem sequer sabidas como existentes. Ou mesmo somadas ao repertório da métrica, não fazem diferença. Quantas delas nós conhecemos? Seus rostos e sonhos, suas continuidades, para onde seguiram ou seguirão? Até ouvimos dizer, mas como um eco tardio do inevitável. Muitas delas ganham geografia na pós-vida, naquele lugar da calculabilidade; suas memórias retrucadas pelo esquecimento produzido ou reverberado pelos narradores opulentos.
A segunda (por didatismo apresento uma ordem) são as vidas desperdiçadas dos “diferentes”. Há um modelo reiteradamente apresentado como sendo o normal, o certo, o preferível. Quantas pessoas “jogamos” para dentro dessa categoria, impingindo toda sorte de maneiras de qualificá-las, enredando suas vidas no espasmo do destino? Quantas vezes nos pegamos sentindo pena, raiva ou ódio dos que não se enquadram nos padrões aceitáveis. Quem é este que aceita? Quem define os critérios de aceitação? Em que se sustentam os recortes epistemológicos e morais que classificam os diferentes modos de se ser?
E por mais paradoxal que possa parecer, penso que há uma terceira instância de vida desperdiçada, que são as vidas das pessoas logradas pelo destino. Não se trata de corroborar a tese de que não temos qualquer agência sobre nós e a realidade, mas de reconhecer a assombrosa ambiência a que são entregues algumas vidas, como se nascessem no lugar e na hora errada, como um estorvo do tempo. Claro que poderíamos dizer que a definição de hora certa ou errada se abre pelo interior de uma construção semântica e situada, infelizmente, muitos são cativos desse acaso que se atravessa e inabilita a possibilidade. Sofro por reconhecer a trágica condição humana: têm coisas que estão fora do nosso alcance e ou se distanciaram de forma irrecuperável.
A palavra final, no entanto, se estica como gesto de reconhecimento de que a absoluta maioria das vidas desperdiçadas depende de um projeto que foi se constituindo e tendo por base uma racionalidade predatória e escorchante. Lógica avessa ao outro, ao diverso, à vida. Os estúpidos poderão se encarregar de conduzir a humanidade ao caos, não sem antes levar consigo as memórias e a impotência dos que são/foram vencidos pelo embestamento ético e estético.
Não, não importava o que a Valentina gostaria, não importava se ela tinha um propósito ou uma certa aptidão pela profissão. Para aquela avó, parecia ser muito simples: escolha o que lhe der mais dinheiro. O contrário, pela sua feição, seria inadmissível.
Eu estava tomando um café, enquanto ouvia a conversa da mesa alheia (desculpe-me, caro leitor) eu entendo a tamanha indiscrição, mas, eu juro! é o tipo de estímulo auditivo que eu simplesmente não consigo ignorar.
Haviam duas senhoras, conversando sobre a vida da Valentina. Uma delas, parecia ser a avó e insistia indignadamente:
– A Valentina deveria fazer medicina, deveria, mas ela não quer. Quer fazer psicologia! Mas, ela deveria fazer medicina, pensa bem, se ela se formar em psicologia, vai ter que fazer uma especialização, um mestrado, doutorado… daria o mesmo tempo que fazer uma residência. A diferença é que ela estaria ganhando muito mais! (assim como metade da família médica, pelo que eu compreendi).
Naquela altura do campeonato, a minha vontade era simplesmente levantar e fazer um sermão! Eu não sou padre, eu não fazia ideia de quem era Valentina, mas sua autenticidade deveria ser defendida. Eu levantei… acovardei-me e fui para a casa… a verdade é que eu sou péssima em improvisos e aquilo não daria certo… por mais que vontade não me faltou!
Depois que partimos, fiquei pensando em como aquela simples conversa retratava um pouco dos “ideais” da civilização contemporânea, que pode muito bem ser traduzido por dinheiro, money, bufunfa, grana ou dindin.
Não, não importava o que a Valentina gostaria, não importava se ela tinha um propósito ou uma certa aptidão pela profissão. Para aquela avó, parecia ser muito simples: escolha o que lhe der mais dinheiro. O contrário, pela sua feição, seria inadmissível.
Para compensar a minha covardia, lembrei da vez em que eu criei coragem e fui mesmo brigar com o meu ex-psiquiatra. Eu defendia a ideia de que seria possível viver sem antidepressivos, mesmo após uma depressão e alguns episódios de ansiedade generalizada, e que achava aquela estória da falta de neurotransmissores uma conversa para boi dormir e para a indústria farmacêutica acordar, né, (claro, eu fui bem mais educada e técnica, mas no final, foi isso mesmo que eu quis dizer).
Enquanto que, surpreendentemente, em alguma etapa da discussão, ele me respondeu que tomava um antidepressivo de manhã e outra à noite, confessou-me que chegou em um momento da vida dele em que ele estava ganhando bem, mas, não via mais sentido naquilo que ele fazia. A resposta que ele encontrou pra si mesmo foi aquela que possivelmente ele aprendeu na residência? É questão de química!
O problema era o seu, e o meu, cérebro que não produziam neurotransmissores de modo suficiente e isso estava muito bem embasado, graças as teorias da época e ao seu histórico familiar. Era genético. Dentro dessas limitações, não havia o que ser feito a não ser aceitar e tomar o seu remedinho.
Eu lembro até hoje dele olhando para mim e dizendo: Ana, está vendo este óculos? Assim como eu o utilizo porque não enxergo direito, você também deve utilizar o antidepressivo, pois, não produz adequadamente a serotonina (um neurotransmissor). Na época eu preferi não discutir essa falácia, especificamente caracterizada como falsa analogia.
Eu compreendo que o intuito dele com aquilo era simplificar, o porém, é que é justamente esse o problema. Algumas “soluções” da medicina parecem simplificar o complexo jogo de nossas reações químicas, que derivam não só da genética, como da epigenética, conduzida pelos fatores ambientais, além de nossa estrutura cognitiva, comportamental e emocional.
É fácil resolver o problema enxergando desse modo, (aliás, enxergando mal e precisando de óculos) o problema é que… os antidepressivos resolvem mesmo o problema? Ou deveriam ajudar a resolver o problema?
Essa discussão ocorreu faz alguns anos… e aqui eu gostaria de fazer a minha primeira ressalva. Meu intuito com o texto não é fazer as pessoas fugirem dos psiquiatras. Pelo contrário, acredito que a psiquiatria tenha evoluído muito até o momento, e talvez até o meu ex-psquiatra, além disso, acredito também que novas abordagens estão sendo propostas. Deixo aqui minha total admiração aos profissionais que genuinamente buscam compreender a complexidade humana e restituir a sua saúde mental.
Feita a ressalva… como eu já confessei, eu não me dou bem em improvisos e na época eu estava com o meu sistema nervoso tão alterado que a única coisa que eu consegui pensar depois daquele desabafo foi: bom, se ele mesmo toma antidepressivo, ao menos quer dizer que pelo menos ele realmente acredita na teoria que ele aplica, isso é digno de nota e, no fundo ele é uma boa pessoa.
Eu segui a procura de respostas, não foi um caminho fácil, na busca por autoconhecimento, precisamos mexer dentro, e nos deparamos com muito sofrimento, medo e apreensão. Além da solidão, pois, quando contestamos uma teoria famosa, também nos sentimos sozinhos e sem apoio.
Perguntei-me várias vezes se estaria no caminho certo, encontrei respostas na meditação (leia de novo e devagar para não confundir com medicação), ou melhor, encontrei respostas em um exercício continuo de consciência sobre as minhas ações e só consegui superar as minhas crises quando eu genuinamente passei a conhecer a si mesma e com isso também reconhecer o meu propósito de vida, que, com essa história, não poderia ser algo diferente de Filosofia.
Hoje, sinto por aquele não ter sido o momento de dizer: com todo o respeito, considero que, talvez, o que lhe falte não são neurotransmissores, é um propósito. Sinto muito por você não conseguir perceber as consequências de não olhar criticamente para uma cultura fundamentada no lucro. Em que somos ludibriados e convencidos a escolher as nossas profissões prioritariamente por status e dinheiro. Até que depois de um tempo, começamos a perceber que isso não é suficiente para preencher o vazio que cresce dentro da gente a cada dia, alimentando-se da falta de sentido.
Talvez, ele estivesse na profissão certa, reconheço ser equivocado julgar sem conhecer. Não sei as motivações de sua escolha. O que eu sei, é que aquela teoria não parecia estar funcionando. E que se a tristeza batia em sua porta, com certeza ela teria um motivo de ser muito além dos seus neurotransmissores.
É por essas que a Valentina não vai fazer medicina! E seja lá onde você estiver, eu gostaria de dizer que eu torço muito por você!
. . .
P.S: É sempre complicado tratar de questões complicadas. Quadros de depressão e ansiedade são questões complicadas, sérias. Em função disso, acredito ser necessário algumas observações. Gostaria de dizer que não me oponho ao uso de medicamentos psiquiátricos, desde que sejam implementados com parcimônia, além de uma estratégia, clara e definida, e preferencialmente, visando um prazo determinado. Desde que eles não sejam a principal solução para os seus problemas, pois, acredite, eles não são!
Oponho-me a teorias reducionistas que limitam o ser humano a uma mera composição química. Oponho-me a uma sociedade acrítica, que não consegue enxergar o fato de que uma vida fundamentada no lucro, em que o dinheiro é fim e não meio, não só está nos deixando doentes, como também pode nos cegar a ponto de não conseguirmos enxergar os nossos principais motivos de ser e viver (e aí, você vai precisar de “óculos”!).
Oponho-me a tudo isso porque realmente acredito que perdemos muito do tanto que poderíamos ser e viver se compreendêssemos mais sobre nós mesmos, ao invés de procurar resolver os nossos problemas, apenas, tomando o nosso remedinho.
Todos sabem como melhorar a educação. Todos sabem como dar uma boa aula e quais assuntos deveriam ser ensinados.
Menos os professores.
Professores não sabem nada.
Por isso, quando se fala em educação, os últimos a serem consultados — quando são consultados! — são os professores.
Pergunte a um mecânico, a um médico ou a um bancário, mas jamais a um professor. Pergunte a um empreendedor. A um coach. Afinal, qualquer um sabe como ensinar à criança e ao jovem.
Pelo menos no Brasil é assim.
O mundo de hoje é a negação do princípio socrático.
Sócrates dizia:
— Só sei que nada sei.
Nós gritamos:
— Só eu sei!
Nestes tempos fragmentados, cada um sabe o que é melhor para si — e os outros que se danem! O resto, se não concorda comigo, só pode estar errado.
Sócrates era imbecil. Pouco sabia, de fato. Pudera: era professor…
Há, no entanto, uma classe específica, essa sim — sábia!
É a dos políticos.
Se um professor não sabe nada, um político sabe tudo.
Ao urdirem planos para a educação, políticos dispensam opiniões — principalmente a opinião dos professores.
O carro estragou? Procure um mecânico.
Está doente? Consulte um médico.
Mecânicos sabem.
Médicos sabem.
Professores, todavia, não sabem.
Por isso precisam ser vigiados. Vamos colocar câmeras para provar, de uma vez por todas, que esses sujeitinhos não sabem nada. Vamos treinar olheiros, exigir relatórios e aumentar a papelada. Garantir, enfim, um mínimo de eficiência.
Não fazemos isso com mecânicos, médicos, bancários, empresários e coachs — porque eles sabem.
Não precisamos fazer isso com políticos. Eles, melhor que todos, sabem. Seria um pecado vigiá-los.
Só os professores não sabem. Esses sem-vergonhas!
Além de professor, sou escritor. Quer ver ficar pior? Sou poeta. Meu Deus, um professor-filósofo-escritor-poeta! Não sou apenas inútil. Sou O inútil entre os inúteis… Leia mais:https://www.neipies.com/apenas-dou-aulas/
“Não há duas crises separadas: uma ambiental e outra social; mas uma única e complexa crise socioambiental”. (Papa Francisco, Laudato Si’, LS, 139)
Respeitando o olhar da ciência, não há como esconder mais uma verdade inconveniente: estamos promovendo a mais avassaladora destruição da natureza, da biodiversidade, dos ecossistemas, do clima. Estamos contaminando cursos de água, intoxicando os solos com pesticidas. Eliminamos em massa espécies animais e vegetais. Já alteramos 70% da superfície terrestre da Terra. A temperatura global da atmosfera bate recorde. Há um acúmulo de evidências trágicas. Sintetizando, a crise climática está aqui, entre nós, e estamos cada vez mais próximos de um ponto de não retorno.
Seja como for, a escala da interferência humana no sistema Terra nos denuncia. Para começo de conversa, até hoje, pensando a ofensiva espoliadora contra o meio ambiente, é fácil concluir que não há lugar no Lar Planetário que o chamado homem moderno, de um jeito ou de outro (pouco importa), não tenha modificado.
Resposta óbvia: na tarefa de cuidar do planeta, temos sido um fracasso espetacular. Não por acaso, crise no meio ambiente passou a ser lugar-comum, decerto, referência imediata do nosso jeito antropocêntrico – antropocentrismo dominador.
E poderíamos dizer ainda algo com mais ênfase. Por conta direta do paradigma que nos trouxe até aqui, o da dominação de tudo e de todas as coisas, visto pelo lado do meio ambiente, o veredito parece ser um só: “Nos aproximamos cada vez mais de grandes desastres, provocados especialmente pelo modo como tratamos o planeta”.1
Nesse caso concreto, reforçando o que acabamos de anunciar, acumulam-se evidências de que o jeito como habitamos a Casa Comum que nos acolhe, “especialmente depois que entramos na fase capitalista”, usando as palavras do filósofo alemão Anselm Jappe, define, a rigor, a situação ecológica do mundo, tanto quanto define a saúde e o desenvolvimento humanos. Pesarosa constatação, a verdade é que, moralmente, somos denunciados por isso.
De modo simples e direto, suspeitamos que essa crítica é pertinente porque desnuda nossa irresponsabilidade ambiental, algo que, vale reconhecer, está na base da vida social conhecida. Não por acaso, em pouco mais de 50 anos, diante da crença (cada vez mais influente e dominante) de que a tecnologia pode levantar uma economia sem limites, dobramos nossa pegada ecológica.
Agora, “viciados em modernidade”, como gosta de dizer Aílton Krenak, “transformamos” o mundo num gigantesco hipermercado repleto de bugigangas. O resultado não poderia ser outro: a Humanidade toda já excede em 50% a capacidade de regeneração e absorção do planeta.
No horizonte crítico, isso tem um significado claro: para sustentar o peso da produção humana (massa antropogênica talvez seja o termo mais adequado), a atividade humana já explora num ritmo insustentável mais de 100 bilhões de toneladas de materiais (areia, pedra, cimento, biomassa, materiais metálicos e assim por diante) a cada ano. São 13 toneladas por habitante do planeta. Quase a metade disso se transforma em habitações, prédios comerciais, meios de transporte; enfim, produção para uso da sociedade humana.
Por tal razão, aceleramos o planeta em direção ao desastre. Parece que nos especializamos em produzir variados problemas ambientais com o pendor de aprofundar a crise global do meio ambiente. E tudo com velocidade inédita. Agora mesmo, está em avançado curso uma gravíssima crise de recursos hídricos – a crise da água no mundo atual, ou o problema da escassez de água potável, um entre os dez maiores impactos que o planeta enfrenta. De igual modo, aceleramos o aumento de gases estufa cem vezes mais rápido do que em qualquer outro momento da evolução humana.
Poluição, de todos os tipos, se tornou prática comum. A cada ano, 14 milhões de toneladas de plástico, assim relata a União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN, na sigla em inglês), terminam nos oceanos, ameaçando sobretudo a vida marinha. São 100 mil animais marinhos levados à morte, todos os anos, repita-se.
Com efeito, nessa mesma linha de ameaça à vida animal, segundo o Fundo Mundial para a Natureza (WWF), a partir da degradação ambiental dos habitats pela atividade humana, um terço das espécies de mamíferos corre risco de extinção até a metade do século.
Não surpreende, portanto, que tudo o que estamos aqui relatando, ainda que resumidamente, tenha nomes e sobrenomes conhecidos: crise socioecológica, descompasso climático em avançado estágio. O que talvez cause certa surpresa é a lentidão dos humanos, especialmente das classes mais ricas, em atenuar, conter e mitigar os efeitos do desajuste planetário.
Reconhecidamente, a elite dominante, em larga medida, é a causadora de boa parte do problema. O motivo principal? Deixemos essa boa explicação com a Oxfam em parceria com o Stockholm Environment Institute: as emissões per capita de alguém que faz parte do 1% mais rico são 100 vezes maiores do que as de alguém que faz parte dos 50% mais pobres e 35 vezes maiores do que a meta estabelecida para 2030. Desde 1990, os 5% mais ricos foram responsáveis por mais de um terço do crescimento das emissões totais. Os 1% mais ricos foram responsáveis por mais do que toda a metade mais pobre da população.
Trocando em miúdos, faz tempo que o conhecimento científico nos informa que milhões de mortes no mundo estão relacionadas à crise climática provocada pela ação humana no planeta. Como atestou em relatório a Organização Pan-Americana para a Saúde (OPAS), não é de hoje que a sociedade humana convive com uma “tripla crise planetária”: a mudança climática, a perda de biodiversidade (fenômeno global) e a poluição.
Ocorre que, para essa relevante discussão, parece apropriado afirmar abertamente que, diante de uma tragédia ambiental que enfraquece a capacidade da Terra de responder às mudanças e às constantes perturbações antropocêntricas, sequer o sujeito humano pensa em retroceder. Ao contrário, bem adaptada às sociedades industrializadas e cada vez mais longe de inaugurar um modo de vida frugal, os homens da modernidade seguem avançando além do tolerável.
Diante dessa realidade, ao passo que o modelo vigente insiste em combinar destruição ambiental (superexploração de recursos) e crescimento econômico (a busca de novos mercados), os limites seguros do planeta (biológicos e físicos) estão sendo afrontados. Em sentido corrente, com o agravamento da situação de crise, tem ficado cada vez mais claro que produção e consumo excessivos (indicadores do tamanho da economia), escassez de água, alterações severas no clima, poluição, esgotamento de ecossistemas, alteração das cadeias vitais, são, de fato, ocorrências interrelacionadas.
A título de informação, a insustentabilidade ambiental daí decorrente tende a se consolidar diante de nossos olhos. Em outros termos, estamos falando de um mesmo e abrangente problema multidimensional: o processo de destruição da própria natureza, nosso fundamental sistema de suporte da vida. Inquestionavelmente, esse é o nervo central da questão.
De particular contexto, para entender essa verdade que somente os negacionistas (adversários da ciência e da vida) fazem questão de objetar, David Attenborough, melhor que ninguém, levanta uma sentença emblemática: “o mundo natural está desaparecendo”.
Pensando nisso, sejamos diretos e francos: o agir humano responde diretamente por esse trágico momento.
De tal forma, soa a dolorosa conclusão: embotados pelo véu da ignorância, nos falta a responsabilidade como forma de cuidado. Daí a facilidade com que desafiamos os limites seguros dos sistemas naturais. Na dúvida, vejamos atentamente que:
sessenta por cento dos serviços vitais que os ecossistemas fornecem à humanidade são explorados de maneira não sustentável ou já estão degradados;3
três quartos do ambiente terrestre e 66% do ambiente marinho4 sofreram severas modificações nos tempos recentes;
em apenas 50 anos, da metade do século passado até o ano 2000, foram destruídas mais florestas do que em toda a história de evolução da humanidade;
por ano, são perdidos 24 bilhões de toneladas de solos férteis, notadamente devido a urbanização e agricultura industrial5;
de 1980 para cá, metade da vida selvagem já morreu6;
mais de 95% da população mundial respira um ar que não é seguro, conforme as medições dos Padrões de Qualidade do Ar da Organização Mundial de Saúde (OMS). A propósito, a poluição do ar mata no mundo todo mais de 10 mil pessoas por dia;
desde 2009, o mundo já perdeu aproximadamente 14% dos corais7.
Conceito fechado, isso tudo pede uma resposta firme voltada a vencer elementares desafios, tais como:
(1) enfrentar a Era do Antropoceno e suas transformações geridas pela sociedade pós-industrial (ameaças ecológicas);
(2) efetuar a transição da era fóssil para a economia de baixo carbono (imperativo de primeira ordem que determina sobretudo o futuro ecológico e que requer o enfrentamento da poderosa indústria dos combustíveis fósseis que movimenta mais de 5 trilhões de dólares por ano);
(3) repensar as atividades humanas, a organização social, o estilo ecomportamento de vida cotidianos, e mesmo essa atual e deprimente sociedade de descarte e consumo excessivos, hoje, como ontem, localizados na chamada economia plastificada que não cessa de aumentar.
Fazendo um recorte específico e enfatizando o trivial, ao fim, é sempre assim: o nosso real e imediato compromisso com o futuro é o de construir um mundo sustentável para nós, agora; para as gerações futuras, no amanhã; e para os outros seres vivos, hoje, amanhã e sempre.
Em suma, fundar um novo agir é, sim, a missão maior que nos espera.
Enquanto potencializamos a dívida ecológica em todos os sentidos, fingimos não acreditar que “nosso problema é o crescimento físico em um mundo finito”, como escreveu Dennis Meadows. Leia mais: https://www.neipies.com/divida-ecologica-2/
AUTORES: Gilberto Natalini *, Eduardo Jorge **, Marcus Eduardo de Oliveira***
(*) GILBERTO NATALINI é médico cirurgião, vereador por cinco mandatos na Câmara Municipal de São Paulo. Foi secretário municipal do Verde e do Meio Ambiente (2017) e candidato a governador do Estado de São Paulo, pelo Partido Verde (PV), em 2014.
(**) EDUARDO JORGE é médico sanitarista. Por duas vezes foi secretário municipal de saúde e secretario do meio ambiente. Foi candidato a presidente da República em 2014.
(***) MARCUS EDUARDO DE OLIVEIRA é economista e ativista ambiental. Mestre em Integração da América Latina pela Universidade de São Paulo – USP (2005). Autor de ECONOMIA Destrutiva (CRV, 2017) e Civilização em Desajuste com os Limites Planetários(CRV, 2018), entre outros.
Notas:
1. Expressão de David Attenborough. Ver A Perfect Planet, documentário produzido pela BBC. Para mais detalhes: <https://www.bbcearth.com/shows/a-perfect-planet
De forma precária, e improvisada, Ratinho Jr. e Tarcísio de Freitas bancam um sistema que ainda não virou realidade nos países com os melhores índices de Educação
Após a Suécia decidir recuar no processo de digitalização da Educação Básica em decorrência das quedas drásticas nos exames educacionais internacionais do país, os governos de São Paulo e Paraná têm enfrentado um dilema acerca da implementação dos meios “modernos” de ensino nas escolas dos estados.
Segundo a Suécia, os alunos passaram a ler menos e apresentaram mais dificuldades de compreensão após a implementação do sistema digital.
As salas makers, suspeito, são a moda da vez. Assim mesmo, em inglês, para dar pompa às circunstâncias, à espetacularização do momento. Comenta-se muito, agora, sobre tecnologia e inclusão digital. Enquanto isso, na realidade, a maioria dos estudantes amarga desempenhos ruins em disciplinas básicas, como Português e Matemática.(Aleixo da Rosa) Leia mais:https://www.neipies.com/o-curioso-caso-dos-alunos-que-preferiram-os-livros/
No caso do Paraná, o governador Ratinho Jr. adotou a digitalização da educação com o auxílio do empresário Renato Feder. No entanto, após discussões a respeito da eficiência desse tipo de educação, à exemplo do levantamento suéco, os programas educacionais digitais têm enfrentado contestações por parte de representantes da comunidade escolar.
Mesmo com as grandes discussões neste âmbito, Tarcísio de Freitas (Republicanos), atual governador de SP, resolveu trazer o empresário Renato Feder para liderar a pasta da Educação, afim de implantar o mesmo sistema de digitalização no estado paulista.
A decisão tem gerado debates acalorados, com especialistas da Educação preocupados com os possíveis efeitos negativos que a digitalização pode trazer para o ensino e a aprendizagem dos alunos brasileiros.
Antes de criticar plenamente a digitalização do ensino, a maioria dos especialistas da área defendem que é essencial que se leve em conta as experiências de outros países que enfrentaram dificuldades similares ao tentar adotar uma abordagem parecida na educação, além da avaliação das evidências e impacto real da digitalização no processo de ensino.
O documento é mais um que põe em xeque o modelo educacional adotado pelos governos de Ratinho Jr. e Tarcisio e destaca que a tecnologia sozinha não garante bons resultados.
Debates e profunda reflexão sobre os impactos dos métodos modernos de ensino precisam entrar na pauta da Educação de forma urgente, antes que seja tarde e mais uma vez o país siga para mais um período de retrocesso.
Tempo para brincar, para ler um livro, para ficar com a família, para jogar. Porque se a gente não medir (e falo isso tanto para pais quanto para professores), em pouco tempo estaremos todos esgotados mentalmente. Deve ser algo leve e prazeroso, a tecnologia é nossa aliada, não vamos virar escravos dela. (Autora Graziela Bergonsi Tussi) Leia mais:https://www.neipies.com/tecnologias-sao-aliadas-da-educacao/
Para Blaise Pascal o pensamento faz a grandeza do homem. “O homem não passa de um de um caniço, o mais fraco da natureza, mas é um caniço pensante.
Blaise Pascal (1623-1662), foi um importante pensador do século XVII. Segundo seus biógrafos, desde cedo revelou um espírito extraordinário, não só pelas respostas que dava a certas questões, mas sobretudo pelas questões que ele mesmo levantava a respeito da natureza das coisas. Perdeu sua mãe com três anos de idade e foi basicamente educado por seu pai, um matemático que se encarregou de dar-lhe a melhor instrução possível.
O pai queria que o filho estudasse línguas e, mesmo sendo matemático, evitou que o filho tivesse contanto com a ciência dos números, prometendo-lhe que teria acesso a ela depois que soubesse com profundidade latim e grego. Apesar disso, Blaise sentiu-se profundamente atraído pelas figuras geométricas revelando-se em pouco tempo um gênio na capacidade de assimilar conhecimentos abstratos dificílimos.
Não apenas na matemática revelou-se o gênio precoce de Pascal. Aos dezenove anos inventou a máquina aritmética que permitia que se fizesse qualquer operação sem lápis nem papel, sem que se soubesse qualquer regra de aritmética, mas com segurança infalível. Podemos dizer, de certa forma, que tal máquina constitui a base para a invenção da calculadora utilizada até os dias de hoje.
Aos 23 anos de idade, tendo tomado conhecimento da experiência de Torricelli (1608-1647) referente a pressão atmosférica, realizou uma outra denominada “a experiência do vácuo” provando que os efeitos comumente atribuídos ao vácuo eram, na verdade, resultantes do peso do ar.
Pascal viveu num cenário em que prevaleceu a vitória do racionalismo filosófico e o mecanicismo científico. O desenvolvimento de uma nova forma de ver o mundo provocado pelo pensamento filosófico e pela revolução científica moderna substituiu tanto o mundo geocêntrico dos gregos quanto o mundo antropomórfico da idade média. Trata-se da substituição da ideia de uma ciência contemplativa para uma ciência ativa, o que fez com que o homem se transformasse de espectador em possuidor e senhor da natureza. No lugar da preocupação com o “outro mundo” (mundo espiritual), colocou-se o interesse por este mundo (mundo na natureza, físico, material).
A imagem do universo concebida como sendo um organismo governado por uma finalidade foi substituída pela ideia de que existe uma explicação causal e mecanicista de como tudo funciona. Todas essas compreensões e mudanças são possíveis porque o ser humano é capaz de pensar.
Para Blaise Pascal o pensamento faz a grandeza do homem. “O homem não passa de um de um caniço, o mais fraco da natureza, mas é um caniço pensante. Não é preciso que o universo inteiro se arme para esmagá-lo: um vapor, uma gota de água, bastam para mata-lo. Mas, mesmo que o universo o esmagasse, o homem seria ainda mais nobre do que quem o mata, porque sabe que morre e a vantagem que o universo tem sobre ele; o universo desconhece tudo isso”.
Estas ideias escritas por Pascal e publicadas postumamente no obra Pensamentos revelam a lucidez de um pensador marcado pela consciência trágica da vida e da condição humana, apavorado diante “dos silêncios eternos dos espaços infinitos” que perturbam todos aqueles que se dão conta da imensidão do universo e da fragilidade humana. De fato, se nos compararmos ao universo, ao poder destruidor dos fenômenos naturais (tornados, furacões, vendavais, tempestades etc) somos insignificantes, um simples grão de areia diante de um oceano.
No entanto, “a grandeza do homem” é sua capacidade de pensar. É do pensar que surgem as invenções, o domínio da natureza, a forma de organizar melhor a sociedade e as coisas. Mas há uma enorme diferença entre pensar qualquer coisa e pensar bem. O pensar não pode ser comprado com dinheiro ou delegado por procuração.
O pensar não surge espontaneamente, senão por um profundo e trabalhoso processo educacional que exige esforço, dedicação, pesquisa, leitura, conhecimento, sabedoria, ética e honestidade. Quando olhamos para os rumos do Brasil, parece que estamos tomando o caminho contrário do “aprender a pensar”.
Quando a especulação financeira é mais importante que a vida e a saúde das pessoas; quando as banalidades do cotidiano e a forma de vida fútil de certas celebridades recebem mais destaque na imprensa que os grandes problemas sociais como a fome, a mortalidade infantil, a pobreza, o analfabetismo, a falta de saneamento básico, o desemprego e tantos outras emergências; quando o fundamentalismo religioso que produz alienação e subserviência do povo simples é mais valorizado que a educação dos filhos; quando o consumismo de futilidades compromete mais o orçamento da família do que o gasto com as necessidades básica; quando o estado se abraça na racionalidade neoliberal e promove reformas que beneficiam a elite do atraso ao invés de promover a proteção social dos que tem menos – estamos diante de evidências de que o ser humano não quer ou não deseja PENSAR e tornar-se dono das própria ações.