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A importância das tarefas na vida das crianças: autonomia

As crianças precisam de autonomia desde os primeiros momentos em que começam a despertar para o mundo, ou seja, desde cedo. Aos poucos os pais devem ir permitindo que elas façam algumas tarefas sozinhas, que se tornem independentes e façam escolhas ou tomem decisões.

Inicio este texto com um poema da querida poeta americana Emily Dickinson intitulado “O amor aprendemos inteiro” que diz nos seus belos versos “O Amor aprendemos Inteiro – / O Alfabeto – As Palavras – / Um Capítulo – e o Livro todo – / E da Revelação – o segredo – / Mas nos olhos Uma da Outra / Divisou-se a Ignorância – / Mais divina do que a Infância – / Uma e Outra, Crianças – / Buscando explicações – / Nenhuma entendeu – nada – / Ai! Como é largo o Saber – / E a Verdade – que complicada –”.

Buscar explicações é o que fazem as nossas crianças a todo instante nos seus pequenos mundos de incompreensões em que os adultos costumam depositar conhecimentos e darem ordens como verdadeiros tiranos fazendo delas súditas que não podem perguntar ou criticar, apenas aceitarem e dizerem sempre que sim. É preciso deixar a criança viver, experimentar, gerenciar e receber do mundo externo o necessário para o seu desenvolvimento interior.

Educar é uma tarefa difícil e complexa. Cada pai tem a sua maneira de educar a sua criança. Alguns preferem o cuidado exagerado, outros permitem que a criança desde cedo cresça sendo independente. Na verdade, a educação das nossas crianças é algo desafiador, mas que vale a pena ser conversado entre os pais, professores e responsáveis.

Cada pai tem uma opinião diferente em relação a criação do seu filho, cabe a nós respeitar. Assim é com a autonomia, alguns preferem não deixar que as crianças façam nada além de brincar outros permitem e até acham bom que elas aprendam desde cedo a terem responsabilidades.

Neste sentido que discutiremos a questão da autonomia na criança. A autonomia é o poder do ser humano em se governar de acordo com seus ideais e princípios. Logo, uma criança autônoma é aquela que, dentro dos seus próprios limites, ganha responsabilidade e autoconsciência sobre seus atos.

As crianças precisam de autonomia desde os primeiros momentos em que começam a despertar para o mundo, ou seja, desde cedo. Aos poucos, os pais devem ir permitindo que elas façam algumas tarefas sozinhas, que se tornem independentes e façam escolhas ou tomem decisões. Claro que sempre com os cuidados daqueles que cuidam delas.

Sueli Ghelen Frosi, da Escola de Pais do Brasil, afirma que pais e mães sempre são educadores e que devem ser parceiros da escola, para a humanização dos filhos. Os filhos são educados pela linguagem, pelas emoções, pelo respeito e pelos exemplos. Assista:https://youtu.be/LJTBoRNPkBU?t=103

A autonomia da criança é importante para a sua formação enquanto cidadã. É por meio dela que a criança se desenvolve e aprende a tomar decisões para a vida adulta. Adquire vivências e experiências, enrique o pensamento e amadurece o pequeno espírito. Toda criança quer aprender, quer fazer as coisas dos adultos, quer nos imitar naquilo que fazemos além de somente nos imitar nas palavras. Somos espelhos para elas.

Logo as tarefas que podemos atribuir às nossas crianças estimulam um crescimento favorável ao desenvolvimento do pensamento cognitivo, das responsabilidades, da memorização e da rapidez em tomar decisões. As crianças gostam de ajudar em casa. Elas se sentem felizes quando são convidadas a participarem junto com os pais de algumas tarefas como dobrar as próprias roupinhas, tomar banho sozinhas, escovar os dentes, poder alimentar-se sozinha ou vestir-se sozinha para ir à escola.

Há muitas tarefas que as crianças podem fazer dentro de uma casa e que lhes garante a autonomia, tendo-se o cuidado de respeitar a idade de cada uma delas. O desejo de serem autônomas já nasce com elas, mas ao longo da infância os pais por cuidados muitas vezes exagerados preferem evitar que elas façam determinadas tarefas e acabam as inibindo, fazendo com que se tornem dependentes.

Deixar que as crianças vivam as suas próprias experiências é uma tarefa importante e desafiadora para os pais e para elas próprias. Ainda que seja difícil permitir que as crianças sejam autônomas porque as vemos pequenas demais para fazerem tarefas que achamos ser só nossas devemos confiar nelas e aos poucos ir lhes atribuindo algumas delas, tais como: tirar a louça da mesa e levar para a pia, arrumar a cama ou guardar os brinquedos.

Não podemos dar às crianças tarefas difíceis ou que possam prejudicá-las de alguma forma, mas também não podemos fazer tudo por elas. Vivemos num mundo em que a competitividade e o mercado de trabalho exigem que os adultos saibam de tudo um pouco e sejam espertos e criativos. Se educamos as nossas crianças com excesso de cuidados não permitindo que elas façam nada dentro de casa, tendemos a prejudicar os seus desenvolvimentos podendo fazer com que elas se tornem adultos frágeis e inseguros.

O estímulo da autonomia deve começar de muito cedo. Quanto antes a criança conseguir enfrentar os desafios que a cerca melhor será para ela. A questão da cidadania, da solidariedade, da caridade e as diversas funções sociais que regem as nossas vidas em sociedade são importantes para o amadurecimento do espírito e o desenvolvimento da autonomia. Uma sociedade, que se diga de passagem, faz cobranças e exigências ao passar dos anos e que espera encontrar crianças preparadas para enfrentarem a vida desde muito cedo.

Não podemos ter excesso de cuidados, mas estarmos junto com as crianças as ensinando a fazerem algumas atividades que podem vir a ser muito boas para elas na vida adulta.

A capacidade de pensar por conta própria e tomar decisões, de realizar atividades do dia a dia e de ser independente fisicamente são benefícios ligados ao desenvolvimento da autonomia. Só para ilustrar o que estamos dizendo aqui citaremos alguns outros benefícios do estímulo a autonomia da criança: psicomotricidade, autoestima, inteligência emocional, autoconfiança, persistência, habilidade social e desenvolvimento cognitivo. Tudo isso colabora com um crescimento saudável e mais autônomo para a criança.

O importante é que os pais saibam valorizar o desejo da criança querer participar de alguma atividade dentro de casa, que ela possa de alguma forma ajudar, dar a sua colaboração, sentir-se útil e responsável. Todos nós gostamos de fazer alguma coisa pelas pessoas ao nosso redor ou pelo mundo. Incentivar a criança a levar o lixo para fora, a dar banho no cachorro, a aguar as plantinhas também são tarefas maravilhosas.

A autonomia não surge do nada, nem do dia para a noite, para uma criança tornar-se autônoma ela precisa do estímulo e motivação dos pais. Quando uma criança recebe esse estímulo desde os primeiros anos ela costuma ter também: boa memória, rapidez no raciocínio, senso de responsabilidade, poder de achar soluções rápidas, criatividade e habilidades especiais.

São vários os benefícios que a autonomia traz à criança. O mais importante de todos é que ela se sinta feliz sendo útil dentro de casa e para os seus pais. Que faça o que lhe pedirem com felicidade e vontade. Sem que nada lhe seja forçado ou obrigado. Tudo precisa ser espontâneo e gratificante para ela. A tarefa de apanhar as folhas secas da árvore do quintal de casa todas as tardes e a checagem da caixa de Correios todos os dias. O bom é que sejam tarefas rotineiras e que tenham horários para serem feitas, pois isso desperta o lado responsável da criança.

Essa independência vai ajudar a criança a ser um adulto mais preparado para o futuro, pois com o passar dos anos as responsabilidades vão chegando e nem sempre os pais estarão por perto para ajudar. Precisamos educar as nossas crianças não para a gente, mas para o mundo, pois logo elas crescerão e não mais nos terão por perto a todo instante.

Ademais, é bom ver a criança exercendo a autonomia sentindo-se livre para fazer as tarefas da casa que lhe foram atribuídas. O processo de autonomia deve ser gradual e visto pelos pais porque cada idade tem seus limites a serem respeitados. Desse modo, é bom não sobrecarregar a criança e nem esperar que ela faça tarefas das quais ainda não consegue fazer sozinha.

As tarefas dadas às crianças devem seguir as suas idades para que não se sintam sobrecarregadas ou até mesmo não consigam fazer com destreza o que lhes pediram e acabem se sentindo desencorajadas e frustradas. Os pais devem ter o cuidado de saberem quais tarefas os seus filhos estão prontos para fazerem sozinhos.

Na escola, ocorre a mesma coisa que em casa. Os professores devem ter cuidados quando derem tarefas para os seus alunos incentivando a autonomia como já dizia o nosso amado e respeitado educador Paulo Freire em seu livro “Pedagogia da autonomia” como podemos ver nas suas seguintes palavras “Ninguém é sujeito da autonomia de ninguém. Por outro lado, ninguém amadurece de repente, aos vinte e cinco anos. A gente vai amadurecendo todo dia, ou não. A autonomia enquanto amadurecimento do ser para si, é processo, é vir a ser.” Que este vir a ser seja apresentado à criança desde a tenra idade, para que possa ser desenvolvido e experimentado enquanto se pode errar sem sofrer desafetos e frustrações prejudiciais ao emocional.

O estímulo em casa ajudará a criança a se adaptar mais facilmente no ambiente escolar. Na escola, os desafios são ainda maiores para os adultos e pequenos. É preciso saber quais tarefas a criança está preparada para fazer sozinha baseando-se na sua individualidade, amadurecimento e habilidades. Por isso, estes dois ambientes devem trabalhar em conjunto para que a criança alcance sucesso no seu desenvolvimento autônomo. Assim, os professores precisam criar um ambiente favorável ao desenvolvimento da autonomia, realizar as atividades no tempo adequado para cada aluno, proporcionar liberdade de escolhas e de atividades, trocar ideias e informações, ouvir a opinião das crianças.

Professor, use as brincadeiras para desenvolver a autonomia dos seus alunos. Elas são excelentes para que as crianças se identifiquem com aquilo que poderão fazer com prazer. É por meio delas que as crianças mais aprendem. Você pode criar brincadeiras ou usar as que a criança já está acostumada.

Possibilite a tomada de decisão entre as crianças, pois com isso elas se sentirão responsáveis e poderão escolher tarefas que sabem desenvolver. Crie situações que as crianças possam resolver sozinhas. Assim, elas se sentirão parte de um todo, terão suas autoestimas elevadas e a autoconfiança mais desenvolvida.

Encorajar a criança também é um dos passos para o seu desenvolvimento autônomo. Afinal, o medo é um mecanismo de defesa do ser humano. Mas, o medo também é um grande limitador que nos impede de seguirmos em frente. Isso acontece porque estamos acostumados a parar diante do medo. Quando os pais são superprotetores essa paralisação diante do medo é ainda maior, por isso você, professor, deve ouvir as questões pessoais dos seus alunos, respeitar as suas escolhas e acolhê-los sempre que for possível.

Despertar a independência difere de deixar que a criança tome decisões e faça escolhas por conta própria. O dever dos pais é motivar os filhos todos os dias, orientando, estando ao lado deles, propondo desafios e dando espaço para que eles errem dentro de um ambiente seguro. Um dos maiores entraves é que muitos pais acabam interferindo, pois não conseguem ver os filhos frustrados ou tristes.

Evite dar broncas frequentes na sua criança quando ela errar uma ou outra atividade. O ideal é sentar-se com ela e conversar, perguntar se está tudo bem ou o que está se passando. Ouvir a criança é fundamental para o desenvolvimento da autonomia. A bronca só paralisa, desestimula, desencoraja.

Sempre que possível incentive a sua criança a lidar com as frustrações, afinal na vida todos temos que saber lidar com as perdas e erros. Não proteja demais a sua criança para que ela não viva essa emoção, pois ela é necessária. Tome cuidado para que ela não se sinta machucada por demais com alguma perde ou um erro que cometeu. Mas, a deixe viver o seu momento.

Com efeito, muitos pais cometem o erro da superproteção e acabam criando filhos inseguros, imaturos e desobedientes, que não sabem lidar com as perdas. Uma boa forma para a criança aprender isso são os jogos e as práticas esportivas em que haverá um vencedor e um participante.

Na verdade, ao longo da vida a criança precisará enfrentar muitos obstáculos, desafios e pedras no seu caminho e nada melhor do que ela esteja preparada para tomar decisões sozinha e sinta-se confiante e pronta para fazer escolhas sábias que poderão decidir o rumo da sua vida. Mesmo que os pais tentem tardar essa liberdade em algum momento da vida a criança terá que fazer as suas escolhas, logo é importante que desde cedo aprenda a ser autônoma.

Finalizo este texto com um poema do meu poeta português predileto e com quem aprendi a escrever não somente poemas para crianças, mas tudo o que me vem ao pensamento transcrevo para o papel, Fernando Pessoa que nos seus versos lindos nos diz “Quando as crianças brincam / E eu as ouço brincar, / Qualquer coisa em minha alma / Começa a se alegrar. / E toda aquela infância / Que não tive me vem, / Numa onda de alegria / Que não foi de ninguém. / Se quem fui é enigma, / E quem serei visão, / Quem sou ao menos sinta / Isto no coração.”

Que toda criança possa viver a sua infância do seu jeito e com a sua individualidade sendo respeitada a sua vontade de desenvolver a autonomia quando quiser ajudar em casa ou na escola com aquilo que saber fazer e sente-se bem ajudando.

O vir a ser é necessário para o crescer emocional e físico. Que Fernando Pessoa, junto a Paulo Freire, conquistem pais e professores que permitam as crianças a serem autônomas e a desenvolverem as suas habilidades físicas e espirituais.

Autora: Rosângela Trajano

Independência?

Acredite na democracia e acredite no seu poder das tuas escolhas. É ela o único meio que temos para promover a verdadeira mudança, a verdadeira independência, que, no fundo, deve partir e ser refletida por cada um de nós.

Estado de não se achar sob domínio ou influência estranha. Autonomia [1]. Depender, assim como o francês dèpendre, proveio do latim dependere, formado de de-, “para baixo” e pendere, “pender, estar pendurado”. Portanto, “depender” é literalmente “pender para baixo, estar pendurado (em algo ou alguém)” [2]. Já o prefixo IN acaba atribuindo ao termo uma posição contrária, ou seja, aquilo que não depende de algo ou alguém, apresentando, portanto, uma certa ideia de liberdade.

No dia 9 de janeiro de 1822, Dom Pedro I decide acatar o clamor da população, proclamando a célebre frase “se é para o bem de todos e a felicidade geral da nação, diga ao povo que fico”. Alguns meses depois, às margens do Rio Ipiranga, no dia 7 de setembro de 1822, trajado a carácter de si — como um príncipe — montado em um belo cavalo, ele inclina a sua espada aos céus e dá voz a sua alma: “Independência ou Mooooorte”! O que aconteceu depois ninguém sabe… (brincadeira, há indícios que guerras eclodiram em algumas partes do Brasil).

A verdade é que, graças a uma sucessão de fatos, sendo eles os mais realistas ou mitológicos possíveis, hoje somos um país independente. E, ao observar as histórias concernentes às independências, podemos avaliar que, na grande maioria delas, a sua semente germina por meio de um acúmulo de mal-estar coletivo que seguidamente se relaciona às formas de exploração e desrespeito.

A impressão que tenho é que possuímos um anseio, quase que inerente ao humano, por igualdade de direitos e em dignidade, que afronta qualquer tipo de contradição a esses preceitos. Quando reconhecemos isso, alimentamos uma repulsa pelo status quo, que incentiva a mudança, mesmo a alto preço.

Eu olho para a história e fico admirada com a infinidade de pessoas que colocaram a própria vida em risco, superando seus maiores medos em prol de um ideal, ou melhor, em prol daquilo que consideravam ser a justiça e isso se traduz por independência ou morte.

Eu olho para o presente e reconheço esse mesmo espírito, que ainda vive em cada um de nós, brasileiros, e clama pelos mesmos princípios. Nos sentimos seguidamente explorados e injustiçados pela máquina pública, que consome a nossa energia (tempo e dinheiro) para financiar escândalos e a falta de ética. Não confiamos na política, mas é a política quem nos governa. Como podemos viver assim?

Fomos abrigo para muitos imigrantes. Nossas terras férteis salvaram diversas pessoas que abandonaram o Velho Mundo com a esperança de dias melhores, a mesma esperança que ainda pulsa no coração dos brasileiros. Foi 199 anos de “independência”. De famílias que literalmente partiram do zero e ajudaram a construir uma nação repleta de cor, cultura e sabor.

Graças a essa receptividade, é que somos gigantes pela própria natureza, não só a ambiental, mas também humana: que abrange o mundo inteiro e resulta no ser brasileiro. Eu sei, nem só de flores são compostos os nossos campos — tem muito agrotóxico por aqui também!

E, quando tudo parece perdido, ainda mais em função da nossa desestrutura política, eu penso: calma! “Ainda somos jovens” ♪ como nação e a evolução moral se constrói com base nos nossos erros, ou melhor, com base naquilo que aprendemos com eles. E, com isso, muitas vezes precisamos de tempo, acontecimentos, e o principal, discernimento.

Outrossim, é válido alertar que a evolução moral não acontece quando temos fome ou quando não conseguimos o mínimo para sobreviver, nesses casos, na imensa maioria das vezes, o que rege é o instinto de sobrevivência. Só após preenchidas as nossas necessidades primitivas é que conseguiremos nos aprofundar em nossos valores e nas estruturas que nos fundamentamos para gerir o meio social.

Com base nisso, observa-se a importância de capacitar os brasileiros para serem autônomos. Em um primeiro momento, emocionalmente e financeiramente, em um prazo mais distante, intelectualmente. Para que a nossa ajuda sirva para ajudar a quem precisa a não precisar mais de nossa ajuda.

O maior desafio aqui, é justamente, ensinar a pescar, pois, considero não haver nada mais digno para um ser humano que não depender de alguém ou de algo para gerir a sua própria vida e isso se traduz pela verdadeira independência.

Em matéria de Brasil, eu continuo a olhar com esperança para o futuro, reconhecendo e me relembrando constantemente de que uma evolução moral é lenta e gradual. Faço um esforço para identificar, a cada pequeno gesto ou ação os princípios que estão nos fortalecendo e nos unindo como um povo. Assim eu não sucumbo, assim eu me alimento.

E com base nessas ínfimas observações, eu afirmo: a evolução moral está acontecendo. E a prova disso, é o que os seus ancestrais foram e o que você é, e o quanto o que eles construíram ainda têm lhe dado suporte, para que você sane as suas necessidades básicas, e tenha espaço para investir na sua formação, tenha tempo para ler um texto reflexivo como este e cognição suficiente para interpretá-lo, argumentar e até mesmo discordar.

Outro indicativo de tal evolução é a ascensão da Filosofia, aqui no Brasil, e com ela a descoberta de que nem só de exatas vive o homem e muito menos uma sociedade (já alertava o hino rio-grandense: povo que não tem virtude acaba por ser escravo!).

Estamos nos dando conta de que o PIB não se traduz por felicidade da nação e de que o dinheiro nunca comprará os nossos valores. Sentimo-nos exauridos com o sistema de barganha que contamina e degrada o nosso primeiro e fundamental ideal, aquele que Dom Pedro I instaurou a 199 anos: “se é para o bem de todos e a felicidade geral da nação”.

Onde então a felicidade pode ser encontrada? Na prática daquelas coisas que a natureza do homem exige. Como então ele fará tais coisas? Com seus dogmas, ou princípios morais e opiniões (dos quais todos os movimentos às ações se originam) sendo corretos e verdadeiros. Quais são tais dogmas? Aqueles que se relacionam ao que é bom ou mau, visto que não há nada verdadeiramente bom e benéfico para o homem além daquilo que o torna justo, temperante, corajoso, liberal. E não há nada verdadeiramente mau e prejudicial ao homem senão aquilo que causa os efeitos contrários (Marco Aurélio, demonstrando que a Filosofia é atemporal e muito úteis para os tempos atuais).

Diante do exposto até aqui, eu lhe aconselho: recupere a consciência de que o Político deve ser aquele que tem o ideal de justiça. Desmistifica a ideia de que eles são de outra espécie, distantes de nossas realidades e de nossas necessidades.

Aproxime-se da política, e escolhe, com cautela, os seus representantes; educa a população. Acredite na democracia e acredite no seu poder de escolha. É ela o único meio que temos para promover a verdadeira mudança, a verdadeira independência, que, no fundo, deve partir e ser refletida por cada um de nós.

Fontes:

[1] Dicionário Online Priberam https://dicionario.priberam.org/

[2] Etimologia https://diariodeumlinguista.com/2020/09/07/no-dia-da-independencia-a-origem-da-palavra/

Autora: Ana P. Scheffer

[3] Meditações: o diário do Imperador Estoico Marco Aurélio. Tradução de Willians Glauber. — São Paulo: Citadel, 2021. P. 107–108.

Todos temos um rio de infância e uma ponte

Muitas coisas referentes ao passado de nosso rio Passo Fundo são difíceis de acreditar. A começar que se dava alguns mergulhos nele e um que outro peixe se pescava. Aos poucos, os peixes começaram a não ser mais peixes. Eram coisas que nem sabíamos definir. E a velha ponte foi coberta por outra, mais larga e sem significado algum.

Na minha infância, junto com meus irmãos e mais alguns vizinhos, construímos uma tosca canoa de difícil manobrabilidade e de fácil afundamento. Por medida de segurança, fixamos dentro da canoa, amarrada por uma corrente, uma boia feita de rolha.

No primeiro dos inúmeros desastres náuticos que viriam a se repetir, quando a água começou a tomar conta, o mais afoito de nós agarrou-se à boia e jogou-se na água. Óbvio que a rolha escorreu por entre seus braços e permaneceu presa pela corrente. A canoa acabou não afundando, e o único que se salvaria acabou sendo o único a naufragar.

Era difícil andar de canoa no rio, porém, quando ele alagava, a criançada imaginava navegar num oceano. Dava inclusive para passear de canoa por baixo da ponte e, forçando bastante a imaginação, ter-se a sensação de andar no rio Sena conforme visto em desenhos e fotos.

Sim, o rio Passo Fundo já teve uma ponte construída à imagem e semelhança das pontes de Paris. Construída com pedras fixadas com cimento vindo da Inglaterra, pois aqui não havia, apresentava três arcos e quatro pilares. Em sua amurada foram colocados quatro candelabros de ferro para a iluminação.

Quando intendente do município, entre 1926 e 1928, Armando Araújo Annes promoveu sua construção com base nas recordações do período vivido em Paris no início do século XX. Ele nascera e vivera a maior parte de sua longa vida às margens do rio. Gostava dele.

Muitas coisas referentes ao passado de nosso rio são difíceis de acreditar. A começar que se dava alguns mergulhos nele e um que outro peixe se pescava. Aos poucos, os peixes começaram a não ser mais peixes. Eram coisas que nem sabíamos definir. E a velha ponte foi coberta por outra, mais larga e sem significado algum.

Continuo morando próximo ao rio. Sou um ribeirinho. E contínuo tendo no meu coração aquele rio navegável, habitado por peixes de verdade, engalanado pela ponte de pedra de três arcos e quatro candelabros.

Dia desses fiquei feliz: vi meu amigo Schneider junto ao rio. Festejava Iemanjá com uma braçada de flores: as brancas pediam a paz e as vermelhas, o amor. Amor ao nosso rio de infância.

Autor:  Jorge Alberto Salton

Incentivar a competitividade é bom para a criança?

Que toda criança possa ser grande na arte de viver e nas competições que a vida lhe trouxer para saber ganhar ou perder, o importante é o existir além da vitória, nas nuvens, nas ondas do mar, num espanto do peixinho na beira do rio a pular para ver o seu olhar assustado.

Trago os versos daquele que é filho de Portugal, país que nos colonizou e tornou este um lugar lindo para se morar se não tivessem massacrado os nossos indígenas seria mais lindo ainda. Mas, sei que se ele estivesse numa daquelas naus de Cabral não teria permitido que nenhum indígena tivesse sido ferido ou violentado, porque ele é e sempre será “O menino da sua mãe”.

Falo do poeta Fernando Pessoa e trago o seu poema intitulado “Havia um menino” que diz “Havia um menino / que tinha um chapéu / para pôr na cabeça / por causa do sol.” Que todo menino ou menina possa ter um chapéu mágico para colocar na cabeça e assim num passe de mágica aprender a amar e respeitar o outro.

Competir nos ensina antes de qualquer coisa que a vida é dura e difícil e que vamos crescer sempre lutando pelos nossos ideais e objetivos. Cresceremos em busca dos nossos sonhos, mas sempre respeitando as regas da vida e os amigos que poderão se tornar os nossos adversários no jogo do tempo.

A competitividade é algo meio difícil entre as crianças. Se por um lado ela motiva e faz com que a criança tenha vontade de ir em frente, de ganhar, de lutar de ser cada vez melhor naquilo que faz por outro ela nos consome as energias muitas vezes e nos deixa tristes quando perdemos e não sabemos como perder. Estamos acostumados a somente ganhar e valorizamos as conquistas.

A infância é o momento de descobertas, de buscas e encontros com o novo. É neste momento que queremos mostrar para nós mesmos e para os amigos que somos fortes, inteligentes, corajosos e que vencemos tudo o que desejarmos. É quando construímos a nossa identidade, formamos o nosso espírito, nos proclamamos seres pensantes e muitas vezes precisamos nos reafirmar perante os amigos e familiares, para isso precisamos ganhar as coisas que desejamos, a nós só importa a vitória.

Ninguém quer ser chamado de perdedor ou fracassado. Muito menos as crianças. Elas não sabem lidar com as perdas. Elas vão sofrer se forem o tempo todo incentivas a competirem para ganhar. É preciso que pais, responsáveis e professores estabeleçam limites e digam para elas que competir é um ato de bravura e de demonstrar que somos iguais aos outros competidores e estamos ali pelos nossos méritos. Se vamos ganhar ou não é uma outra questão.

O fato de querermos competir já nos traz o espírito de campeões na vida, nas lutas, nas batalhas e em nas nossas emoções e sentimentos porque muitos não sabem competir.

E, para competir, é preciso ter um espírito valente e saber aceitar as perdas e as vitórias sem se deixar magoar tanto, sem se deixar sofrer muito e, principalmente, não ficar envergonhado diante dos amiguinhos porque perdeu o pênalti que daria o campeonato para o seu time ou ficou em último lugar na competição da natação da escolinha. Precisamos ensinar às nossas crianças que perder faz parte da vida, nem só de vitórias vive o homem contemporâneo.

Estamos num momento da humanidade em que competir é preciso em tudo. No trabalho, na academia universitária, nas relações afetivas e até mesmo conosco. Nos preparamos durante anos para uma competição e, muitas vezes, no dia da prova não nos sentimos bem, ficamos nervosos demais e acabamos perdendo. Também pode ocorrer do adversário ter treinado mais do que a gente.

Ensinar às crianças que é preciso respeitar os seus adversários também é dever dos pais e professores. Nem sempre ela será a melhor em tudo. Pode ser que apareça alguma criança mais preparada, que estudou mais, que se dedicou mais ou que teve mais sorte do que ela. Uma competição além de preparo psicológico e físico exige sorte. A criança deve respeitar todos os seus amiguinhos da escola mesmo sabendo que é a melhor nas disciplinas, que tem altas habilidades e grande criatividade.

Como dizia o filósofo grego Sócrates “Só sei que nada sei” deve ser ensinado às crianças desde cedo a humildade, a prática da empatia, o amor ao próximo, o respeito as opiniões alheias e ao outro e mais do que isso o respeito pelo resultado da competição tratando o seu adversário com cuidado e gentileza e não como um inimigo.

Os nossos pequenos querem ser os mais inteligentes da sala de aula, os mais queridos pelas professoras, os mais altos das turmas e os primeiros da fila da merenda. Querem se destacar nas brincadeiras e atividades da escola, querem ser escolhidos pelas professoras para fazerem alguma tarefa específica ou ajudá-la em sala de aula, ou seja, querem ser os melhores em tudo.

Aliás, quem não quer ser o melhor em tudo? Até nós, adultos, vivemos atrás disso, imagine as crianças.

Devemos incentivar as crianças a serem boas em tudo o que fizerem, mas nunca ficarem tristes se não conquistarem o que desejavam porque deve sempre ser dito para elas que existirão novas oportunidades, que elas poderão tentar novamente no próximo semestre, no ano seguinte. É necessário deixar claro que uma perda não significa o fim do mundo, que tudo vai passar, que perder faz parte da vida.

Os pais e professores devem atentar para que a competitividade não se torne algo negativo na vida da criança. Afinal, uma coisa é ter motivação para competir sempre e outra é querer ganhar sempre ou ser o melhor em tudo sempre. É neste ponto que se encontra a competitividade saudável e a tóxica.

Se a criança se frustra com qualquer coisa é importante que os pais passem a observar este comportamento e trabalhe com elas uma mudança interior e exterior mostrando-lhes exemplos de atletas e pessoas que vivem ganhando e perdendo competições. A vida é uma constante competição entre o bem e o mal e as crianças assimilam isso desde cedo.

Elas aprendem isso nos contos de fadas ou nas demais histórias que são contadas para elas sobre quem vai vencer no final da historinha, até torcem pelo herói que muito sofre.

Numa competição vencer é bom e todo mundo gosta quando atinge os seus objetivos e conquistas, porém quando a competitividade é exagerada e passa por cima do outro, desrespeita as normas da competição, falta empatia, passam por cima da solidariedade e da cooperação ela se torna algo negativo, tóxico para a criança e para as pessoas que estão ao seu redor.

Nas escolas, ainda que existam competições, os professores devem incentivar a cooperação, a solidariedade e a empatia com as crianças.

Comparar notas, dar estrelinhas para os melhores da turma, desvalorizar os que não vão bem nas disciplinas, sempre colocar um vencedor nas atividades ou procurar sempre um aluno melhor do que o outro pode ser uma competitividade tóxica que tem o feito contrário à motivação, desestimulando as crianças e os colocando um contra o outro, causando transtornos na autoconfiança, autoestima e autocuidado.

Para os pais é importante fazer cobranças exageradas. O importante não é o resultado, mas a participação da criança no evento. A sua coragem e força de vontade de competir sem ter vergonha dos demais amiguinhos.

Comparar a criança a outras crianças pode torná-la insegura e numa situação desconfortável. Transferir os seus desejos e expectativas para a criança pode ser bastante prejudicial. Se a sua criança participará de alguma competição o importante é apoiá-la no que precisar, mas não incentivá-la que só a vitória vale.

Ademais, numa competição o aprendizado e a experiência valem mais do que a vitória e isso é que deve ser ensinado à criança para uma relação saudável diante da competitividade. Muitas vezes o perdedor é alguém que se dedicou muito, se esforçou muito, quis muito, mas não conseguiu por algum motivo que não cabe ficar procurando.

O importante mesmo é sempre competir, dizer para a criança estudar mais, treinar mais que existirão outras oportunidades e que nem sempre vence o melhor. Às vezes o melhor pode não estar num dia bom, afinal todos nós temos dias bons e ruins.

Nós adultos devemos ensinar para as crianças que o espírito de equipe e de cooperação devem sempre prevalecer e que os esforços de todos precisam ser valorizados independente do resultado final. Ensine a sua criança a parabenizar o seu adversário vencedor, isso faz parte da empatia e da solidariedade no esporte.

A criança que é ensinada na escola e em casa a competir com espírito de cooperação e solidariedade crescerá preparada para os desafios da vida contemporânea. Ela não ficará extremamente triste com uma perda.

Na vida, as crianças vão se deparar com muitas perdas e isso precisa ficar claro desde a tenra idade. O melhor é que elas aprendam a competir para superarem os seus medos e ansiedades diante das perdas, e saibam desde cedo que o importante é a participação é o espírito competitivo. A dedicação aos estudos e ao esporte, ou seja, qual for a modalidade da competição não vai torná-la melhor do que as outras crianças.

Uma criança que esnoba do fracasso do seu amiguinho em sala de aula, que se torna logo cedo a “mais sabida” da turma como dizem as demais crianças e passa a ter comportamentos de egoísmo e ambição acaba prejudicando a sua formação enquanto cidadã com valores e virtudes morais.  Toda criança deve ser ensinada a ter empatia pelo outro, seja ele quem for, principalmente se for o amiguinho da sala de aula que não consegue sucesso no ensino-aprendizagem.

O ideal é que o professor ao invés de incentivar competição oferecendo estrelinhas para os melhores da turma, incentive que aqueles que são melhores em determinadas disciplinas ajudem os demais que sentem dificuldades sendo uma espécie de monitores e ajudando na sala de aula o ensino-aprendizagem. Muitas vezes o aluno que não consegue um bom desempenho escolar traz sérios problemas de casa ou até mesmo pode ter algum problema emocional que o impede de aprender o que lhe é ensinado com sucesso.

Na verdade, há diversas formas de ensinar as crianças a serem competitivas. Alguns pais não gostam de expor os seus filhos a coisas competitivas, já tem outros que acham ser uma boa lição de que eles vão levar para a vida adulta. Acredito que todos os pais e professores devem saber a dose certa para uma criança competir com confiança e saber aceitar o resultado. Não basta apenas ganhar é preciso saber participar.

Para finalizar eu deixo vocês com os versos do meu poeta português Fernando Pessoa do poema intitulado “Liberdade” que nos diz “Grande é a poesia, a bondade e as danças… /  Mas o melhor do mundo são as crianças, /  Flores, música, o luar, e o sol, que peca / Só quando, em vez de criar, seca”.

Que toda criança possa ser grande na arte de viver e nas competições que a vida lhe trouxer para saber ganhar ou perder, o importante é o existir além da vitória, nas nuvens, nas ondas do mar, num espanto do peixinho na beira do rio a pular para ver o seu olhar assustado. Viva as crianças!

Jogos cooperativos ensinam crianças a conviver em grupo. Projeto “Jogos Cooperativos” melhora o desempenho escolar dos alunos, unindo Educação Física à Língua Portuguesa. Assista!

Autora: Rosângela Trajano

A dor se transformou em vida

“Toda dor pode ser suportada se sobre ela puder ser contada uma história” Hannah Arendt

A vida é construída de retalhos. De dores que geram histórias. De histórias que povoam as pessoas. De pessoas que contam e compartilham um pouco de si mesmas com os semelhantes. De contos reais ou inventados que ajudam a preservar o grande tesouro humano: a memória.

A lenda da mãe preta é assim. Narrativa popular mais conhecida de Passo Fundo, surgiu da boca do povo. Como patrimônio oral de uma comunidade inteira, foi sendo contada e recontada; por vezes esquecida, exaltada em outros momentos. Para não se perder a sua essência, ergueu-se um monumento em sua homenagem. O concreto simbolizando uma história da tradição folclórica, que resiste firme, apesar dos pesares.

Resgatar, recontar, relembrar. É com esse intento que nasceu o projeto A lenda da mãe preta: resgate de uma Passo Fundo viva, pelo escritor e contador de histórias Gabito. A ideia surgiu de um outro projeto, intitulado Conta Gaúcho, que está levando a escolas municipais contações de histórias e exposição de artes visuais com temática regionalista. https://www.neipies.com/a-lenda-da-mae-preta-resgate-de-uma-passo-fundo-viva/

A narrativa, envolta em aspectos históricos, ambientais e até mesmo místicos, traz a saga de Mariana, escrava do Cabo Neves, um dos pioneiros na fundação de Passo Fundo. Mãe preta, dada a sua origem africana, tinha em seu único filho o grande tesouro de sua existência. Certo dia, porém, o menino fugiu para longe. Mariana, como toda mãe em desespero, chorou. Do seu pranto desconsolado nasceu uma fonte. A dor se transformava em vida.

É interessante notar os efeitos que um conto da tradição oral provoca sobre os ouvintes e as mensagens contidas nele. Usando quase sempre de um simbolismo metafórico, reporta consigo lições de vida, dramas, questões humanas essenciais, numa construção onde o mágico e o sobrenatural prevalecem. Essa forma de suportar a própria dor é o que oferece a segurança para continuarmos em pé. Narrar é, portanto, uma forma de sobrevivência diante do caos, do inesperado, do desconhecido.

O caso da mãe preta, cuja dor foi aplacada pelo próprio Cristo, segundo a lenda, exemplifica de maneira clara essa questão. Quando uma lágrima encharca o solo e, unida a um pranto sincero de saudade forma uma fonte, há uma mensagem explícita de resistência e de esperança. É a subversão da lógica, a negação da morte; não é o fim de uma mãe ferida pelo destino e sim o seu renascimento, a sua metamorfose. É também um ato de doação, onde a protagonista abdica de si mesma, afirmando: “e como lembrança quero deixar essa fonte. Assim, quem dela beber sempre retornará a esse local”.

Hoje, o projeto A lenda da mãe preta: resgate de uma Passo Fundo viva, busca recontar e difundir essa história.

Publicada em livro, a narrativa agora não estará apenas na memória de poucos, mas na mãos de muitos. Circulará entre jovens e adultos, será objeto de estudos e debates; há de se sentir orgulho dela. Pois a oralidade popular nada mais é do que um ato de protesto contra o fim. Quem relembra o percurso de seus antepassados, não se perde jamais. Quem conta suas histórias não morre nunca.

Curiosidades sobre os monumentos das duas mães de Passo Fundo: Assista: https://youtu.be/O7m4FSBp_sw?t=108

Fotos da Praça da Mãe Preta: obtidas do vídeo Nexjor UPF: https://youtu.be/O7m4FSBp_sw?t=91

Autor: Gabriel Cavalheiro Tonin

Quando a vaidade toma conta da vida

Mas, o que é a vaidade? Como ela se manifesta na vida das pessoas? Por que constitui-se uma das principais características da sociedade pós-moderna? Como age o vaidoso?

A vaidade é considerada um dos sete pecados capitais ao lado da preguiça, luxúria, avareza, gula, inveja e ira. Certamente é uma das características que marcam o modo de ser de muitas pessoas na nossa sociedade considerada pós-moderna, por alguns autores.

O homem pós-moderno, segundo esses autores, vagueia pela vida de fragmento em fragmento, tem dificuldade de encontrar uma identidade duradoura, vive como um “eterno turista”, fica indiferente perante os problemas sociais, é alheio com as injustiças e maldades que cruzam sua existência, possui escassa formação humanística, tornou-se entusiasta da superficialidade, do consumo, da diversão sem limites e da permissividade.

Na expressão muito bem cunhada pelo pensador francês Gilles Lipovetsky, o homem pós-moderno vive acometido pelo crepúsculo do dever. No entanto, uma das suas principais características que marcam o modo de ser do homem pós-moderno é a cultura da vaidade.

Mas, o que é a vaidade? Como ela se manifesta na vida das pessoas? Por que constitui-se uma das principais características da sociedade pós-moderna? Como age o vaidoso? Onde reside sua perversidade que causa um desalento moral contemporâneo? Que escolhas e atitudes alimentam a vaidade? Enfim, por que a vaidade é a escolha do caminho invertido na escolha de uma vida ética?

Se formos ao Aurélio, encontraremos a seguinte definição de vaidade: “qualidade do que é vão, ilusório, instável e pouco duradouro; desejo imoderado de atrair admiração ou homenagens; coisa fútil ou insignificante, frivolidade, futilidade, tolice”. Pela definição do dicionário encontramos de imediato diversos traços que levam a indicar a vaidade como característica do nosso tempo e identificá-la como algo negativo que deturpa a busca de um comportamento moralmente aceitável.

Alguém pode objetar dizendo que vaidade é algo positivo, pois significa amor próprio, gostar de si, valorizar suas qualidades, cuidar da aparência, buscar a auto-afirmação. Mas é exatamente aqui que reside o grande problema: o senso comum confunde vício com virtude.

Para Yves de La Taille, reconhecido estudioso da psicologia do comportamento moral da Universidade de São Paulo (USP), “o conceito de vaidade é estranho à dimensão moral, pois não faz sentido dizer que alguém é generoso ou justo por vaidade”.

Uma pessoa vaidosa costuma atribuir valor a aparências, não a virtudes. Por isso, o vaidoso cuida de forma excessiva do espetáculo de si mesmo, pois para ele é “essencial” convergir para si o olhar e a admiração dos outros, exibir e ostentar uma suposta imagem mesmo que temporária e ilusória.

Há uma moral heterônoma no comportamento do vaidoso porque reduz o juízo do outro a uma dependência unilateral. O outro, não é reconhecido pela alteridade e sim pela possibilidade de ser um adulador capaz de expressar elogios, um subserviente espectador que aplaude e reconhece a identidade superficial do vaidoso.

Exagero! Nem tanto. Se prestarmos atenção aos constantes apelos publicitários que diariamente invadem nossas vidas, se vasculharmos os diversos conteúdos implícitos que comandam o império do consumo, se analisarmos as razões que levam milhões de homens e mulheres realizarem intervenções cirúrgicas em seus corpos por motivos puramente estéticos, então compreenderemos que a vaidade se traduz na grande marca de nosso tempo.

A escola também pode se tornar um dos tantos espaços em que a vaidade pode ser caprichosamente alimentada e inflamada. Não estar atento a este fenômeno hodierno é perder uma rica oportunidade de pensar filosoficamente sobre essa importante temática que caracteriza fortemente nosso cotidiano, inclusive escolar.

Certamente é por isso que numa das cenas derradeiras do famoso filme O advogado do diabo, quando Kevin Lomax (principal protagonista do filme) pergunta a John Milton (interpreta o diabo) sobre as razões que o levaram a tomar decisões moralmente tortas, Milton responde que foi por causa da vaidade, e que esta é um dos seus pecados prediletos.

Autor: Altair Alberto Fávero

A superação da fome e miséria como programa de Estado

As situações de crise econômica, que agravam a miséria e fome são geralmente fruto de má condução econômica. Quando a economia vai mal, as primeiras vítimas são os pobres.

Duas notícias foram publicadas recentemente. A primeira diz respeito à insegurança alimentar. Esta condição significa incerteza quanto ao ter o que comer no dia seguinte pela situação de pobreza e miséria.

Por segurança alimentar compreende o acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como base práticas alimentares promotoras de saúde, que respeitem a diversidade cultural e que sejam social, econômica e ambientalmente sustentáveis (Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional). O não preenchimento destes requisitos indica que a pessoa, família ou sociedade vive uma realidade de insegurança alimentar, não está segura quanto ao direito ao alimento saudável.

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatista (IBGE) classifica a insegurança alimentar em três níveis: leve, moderada e grave. Aa insegurança grave diz respeito à falta de comida mesmo. A pessoa vai dormir sem comer e, no outro dia, não tem certeza se vai conseguir comer.

Semanas atrás noticiou-se que o percentual de brasileiros vivendo nessas condições chega a cerca de 33 milhões de pessoas. É uma situação preocupante sobretudo em um Brasil que tem grande área agrícola e que produz muitos grãos. Então a pergunta: produz para quê é para quem? O Brasil produz muito, mas muitos ainda passam fome.

A segunda notícia diz respeito à possibilidade de o governo em exercício potencializar os gastos sociais em vista das próximas eleições, atitude também tomada em governos anteriores e com consequências graves pelo descontrole de gastos e pelo risco de não continuidade. Não demonstra interesse real em atender as pessoas em situação de vulnerabilidade mas garantir a vitória no pleito eleitoral a partir de um engodo.

No Brasil, todo o governo é eleito por um período e quatro anos, com possibilidade de reeleição para mais um mandato. Um bom plano de governo elege algumas prioridades a serem enfrentadas em quatro anos de atividade governamental.

É mister que em um país com déficit nutricional, tenha o combate a fome como prioridade. Todavia esta diretriz também é um limitante. Depende da proposta daquele grupo que ora governa o país.

Um governo equilibrado e preocupado com a equidade social terá condições pelas ações empreendidas de aliviar os níveis de pobreza a começar pela boa gestão da economia. As situações de crise econômica, que agravam a miséria e fome são geralmente fruto de má condução econômica. Quando a economia vai mal, as primeiras vítimas são os pobres.

Agrava o fato de o Brasil ser um país estruturalmente desigual. Indica que tal realidade é estrutural mais que conjuntural. A conjuntura de crise e má gestão apenas torna-a mais grave.

A tese a ser sustentada é que devido a nossa tradição de diferentes déficits sociais o combate à miséria e à fome deve ser uma política de Estado, independente deste ou aquele governo. Isto perduraria até que se chegue a uma situação que fuja aos riscos sazonais, à mercê de crises econômicas, de fome e miséria.

Diferencia-se Estado de Governo. O Estado é uma instituição social fundada em um povo, por ele governado; um território e um conjunto de leis visando a coesão social. Também é possível compreender como um conjunto de instituições permanentes que organizam e controlam o conjunto da sociedade. São os poderes executivos, legislativo e judiciário. Por governo compreende-se o conjunto de pessoas que administram o Estado por determinado tempo, portanto com caráter transitório.

O combate à fome e à miséria, sendo política de Estado, teria perenidade. Não ficaria à mercê de ideologias políticas e jogo eleitoreiro e também daria uma finalidade social à economia que hoje vive um processo de centripedação, gira ao redor de si mesma, não se importando com o mínimo de dimensão social.

Enquanto estruturada como política de Estado considera-se também a preocupação com a forma de aplicação das iniciativas para que não sejam meramente assistencialistas, mas que provoquem a emancipação e melhoria real das condições de vida da população vulnerável. Sendo uma política de Estado, que envolve todos os poderes, não fica sujeita aos humores e opções dos governos que estão exercendo o poder no momento.

Aqueles que estão em situação de vulnerabilidade social, enfrentado a fome merecem uma consideração maior. Como dizia Betinho: quem tem fome tem pressa.

Autor: Pe. Ari Antonio dos Reis

Pandemia ampliou desigualdade no ensino, evasão escolar e perda de aprendizagem

Os desafios e esforços de estudantes, famílias e educadores no pós-pandemia ainda são grandes. Pelo país, professores e alunos sofrem com a ansiedade, depressão e outros problemas relacionados à saúde mental, principalmente com retorno das aulas presenciais, depois de dois anos de pandemia, e problemas estruturais nas escolas.

A maior crise sanitária do século jogou luz e ampliou as desigualdades no ensino público no Brasil. Escolas fechadas, evasão escolar, problemas de aprendizagem, falta de estrutura nas escolas, queda nas matrículas e saúde emocional de alunos/as e professores/as abaladas são alguns dos problemas que a educação pública brasileira enfrenta.

De acordo com uma pesquisa divulgada pelo Datafolha, em janeiro, 4 milhões de estudantes abandonaram a escola durante a pandemia. As principais motivações foram a dificuldade do acesso remoto às aulas e problemas financeiros, em que os alunos que lideraram a taxa de abandono pertenciam às classes D e E.

Além disso, um em cada quatro brasileiros não têm acesso à internet, representando cerca de 46 milhões de pessoas, conforme a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua – Tecnologia da Informação e Comunicação (Pnad Contínua TIC), de 2018. Durante dois anos de pandemia de Covid-19, 38 milhões de alunos de escolas públicas enfrentaram 287 dias de escolas fechadas entre 2020 e 2021, segundo o Inep. A média equivale a quase um ano letivo e meio.

A professora de história da rede municipal de Maracanaú, município do estado do Ceará, que fica a 24 km da capital Fortaleza, Nivia Marques Monteiro, vivenciou esse drama de perto. “Muitos alunos não conseguiram acompanhar as aulas remotamente, a gente teve uma evasão muito grande por muitas questões (…). Aqui, a desigualdade social é grande e tinha alunos sem equipamentos para estudar, sem materiais, e daí muitos deles se afastaram da escola”, conta.

O município foi um dos últimos do estado a voltar às aulas presenciais devido aos muitos problemas estruturais nas escolas, adequação dos protocolos sanitários e escolas não padronizadas. O resultado foi muita defasagem de aprendizagem e problemas de evasão nas escolas.

O que a professora relata é comprovado pelo levantamento do jornal Folha de S. Paulo que aponta que o fechamento de escolas na pandemia em 2020 derrubou em 72,5% o aprendizado esperado.

Os dados da rede estadual paulista mostram ainda que o risco de abandono cresceu 365% durante o período em que as escolas ficaram fechadas e a falta de aulas presenciais fez esse risco médio crescer no mínimo 247% (ou seja, mais que triplicar), mesmo em cidades em que a pandemia foi mais leve.

Para Nivia, que também é secretária de políticas de gênero do Sindicato Unificado dos Profissionais em Educação no Município de Maracanaú (Suprema), o atraso nas tomadas de decisões da prefeitura, que cortou vários benefícios dos professores/as, levou docentes e estudantes a terem problemas físicos e emocionais.

“O ano de 2020 foi bem difícil aqui em Maracanaú porque quando veio a pandemia a gente teve um atraso grande em tomar uma decisão. As escolas foram fechadas, mas demorou a pensar como seria o ensino remoto e ficou todo mundo ansioso e confuso com o que estava acontecendo”, completa.

O documentário “Desconectados”, com pré-estreia agendada para esta semana, mostra histórias de como foi viver este isolamento, na voz dos que viveram na pele o que milhares de outras famílias passaram durante a crise sanitária.

Prejuízos para toda sociedade

A falta de coordenação do MEC do governo federal e a ausência de apoio para as prefeituras e estados levou o período sem aulas presenciais à desigualdade na oferta do ensino remoto, que esbarrou em problemas estruturais, como a falta de conectividade de rede de internet. Menos da metade dos estudantes brasileiros (39%) tiveram acesso às aulas de reforço durante o isolamento provocado pela pandemia, o que intensificou a desigualdade educacional.

“São prejuízos para toda sociedade e com certeza para a educação, que é uma parte fundamental do desenvolvimento do nosso país, sofreu muito porque não houve um investimento adequado durante e depois da pandemia”, afirma Ieda Leal, professora e secretária de Combate ao Racismo da CNTE.

Para ela, a educação está numa situação caótica porque houve perdas irreparáveis de colegas de trabalho, alunos que desapareceram na pandemia e famílias que foram devastadas. Segundo os dados da “Educação na perspectiva dos estudantes e suas famílias”, realizada pelo Datafolha, por outro lado, os alunos que tinham aulas online antes da pandemia foram menos prejudicados pelo fechamento das escolas, tanto no risco de abandono quanto na perda de aprendizagem.

“A pandemia aumentou a miséria, a desigualdade social e, de quebra, a desigualdade escolar. Se a gente não tem a condição normal de aprender, perdemos essa possibilidade e serão anos para retornar. Precisamos fazer um esforço para enfrentar essa disparidade entre alunos que conseguiram acompanhar remotamente com internet, aparelho celular, e tivemos alunos que não acompanharam porque tiveram problema de sinal e de energia”, finaliza a dirigente.

Como a reportagem da CNTE já mostrou, os desafios e esforços de estudantes, famílias e educadores no pós-pandemia ainda são grandes. Pelo país, professores e alunos sofrem com a ansiedade, depressão e outros problemas relacionados à saúde mental, principalmente com retorno das aulas presenciais, depois de dois anos de pandemia, e problemas estruturais nas escolas.

Autor: CPERS SINDICATO

Artigo publicado no site do CPERS SINDICATO em 24/08/2022: https://cpers.com.br/pandemia-ampliou-desigualdade-no-ensino-evasao-escolar-e-perda-de-aprendizagem/

Nem azul, nem rosa: criança veste qualquer cor

Parece que vivemos um retrocesso no que diz respeito a educação das nossas crianças. Por mais que as sociedades mudem, sempre permanecerá o machismo dando as suas ordens e mostrando que ainda é forte nas sociedades contemporâneas.

Trago hoje o poeta português Fernando Pessoa com os versos do seu lindo poema “Eros e Psique” que nos diz “Conta a lenda que dormia / Uma Princesa encantada / A quem só despertaria / Um Infante, que viria / Do além do muro da estrada.”

Não importa se a princesa encantada se veste de azul o seu infante vai de qualquer jeito a salvar e não porque é a sua obrigação como homem salvar uma mocinha, mas porque ele a ama.

Ainda se cultiva a prática de comprar roupinhas para o bebê da cor rosa ou azul entre alguns pais brasileiros. Quanto mais a sociedade se desenvolve tecnologicamente, politicamente, culturalmente e economicamente parece que mais andamos para trás iguais a caranguejos.

Parece mentira que, em tempos de tanta tecnologia e diversidade, alguns pais ainda vibrem ao saberem o sexo da criança que está para nascer mostrando os seus lados machistas e patriarcais. Eu às vezes não quero acreditar que ainda vivo em uma sociedade tão machista e ignorante.

Outro dia vi as fotografias da festa de uma criança do sexo masculino que está para nascer e tudo era decorado de azul. O azul que é a cor de menino, professora. Assim me disseram e eu tive que concordar que sim, que estava bonita a decoração com azul em tudo quanto era canto. Por que não usaram outras cores? Por que criticamos tanto as coisas antigas e continuamos agindo como se estivéssemos em pleno século vinte?

Eu vejo tanta coisa no meu dia a dia que discordo em relação às crianças. Só para citar um exemplo: quem disse que é bonito uma menina de apenas três anos de idade ter as suas unhas pintadas? É apenas uma criança, gente. Deve agir e se comportar igual a uma criança que está descobrindo o mundo. Não deve se comportar como adulto.

Vou voltar para as cores das roupas no próximo parágrafo. É que fico indignada com essas coisas que alguns pais fazem com seus filhos. Querem adultizar as crianças cedo demais.

Antigamente, o enxoval do bebê só era feito depois que as mães ficavam sabendo do seu sexo. Se fosse menina tudo seria da cor rosa e se fosse um menino seria da cor azul. A criança por muito tempo só vestiria uma dessas duas cores. Ai de quem chegasse com um presente de outra cor. Existem costumes que não se acabam e esse das cores das roupas dos bebês é um deles.

Por mais que as sociedades mudem, sempre permanecerá o machismo dando as suas ordens e mostrando que ainda é forte nas sociedades contemporâneas.

Vivemos tempos em que a diversidade está tão presente em nossas vidas seja no trabalho, na escola, na igreja ou no futebol. Tempos em que as pessoas escolhem um nome social conforme se identificam com o seu gênero, tempos em que mais cedo as pessoas estão saindo do “armário” e dizendo as suas orientações sexuais sem se preocupar com opiniões alheias. São esses tempos que derrubam o patriarcado e o machismo e acabam com esse costume de menina veste rosa e menino veste azul.

Crianças ficam lindas vestidas em qualquer cor desde que se sinta bem e estejam confortáveis dentro das mais diversas roupinhas que as mamães cuidadosamente escolhem para elas. É preciso ter cuidado com as roupinhas das crianças para não ficarem apertadas demais em seus corpinhos ou grandes demais. Tudo tem que ser no tamanho certo. Uma roupinha colorida vai chamar a atenção da criança.

Quanto mais cores, mais bonitas são para os seus olhinhos cheios de brilho e encantamento que ainda estão em processo de conhecimento das coisas ao seu redor.

Não quero esquecer-me das crianças com deficiência visual. Para elas, não importa a cor da roupa, mas se é confortável ou não. Se consegue colocar o bracinho rapidamente na manga da camisa e a perna rapidamente no calção. Essa coisa de escolher cor de roupa para a criança conforme o seu gênero não era para existir mais. Porém, o patriarcado é quem dita as normas nas nossas sociedades que querem mostrar avanços culturais e vivem presas ao passado.

Parece que vivemos um retrocesso no que diz respeito a educação das nossas crianças. Querem que as meninas voltem a usar a cor rosa e os meninos a cor azul, querem que as crianças voltem a estudar em casa e não querem que elas aprendam sobre sexualidade nas salas de aulas que é tão necessário para evitarmos que vivam certas situações constrangedoras e violentas com os seus corpos.

Digo às mamães e aos papais que as suas crianças não serão mais mulheres ou menos homens se deixarem de vestir a cor rosa ou a cor azul. A questão da homossexualidade não é uma doença ou algo que se aprende através dos tempos. Nascemos assim. Não vai ser cor de roupa que vai mudar a orientação sexual do seu filho, papai. O menino que só veste azul e não pode brincar de boneca e muito menos falar fino não quer dizer que ele será um homossexual quando tornar-se adulto.

A nossa filósofa e escritora francesa também feminista Simone de Beauvoir nos deixou uma frase bonita que diz “não se nasce mulher, tornar-se mulher”. Esta é uma frase para quebrar com o machismo e acabar de uma vez por todas com o patriarcado nas famílias brasileiras. Não é que seu menino vá tornar-se uma mulher pelo simples fato de vestir roupas da cor rosa. Ele pode tornar-se uma mulher porque está na sua essência, no seu ser, naquilo que o constitui como pessoa humana.

Sem contar que o tornar-se mulher de Simone de Beauvoir é o agir conforme a delicadeza e sensibilidade de uma mulher, é se colocar no lugar da mulher e procurar viver os seus desafios e lutas junto com elas e nunca se deixar ser tomado por atos e palavras machistas que ameaçam os direitos de igualdades de gênero. Tornar-se mulher é uma inspiração para os homens sentirem no peito e na alma as verdadeiras batalhas feministas.

Na verdade, há uma explicação até mesmo não machista para o fato da menina vestir rosa e o menino vestir azul que eu acho bonita. Sim, esse era o padrão indicado pelos especialistas em roupas infantis em 1939. Uma revista para pais, também dos Estados Unidos da América, argumentava que o rosa remete ao vermelho, cor do deus da guerra, Ares/Marte, enquanto o azul estaria associado a Afrodite/Vênus e à Virgem Maria.

Algumas vezes na escola pode ocorrer do menino que estiver vestido de rosa sofrer bullying por parte dos amigos, mas cabe a escola chamar a atenção das outras crianças conversando com elas, explicando, mostrando exemplos e fazendo questionamentos sobre as suas vidas fora da escola para descobrir de onde elas tiraram esse conhecimento errado.

Os meninos sofrem mais bullying do que as meninas com as cores das roupas, isso porque o machismo ainda é grande nas nossas sociedades e os pais começam a ensiná-lo cedo aos seus filhos porque não é possível que crianças de seis ou sete anos já saibam que a cor rosa é de menina e menino que a veste pode tornar-se um afeminado.

Se as crianças que fazem bullying com os meninos que vestem a cor rosa trazem esse conhecimento de casa é porque algum adulto as ensinou. E isso deve ser combatido pela escola porque nela só há lugar para um mundo diverso onde as crianças possam se apresentar do jeito que quiserem e serem livres para mostrarem as suas orientações sexuais desde cedo.

Temos muitas histórias de adultos transexuais e travestis que sofreram bullying na escola, quando crianças, por se apresentarem como se sentiam por dentro. Esta é uma questão muito complexa, eu sei. Questão difícil de ser abordada, mas o que eu quero alertar aos pais e professores é sobre a cor da roupa das crianças. A escola deve estar preparada para enfrentar esses comportamentos e aprendizagens errados e preconceituosos que as crianças trazem de casa e mostrar-lhes o correto, por isso é tão importante o ensino da sexualidade.

Alguns pais pensam que as aulas sobre sexualidade é ensinar as crianças a fazerem sexo ou se tornarem homossexuais. Que vão mexer na piroca do seu filho ou no piu-piu das suas meninas, mas não é isso, pais! Nunca será isso! O ensino da sexualidade em sala de aula vai muito além do que ensinar a como fazer sexo, ele alerta para os cuidados que a criança deve ter com o corpo e quebra muitos tabus que não podem ser mais aceitos como este do menino não poder vestir a cor rosa porque pode virar um homossexual.

Vivemos em uma sociedade em que se uma mulher está grávida de uma menina, automaticamente, ela recebe presentes de cor rosa e, se for menino, de cor azul. 

Quando o bebê nasce e é uma menina, lhes dão de presente bonecas e “coisas de menina” e se for menino, carrinhos e “coisas de menino”.

Parece que os bebês chegam rotulados a este mundo, e as cores começam a adquirir importância na vida deles. Porém, o que importa na vida das crianças não são as cores que lhes digam que são mais apropriadas a eles, mas sim que se sintam bem e que saibam que sua integridade é o principal em qualquer momento da vida deles. Talvez uma menina goste de azul e um menino de rosa, e isso é normal.

Não devemos rotular as nossas crianças por gostarem mais de uma cor do que de outra, como também não podemos rotulá-las por gostarem de brincadeiras que são ditas apenas de meninos como o futebol. Muitas meninas adoram jogar futebol e hoje temos grandes jogadoras profissionais de futebol que não deixaram de ser mães, esposas e donas de casa! 

Não foi o futebol que fez com que elas mudassem as suas orientações sexuais. Do mesmo jeito ocorre com os meninos que brincam de bonecas. Existem muitos estilistas que são casados, pais e donos de casa. Nem por isso deixaram de exercer as suas masculinidades.

Os pais não devem se deixar levar pelas cores, mas sim deverão, ao longo do crescimento da criança, respeitar os gostos dos filhos, sejam quais forem. Por exemplo, para não cair na tentação de decorar o quarto de uma menina de rosa ou de um menino de azul, então, o ideal seria pensar em cores neutras que não enquadrem a criança dentro de um gênero ou outro. Ou simplesmente pensar em uma cor que as crianças gostem. Sem importar se ela for a cor rosa, azul ou qualquer outra cor.

Na verdade, a criança não está preocupada com as cores das suas roupas ou das paredes dos seus quartos, o que elas querem é serem bem tratadas conforme são verdadeiramente, sem precisarem esconder o que sentem, o que pensam, as suas dúvidas e medos em relação aos seus corpos e as suas orientações sexuais.

As crianças precisam ter em quem confiar essas coisas da sexualidade que são tão difíceis de serem compreendidas, por isso que a escola deve estar preparada para falar sobre isso já que em casa os pais, muitas vezes, evitam essas conversas ou desconversam por não saberem como começar explicando às crianças o que elas tanto costumam perguntar.

Quando um menino ou uma menina está brincando, acaba sendo apropriado oferecer-lhes toda a oportunidade de brincar com todo tipo de brinquedos. Por exemplo, se for uma menina, você pode oferecer carrinhos ou aviões e se for um menino pode oferecer bonecas e ursinhos de pelúcias e se estão brincando juntos os meninos e as meninas, oferecer todo tipo de brinquedo para que sejam eles que escolham com qual brinquedo preferem se divertir.

Se a menina quer vestir a cor azul ou outra cor e não gosta da cor rosa não é uma questão de impor para que ela venha a gostar dessa cor e passe a usá-la nas suas vestimentas. Na verdade, trata-se de uma questão que os pais devem respeitar os gostos e afinidades dos seus filhos.

Se o menino gosta da cor rosa e pede roupas e outras coisas dessa cor, os pais têm como cuidado e respeito aceitar e lhes oferecerem aquilo que vai fazer-lhes bem.

Afinal, ser criança é algo tão difícil e complicado que não devemos complicar ainda mais impondo as nossas vontades como se fôssemos verdadeiros tiranos e elas as nossas súditas.

É fundamental respeitar os filhos pelo que são e não pelo que desejamos que eles sejam, não podemos sufocá-los com as nossas ansiedades e expectativas em relação aos seus comportamentos, pois os seus espíritos ainda em formação podem se sentir sufocados ou asfixiados e acabarem sendo prejudicados. O ideal é que deixemos as crianças escolherem sempre o que desejam desde que aquilo seja bom para elas.

Para finalizar, eu deixo vocês com o poema de Cecília Meireles intitulado “O menino azul” que nos diz nos seus lindos versos “O menino quer um burrinho / que saiba inventar histórias bonitas / com pessoas e bichos / e com barquinhos no mar. […] (Quem souber de um burrinho desses, / pode escrever / para a Ruas das Casas, / Número das Portas, / ao Menino Azul que não sabe ler.)”

Que apareçam meninos rosa, verde, amarelo ou vermelho que também queiram um burrinho para com ele passear.

Reforçando papéis construídos socialmente, lá na infância, fazemos com que os adultos naturalizem que o trabalho doméstico e ensinamos que cuidar dos filhosé uma função da mulher, que o homem deve ser agressivo,correr de carro, demonstrar masculinidade portando armas… (Ingra Costa e Silva) Leia mais: https://www.neipies.com/coisa-de-menino-e-coisa-de-menina/

Autora: Rosângela Trajano

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