A escola e a universidade são o contrário da nossa casa. Em casa, estamos entre iguais; na escola, entre diferentes. E o que nos educa é a diferença. Em casa, estamos no ambiente privado; na escola, num ambiente público. Em casa, estamos num ambiente que é nosso; na escola, num ambiente que é de muitos.
Há acontecimentos, alguns até de alta repercussão, que causam pouco impacto em nossas vidas. Porém, com outros acontecimentos, deveríamos aprender mais e nos preocuparmos com seus impactos na sociedade que queremos construir.
Algumas análises e evidências nos indicam que, com a pandemia, pouco aprendemos, apesar de seus impactos sociais, econômicos, humanos e educacionais. O processo eleitoral brasileiro pautado por polarizações, intolerâncias e violências indica que, também, não estamos tirando as aprendizagens possíveis e necessárias.
Continuamos concebendo adversários como inimigos e os diferentes com preconceitos sociais, políticos e étnicos. O que pensa diferente sobre a pandemia ou sobre o processo político eleitoral é considerado inimigo e precisa ser combatido.
Estes posicionamentos atingiram não somente a convivência social, mas, inclusive as famílias, escolas e universidades. As manifestações preconceituosas ocorridas em instituições de ensino, entre outras, indicam a necessidade de nos reeducarmos para uma vida compartilhada, com liberdade, cidadania e democracia. Ou produziremos a barbárie que imaginamos combater.
É preciso termos o discernimento de que a escola e a universidade são o contrário da nossa casa. Em casa, estamos entre iguais; na escola, entre diferentes. E o que nos educa é a diferença. Em casa, estamos no ambiente privado; na escola, num ambiente público. Em casa, estamos num ambiente que é nosso; na escola, num ambiente que é de muitos.
A grande contribuição da escola é ser diferente da casa. Os professores diferentes dos pais.
Os colegas diferentes dos irmãos. Por essa razão, é tão importante a colaboração entre escolas e famílias, com funções diferentes, mas complementares na formação dos estudantes. A educação não serve para nos fecharmos no que já somos. Precisa servir para aprendermos a começar o que ainda não somos.
A vida, acima de tudo, é condominial. Se a vida é o lugar onde vivemos juntos, o nosso planeta, o nosso país, a nossa cidade e a nossa escola é onde vivemos juntos. Escola, enquanto espaço comum, é um espaço de educação, convivência e de formação ética.
Aprender não é um ato individual ou privado, precisa dos outros. É na relação e na interdependência que se constrói a educação. Não aprendemos com nossa bolha, mas com a riqueza e pluralidade social que precisa estar expressa nas escolas e universidades, sejam públicas ou privadas.
O ser humano é um ser social e gregário, é ser junto. A função socializadora da escola e da educação é ensinar a viver juntos. É formar para a cidadania, para fazer parte de coletividades, sociedades, culturas diversas, tribos, grupos sociais e profissionais.
A educação deve formar pessoas e cidadãos éticos. Ética é uma relação com o outro, o alter, o diferente. Não basta empatia, pois nem sempre consigo me colocar no lugar do outro. Por isso é preciso formar pessoas com compaixão.
Se depender de mim, farei coro com quem peita o sistema, esperançoso de que minhas filhas e netas viverão num mundo mais belo, bom e justo do que viveram suas avós. Se quiserem ser dondocas, que sejam. Pelo menos terão escolhido isso por conta própria e não por alguém lhes impor tal padrão.
Se dependesse de alguns, ainda estaríamos vivendo nos moldes da era vitoriana. É muito fácil pagar uma de defensor da família tradicional, paladino da moral e dos bons costumes, e com isso, detonar qualquer movimento social que não caiba nesta moldura. E é assim que se critica as feministas, como se estas fossem as principais responsáveis pela deterioração da família.
Já li e ouvi de alguns líderes religiosos que o número crescente de homossexuais se deve ao fato das mulheres terem deixado seus afazeres domésticos e o seu papel de mãe para se dedicarem a uma carreira profissional. Não precisa ser nenhum sociólogo ou psicólogo para perceber a desfaçatez desta alegação.
Creio, sem medo de errar, que as sementes que fizeram eclodir o movimento feminista podem ser encontradas ao longo das páginas da Bíblia Sagrada.
Nem a forte misoginia das culturas antigas conseguiu cimentar o solo onde estas “sementes de mostarda” foram deliberadamente depositadas. Daí encontrarmos figuras como Sara, a quem Deus ordenou que Abraão desse ouvidos. Rebeca, que não apenas participou ativamente da conspiração para transferir a bênção da primogenitura de Esaú para Jacó, como também foi quem recebeu o oráculo divino de que o maior serviria ao menor, e agiu para realizar a vontade divina, indo contra os padrões de sua época. Raquel que era pastora de ovelhas, atividade então restrita aos homens.
Débora, juíza em Israel, numa época em que os juízes governavam no lugar de monarcas. Poderíamos citar inúmeros exemplos (se veio atrás de versos bíblicos, perdeu seu tempo. Vou deixar para outra ocasião).
Ademais, ninguém valorizou mais as mulheres do que Jesus, a ponto de aceitá-las como discípulas, o que nem os filósofos gregos com toda a sua genialidade aceitaram.
Imagem JW.org
Mas gostaria de destacar uma mulher com a qual costumamos ser injustos: Vasti. Quando seu marido, rei Assuero, resolveu dar um banquete em seu palácio, Vasti, sua esposa, não deixou por menos, e promoveu também seu próprio banquete. Ao ser convocada para deixar tudo e atender a Assuero que pretendia ostentá-la diante dos convidados devido à sua exuberante beleza, Vasti simplesmente se negou a atender.
Vasti era uma mulher à frente de seu tempo, que não queria ser vista como um objeto decorativo, mas um ser humano portador de dignidade intrínseca, que sabia pensar por si, que tinha sentimentos, vontade própria, e como qualquer outra mulher, não merecia ser subestimada. Sentindo-se constrangido diante dos convidados, Assuero, orientado por seus conselheiros, resolveu destituí-la, deixando vago o seu trono.
Foi Ester, uma linda jovem judia que venceu o concurso de beleza que visava substituir a rainha rebelde. Quero crer que todos conheçam esta história, e os que porventura não a conhecerem, sugiro que pesquisem. É uma das mais lindas histórias de empoderamento feminino registradas nas Escrituras Sagradas.
Ester era bem mais do que um rostinho lindo, um corpo escultural. Graças a ela, seu povo não sofreu um verdadeiro genocídio. Foi sua atuação junto ao rei que impediu que um homem chamado Hamã lograsse êxito em seu intento de extinguir os judeus que viviam na Pérsia. Como o decreto já havia sido estabelecido, o rei não pôde revogá-lo. Mas deu aos judeus o direito de se defenderem do ataque opressor patrocinado pelo próprio estado.
Até hoje os judeus celebram o Purim, festa alusiva àquele episódio de sua história. Naquele dia, eles puderam se defender de um estado opressor, fazendo uso de qualquer recurso que estivesse às mãos, inclusive lanças e espadas. Mas jamais foram chamados de terroristas por isso.
Se pensarmos bem, a ousadia de Ester se deveu ao caminho deixado aberto por Vasti. Mesmo que discordemos de sua antecessora em sua petulância, que a enxerguemos como uma quase vilã (o que não é verdade!), sem ela, Ester não teria encontrado a mesma facilidade para fazer o que fez. Ester simplesmente rompeu com todos os protocolos, arriscou a própria pele para salvar o seu povo.
Vejo hoje uma geração de mulheres desfrutando de direitos que foram conquistados lá trás graças ao atrevimento de muitas Vastis.
É fácil criticar aquela geração de mulheres que saiu às ruas fazendo fogueira com seus sutiãs. Mas se não fosse por elas, talvez ainda hoje as mulheres não usufruíssem do direito ao voto. A maioria teria que se contentar com os adjetivos de bela, recatada e do lar.
Em momento algum, flagramos Ester desdenhando de Vasti. Deveríamos, portanto, seguir seu exemplo, e valorizar quem lutou em muitos movimentos sociais, não apenas as feministas, para que vivêssemos numa sociedade mais justa e igualitária. Não fossem por esses, quiçá ainda convivêssemos com a vergonha da escravidão. Talvez não tivéssemos o Estatuto da Criança e do Adolescente, o Estatuto do Idoso, a Lei Maria da Penha, etc.
Eu, particularmente, acredito que ainda haja muita coisa para mudar até que tenhamos uma sociedade mais justa e equilibrada. Por isso, prefiro colocar-me ao lado dos que lutam por direitos, e não dos que preferem que tudo permaneça do jeito que sempre foi.
A única coisa que pretendo conservar é meu idealismo, sem o qual, corro o risco de ser cortejado pelo cinismo e pela hipocrisia.
Se depender de mim, farei coro com quem peita o sistema, esperançoso de que minhas filhas e netas viverão num mundo mais belo, bom e justo do que viveram suas avós. Se quiserem ser dondocas, que sejam. Pelo menos terão escolhido isso por conta própria e não por alguém lhes impor tal padrão.
P.S. O anjo que anunciou a Maria que seu ventre geraria o Filho de Deus, só se ausentou após ouvir dela a autorização: “Que se cumpra em mim a sua palavra”. Afinal, o ventre era dela! A Sulamita do livro de Cantares é outra que rompe paradigmas, saindo sozinha pelas ruas em busca do seu amado, sendo protagonista em uma história de amor na qual o homem (o “amado”) é o seu objeto de desejo!
Depressão é o excesso de passado, o estresse é o excesso de presente e a ansiedade é o excesso de futuro.
A resposta para esta pergunta parece óbvia, provavelmente você esteja pensando que é o presente, certo? Porém, para a maioria das pessoas isto não é tão claro assim.
Algumas estimativas dizem que, no máximo, chegamos a dedicar 65% do nosso tempo para pensar no presente. O passado ocupa as mentes de muitas pessoas por boa parte do dia, da mesma forma, outras focam seus pensamentos e desejos no futuro. Parece que o mais difícil mesmo é viver o presente embora ele seja o único espaço de tempo que nós temos algum controle.
Por que nos ocupamos com o passado?
Em determinadas situações os sentimentos do passado nos atormentam. Isto geralmente ocorre quando passamos por algum trauma, seja a perda de pessoas queridas, separações, fracasso nos negócios, o que fizemos que não queríamos ter feito ou o que deixamos de fazer e que nos arrependemos.
Alguns transformam o passado numa âncora que não os deixa seguir em frente, outros tentam sepultá-lo. Estes transtornos fazem parte da vida, mas se eles se transformam em apatia, então precisam ser tratados.
Por que nos ocupamos com o futuro?
O futuro pode significar esperança ou ameaça. Geralmente sonhamos com um futuro melhor, fazemos planos de quando tal coisa acontecer, aí sim seremos mais felizes. Algumas pessoas esperam pela aposentadoria para fazer algo que gostam ou para mudar para o lugar dos seus sonhos. Outros fazem planos para quando terminarem de pagar a casa, quando não precisarem mais pagar a pensão, quando não tiverem mais que conviver com alguma coisa que lhe custa dinheiro, tempo ou lhe causa incômodo. A esperança de superar estes momentos move muitas pessoas. A felicidade ou a vida desejada certamente virá no futuro. Por outro lado, para quem valoriza as incertezas, o futuro pode ser preocupante. Surge o medo do desemprego, de não poder pagar as suas contas, de aparecer uma doença ou de acontecer algo de ruim para uma pessoa querida.
E o presente?
O presente parece que anda no piloto automático, ao acordarmos pela manhã, já sabemos o que teremos que fazer nas próximas 24 horas. Nosso cérebro desperta pensando em como evitar os momentos de estresse. O que fazer para não chegar atrasado? Como entregar a tarefa do dia? E aquela reunião chata que temos que participar? Tentamos inutilmente ter controle sobre o presente, mas ele sempre nos escapa e precisamos reorganizar os planos.
Não sei a autoria da frase que explica os excessos e que para mim faz muito sentido: “depressão é o excesso de passado, o estresse é o excesso de presente e a ansiedade é o excesso de futuro”.
Dependendo da fase da vida em que nos encontramos, poderão pesar mais os pensamentos do passado ou do futuro. O jovem sonha mais com o futuro do que o idoso, que ocupa seus pensamentos mais com o passado.
Gostei muito de uma análise atribuída a Santo Agostinho, que diz: “o passado é uma memória que trazemos para o presente, mas que não é exatamente como aconteceu. E o futuro é uma visão do que não foi vivido e que talvez nunca venha a existir”. E quanto ao aparente dilema entre investir no presente ou guardar para o futuro, podemos dizer que isto se resolve com a ideia de “nem tão formiga, nem tão cigarra”, ou seja, o equilíbrio entre poupar e se poupar.
Fazendo uma analogia com as navegações, diria que o passado é o porto de onde partimos e o futuro é onde queremos chegar, enquanto o presente é o navegar. Nos sentimos felizes quando chegamos ao destino desejado, mas a vida é movimento e ficar no porto por muito tempo é não aproveitar os ventos que sopram. Penso que a vida é algo semelhante ao navegar, o passado e o futuro são referências, mas só podemos desfrutar é do presente.
Desligue o complicômetro e carpe diem (aproveite o momento)!
Organizações que atuam na defesa dos direitos humanos lançam o “Manifesto Nacional Dia DH” em 2022
As organizações de direitos humanos que constroem o Dia DH vêm a público para manifestar que precisamos do Dia dos Direitos Humanos para lembrar à sociedade, aos governos, às empresas, às organizações, aos movimentos sociais, que ainda há muito a fazer para acabar com as violações, responsabilizar seus autores e, especialmente, para que todos os direitos humanos sejam vida concreta de cada uma e de todas as pessoas.
O Dia DH tem por finalidade promover uma ação articulada, combinada e compartilhada em todo o país, em diversos lugares, para a valorização dos direitos humanos e da atuação da militância das defensoras e dos defensores dos direitos humanos.
Estamos num momento importantíssimo de transição, com alta expectativa em relação ao futuro de nosso País. As urnas deram um recado: a sociedade não quer a continuidade do fascismo. Ousamos dizer, que está diante de nós o desafio de derrotar, destruir, superar, todas as práticas que alimentam o e se alimentam do fascismo. Renovam-se nossos compromissos históricos com a superação de todas as violações dos direitos humanos, com a responsabilização de todos seus autores, com a proteção de todas e todos que precisarem e a promoção da realização dos direitos humanos.
As organizações e movimentos de direitos humanos estamos vigilantes e participando intensamente do processo de elaboração de propostas para a reconstrução dos direitos humanos, para a revogação de medidas violadoras, para a definição da institucionalidade adequada e das ações emergenciais para que efetivamente os direitos humanos estejam nas políticas e que sejam implementadas políticas específicas de direitos humanos.
Defensoras e defensores de direitos humanos precisam de uma política permanente de proteção, o que inclui um plano de ação e o fortalecimento do programa de proteção com sua institucionalização e ampliação. A participação social é fundamental em todas as políticas, e ela precisa ser consistente, permanente e independente. Afinal, direitos humanos não se realiza por representação e nem por procuração, mas pela participação direta nos processos e ações para sua efetivação.
Queremos proteção para a atuação das defensoras e defensores de direitos humanos. Isso requer fazer o enfrentamento e superação das causas que levam ao risco em sua atuação, o fortalecimento da institucionalidade pública necessária para tal e a criação de um ambiente favorável à atuação autônoma e independente das organizações e movimentos sociais. Queremos seguir fazendo o cuidado das defensoras e defensores pela proteção popular, mas também precisamos da proteção institucional.,
Fazer o plantio de árvores, efetivamente onde for possível, simbolicamente onde as legislações forem restritivas, é uma iniciativa que pretende homenagear as defensoras e os defensores de direitos humanos: aquelas e aqueles que antes de nós construíram lutas, processos, organizações para fazer vivos e efetivos os direitos humanos e que nos legaram esta causa para que a levemos adiante enfrentando os desafios dos dias atuais.
Que bom estarmos aqui para esta ação. Seguiremos reunidos, articulados, agindo com coragem para que a realização dos direitos humanos alcance cada vez mais efetividade no cotidiano e, dessa forma, contribua para o cuidado, a promoção e o desenvolvimento da vida, em abundância.
Viva os direitos humanos!
Viva as defensoras e defensores de direitos humanos!
Brasil, 07 de dezembro de 2022.
Assinam o Manifesto
Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH Brasil)
Associação Brasileira de Organizações Não-Governamentais (Abong)
Sociedade Maranhense de Direitos Humanos (SMDH)
We World Brasil
Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos (ABGLT)
Articulação para o Monitoramento dos Direitos Humanos no Brasil (AMDH)
Comissão Pastoral da Terra (CPT)
Conselho Indigenista Missionário (CIMI)
Associação de Servidores da Educação Básica PI
Centro de Defesa da Vida Herbert de Souza (CDVHS) CE
Centro de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente Pe. Marcos Passerini MA
Centro de Defesa dos Direitos Humanos da Serra (CDDH Serra) ES
Centro de Direitos Humanos de Londrina (PR)
Centro de Direitos Humanos Dom Máximo Biènnes (MT)
Centro de Direitos Humanos e Educação Popular (CDDHEP) AC
Centro de Direitos Humanos e Educação Popular de Campo Limpo (CDHEP) SP
Centro de Direitos Humanos e Memória Popular (CDHMP) RN
Centro de Estudos e Defesa do Negro do Pará (Cedenpa) PA
Centro Dom Helder Câmara de Estudos e Ação Social (CENDHEC) PE
Centro dos Direitos Humanos Maria da Graça Braz (CDH Joinville) SC
Comissão de Direitos Humanos de Passo Fundo (CDHPF) RS
Comissão Regional de Justiça e Paz MS
Fundação de Defesa dos Direitos Humanos Margarida Maria Alves (FDDHMMA) PB
Grupo Tortura Nunca Mais da Bahia (GTNM) BA
Instituto Braços – Centro de Defesa dos Direitos Humanos SE
Instituto Brasil Central (Ibrace) GO
Instituto DH – Promoção Pesquisa e Intervenção em Direitos Humanos e Cidadania MG
Movimento Estadual de Direitos Humanos TO
Organização de Direitos Humanos Projeto Legal (ODH Projeto Legal) RJ
Todos nós podemos encontrar em suas Confissões algo de psicologicamente verdadeiro para entender nosso tempo e certas luzes que nos ajudarão a entender melhor a importância das escolhas certas para sermos pessoas melhores e construirmos um mundo melhor para viver.
Depois de Jesus Cristo e dos Apóstolos, nenhum ser humano influenciou tanto o curso da cristandade quanto Santo Agostinho(354-430), também conhecido como Bispo de Hipona. Nasceu em Tagaste, Numíbia (atual Argélia), província romana do norte da África, fez seus estudos primários na cidade natal e os estudos superiores em Cartago, onde se tornou profundo conhecedor de gramática e retórica. Despertou para a filosofia aos 18 anos, ao ler uma obra de Cícero (Hortencius).
No desejo de encontrar uma doutrina religiosa e racional, Santo Agostinho aproximou-se do maniqueísmo, corrente de pensamento que abraçou por nove anos. Desiludido com o maniqueísmo, atravessou uma fase inquieta e breve, marcada pela descrença.
O pensamento de Santo Agostinho foi o grande responsável por realizar uma ligação entre a Roma pagã e a Idade média. Não importa se concordamos com suas ideias ou mesmo se nos sentimos a vontade com relação a elas, conhecer seu pensamento nos impele a uma reação. Suas habilidades e discernimentos, são tão intensos que ler suas Confissões nos faz refletir sobre nossa própria existência e alcançar uma espécie de autoconhecimento.
Nas Confissões, Agostinho testemunha sua própria conversão quando conta que, tomado de grande angústia e depressão, retira-se para o jardim de sua residência, pedindo a Deus que lhe mostrasse o verdadeiro caminho da salvação. Foi quando ouviu uma voz infantil que repetia: “Toma e lê; toma e lê”. Abrindo uma das cartas de São Paulo, deparou-se com a seguinte passagem: “Não caminheis em glutonarias e embriaguez, nem em contendas e rixas; revesti-vos do Senhor Jesus Cristo e não procureis a satisfação da carne com seus apetites”. Para Agostinho foi suficiente para encontrar uma espécie de luz serena e dissipar as trevas da dúvida.
Para Agostinho, o homem é uma criatura privilegiada na ordem das coisas, pois é feito a imagem e semelhança de Deus.
A presença no ser humano das três faculdades da alma (memória, inteligência e vontade), corresponde as três Pessoas da Santíssima Trindade que todos os cristãos invocam ao fazer o sinal da Cruz: Pai, Filho e Espírito Santo. A memória, enquanto persistência de imagens produzidas pela percepção sensível corresponde à essência que é o Deus Pai, aquilo que nunca deixa de ser; a inteligência seria o correlato do verbo, razão ou verdade, que corresponde ao Filho; finalmente, a vontade que constitui a expressão humana do amor e da escolha, corresponde ao Espírito Santo.
Para o Bispo de Hipona, de todas as faculdades da alma, a mais importante é a vontade, pois é ela que intervém em todos os atos do espírito e constitui o centro da personalidade humana. A vontade seria a essência criadora e livre, que nos possibilita o livre arbítrio, a capacidade de escolher.
Enquanto ser livre, o ser humano pode fazer escolhas e se torna responsável pelas escolhas que faz. Dessa forma Agostinho justifica a presença do mal e do pecado e a possibilidade do ser humano escolhê-los como forma de vida. O pecado e o mal são, neste sentido, uma transgressão da lei divina, na medida em que a alma foi criada por Deus para reger o corpo, e o homem, fazendo mau uso do livre-arbítrio, inverte essa relação, subordinando a alma ao corpo e caindo na ignorância e na prática do mal.
Todas estas reflexões aqui apresentadas de forma resumida, são amplamente abordadas na obra Confissões, a obra mais conhecida e lida de Santo Agostinho.
Não podemos julgar o pensamento de Agostinho por padrões modernos, mesmo que o seu tempo se parecesse com o nosso. No entanto, seu pensamento é figura-chave para entender a transição da filosofia pagã à filosofia cristã.
Todos nós podemos encontrar em suas Confissões algo de psicologicamente verdadeiro para entender nosso tempo e certas luzes que nos ajudarão a entender melhor a importância das escolhas certas para sermos pessoas melhores e construirmos um mundo melhor para viver. Um desafio filosófico e educacional de imensa grandeza para pensarmos o presente e o futuro na construção de uma humanidade e de uma sociedade mais solidária e menos mesquinha.
A proposta da bioeconomia, aliado à utilização de novas tecnologias, se inscreve num quadro de estratégia-elementar para o desenvolvimento de produtos e negócios sustentáveis, daí a necessidade de esboçar um consistente paradigma de desenvolvimento social local capaz de fazer “uso” da marca brasileira de mais destaque em todo o mundo, a Amazônia.
Excetuando os negacionistas, ferrenhos adversários do conhecimento científico, ninguém mais coloca em dúvida que o avanço da economia linear, sem que se priorize a eficiência energética, nos deixa de vez diante de uma situação-limite. E isso exige ação imediata. Redobrando nossas responsabilidades com o Planeta, precisamos repensar a construção de uma nova organização social com vistas a imprimir uma nova lógica à economia global.
Ponto decisivo, não basta apenas criticar a racionalidade econômica dominante. Cabe, antes de mais nada, discutir alternativas de civilização que confronte àquilo que o velho Marx um dia chamou de “o progresso destrutivo” do capitalismo.
Com efeito, pensando de forma particular em termos de projeto vital, devemos convir que ainda não fomos capazes de cumprir um amplo e extensivo programa de desenvolvimento socioambiental e econômico a partir da economia do conhecimento da natureza. Ou, dito de outra maneira, a bioeconomia da floresta em pé.
Enquanto a bioeconomia é vista lá fora como fundante estratégia e até mesmo como ponto de apoio para superar a economia dependente de combustíveis fósseis e transitar para uma economia baseada em insumos biológicos, a combinação Amazônia-bioeconomia, pode, sim, se tornar um arrojado projeto de industrialização própria centrada no aproveitamento da biodiversidade (recursos de base biológica). Decerto, o que mais se espera com isso é valorizar o bioma, recompor a floresta e defender a maior reserva de biodiversidade do planeta.
Paradigma produtivo e reprodutivo, a bioeconomia, em nosso caso, tem como foco principal valorizar a diversidade biológica, particularmente diante de todo o conhecido potencial biodiverso na Amazônia. Importa deixar claro, para todos os efeitos, que são imensas as possibilidades de valorização dos diversos produtos da biodiversidade amazônica: de fármacos à cosméticos; de frutas e sementes à produção de óleos vegetais; de fermentação de produtos às fibras; da produção de manteiga de cupuaçu à negócios com borracha natural.
De toda sorte, com a proposta da bioeconomia é possível combinar um inovador modelo de produção sustentável, este, na verdade já desenvolvido e realizado há mais de século pelas populações tradicionais da floresta amazônica, com inigualável capacidade de transformar biorecursos recicláveis e renováveis.
E tem mais: com a “bioindustrialização da Amazônia”, como também tem sido chamada, é possível estimular estratégias de defesa ambiental para manter a floresta em pé, produzindo em áreas abertas. De certa maneira, quando se busca aproximar a bioeconomiada realidade amazônica, ao menos três temas ganham redobrada importância: conservar o ativo florestal (isto é, exploração sustentável de produtos florestais combinada à necessidade de investimentos em infraestrutura sustentável); combater as ilegalidades (não apenas, mas principalmente a grilagem de terras), até porque estas são responsáveis por expulsar para as periferias urbanas, ao longo do tempo, milhares de famílias de populações tradicionais e exterminar povos originários ou jogá-los a uma situação de absoluta miséria; e, por último, mas não por fim, reconhecer a contribuição de agricultores familiares, comunidades indígenas e tradicionais, valorizando os povos locais (povos da floresta) e suas diferentes formas de produção e integração econômica.
Numa perspectiva mais aberta, a proposta desafiadora do campo da bioeconomia como vetor de ação em favor da Amazôniase ajusta à necessidade de transformar as relações entre sociedade e natureza (a floresta) voltada a preservar o equilíbrio biótico e climáticodo planeta, ao mesmo tempo em que se estimula estratégias de desenvolvimento em linha com os critérios de sustentabilidade, especialmente o extrativismo sustentável, hoje encontrado em pequena escala, mas que, além de garantir o sustendo de boa parte das populações locais, já se comprovou como absolutamente responsável pela conservação ao longo do tempo de milhares de hectares da floresta com todas as espécies nela existentes.
É bom ainda não perder de vista que a proposta de diversificação econômica com base na biodiversidade – dada a ideia vital de floresta em pé e os rios fluindo (18% do fluxo de água que corre para os oceanos vem da Amazônia), está no centro da necessidade de conservar o ecossistema e de responder pela saúde do meio ambiente no mundo contemporâneo.
Ainda assim, nossa especial bioeconomia, tomemos a liberdade de chamar assim, se diferencia das demais interpretações conhecidas de bioeconomia mundo afora por ter como características-chave determinados valores conhecidos e desde há muito reclamados, tais como “indução ao desmatamento zero; conservação da floresta; ordenamento territorial; combate a ilegalidades; manutenção dos direitos indígenas, de populações tradicionais e camponeses; distribuição justa de benefícios; investimentos em ciência e tecnologia e assistência técnica adequadas à sua produção” (Costa, F. et al).1
E que não haja dúvida consistente: a proposta da bioeconomia, aliado à utilização de novas tecnologias, se inscreve num quadro de estratégia-elementar para o desenvolvimento de produtos e negócios sustentáveis, daí a necessidade de esboçar um consistente paradigma de desenvolvimento social local capaz de fazer “uso” da marca brasileira de mais destaque em todo o mundo, a Amazônia.
Pelo sim pelo não, insistindo no assunto que sabemos ser urgente, a bioeconomia deve mesmo ser bem entendida como um paradigma capaz de inaugurar uma promissora matriz de avanços socioeconômicos no Brasil pós-Bolsonaro. Janela de oportunidades para expressivas vantagens no terreno econômico, a proposta da bioeconomia permite, sobretudo, fazer a economia funcionar respeitando a diversidade amazônica e eliminando o processo de degradação ambiental em curso, ao mesmo tempo em que são criados negócios baseados na sociobiodiversidade.
A par de uma aguardada nova agenda de desenvolvimento ampliada, imprescindível em tempos de desajuste ambiental e climático, é lícito pensar de uma vez por todas em sepultar o modelo vigente de economia linear que depende da extração contínua, de onde resulta a degradação dos ecossistemas e das culturas locais.
Em nosso sentir, nos dias de hoje, a bioeconomia deve prioritariamente ocupar o espaço principal em matéria de desenvolvimento sustentável, até mesmo porque, como ação efetiva, é a partir daí que o Brasil pode liderar a economia circular no mundo moderno.
Diante da extrema urgência em erguer economias resilientes, somos partidários da ideia central de que não mais podemos desperdiçar oportunidades (cadeias produtivas, por exemplo).
Dura realidade, ainda hoje estamos à margem. Até aqui, em termos de planejamento, fracassamos. Falta ação.
A bem da verdade, o País sente falta de um amplo programa estratégico em referência ao carbono neutro, tanto quanto nos falta, em linhas gerais, um “posicionamento político” para ajudar a fazer a transição à energia solar e, com muito determinismo, interromper a atual e predominante “economia de destruição da natureza”, quer dizer, especificamente a destruição da Amazônia, hoje quase completamente entregue a grileiros e desmatadores ilegais, por isso acomodada num modelo de ocupação que não hesita em substituir a área florestal por agropecuária tradicional.
Chegou a hora de virar a página.
Autores:
Marcus Eduardo de Oliveira
Gomercindo Rodrigues
Imagem de Le Monde Diplomatique Brasil. Brasil, 2020.
Notas:
1. COSTA, F. et al. Uma bioeconomia inovadora para a Amazônia: conceitos, limites e tendências para uma definição apropriada ao bioma floresta tropical Disponível aqui. Acesso em: 07 Out 2022.
Descubra como o conflito na Ucrânia tem mais a ver com você do que você imagina, além de reflexões complexas práticas para resolver definitivamente o problema!
Era 2022 e recém havíamos passado por uma guerra contra um vírus. Lutávamos com a ciência, a fé e a esperança. No começo foi assustador, era difícil aceitar a ideia de que deveríamos combater um inimigo invisível (parecia até resquícios de uma Guerra Fria). Até o momento, foram mais de seis milhões de combatentes mortos, muitos deles, sem chance alguma de conseguir se defender.
Aos poucos, a ansiedade se convertia em ciência, começamos a reconhecer os padrões, desvendar os mecanismos de ação e então, o monstro invisível se tornou pequeno diante da curiosidade humana. A arma mais potente chegou (a vacina), e a partir daí, começávamos a ver luz no final do túnel.
Ainda estávamos na enfermaria quando os novos boatos surgiram. Vai ter Guerra! Ouvi alguém dizer. Vai ter Guerra, ouvi outro alguém dizer. Não, não era possível. Era outra realidade difícil de aceitar, ainda mais em pleno século XXI, quando somos convencidos por uma singela impressão que estamos nos tornando cada vez mais civilizados — ou, ao menos deveríamos, diante de tanta possibilidade de aprendizado que a própria história nos fornece – mas, não, não pareceu ser o caso. A guerra entre Ucrânia e Rússia eclodiu.
E em comunhão com a indignação do mundo, por aqui, dentro de minha angústia, nasceu uma busca por querer compreender o que exatamente está faltando para podermos ao menos se afastar desse fantasma.
Aniquilamos todos os Putins do universo? Desarmamos o mundo todo, sem exceções? Ah não, a resposta não parece ser tão fácil assim, não é mesmo?!
Então, é sobre isso que filosofaremos no texto de hoje. Mas, acautele-se Leitor, pois, adentraremos nos recônditos mais umedecidos e lamacentos da espécie humana, portanto, amarre uma corda bem firme para conseguir sair de lá no final do texto, heim!
Ao pedir ajuda para o Aurélio (meu amigo que tem sempre uma coisa a me dizer), ele me recordou que o significado da palavra “Guerra” se relaciona a um “conflito armado entre povos ou etnias diferentes, buscando impor algo pela força e pela violência, com o objetivo de proteger os seus próprios interesses” [1].
Observo que, por mais que tentamos, insistentemente, encontrar um motivo para o estopim da guerra, a complexidade humana nos alega que há muito mais por trás da informação que financia essa barbárie.
A pergunta que nos cabe então, é o que leva uma pessoa, ou melhor, um grupo de pessoas a optar por uma das mais desumanas formas de se resolver uma tensão?
E de fato, seja na briga com o seu vizinho, seja na guerra da Ucrânia e Rússia, existe tensão. Que pode ser traduzida por um estado de ânimo incômodo, que aumenta a tração toda vez que um ato fere, novamente, os seus princípios básicos e/ou ultrapassa a barreira do respeito. Essa tensão pode ser resolvida com o diálogo e o bom senso entre às partes (o que nem sempre é possível), como também pode evoluir para níveis intoleráveis e romper a corda — ou seja lá o que você estiver segurando.
Dentro deste escopo estão inseridas as emoções humanas. Que aparentemente parecem reger a trama das discussões, inclusive aumentando ou diminuindo a resistência a tração.
Digo isso, pois, é difícil romper a corda quando estamos tranquilos e governados pela consciência. Por outro lado, se nos sentirmos injustiçados, irados ou ameaçados, nossas chances de fazer algo em que nos arrependeremos depois cresce em porcentagem inestimável.
Isso acontece por recorrermos a um mecanismo de sobrevivência muito primitivo e involuntário. Quando nos sentimos assim, de certo modo ameaçados, quem assume o controle do nosso cérebro é a amígdala cerebral. Responsável pela resposta de luta ou fuga e o detalhe, é que ela é reativa, e nenhum pouco empática e até mesmo inteligente. É por essas que depois que tudo passa, você fica se perguntando se foi você mesmo que fez aquilo… (a resposta é: não, mas sim!).
Confesso que compreender de relações internacionais, políticas e bélicas não é muito a minha praia, mas, observando por alto, podemos dizer que talvez essas emoções realmente possam financiar isso tudo. De um lado, temos a Rússia, e seu “presidente”, que parece se sentir ameaçado com a possibilidade de a Ucrânia fazer parte da Othan. Além disso, quando ele, segundo a mídia, alega que está a defender a liberdade do povo Russo na Ucrânia (mas, que voltem para Rússia…), podemos encontrar aí também um sentimento de injustiça por parte de seus semelhantes.
No caso da Ucrânia, essas mesmas emoções parecem repercutir de uma forma bem mais ampla. Além de uma ameaça real e constante vivenciada pelos Ucranianos, o mundo também se tenciona e sofre com a possibilidade de uma globalização desse conflito. Já o sentimento de injustiça, bem, esse está sendo partilhado por todos os nossos corações.
Não, não é aceitável você colocar em risco a vida de inocentes, destroçar as suas comunidades, fragmentar as suas famílias, interferir significativamente em seu bem-estar, violentando a sua estrutura psíquica, com feridas na alma que os acompanharão pelo resto de suas vidas. Seja lá qual for o seu motivo, isso rompe com a estrutura que chamamos humanidade.
Mas, querido Leitor, reconheço que é ingenuidade e incoerência justificar uma guerra apenas pelo instinto animal humano. Se a guerra fosse apenas o reflexo da ira, ela já teria acabado, pois, todo o ataque da raiva não sobrevive por muito tempo (ou você enfarta ou acalma). Com base nisso, cabe a nós fazermos mais um questionamento: qual é o alimento que nutre (financia) uma guerra?
Talvez, a resposta se encontre em um “amor exagerado pelos próprios interesses a despeito de outrem [2]” ou em outras palavras, no egoísmo. Alguns Seres Humanos têm essa “pecinha” descalibrada, que gera uma necessidade de posse meio que insustentável, muitas vezes acompanhada por um instinto natural de liderança e persuasão de multidões. A história está repleta de figuras que tentaram dominar o mundo, incluindo o Pink e o Cérebro!
Em verdade, avalio que parece ser uma necessidade inabalável de controle, que bem a fundo reflete uma emoção primitiva de desproteção. Em essência seria isso, mas, claro, às coisas vão ficando mais complicadas à medida que vão se fundindo a teia social humana. E então, essa origem vai se ramificando e sendo potencializada por emoções mais complexas, como é o caso da ganância e o orgulho, por exemplo.
Falando em ganância, sabe a ideia de materializar o valor das coisas (o dinheiro), pois, então, ele também serve como um meio de controle e muitas vezes como pretexto de uma guerra (assim como a proteção dos negócios bilionários dos monopólios Russos e Chineses do setor de gás e energia, por exemplo).
Falando em orgulho, eu confesso que penso muitas vezes na situação do Putin. E sim, ele errou feio em suas escolhas, e as reações de repúdio do mundo acabam evidenciando exatamente isso. Mas, cá entre nós, quem aqui já teve que baixar o rabinho, colocá-lo entre as pernas e pedir desculpas? Isso na maioria das vezes não é uma tarefa fácil, ainda mais se você for um pouco orgulhoso ou teimoso (assim como eu).
Isso porque, no calor de uma discussão, o orgulho de nosso ego, geralmente, coloca-nos em uma situação acima do oponente, onde faremos de tudo para tentar convencê-lo que o nosso ponto de vista é o certo (e naquela hora, você realmente acredita que é, além de ter bons motivos para isso!).
Depois que as coisas esfriam, e as suas emoções passam, talvez, revendo a discussão, conversando com outras pessoas, você perceba que tem algo a corrigir, até porque, infelizmente não dá para estar certo sempre (e se você não concordou com essa frase, muito possivelmente seja alguém teimoso que precisa rever os seus conceitos).
O maior problema é que você até pode aceitar que errou (o que já considero um grande avanço pessoal), mas, para muitas pessoas, pedir desculpas e assumir o erro diante dos outros, pode gerar uma sensação de que estamos nos “rebaixando”, ainda mais se a discussão foi feia e o oponente lhe feriu com as palavras. Então, precisamos fazer um esforço para separar a raiva que sentimos da pessoa, do objeto de discussão, a fim de conseguir fazer o certo (coisa que na maioria das vezes não é nenhum pouco fácil!).
Acredito que a situação de uma figura de referência social, como o Putin acaba sendo para Rússia, complica mais às coisas. Isso porque, voltar atrás em suas escolhas pode transmitir a ideia de incoerência e até mesmo fragilidade. Voltar atrás pode significar fracasso, rejeição e traição por parte de seus apoiadores. E por fim, um sentimento de vergonha e solidão, que no fundo eles existem em qualquer pessoa, mas, tentamos mascarar a todo custo.
É lógico afirmar que essa “pressão” pode acabar financiando a permanência de escolhas ruins. Mas, o maior problema ainda acontece pelo fato de que o orgulho e o egoísmo podem ser o fio condutor da insanidade, principalmente, quando percebemos que fracassamos e não conseguimos lidar bem com isso.
Essas emoções podem ser tão insuportáveis, que deturpam a nossa ideia de mundo, fazendo-nos sentir que nada mais tem valor (inclusive as outras pessoas), além de anularem qualquer fagulha de consciência que nos faria aceitar dignamente uma derrota. E o resultante disso é aquela célebre frase que você já deve ter ouvido por aí: “se eu não ganhar, ninguém ganha” ou melhor (essa sim! Eu acho que você lembra) “ninguém vai sofrer sozinho, todo mundo vai sofrer” ♫ ♫ ♫ . E BOOOM a bomba atômica foi lançada, e assim, acabou o mundo!
Isso me faz pensar que compartilhar o nosso sofrimento aparentemente alivia a nossa dor, mas essa frase pode ser realmente problemática se levada ao pé da letra…
Mas, nem só de desgraça esse texto se constitui, caro Leitor. Também podemos pensar em como seria heroico o Putin romper com as amarras do autoritarismo, que aparentemente estão em suas entranhas desde pequenininho. Pois, não pense você que uma pessoa se origina do nada (lembra do tio Lavoisier), o seu passado e contexto estão diretamente conectados a essa personalidade.
Envolver-se militarmente, ser treinado para encontrar o perigo e proteger uma nação, seguir uma hierarquia clara e bem definida, são alguns dos atributos citáveis, que podem influenciar uma personalidade rígida e autoritária, sem talvez que ele mesmo perceba. Olhando por alto, a impressão que dá é que Putin e a sua introversão foram criando uma muralha onerosa e difícil de sustentar.
E o que eu gostaria de evidenciar aqui é justamente a complexidade da situação, pois, podemos observar que para romper com essa batalha contra o mundo, Putin deverá criar uma batalha contra si mesmo. Mas, por que ele faria isso?
A oferta seria nada mais, nada a menos que a Paz e a Felicidade genuínas, tentadora, não?! Imagino que se Putin pudesse provar um pouco de vida verdadeiramente livre, sem precisar estar a todo momento supervisionando uma estrutura que não pode vazar, imerso e um sistema engessado pelo medo, sozinho, onde a impressão que dá é que ninguém é seu amigo, mas sim seu colaborador, eu imagino que as coisas poderiam ser bem diferentes.
Aprender a cultivar amizades e com elas a confiança é a base para a liberdade e bem-estar de toda uma civilização. A cooperação faz parte de alma humana, mas para ela acontecer, devemos nos sentir conectados com os outros, e portanto, desenvolver a empatia e inclusive o respeito.
Sabe, todo mundo quer ser respeitado, mas devemos compreender que o respeito não existe sem reciprocidade. Muitos de nós aprendemos a obedecer acreditando que isso é respeito, mas não é. Respeito é uma via de mão dupla e envolve compreender o outro e até mesmo não concordar com ele, mas, mesmo assim aceitar e procurar conviver em harmonia.
Observando um pouco dessa reflexão, a essa altura do campeonato já podemos considerar que apesar de uma guerra ter precedentes, por vezes claros e bem definidos, além de fazer uso de muitas competências complexas humanas, em essência, ela ainda pode ser descrita como um mecanismo muito primitivo humano, que se fundamenta em emoções perturbadoras, principalmente na raiva, e utiliza da violência como meio de “resolver” um problema.
O maior problema em resolver assim, esse problema, é que continuamos com o problema… calma! Já explico! Freud nos lembrava que “as emoções não expressas nunca morrem, elas são enterradas vivas e saem de piores formas mais tarde” [3]. Ou seja, uma guerra, que é conduzida pelo ódio, pela destruição, pela injustiça e muitas vezes humilhação, muito possivelmente não será aceita simplesmente.
Mas sim, torna-se a base para que o espírito de vingança se nutra e que todos essas emoções com potenciais nocivos, abafados pela imposição de seu oponente, revivam em alguma hora. Talvez, a Alemanha nazista seja um exemplo bem concreto disso. E aqui, cabe a mim, retomar a pergunta que fiz no início do texto, a saber: o que exatamente está faltando para que possamos ao menos se afastar desse fantasma?
Bem, aparentemente, parece não ser sustentável acabar uma guerra com as mesmas emoções que a iniciaram. Isso, de certo modo ainda causa um desequilíbrio e a chave está no oposto. Equilíbrio significa encontrar um ponto entre as razões e as emoções dos oponentes que resolva o conflito de uma forma respeitosa. Eu sei, é muito fácil dizer isso, o problema é como fazer, não é?!
Autoconhecimento, empatia e diálogo parece ser uma resposta simples demais?!
Vejamos,
Você pode até questionar o fato do autoconhecimento estar incluso em uma relação que envolve o outro e não apenas você. Mas, o ponto é que precisamos ter clareza de nossas fraquezas, perceber que também temos dificuldade para mudar velhos e enraizados hábitos. Observar que erramos e não porque queremos, mas simplesmente porque erramos. E então, procurar compreender o porquê erramos.
Entender de si é a base para compreender e até mesmo perdoar o outro, e é aqui que entramos com a empatia. Precisamos esclarecer que ela não é simplesmente se colocar no lugar do outro. Muitos falham em fazer esse exercício vestidos de si. Empatia envolve um passo a mais do que esse, necessitamos nos esforçar para compreender o outro adotando como referência as suas roupas, e não as nossas (por mais complexo que isso pareça).
Se ainda estiver difícil de compreender, você pode voltar ao parágrafo em que me esforcei para tentar interpretar o que acontece dentro do Putin, usando algumas referências históricas e um pouco de conhecimento humano. Por exemplo, eu reagiria de uma forma diferente, pois a minha cultura, carga emocional, valores e percepção do mundo são outras.
E sim, minha dedução pode estar muito errada, mas o que quero enfatizar aqui não é a assertividade de minhas considerações, mas o exercício em si. Fazer isso possibilitou a me despir daqueles julgamentos involuntários que tenho, de repulsa e raiva, pelas suas ações, e olhar para um ser humano que também sofre, e que dentro da sua estrutura psíquica, está tentando fazer pelo melhor (por mais incoerente que isso possa parecer).
A partir do momento que eu busco tentar compreender o outro, e perceber que lá também habitam emoções e temores muito parecidos com os meus, torna-se infinitamente mais fácil encontrar uma solução harmônica, que não seja financiada pela violência.
Mas, sim. Eu também estou tendo dificuldades em imaginar o Putin fazendo terapia e o Zelensky procurando se colocar no lugar do Putin a fim de encontrar uma pacifica solução. E então, chego à conclusão que não podemos nutrir uma semente que não temos plantada. Mas, podemos deixar que alguém nos plante uma semente!
Que papo mais maluco é esse, Ana?!
Sabe aquela história de que uma pessoa que nunca foi amada não pode dar amor, a não que ela tenha contato, aprenda e sinta o que é o amor? O mesmo acontece com o autoconhecimento e a empatia. Por vezes, precisamos que alguém ou algo (como um bom livro, por exemplo) nos mostre a importância dessas capacidades para conseguirmos coloca-las em prática, a fim de colhermos os seus benefícios.
É aqui que entra o Diálogo. Como uma lã que vai tecendo duas partes em prol de um moletom bem quentinho, ou melhor, da resolução de um conflito. Mas, se colocarmos esses dois (o Putin e o Zelensky) em uma sala para conversar, parece-me que ainda assim haveria um abismo. Então, o que fazer?
Bem, a ONU representa um grande avanço na manutenção e fomento a paz do nosso mundo. Penso que a ela deveria ser atribuída (olha quem sou eu para atribuir algo, ainda mais à ONU kkk) a responsabilidade de aprimorar o que podemos chamar de “mediadores” (até que se encontre um nome melhor). Seres humanos com aptidões ou até mesmo uma predisposição a busca pelo entendimento humano, e é claro, dotados de autoconhecimento e empatia.
Imagino que primeiramente, se faria um acordo de cooperação, cujos líderes dos países em conflito, deveriam receber e dialogar com o mediador, quantas vezes se considerar necessário, mediante a implementação de sanções internacionais em caso de rejeição. Essa pessoa não, obrigatoriamente, teria o objetivo de colocar face a face a oposição para resolver o conflito, mas, em um primeiro momento, atuaria como ponte que deveria ouvir os dois lados e buscar por semelhanças.
Por exemplo, o fato de que ambos desejam o melhor para cada nação, além de também desejarem ser felizes. A semelhança é a abertura para conexão, mas ela só se mantém com o autoconhecimento e a empatia. E eis o maior desafio do mediador, semear esses atributos equilibrando o tempo, merecendo a sua confiança, acolhendo o outro, entendendo as suas necessidades e emoções, conseguindo fazer ver uma outra perspectiva e construindo a melhor escolha.
Obviamente e infelizmente, não estamos lidando com uma receita de bolo, mas com a complexidade humana, então, não há garantia de sucesso. No entanto, eu não consigo enxergar uma solução efetiva distante de nosso lado consciente. Justamente, porque nunca acabaremos com a energia de guerra enquanto houver uma busca por exterminar o outro ao invés de compreender o outro. Quando fizermos isso, as emoções negativas enterradas que seriam ressuscitadas em uma próxima oportunidade se transformam em respeito e, isso sim, se chama paz.
Uau, este texto é tão comprido que eu nem acredito que você chegou até aqui! Muito obrigada pela sua atenção neste tempo todo! Caso possuir algum comentário, sinta-se a vontade em escrever, eu vou adorar poder manter este contato com você. Um abraço apertado e até o próximo!
Autora: Ana P. Schaeffer,
Arquiteta e Urbanista, Mestre em Engenharia e estudante de Filosofia.
“É por isso que a educação é um campo perigoso na visão de conservadores e liberais e tem que ser acompanhada de perto, sempre que possível, colocada fora do controle do Estado e nas mãos de agentes seguros ideologicamente, como os empresários e os sacerdotes” (Luiz Carlos de Freitas – Unicamp)
O processo eleitoral que vivenciamos em 2022, que alguns segmentos perdedores ainda não reconhecem, evidenciou, entre tantas outras, três agendas estruturantes em disputa pela elite junto a sociedade: a democracia, a educação e a insegurança do tal “mercado”.
Algumas indagações precisam ser feitas para pensarmos juntos: qual é a relação e os interesses em disputa? Por que temos esta radicalização? Porque a democracia liberal, depois de seus 200 anos, ainda lida mal com assegurar direitos?
Quais os interesses em disputa que mobiliza técnicos e especialistas das fundações empresariais que dominarem os GTs de transição, inclusive o da Educação atacada quatro anos pelo atual governo?
Qual educação e qual democracia efetivamente queremos para no Brasil? Ou, ainda, que nação e sociedade queremos construir?
Estas questões, complexas, diz o Professor Luiz Cardos de Freitas (Unicamp), não podem ser respondidas reduzindo-se sua complexidade a uma questão de “troca de governo”, liberais ou conservadores, esquerda ou direita.
Foto: Ramón Vasconcelos
Mas é preciso ir além. Para isto, é necessário refletir e buscar compreender o que efetivamente está em jogo com a tal “insegurança dos mercados”, com os acampamentos pedindo intervenção militar e com o não reconhecimento do resultado das eleições.
O Brasil está, efetivamente, ameaçado pela esquerda comunista (fantasmas imaginários) ou trata-se da manutenção projeto do capital, especialmente da elite financeira, que somente em 2021, abocanhou R$ 1,96 trilhão (50,78%) do orçamento federal executado em amortizações de dívidas e juros?
Para o pesquisador da Unicamp, há um grande reconhecimento, hoje, da existência de uma crise da democracia liberal que também nos remete a uma crise do estado de direito que a sustenta.
Esta crise tem origem, por um lado, na própria lógica existencial do capital que, como advertia Schumpeter nos idos da década de 40, terá problemas não pelo seu fracasso, mas pelo seu próprio “sucesso”.
Esta lógica direciona a humanidade para o objetivo de ganhar dinheiro para ganhar mais dinheiro, indefinidamente, e nenhum sistema social pode operar por acumulação permanente sem destruir os seres humanos e o ambiente.
É um sistema voltado para o lucro infinito em detrimento de direitos e, inclusive, de democracias.
Mas qual a relação desta análise com a educação e a democracia, particularmente esta educação que prima pela competição meritocrática como fundamento de um empreendedorismo individualista, ao invés de se falar em “assegurar direitos” e a inclusão das crianças e jovens nas escolas e universidades?
O filósofo liberal americano John Dewey (1859-1952) dizia que “na hierarquia dos problemas de uma nação, nenhum sobreleva em importância, ao da educação”.
A escola participará da mudança social democrática somente “se ela se aliar a algum movimento das forças sociais existentes”. Não nascemos democráticos nem antidemocráticos.
A “democracia tem que nascer de novo a cada geração, e a educação é a sua parteira” afirmava Dewey.
Educação e democracia
Sobre esta relação entre a educação e a democracia, o pensador americano é diretivo ao afirmar: “democracia é liberdade”.
A educação para a democracia requer que a escola se converta em “uma instituição que seja, provisoriamente, um lugar de vida para as crianças, em que ela seja um membro da sociedade, tenha consciência de seu pertencimento e para a qual contribua”.
Para tanto, diz o filósofo, têm de corar um entorno social em que os estudantes assumam, por si mesmas, as responsabilidades de uma vida moral democrática. Porém, advertia o educador, o que aborrece é que a maioria das escolas não foi concebida para transformar a sociedade, mas para reproduzi-la, tanto que “o sistema escolar sempre esteve em função do tipo de organização da vida social dominante” (Dewey, 1896).
As escolas, queiramos ou não, veiculam finalidades educativas. Estamos formando a juventude agora. Tais finalidades educativas que orientam todo o currículo são expectativas extraídas de uma determinada forma de concebermos a sociedade que temos ou que desejamos.
Quando pensamos, portanto, na formação dos seres humanos, é importante indagar, antes, que tipo de sociedade queremos construir e, consequente, que tipo de escola precisamos para isso, pois são estas decisões que orientam a própria formação do magistério.
Aliás, para entender estes atos antidemocráticos, de maioria branca e bem nutridos, bem diferente das 62,5 milhões de brasileiros na linha da pobreza, e destes 17,9 milhões – ou 8,4% da população – que estão na extrema pobreza (com fome), é preciso reler Dewey e fazermos a autocrítica da necessidade de fortalecer a formação para a cidadania, para a democracia e respeito a pluralidade humana.
Esta educação sobre nossa formação histórica, social, econômica e política se dá, principalmente, por meio das ciências humanas que estão sendo drasticamente reduzidas e/ou excluídas dos currículos escolares e das universidades, tanto mundo a fora bem como por meio das reformas educacionais em curso no Brasil: BNCC, reforma do novo ensino médio e currículos mínimos de natureza profissionalizante tecnicista.
Por outro lado, as manifestações preconceituosas de estudantes em algumas instituições de ensino, logo após o segundo turno das eleições, evidenciam que estes espaços formativos por excelência não educam para a convivência democrática em sociedades plurais, diversificadas e desiguais como a brasileira, ou seja, não conhecemos o país que vivemos ao acusar nordestinos, pretos e a população LGBTQI+.
Nesta perspectiva, alerta António Nóvoa (Universidade Lisboa), é a diferença que nos educa. A educação não serve para nos fecharmos no que já somos. Precisa servir para aprendermos a começar o que ainda não somos: seres potencialmente sociais, racionais, éticos e políticos.
A vida, acima de tudo, é coletiva (condominial). Se a vida é o lugar onde vivemos juntos, o nosso planeta, o nosso país, a nossa cidade e a nossa escola é onde devemos exercitar e aprender a viver juntos.
Escola, enquanto espaço comum, é um espaço de educação, de convivência e de formação ética. Aprender não é um ato individual ou privado, precisa dos outros. É na relação e na interdependência que se constrói a educação. Isolados somente na nossa bolha não aprendemos que que nossa potencialidade e riqueza está na pluralidade e diversidade social.
Enquanto muitos segmentos da elite brasileira permanecem contestando a eleição com manifestações antidemocráticas em frentes a quartéis, bloqueando estradas e avenidas urbanas, atentando contra o direito de ir e vir, contra o estado democrático de direito, outros setores, se movimentam e já ocupam os GTs de transição do novo governo, disputando a direção política, intelectual e ideológica da futura gestão federal.
Enquanto o mercado financeiro pressiona e disputa a direção na economia, os futuros gastos e investimentos do país, as Fundações e Institutos Empresariais ocupam espaços nos diversos GTs da transição para prosseguirem com suas políticas educacionais aprovadas a partir de 2016.
O professor Fernando Cássio, pesquisador da UFABC, adverte que O GT da Educação é composto majoritariamente por pessoas que trabalharam na burocracia do MEC nos governos petistas e, por representantes de elites interessadas em ditar as políticas públicas para a educação dos pobres.
Nos interstícios do grupo principal, situam-se algumas pessoas historicamente vinculadas às agendas educacionais do campo popular e outras ao debate educacional interno do PT.
A ausência de sindicatos, entidades representativas estudantis e associações científicas da educação é patente.
Articulação
Entusiasta maior da reforma do ensino médio, a coalizão empresarial conhecida como Movimento pela Base está presente no GT através de diversos membros de seu conselho consultivo e de suas organizações mantenedoras e parceiras: Fundação Lemann, Instituto Natura, Instituto Unibanco, Itaú Educação e Trabalho, Cenpec, D3e, FGV Ceipe, Instituto Singularidades, Instituto Sonho Grande e Todos pela Educação. Dos 48 participantes identificados na lista inicial de participantes da reunião, 18 (37,5%) são vinculados de maneira direta a dez organizações privadas associadas ao Movimento pela Base.
A grande agenda educacional das elites nacionais é prosseguir exatamente de onde pararam no governo de Michel Temer, uma vez que o governo Bolsonaro lhes bateu com a porta na cara, pontua Cássio.
Para Henrique Paim, que coordena o GT de transição na área da educação, o princípio é que a política educacional brasileira tem de estar associada ao que chamamos de visão sistêmica.
Precisamos pensar da creche até a pós-graduação. Porque, quando falamos em educação básica, existe um elemento muito importante que é a formação de professores, que se dá no ensino superior. É importante uma ação do ministério que envolva todos esses níveis educacionais e, obviamente, cuidando de cada etapa da educação básica e do ensino superior.
O ex-ministro da educação pontua que tivemos um problema muito sério nesses últimos anos que tem a ver com a pandemia, mas também com a ausência de políticas que gerem oportunidade para os jovens. Isso, de certo modo, acabou levando o país a uma distopia.
Temos uma redução enorme de participação dos jovens, daqueles que concluíram o ensino médio, no Enem. Isso é reflexo da desesperança dessas pessoas com a educação. É também reflexo da necessidade de muitos jovens de trabalhar.
O que temos hoje é um quadro de pessoas com mais recursos enfrentando problemas psicossociais, porque tiveram de ficar em casa no período da pandemia, o que gera uma série de dificuldades, e de outro lado, jovens de famílias pobres que tiveram de sair para trabalhar e não estão voltando para a escola.
Temos de ter uma política de oportunidades no ensino médio, na educação de jovens e adultos, no Ensino Superior e na educação profissional para que esse jovem tenha, quando voltar para a escola, ou quando trabalharmos a permanência dele na escola, uma perspectiva junto ao mundo do trabalho, ao setor produtivo.
Já Eliezer Pacheco, um dos coordenadores do Conselho e membro da equipe de transição, afirma que “os brasileiros serão surpreendidos com políticas ousadas na área da educação. Sabemos que temos muito que avançar para ter uma educação de acordo com as necessidades do país e do povo brasileiro”.
Sinalizou, também, que o PNE é uma referência fundamental para a retomada da discussão educacional com a sociedade, numa visão sistêmica da educação e que, programas como Fies, ProUni e Ciências Sem Fronteiras, devem ser retomados para a inclusão de jovens no ensino superior. vres, valores, valores
Para Dewey a “democracia é liberdade” e para Marilena Chauí a “democracia é a única sociedade e o único regime político que considera o conflito legítimo”.
A filósofa lembra que, numa democracia, o “direito” difere da necessidade, da carência ou de um interesse. Mas se distingue fundamentalmente do privilégio, que é sempre particular. Os privilégios se opõem aos direitos.
A democracia não pode se confinar a um setor específico. Ela determina a forma das relações sociais e de todas as instituições, ela é o único regime político que é a forma social da sociedade coletiva. Uma sociedade não é um simples regime de governo porque há eleições, respeito à vontade da maioria e das minorias.
A democracia é uma criação social de tal maneira que determina, dirige e controla o poder dos governantes.
Do ponto de vista político, todos os cidadãos têm competência para opinar e decidir. A política não é uma questão técnica nem científica, mas é a ação coletiva, a decisão coletiva quanto aos interesses da própria sociedade.
Portanto, a cultura e o valores da democracia e da cidadania começam na escola, estendem-se por todas as instituições sociais e educacionais, configurando-se em responsabilidade de todas as gerações e de cada um de nós.
Defender a democracia é defender sua liberdade de educar compartilhando inteligências de nossa condição humana. Direitos fundamentais como educação, liberdade, igualdade e democracia são inegociáveis em qualquer transição ou situação. Quem quer faz a hora, não espera acontecer.
A educação tem tarefa de garantir a participação de cada menina e menino na produção e fruição da imaginação humana. Que se abram pois, as bibliotecas e façamos voar a imaginação!
Em tempos da 68ª Feira do Livro, 2022, perguntemo-nos como se formam leitores, como fazemos acontecer a fome de ler, o amor pelos livros, o prazer de saborear palavras, histórias, como construímos famílias que invistam tempo e recursos no livro e na leitura.
Sim, porque todos nós que passeamos pelas alamedas multicoloridas da Feira, exploramos as caixas das promoções, nos deliciamos com as entrevistas com autores e autoras e seus novos lançamentos, saímos maiores, mais plenos, mais instigados e realizados. Essa dimensão de valor não pode ser subtraída de nenhum ser humano, sob pena de tornarem-se “homínculos” como nos retrata a linda prosa – poema do Patrono da Feira Carlos Nejar em “Carta aos Loucos”.
Nós, adultos, somos responsáveis por essa construção que precisa acontecer ao longo da vida, em especial na primeira infância e na adolescência, quando o processo de constituição da identidade e da subjetividade estão mais abertos e em transformação.
Imaginem as escolas sem bibliotecas atualizadas, sem profissional qualificado para mediar, estimular, organizar projetos de leitura, sem a acessibilidade à exploração livre e voluntária da meninada nos horários de recreio, de entrada e saída das aulas, de modo a construírem seu percurso de leitura e de aprendizagens para além da indução da sala de aula!
Infelizmente é assim que estão quase todas as mais de 2400 bibliotecas das escolas estaduais do Rio Grande do Sul, desde 2019, quando o governador retirou da política de Recursos Humanos o espaço das bibliotecas.
Desde lá, constituímos na Assembleia Legislativa a Frente Parlamentar pelo direito ao livro e à leitura. Em parceria com o Conselho Regional de Biblioteconomia, fizemos audiências, livraços, seminários, representação no MP, caravanas pelas escolas registrando os espaços das bibliotecas, e agora uma exposição que retrata o abandono, a degradação e perda de acervo, redução de uso e circulação dos livros, e de projetos de leitura.
Não há como reparar a enorme perda que quase um milhão de estudantes tiveram por essa decisão, mesmo que as escolas, há que se reconhecer, busquem contornar com projetos desenvolvidos por professores.
“Nós, com as palavras criamos uma memória. E com a memória, criamos a imaginação da espécie.” Afirma Nejar, por ocasião da 68ª Feira.
A educação tem tarefa de garantir a participação de cada menina e menino na produção e fruição da imaginação humana. Que se abram pois, as bibliotecas e façamos voar a imaginação!
Afinal, gostar de ler exige uma série de situações pelas quais é preciso passar: a primeira é a descoberta do valor da leitura; a segunda é a curiosidade pelas novidades que os livros trazem; a terceira é ter livros ou impressos ao alcance das mãos. Tais fatores aparecem, principalmente, quando as bibliotecas estão por perto e são facilmente visitáveis, fornecendo livros emprestados. (Padre César Moreira) Leia mais:https://www.neipies.com/ler-prazer-pouco-explorado/
Sermos pais, mães, tios, padrinhos, madrinhas, ou o que for, contadores de histórias, faz muita diferença. Experimentemos, nem que seja uma vez, dividir o tempo com um pequenino ávido por conhecer novas aventuras. Talvez a viagem imaginária também nos faça.
À beira da cama, sentado ao lado do filho, o pai narra. Não uma, nem duas, mas várias vezes, a mesma história. Sabe de cor cada passo de cada personagem, cada ação, cada movimento. Seria entediante narrar sempre a mesma aventura, se ele não fosse pai, e os pais, bem sabemos, são super-heróis em corpo de gente.
Essa pode ser a história de muitos, privilegiados meninos e meninas que possuem um abrigo para antes de dormir. É, também, a minha história. Eu fui uma dessas crianças apaixonadas por ouvir aquilo que o pai contava. Tinha, como de praxe, a narrativa favorita: a lebre e a tartaruga.
A fábula, tão antiga e difundida, prendia-me de uma maneira inexplicável. Hoje sei que não era exatamente o seu conteúdo que me deixava assombrado e sim o modo com o qual me era apresentado. Hoje sei que o fascínio vinha do modo com o qual o meu contador de histórias favorito narrava.
Dono de uma cadência invejável, meu pai saboreava as palavras e as me entregava numa sonoridade ímpar. Não lia; contava. Contava como quem conversa com um amigo. Contava num ritmo denso, mas sereno. Fazia as vozes dos personagens, dava ênfase nos momentos de êxtase, sussurrava quando havia alguma tensão. Eu o acompanhava, assoberbado, respiração suspensa. Pela minha cabeça passavam todas as cenas, os encontros e desencontros. Até o ponto final eu era todo ouvidos e encantamento. Ele era voz, corpo e gesto a serviço do narrar.
A dedicação empregada por ele fazia surgir seus efeitos. Como toda criança que recebe uma dose de encantamento imaginário, passei a estar, com frequência constante, visitando o “mundo da lua”, como dizem os adultos ou o “refúgio do coração”, nome poético atribuído por mim depois de já bem grande. Essas visitas me tornaram, pouco a pouco, um fazedor de histórias também. Não raro, punha-me a escrever em folhas de ofício dobradas ao meio os meus “livros”. A imaginação fertilizada por aquelas palavras paternas havia me jogado, impreterivelmente, no terreno da livre criação. Foi o princípio de uma das profissões hoje exercidas por mim.
O jogo de quem fala e quem escuta, pai e filho, amigos, enamorados das histórias, durou um longo tempo. Expandia-se por vários contos, fábulas, mas sempre voltava às peripécias de uma lebre espertalhona e uma tartaruga determinada. Talvez estivesse ali um pouco da essência de quem éramos. Certamente se encontrava naquela desventura de Esopo um pouco do que sou hoje: uma tartaruga insistente, obstinada a ganhar a sua corrida, fazendo seu trabalho, acima de tudo.
Hoje, quando percorro escolas, narrando ou dando oficinas para educadores, escuto relatos diferentes. Há muitas pessoas que nunca ouviram histórias com frequência na infância e há inúmeras crianças que também não possuem o hábito em suas residências.
Desabituadas ao contato mais próximo com o universo da fantasia, da imaginação, tornam-se desprovidas de um elemento valioso, fundamental na própria formação humana. Não é um impeditivo de que venham a buscar, futuramente, construir uma boa rede de leituras, vivências, contatos com a palavra. Todavia, o processo se torna, por vezes, mais longo, por falta de referências.
Inexiste um caminho seguro e correto, isso é fato. As diferentes exigências do cotidiano, por vezes, impossibilitam a realização de muitas coisas desejadas. O esforço, porém, é necessário. É em casa que criamos a primeira visão de mundo. É com a família que desenvolvemos as primeiras relações humanas. Povoar essa jornada de histórias, de compartilhamento de ideias e sentimentos, auxilia na compreensão daquilo que somos e seremos.
Sermos pais, mães, tios, padrinhos, madrinhas, ou o que for, contadores de histórias, faz muita diferença. Experimentemos, nem que seja uma vez, dividir o tempo com um pequenino ávido por conhecer novas aventuras. Talvez a viagem imaginária também nos faça.
Aliás, certamente nos fará bem. Afinal, nada melhor do que sair um pouco da órbita de nós mesmos e visitar espaços desconhecidos. Não sei se o Ministério da Saúde recomenda, mas, não custa tentar.
Pennac diria: “é preciso dar de farejar a uma orgia de leitura”. Monteiro afirmou: “um país se faz com homens e livros”. E eu vos digo: “salvem o prazer de ler!” Leia mais: https://www.neipies.com/salvem-a-leitura/