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Filosofia para enfrentar os medos

O pensamento racional filosófico, cuidadoso, abrangente e crítico nos ajuda a enfrentar o medo e construir espaços de socialização condizentes com uma vida saudável e de qualidade.

 

O medo é uma das emoções ou um dos sentimentos primordiais do ser humano. Desde as origens da espécie humana, o medo tem sido uma das reações fundamentais para viver e conviver. Os estudiosos mostram que o medo está na raiz das grandes motivações humanas. Os mitos, as religiões, as ciências, as filosofias, as diversas culturas, enfim todas as criações e realizações humanas não deixam de ser uma forma antropológica de reagir e enfrentar os medos da existência.

Biologicamente, o medo constitui uma reação natural de preservação da vida. Sem o dispositivo do medo estaríamos expostos ao perigo constante. A ausência do medo faz com que não tenhamos a noção de perigo e com isso estaríamos expostos à condição de risco.

No entanto, o excesso de medo e o medo constante pode nos paralisar, causar patologias incuráveis. As diversas fobias que fazem parte dos estudos da psicologia e das ciências da mente são evidências que mostram o quanto o medo pode se tornar destrutivo na condução da vida e atrapalhar a construção de uma personalidade saudável.

A sociedade brasileira de inteligência emocional (SBIE) divulgou recentemente um estudo que indica os 12 principais tipos de medo (fobias). São eles: acrofobia (medo de altura), agorafobia (medo de espaços abertos ou de multidões), aracnofobia (medo de aranhas), catastrofobia (medo de catástrofes ambientais), claustrofobia (medo de lugares fechados), fobia social (medo de pessoas), glossofobia (medo de falar em público), hematofobia (medo de sangue, injeções ou feridas), monofobia (medo de ficar sozinho), nictofobia (medo da noite ou do escuro), tanatofobia (medo da morte) e zoofobia (medo de animais).

A fobia é definida pela SBIE como sendo um medo irracional e neurótico diante de uma situação ou objeto que não apresenta qualquer perigo imediato. As pessoas neuróticas sentem tanto medo que evitam determinadas situações e acabam num certo isolamento social que prejudica a convivência e uma vida saudável e de qualidade.

A lista sobre os medos (fobias) poderia ser infinita e certamente nos próximos anos surgirão novos nomes para identificar os novos medos que surgem diante das transformações culturais ­­­e da evolução tecnológica. O mesmo estudo realizado pela SBIE mostra que as fobias atingem cerca de 10% da população mundial, e qualquer pessoa pode ser acometida por uma em algum momento de sua vida.

As fobias podem surgir de experiências traumáticas ou pela convivência com pessoas que são portadoras de algum tipo de fobia. “A melhor forma de tratar uma fobia”, indica o estudo, “é por meio da alteração emocional entre o indivíduo e o objeto ou situação que provoca o medo”.

Processos terapêuticos que promovem o reprocessamento emocional das situações relacionadas ao medo são os mais indicados para reprogramar os sentimentos e enfrentar os objetos ou situações que desencadeiam a fobia. Dependendo da gravidade e intensidade da fobia, se faz necessário o uso de medicação para equilibrar e ajustar as disfunções neurológicas.

Para além dos casos patológicos que precisam na maioria das vezes de ajuda profissional, há certos medos que precisam ser enfrentados. Me refiro aos medos cotidianos, banais, comuns, aparentemente inocentes, que muitas vezes se transformam em algo destrutivo para a boa convivência entre as pessoas.

A título de exemplos, menciono aqui aos medos provenientes dos preconceitos, da ignorância, da insensibilidade e da falta de caráter que impulsiona comportamentos doentios de discriminação, de racismo, de ódio, de violência, de apartação social.

Nesse sentido, o pensamento racional filosófico, cuidadoso, abrangente e crítico nos ajuda a enfrentar o medo e construir espaços de socialização condizentes com uma vida saudável e de qualidade.  

Leia também “A filosofia em busca de si mesmo”: O que me define, minhas origens, meu futuro não pode ser expresso com um nome, ou com uma explicação biológica, ou com a projeção de algo que hipoteticamente pode acontecer. Na tradição filosófica não faltaram definições sobre o humano, sobre a gênese, sobre a finalidade do existir”. Leia mais: https://www.neipies.com/a-filosofia-enquanto-busca-de-si-mesmo/

Autor: Dr. Altair Alberto Fávero

Edição: Alexsandro Rosset

Educação superior: mais retrocessos e falácia eleitoral

A história não se abre e fecha por si, são os homens e mulheres em luta que abrem e fecham o circuito da história” (Florestan Fernandes, 1977)

Para o professor, antropólogo e sociólogo Florestan Fernandes (1920-1995) o que se tem chamado de desenvolvimento no Brasil, em realidade, não passa de um processo de modernização e de capitalismo dependente, no qual a classe dominante brasileira.

Uma minoria prepotente que se associa ao grande capital, abrindo-lhe espaço para sua expansão. Isso resulta na combinação de uma altíssima concentração de capital para poucos com a manutenção de grandes massas na miséria, o alívio da pobreza ou um precário acesso ao consumo, sem a justa partilha da riqueza socialmente produzida.

O filósofo e educador Gaudencio Frigotto (UFRJ/Uerj) considera que a síntese do sociólogo Florestan, feita há décadas, ganha hoje um realismo sem precedentes.

A classe dominante brasileira, pequena, autoritária, racista, moralista, antipovo, anticlasse trabalhadora, antiEducação e Ciência, humanamente rasa e insensível sustenta, no momento presente, um (des)governo que nos transforma cada vez mais em um país gigante com pés de barro.

Logo, para o projeto da “elite do atraso”, destruir a Educação e a Ciência brasileira é necessário.

O novo bloqueio de 14,5% (R$ 3,8 bilhões) no orçamento das universidades federais em 27 de maio deste ano é emblemático e confirma a tese de redução contínua e sistemática, desde 2016.

Esse corte atinge os valores orçamentários de custeio e o investimento, conforme denuncia a Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes):

“após todo o protagonismo e êxitos que as universidades públicas demonstraram até aqui em favor da ciência e de toda a sociedade no combate e controle direto da pandemia de covid-19; após o orçamento deste ano de 2022 já ter sido aprovado em valores muito aquém do que era necessário, inclusive abaixo dos valores orçamentários de 2020; após tudo isso, o governo federal ainda impinge um corte de mais de 14,5% sobre nossos orçamentos, inclusive os recursos para assistência estudantil, inviabilizando, na prática, a permanência dos estudantes socioeconomicamente vulneráveis, o próprio funcionamento das instituições federais de ensino e a possibilidade de fechar as contas neste ano” (Andifes).

Esse projeto em curso do governo brasileiro confronta-se com as propostas da III Conferência Mundial de Educação Superior (CMES) da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) transcorrida em maio, na cidade de Barcelona, Espanha.

Foram destacados nesta conferência os valores que criaram as universidades, tais como: o ideal humanista, a emancipação por meio do conhecimento, a liberdade, os direitos humanos, a justiça e a paz.

As universidades sempre foram forças fundamentais para transformar a própria sociedade e a realidade em que estão inseridas.

A CMES 2022 revisitou e reafirmou a missão das universidades: formação de cidadãos globais preparados para atuar na complexidade; geração e compartilhamento de conhecimento, ciência aberta e abordagens transdisciplinares; engajamento social, desenvolvimento e responsabilidade ética.

Desmonte

Enquanto isso, no Brasil, a Rede Pública Federal composta de Universidades e Institutos Federais vêm sendo sistematicamente fragilizada e inviabilizada.

Paralelamente, o segmento educacional privado, com dois terços das matrículas do ensino superior, sob o efeito da financeirização, da EaD e sob ataque dos empresários do setor, colocam os professores enquanto categoria em extinção nessas faculdades.

Vejamos algumas evidências:

O mais recente Censo de Educação do Ensino Superior, divulgado em maio ano, registrou a primeira queda de matrículas nas universidades federais (UFs) brasileiras desde 1990.

No período de 2019 a 2020, o número de estudantes que entraram no ensino superior pelas UFs passou de 1,3 milhão para 1,2 milhão.

E, ainda, cerca de 270 mil estudantes suspenderam a graduação por tempo indeterminado. Essa queda de matrículas é, em parte, explicada pela redução dos investimentos nas instituições e suspensão das políticas apoio estudantil;

Já as instituições privadas registraram aumento no número de ingressantes, chegando a corresponder a 86% do total das matrículas no ensino superior em 2020.

Porém, 53,4% desse ingresso ocorreu no ensino a distância, foram mais de 2 milhões de estudantes que se matricularam no ensino remoto, enquanto 1,7 milhão de estudantes, cerca de 46,6%, ficaram no ensino presencial.

Modelo de negócios

Para Andrea Harada, Gabriel Teixeira e Plínio Gentil, em recente artigo no Le Monde Diplomatique Brasil, o mercado educacional se converteu e se consolidou como modelo de negócios, atraindo investidores de toda natureza (muitos sem vínculo com a educação), sem qualquer relação com a democratização do ensino superior, com a redução das desigualdades ou com o desenvolvimento do país.

Na realidade, representam a efetiva oportunidade de valorização dos capitais privados de várias partes do mundo e, os estudantes, são tratados como ativos financeiros e, os docentes, como custos a serem eliminados.

Porém, neste ano decisivo para o futuro do país, a educação é novamente vítima de falácias eleitorais.

Os mesmos governantes e políticos que descumpriram os percentuais constitucionais de investimentos em educação, que reduziram gastos inclusive na pandemia, que apoiaram e aprovaram cortes orçamentários nas verbas da educação e da ciência, realizam novas falsas promessas da educação enquanto prioridade.

Princípios

Cabe registar que princípios como honestidade, coerência e compromisso com a educação não são negociáveis.

A primeira atitude séria deve ser alçar a educação e a ciência brasileira ao status de Política de Estado, fora do teto de gastos, impedindo ingerências político-eleitoreiras e de governos transitórios.

A primeira coisa a fazer para resolver um problema é admitir que ele existe.

A segunda é identificar sua origem e, a terceira, resolver a causa originária; no caso, os oportunistas e falaciosos defensores da educação.

É inadmissível que os cargos de ministros e secretários de educação sejam ocupados por pessoas alheias às escolas e às universidades.

Quem conhece e faz a educação são os professores. Jamais um CEO, um militar, um pastor, um técnico ou empresário deveria responder por essas funções educacionais, a exemplo das melhores experiências internacionais.

A nossa Constituição Federal (CF) de 1988 aponta os fundamentos da República brasileira: soberania, cidadania, dignidade da pessoa humana, valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e pluralismo político.

A mesma Constituição define os seus objetivos: construir uma sociedade livre, justa e solidária; garantir o desenvolvimento nacional; erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação (artigos 1º e 3º).

É nela, também, que consta a educação como direito de todos e dever do Estado e da família, visando à garantia do pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho (artigo 205).

Para que esses fundamentos e objetivos do Estado democrático se concretizem e a educação de qualidade se efetive, é necessário garantir o atendimento aos princípios do artigo 206:

– igualdade de condições para o acesso e permanência na escola, liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber;

– pluralismo de ideias e concepções pedagógicas e coexistência de instituições públicas e privadas de ensino;

– gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais;

– valorização dos profissionais da educação, com planos de carreira e ingresso exclusivamente por concurso público de provas e títulos;

– gestão democrática do ensino público;

– padrão de qualidade;

– e piso salarial profissional nacional para os profissionais da educação pública, nos termos de lei federal.

Já dizia Florestan Fernandes: o intelectual, seja professor ou pesquisador, não cria o mundo no qual vive. Ele faz muito quando consegue ajudar a compreendê-lo, como ponto de partida para a sua alteração real.

Portanto, não será com privatização da educação, nem com educação a distância, muito menos com ensino domiciliar (homeschooling), com pactos paralelos pela educação, com educação meritocrática ou empreendedorismo individual (“Crie o impossível”) que vamos priorizar a educação como pilar para reconstruir e transformar o Brasil.

Portanto, estas eleições oportunizam substituir as bancadas da “bala”, “evangélica” e similares por representações legítimas e qualificadas de professores, cientistas, jovens estudantes e gestores de escolas e universidades.

A decisão está em nossas mentes e em nossas mãos. Quem sabe faz a hora, não espera acontecer!

Autor: Gabriel Grabowski

FONTE: Educação superior: mais retrocessos e falácia eleitoral – Extra Classe

Edição: Alexsandro Rosset

O poeta e o principezinho: as flores e a flor. Uma comparação do poema Flores de Jean Sartief com a flor do Pequeno Príncipe Flores

À sombra de uma árvore

repousa o meu coração de jardineiro. Desdobrei-me em cuidados.

Jean Sartief em Jardim dos Abismos, 2018

Foi o tempo que dedicaste à tua rosa que a fez tão importante…

Antoine de Saint Exupéry, O pequeno príncipe

“Eu cantarei de amor tão docemente”, anunciou o poeta Luiz Vaz de Camões. Assim cantamos o amor, com a doçura dos nossos corações e a sabedoria do rei Salomão nos seus Cantares.

É sabido que o amor é o mais belo sentimento do mundo, o mais sincero e único, o que cura doenças e faz o inimigo temer. Aquele que nos faz largar qualquer coisa pelo nosso amante. Sendo assim, não poderia ser diferente o cuidado que o poeta Jean Sartief dedica a seu jardim daquele que Saint Exupéry demonstra ter, em seu Pequeno Príncipe, com sua flor. Ambos cuidam porque amam incondicionalmente. Um tem um jardim, o outro tem apenas uma flor. Quem será mais feliz? Existirá felicidade no plural? É possível amar por igual?

A verdade é que o poema “Flores” de Jean Sartief dialoga com a flor do Pequeno Príncipe de forma única e angelical, como se fossem duas crianças a cuidarem de algo precioso que não pode ser perdido, que não pode ser machucado, que não pode desaparecer dos seus olhares cuidadosos, porque quem ama desdobra-se em cuidados num planeta cheio de árvores ou em um planetinha onde há apenas uma flor.

Não importa o lugar. Importa o cuidado. Este que temos perdido ao passar dos anos, com a nossa pressa em estarmos sempre em mil lugares ao mesmo tempo e fazendo um milhão de coisas sem nos darmos conta de quantas pessoas e seres estão precisando de nós, do nosso amor e do nosso afeto.

O poeta brasileiro Jean Sartief se diz um jardineiro à sombra de uma árvore. Lá está o seu coração e, certamente, o seu grande tesouro. Como diz Mateus (6:21), “onde está o teu tesouro, aí está o teu coração.”

O coração de Sartief encontra-se diante do seu jardim, um jardim que fica à sombra de uma árvore, criando uma imagem belíssima em nossos pensamentos e fazendo-nos evocar as ninfas que tanto amam os bosques e os jardins. Assim, é a flor do Pequeno Príncipe, para ele, o tesouro maior.

Todos nós temos um tesouro dentro e fora das nossas almas cheias de sentimentos diversos, que muitas vezes são incompreendidos pelo próximo, mas que nos tornam gigantes quando apresentamos cuidados além do esperado por pessoas egoístas que ainda acreditam o tesouro ser apenas bens materiais.

Um tesouro é tudo aquilo que você guarda nas profundezas da sua alma, num lugar seguro, dentro de um baú trancado a sete chaves para que ninguém tenha acesso, porque só você sabe o valor que ele tem.

Cada pessoa tem um tesouro que pode ser desde uma folhinha velha de um cajueiro até um cálice de ouro. Os tesouros são os mais diversos. Eles se apresentam nos poemas e canções assim como nas histórias infantis, nas quais os piratas de perna de pau combatiam nos mares com outros piratas atrás de tesouros que os enriqueceriam materialmente. Aqui, vale o tesouro que enriquece o afeto, o cuidado, o espírito.

O Pequeno Príncipe necessitava cuidar da sua rosa porque era a única e, mesmo depois de descobrir, quem sabe, o jardim de Jean Sartief, ainda assim não deixou de amá-la nem por um segundo. Há um principezinho que tem apenas uma flor no universo, enquanto há um poeta que tem um jardim inteiro e ambos sabem que devem cuidar dos seus tesouros como quem cuida de si mesmo todos os dias, ou seja, fazendo os mais lindos mimos que se pode esperar de quem nos ama.

É preciso cuidar para não deixar morrer e para não deixar que o tempo nos destrua ou destrua os sentimentos surgidos do quase nada e que viraram tanto dentro da gente.

Na ética do cuidado, os cuidadosos estão sempre vigilantes com aqueles que são cuidados. É preciso ser cauteloso e valente para saber cuidar das coisas frágeis, ou seja, das coisas e das pessoas que, por serem delicadas demais, nos pedem cuidados mais atenciosos.

Quando se tem apenas uma flor no mundo que é tudo, além de amiga, é importante saber cuidar dela para que nenhum bicho ou homem a maltrate. Também é preciso cuidar de um jardim inteiro, porque muitas vezes o tesouro pode ser pesado, imenso, grande por demais, porém, a sua essência exige cuidados que o proteja das pragas, dos insetos, dos pés dos homens ignorantes e daqueles que gostam de arrancar flores só para vê-las morrerem em suas mãos.

Um poeta e um principezinho se encontram quando não importa a quantidade, mas o cuidado que é dedicado ao objeto que ganha espaço nos seus corações sensíveis e meigos.

Vivemos tempos em que poetas estão sendo construídos com a inteligência artificial para fazer amigos, cativar e demonstrar cuidados, mas nunca substituirão o verdadeiro homem, como é o caso do app Replika. Este app é um amigo virtual que pode nos escrever poemas caso peçamos.

O poeta de carne e osso não é programado para dar respostas prontas, mas para estar pronto a amar do seu jeito aqueles que precisam dos seus cuidados, mesmo nos momentos em que ele, o poeta ou o principezinho, também precisam de cuidados. Como se diz o velho ditado: eu esqueço a minha dor para cuidar da tua, amigo.

Nessa vida, em que o tempo é o senhor que diz as ordens de como devemos viver, todo cuidado se faz pouco com as coisas que são importantes para nossas almas.

A flor do Pequeno Príncipe era abusada e o deixava preocupado com as suas esquisitices de se fingir de morta só para deixá-lo preocupado, isso porque temia que ele descobrisse a existência de outras flores. O jardim de Jean acalma o seu coração de jardineiro e suas flores parecem ser tranquilas e não ciumentas, mas, ai dele se deixá-las sozinhas, logo morrerão sem cuidados. Assim são as flores cheias de bonitezas e ao mesmo tempo de uma fragilidade que requer zelo redobrado.

Quem tem apenas um amigo precisa cuidar muito bem dele, pois é o seu único tesouro; não é diferente de quem tem um milhão de amigos, pois também precisa cuidar bem de todos e se desdobrar em cuidados que vão exigir tempo e renúncias muitas vezes para ficar ali do ladinho, sempre fortalecendo os laços e ratificando o seu grande amor.

Se não aprendemos a cuidar bem dos nossos amigos, vai chegar o dia em que todos partirão e ficaremos sozinhos.

Tem gente que gosta de ter um jardim inteiro, assim como Sartief, já o nosso principezinho se contentava com a sua única flor. De qualquer modo, o que importa é a amizade, é o tempo que dedicamos a essas criaturas tão especiais para nós que se tornam grandiosas e fascinantes às nossas almas.

Também não é verdade quando as pessoas dizem que quem tem um não tem nada. Tem muita coisa, sim. Como disse anteriormente, não importa quantidade. Vale muito o cuidado e o amor existente a quem temos ao nosso redor.

Uma flor ou um jardim inteiro sempre nos darão trabalho e sempre demonstrarão necessidade de carinho e afeto no momento em que fizermos um sinal de viagem para longe, pois logo sentirão a nossa falta. Que saibamos cuidar da nossa flor ou do nosso jardim, o que fica é o cuidado à sombra de uma árvore ou em volta de uma redoma.

Autora: Rosângela Trajano

Edição: Alexsandro Rosset

Nós, os fanáticos

Todos estamos sujeitos ao fanatismo, porque a base dele está dentro de todos nós, no pensamento infantil ou primitivo que todos um dia já praticamos

Os anos vão passando e a gente encontra um amigo que se fanatizou. Não era assim. Mas agora ele é fanático, por exemplo, por um clube de futebol, acompanha a torcida até fora do Brasil. Pode estar fanático por um líder político, só fala naquele líder político, por uma religião, por um tipo de alimentação.

Não precisamos nos surpreender, todos somos fanatizáveis. Ao final, vou contar uma das vezes em que me tornei fanático.

Como funciona esse processo?

Uma determinada ideia vai se tornando supervalorizada por nós. Passamos a, gradativamente, mais e mais pensar nela, seja ideia política, religiosa, um modismo. E a ideia vai avançando, avançando, e tomando conta. Nesse momento, ela aproxima-se de uma ideia delirante. Mas não é. Para ser teria de haver uma alteração na bioquímica do cérebro, ser uma falsa crença, não corrigida pela realidade e ir se expandindo e tomando conta do pensamento. No caso referido, não há alteração na bioquímica do cérebro a causá-la. E se a pessoa se afastar daquele meio cultural, seja da torcida do futebol, do movimento político, ela tem possibilidade de sair da “bolha”. Pode continuar com pontos de concordância, mas terá crítica.

Se é uma doença da bioquímica do cérebro, como esquizofrenia, por exemplo, não adianta se afastar. Enquanto essa bioquímica não for corrigida por medicamentos apropriados, a pessoa não se liberta. Portanto, trata-se aqui de um problema cultural.

Todos estamos sujeitos ao fanatismo, porque a base dele está dentro de todos nós, no pensamento infantil ou primitivo que todos um dia já praticamos.

Chamado comumente de pensamento maniqueísta, tende a dividir as pessoas em boas e más, entre os que sabem e os que não sabem, entre os que tem a verdade e os que não tem.

Assista também: Mandela e Gandhi não eram maniqueístas.

Esse nosso amigo, que agora encontramos fanático, não está tão distante de nós. Costumo me observar quando estou a defender uma ideia: será ela tão verdadeira assim como de início está me parecendo? Inclusive, me dei conta disso em plena palestra/debate para centenas de pessoas. Enquanto eu defendia o valor da ciência, de sempre duvidar, o outro palestrante e amigo defendia o valor de crer. Ele defendia sua posição com uma convicção fanática.

Pois bem, a certa altura, dei-me conta, eu estava igual: defendia fanaticamente a ciência. Ele tinha a verdade. Eu tinha a verdade. Havia me contaminado. Havia, de repente, me tornado um fanático.

Ao me dar conta, diminuí o tom, aceitei tecer críticas ao método científico. E… perdi o debate!

Autor: Jorge Alberto Salton

Edição: Alexsandro Rosset

Livres, mas conectados na teia da existência

“Nossas vidas não são nossas. Estamos vinculados a outras, passadas e presentes. E de cada crime, e cada ato generoso nosso, nasce nosso futuro.” (Frase filme “A Viagem)

Tudo está conectado. Nada há que desminta tal fato. Pelo contrário, não faltam evidências. Porém, nem sempre a história segue uma trajetória linear. Às vezes, ela lembra mais a mecânica quântica do que o método cartesiano de causa e efeito. Na descrição microscópica proposta pela física quântica, alguns conceitos do nosso cotidiano são desafiados, dentre eles, o de causa e efeito.

No mundo subatômico, o efeito pode anteceder à causa, por mais irracional que isso pareça. Seria como se fôssemos diretamente influenciados pelo futuro, tanto quanto pelo passado (ou até mais). Destoando de seu mestre Freud, Carl Jung, psicanalista suíço, acreditava nesta possibilidade. Pierre Teilhard de Chardin, o teólogo e antropólogo francês, dizia que toda a criação é atraída pelo que chamava de Ponto Ômega.

Ora, os que se atrevem a crer em profecias, creem que o futuro exerça poder sobre o presente, de modo que o efeito preceda a causa na linearidade histórica. Recebemos sinais vindos do futuro o tempo inteiro.

Por isso, não faz sentido ficarmos presos a uma espécie de carma, sendo assombrados pelo passado. Há que se romper o cordão umbilical, ficando livre para avançar na direção do futuro.

Nossa conexão com o passado, entretanto, não se desfaz, assim como a criança não perde seu elo com a mãe depois que seu cordão umbilical é aparado. Se antes fomos carregados em seu ventre, agora a carregaremos em nosso DNA. Seremos, por assim dizer, a extensão de sua existência. Fora do ambiente intrauterino podemos alcançar estatura antes inimaginável. O ventre, entretanto, cumpriu o seu papel, embalando-nos por nove meses, até que estivéssemos prontos para o mundo exterior.

Estamos conectados com nossos contemporâneos, pois partilhamos o mesmo ar, a mesma realidade, a mesma ancestralidade, visto que todos descendemos de um ancestral comum. Somos atores no mesmo palco existencial, ainda que com falas diferentes. Mesmo a nossa felicidade está vinculada à felicidade de nossos companheiros de jornada.

Enfim, tudo está interligado. A existência é uma grande teia. Qualquer vibração em suas extremidades balança toda a sua estrutura.

No dizer de Paulo, somos membros uns dos outros, de sorte que, se um sofre, todos sofremos, se um se alegra, todos nos alegramos.

Que aprendamos com a aranha, listada em Provérbios de Salomão entre os quatro exemplos de sabedoria, tendo cuidado para que a teia que nos conecta a tudo nos sirva de pavimento na direção do porvir, mas jamais nos enrede, enclausure ou embarace o nosso caminhar (Pv.30:28).

Autor: Hermes C. Fernandes

Edição: Alexsandro Rosset

Homeschooling?

A importância da escola no exercício desta prática é imensa. Inaugura o caminho em direção a uma vida civilizada. Cabe à escola o papel de introduzir os estudantes e suas famílias no trato com as fronteiras dos diferentes territórios familiares (atualmente muito distintos) montando as bases da sociedade civil.

As ondas de doenças infecciosas no Brasil, iniciadas em 2018, continuam contaminando, em média, 25% da população. A primeira onda, em 2018, foi a dos alienados. A segunda onda chegou com a nave dos insanos. Morreu muita gente. A terceira reuniu os dementes, contaminados pelo vírus do ódio e da destruição do Estado e, a última, a do homeschooling, envolveu o desassossego de muitas famílias brasileiras.

Homeschooling é tema sobre o qual grande parte dos especialistas está de acordo entre si. A ideia não é boa, em princípio em razão de isolar a criança do convívio social. Mas é importante ressaltar: escola é uma coisa, família é outra. Separar para aproximar o caminho a ser percorrido.

Vários educadores renomados e com experiência na área educacional analisaram o tema e justificaram a inadequação do homeschooling à realidade brasileira citando, inclusive, problemas ligados à alimentação e à violência familiar. É sugestivo acrescentar, à discussão pedagógica, uma abordagem política.

Qual a origem deste hábito, homeschooling? Onde encontramos seus fundamentos? No exclusivismo da percepção dos membros de uma só família? No receio da diferença entre os humanos? Na impossibilidade de uma vida em uma comunidade política presidida pela liberdade de expressão e discussão?

Dentre os motivos destaco alguns deles. O primeiro se refere à forma de tratar “verdades”. Palavra com protagonismo em tempos de fake news. A suposição, por parte de algumas famílias, da existência de uma só verdade justifica os pais desejarem manter os filhos distantes de questionamentos envolvendo as suas convicções. A sensação de conhecer “a verdade única” e o fato de existir muita violência fora de casa justificam o esforço dos pais de proteger e isolar os filhos do perigo.

O segundo problema diz respeito à formação dos professores. As transformações ocorridas no mundo contemporâneo e a necessidade de preparar os jovens para os desafios de gênero, novas tecnologias e emprego (entre outros) exigem do professor e da escola um enorme preparo emocional, científico e cultural. Infelizmente grande parte dos professores brasileiros não recebeu formação adequada para os imensos desafios da atualidade e sobre eles recai a exigência de construir o difícil equilíbrio entre os estudantes, as famílias, a escola, a tecnologia e o mundo conectado nas redes.

O terceiro desafio diz respeito à incapacidade do Estado, por falta de recursos e qualificação da mão de obra, de montar estruturas para a conciliação entre família, escola e sociedade. O desafio é imenso, se, de fato, a intenção for conciliar. Por um lado, a família quer respeito aos seus pressupostos educacionais e, por outro, a escola tem que conciliar as diferenças entre as famílias, os professores e o sistema educacional.

É fácil? Não.

A importância da conciliação é enorme. Trata-se de um ensaio geral dos conflitos que permeiam a sociedade brasileira e o mundo. O primeiro ensaio da vida em sociedade é marcado pelo conflito e conciliação experimentados na escola. O tema (conflito e negociação) permeia não só os vínculos escolares, como se constitui em pauta de todas as relações em nível pessoal, nacional e internacional.

A importância da escola no exercício desta prática é imensa. Inaugura o caminho em direção a uma vida civilizada. Cabe à escola o papel de introduzir os estudantes e suas famílias no trato com as fronteiras dos diferentes territórios familiares (atualmente muito distintos) montando as bases da sociedade civil.

A negociação é uma arte própria da política. A negociação se ensina e se aprende, da mesma forma com que ensinamos e aprendemos física. A arte da retórica, da definição de hipótese, da argumentação e comprovação, a montagem do contraditório e a solução dos impasses são fruto de um extenso aprendizado. Nascemos com mais habilidade para brigar do que para conciliar. Em caso de dúvida, observem as crianças.

No Brasil, os brasileiros conheceram, ao longo de sua história, o pensamento único, o autoritarismo e seus heróis. Pobres e ricos foram preparados, cotidianamente, para mandar e obedecer, apenas. A frase: “Você sabe quem está falando?” tem origem em solo brasileiro.

A escola e a simples alfabetização foram, por anos, deixadas de lado. É justo cobrar das escolas com tão poucos recursos e professores mal pagos, criar as condições para resolver os imensos conflitos propostos pela modernidade?

É o que está acontecendo.

O problema ficou grande demais e os pais das crianças sem condições de enfrentar os desafios do contraditório postos no mundo atual resolveram: “Pelo amor de Deus fiquem em casa, não quero mais problemas no meu dia a dia”.

A proposta de homeschooling é um grito de desespero das sociedades democráticas, educadas democraticamente apenas na sua cúpula, mas autoritárias nas suas extensas bases. Fala-se muito em contraditório. Mas enfrentar o contraditório numa reunião de pais, em escolas de periferia, com professores nem sempre habilitados para este enfrentamento, não é fácil.

A dúvida, precioso ingrediente da razão, aliada da dedução, da experiência e da comprovação, é ingrediente sofisticado na vida escolar. É fruto do conhecimento, das práticas científicas e da razão. Precisa ser ensinada e praticada cotidianamente.

É fácil fazer a pergunta certa diante de um problema? É fácil defender a razão?

Não. Precisa de aprendizado em filosofia.

A narrativa desenvolvida no ambiente familiar é voltada para as emoções, afetos cotidianos, tradições e hábitos próprios à cada família. Já na escola as práticas retóricas visam ao debate, a elaboração de argumentos, o respeito ao contraditório e o uso da razão. Crianças na escola participam de uma microexperiência do viver em sociedade, na pólis. Elas descobrem, brincando, que os vizinhos, mesmo aqueles de hábitos diferentes, não são inimigos. A escola, por meio dos professores, patrocina, administra e protege o respeito à diferença criando as condições para um convívio sadio, sem exclusões.

O professor pode explicar, por exemplo, a sofisticação que envolve comer com pauzinhos sem levar à mesa instrumentos cortantes; é costume no Oriente, onde a faca, por educação, não deve ser levada à mesa. Ou, ainda, o hábito, delicado, de levar o seu próprio guardanapo ao ir comer na casa de amigos.

Conhecer e viver amigavelmente tanto com os vizinhos, defensores da floresta, como com os parceiros comerciais sejam eles chineses ou indianos (entre outros), é tarefa importante na montagem de um mundo civilizado e globalizado.

As descobertas proporcionadas pelo convívio na escola são muitas. Vão além de ensinar a ler, escrever e contar. A escola nos ensina a viver em sociedade, reconhecer o justo para além da família, compreender proporções, avaliar, se existe ou não, a equidade e a isonomia no país em que se vive.

A raiz da democracia é a amizade. Ela é a artesã do tecido social. O tear é a escola capaz de fazer a trama entre a família, os amigos e a escola, compatibilizando velhos e novos hábitos. Só com o auxílio do diálogo entre os amigos estudantes, a família e a escola, é possível diminuir a tensão dos problemas fronteiriços.

Os desafios do mundo contemporâneo são imensos e exigem a formação de um novo profissional capaz de conciliar as partes em conflito. Isolar os estudantes em casa, proibir amizades entre adolescentes é colocar lenha na fogueira. A família fechada tende à exclusão, do amigo, do emprego, da participação política. Não raro silencia ou desqualifica o Outro, o diferente, o forasteiro, o estrangeiro com feições e hábitos distintos. A família tende a preservar a autoridade do patriarca, garantir o seu poder, a sua riqueza e, muitas vezes, sem perceber, estimula o medo à diferença.

Viver envolve risco?

Sim?

É possível viver isolado?

Difícil.

Precisamos da sociedade para sobreviver, expandir os afetos, fazer amigos, arranjar emprego, praticar esportes, nos divertir e rir. Se precisamos da vida em sociedade, é melhor saber lidar com ela. Reconhecer os lugares amigáveis, os perigosos e, especialmente, ter consciência do projeto de vida possível de levar à frente.

A escola representa a pólis, a vida na cidade, lugar do ajuste, difícil, entre as partes. A variedade de professores em uma escola, de conhecimento e de sensibilidades variadas permite ao estudante encontrar distintos modelos de identidade.

E, entre inúmeras variáveis, por meio da prática do seu livre-arbítrio, escolher os amigos e qual será o desenho, possível, para o seu projeto de vida.

Ser livre é perigoso?

Sim.

Vale a pena caminhar?

Do meu ponto de vista, sim.

Trata-se de um exercício, longo, de fineza de espírito.

Temos problemas gravíssimos na educação brasileira, gerando falta de percepção de valor pelos estudantes e famílias de diversas classes sociais. Mas, se o barco está furado, precisamos nos concentrar em consertá-lo, e não oferecer salva vidas para quem pode, enquanto olham de longe o barco naufragando com 99,9% dos passageiros agonizantes. (Autor: Amilton Rodrigo de Quadros Martins) Leia mais: https://www.neipies.com/o-homeschooling-e-a-sentenca-de-morte-da-educacao-integral/

Fonte: Este artigo foi publicado em Jornal da USP. Link: https://jornal.usp.br/artigos/homeschooling/

Autora: Janice Theodoro da Silva, professora da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP

Edição: Alexsandro Rosset

Neri Gomes: uma vida dedicada à política e à cidade

Neri Gomes é um agente político bastante conhecido em nossa cidade. Já foi vereador por 2 mandatos, assessor parlamentar, fez parte do Sindicato dos Comerciários, presidente da CUT (Central Única dos Trabalhadores) Regional Planalto, presidente do Conselho Municipal de Saúde, dentre outros serviços políticos já prestados em nossa cidade. No momento, ocupa temporariamente (por um mês) mandato parlamentar por conta da inédita iniciativa do rodízio de suplentes com mais de 500 votos do seu partido, o PT (Partido dos Trabalhadores), em 2022.

Neri Gomes sempre teve uma postura combativa, com muita clareza e convicção nas discussões e nas proposições legislativas.

Acompanhamos e prestigiamos sua valorosa trajetória política em Passo Fundo, RS, e queremos, neste momento, destacar sua atuação e sua percepção do atual momento político que vive a cidade, o Estado do RS e o Brasil.

SITE NEIPIES: Conte-nos, brevemente, um pouco mais de tua trajetória política. Alguma atividade política como destaque?

Neri Gomes: Tivemos vários momentos de bons debates políticos nestes quase 40 anos de militância no movimento sindical, comunitário e na defesa da saúde pública SUS, e mais o PT, é claro.

A conquista do Campus de Medicina da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS) tem uma grande importância na economia do município e na vida das pessoas porque viabiliza que estudantes das escolas públicas e filhos de jardineiro, de professores, de pedreiros, de metalúrgicos, etc, se tornem médicos, como se diz no popular, se tornem Doutores. Eu tive um papel importante nesta conquista da UFFS, que eu queria destacar.

SITE NEIPIES: Como e porque a política te cativa tanto?

Neri Gomes: A verdadeira política é a arte de construção de espaços públicos e coletivos na inclusão dos vulneráveis nas políticas públicas dos governos.

Na verdade, eu tenho o entendimento que Lula falou na fundação do PT: todos os movimentos sociais e sindicais são importantes, mas todos tem um teto na construção da política. Quem elabora as propostas, quem aprova as leis são os parlamentares nas três instâncias e quem faz acontecer a política são os executivos. Neste caso, entendo que os trabalhadores(as) tem que estar também nos parlamentos para garantir o debate e aprovação dos projetos importantes para a classe trabalhadora. Eu sempre fui um entusiasta da função legislativa.

SITE NEIPIES: Qual é a importância do PT (Partido dos Trabalhadores) ter conquistado novamente uma cadeira na Câmara de Vereadores ocupada pela vereadora Eva Valéria Lorenzato?

Neri Gomes: Na minha opinião, a Câmara de Vereadores sem a presença de vereador(a) do PT não tem oposição política e programática. Nós temos muito a contribuir no parlamento, nossos parlamentares tem feito diferença nas câmaras de vereadores, nas assembléias legislativas e no Congresso Nacional.

SITE NEIPIES: Que importância tem o rodízio que o PT realiza com os três suplentes de vereadores assumindo um mês de mandato parlamentar na Câmara de Vereadores de Passo Fundo?

Neri Gomes: Penso ser um momento histórico para o partido na construção de novas lideranças e do próprio PT e da valorização de quem colocou o nome para contribuir na legenda, até porque em Passo Fundo nunca tivemos vereador que se elegeu sozinho, sem contar os votos da legenda.

SITE NEIPIES: Como foi assumir novamente a função parlamentar nesta cidade depois de alguns anos sem mandato?

Neri Gomes: Mudaram muitas coisas, a conjuntura política é outra. O momento agora é outro, com a informatização e as redes sociais mudou bastante a forma de se comunicar com a cidade, com as lideranças, mas as lutas, infelizmente, continuam as mesmas. Muito mais difícil é retomar as conquistas que já tínhamos e perdemos quase tudo, com o crescimento da extrema direita em nossa cidade.

SITE NEIPIES: Na sua visão, qual é a característica e o perfil dos vereadores eleitos nesta atual legislatura?

Neri Gomes: Na minha opinião, hoje a Câmara de Vereadores tem uma maioria que não conhece o que são políticas públicas, não conhece os programas dos seus partidos e não consegue fazer e propor debate programático e ideológico.

SITE NEIPIES: Quais foram suas prioridades e iniciativas neste mandato parlamentar extemporâneo de um mês?

Neri Gomes: Foi prioridade a defesa da saúde pública e a importância do SUS e, dentro deste tema, recuperamos o debate ambiental com a coleta seletiva e a reavaliação do plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos de Passo Fundo.

SITE NEIPIES: Política e eleições gerais em 2022.Como avalias?

Neri Gomes: Penso que estas eleições são as mais importante dos últimos anos, estamos sendo desafiados a construir programa de governo que possa recuperar o Brasil, mas também nos desafia a eleger o maior número de parlamentares de esquerda pra viabilizar sustentação de eventual governo do presidente da República Lula e, no estado RS, a mesma coisa.

SITE NEIPIES: Que mensagem deixas a todos os cidadãos e cidadãs da cidade de Passo Fundo?

Neri Gomes: A minha presença na Câmara de Vereadores mesmo que só por 30 dias mostrou a importância de um mandado que faça o enfrentamento programático e consiga dialogar com as lideranças partidárias do partido e do movimento sindical e popular. Sei que tenho um perfil diferente da vereadora Valéria que vem fazendo um bom mandato, por isso nosso desafio é aumentar a bancada de vereadores do PT na próxima eleição municipal.

Fotos: Divulgação/ Arquivo pessoal

Edição: Alexsandro Rosset

As coisas que o afeto ensina

Afeto é o que fica. Esse afeto que percebe que o educar se faz nas miudezas. Para além de toda a tecnologia pedagógica atual.

É muito melhor aprender e ensinar quando existe afeto envolvido. Afeto não é apenas beijinhos, palavras melosas.

Afeto é afetar. É o compromisso de transformar o outro. O coletivo. É desafiar, abrir caminhos. É dar as mãos, é generosidade.

Não se educa sem generosidade. A escolha por ser professor deve passar por essa reflexão.

Serei capaz de me entregar com afeto à minha profissão? Serei capaz de afetar o outro de forma a transformar a sua vida?

Somos marcados por mapas afetivos para sempre! Escuto muitas pessoas dizendo que escolheram as suas profissões por conta de um professor específico. Por quê? Pela forma como esse professor afetou você pelo conhecimento. O afeto está na preparação da aula. Nas escolhas do professor. Na voz, no toque, nos pequenos gestos. No silêncio, na forma como esse avalia.

Aprendi que de nada vale estar em uma superescola, com um supermaterial, num superespaço, numa superlinha pedagógica se não há seres capazes de afetar e dispostos a serem afetados pelos outros!

Afeto é o que fica. Esse afeto que percebe que o educar se faz nas miudezas. Para além de toda a tecnologia pedagógica atual.

A afetividade é a via de comunicação mais eficaz entre professor aluno, possibilitando o reconhecimento da capacidade intelectual do educando. Se dizemos que a educação hoje está caótica e difícil, temos o dever de pensar nas causas que a levaram a esta situação, fazendo uma reflexão acerca do comportamento dos pais e do corpo docente, para que possamos encontrar as causas e soluções para os problemas na escola hoje. (Ana Manoela Detoni) https://www.neipies.com/educacao-e-afeto/

Autor: Marcelo Cunha Bueno, é diretor pedagógico da Escola Estilo de Aprender (SP)

Edição: Alexsandro Rosset

Mudas de plantas como lembrancinhas de eventos

Ensinar as nossas crianças que cuidar de uma muda de planta até ela crescer poderá melhorar o ar que respiramos, nos dar sombra e frutos é muito rico para a sua formação enquanto cidadã e parte da mãe Terra.

Quando vamos realizar um evento nos preocupamos com todos os seus detalhes. Muitas vezes contratamos um profissional especializado para cuidar de tudo, mas sempre tem o nosso toque especial. Seja naquilo que vamos querer, na escolha do local ou do serviço a oferecer para os nossos convidados ou clientes. Algumas pessoas gostam de ir fundo nos detalhes.

Nem sempre é uma tarefa fácil escolher a lembrancinha para uma festa, principalmente de casamento, pensando nisso eu tenho uma dica super fofa, barata e sustentável para vocês.


Elas são uma forma simples, delicada e simpática de presentear alguém que esteve presente no seu evento, elas são super fáceis de conseguir, baratas se você for comprar e a montagem dessa lembrancinha também é bem simples e pode ser feita de várias formas.

Além de ser um artigo de decoração lindo na hora da festa, imagina só que fofo você poder levar para casa a sua mudinha depois?!

Eu, particularmente, gosto de participar de eventos de casamento, festas de aniversários, formaturas e lançamentos de livros. Este último um evento do qual sempre participo. Sou detalhista e observadora. Gosto de ver os cuidados que os meus amigos tiveram para realizarem os seus eventos. Uma coisa que chamou a minha atenção no último casamento do qual participei foram as lembrancinhas.

Sim, as lembrancinhas feitas com todo o carinho, estavam num vaso de cerâmica e eram mudas de plantas. Em cada vaso havia uma frase que dizia assim “cuide de mim, eu serei a sua árvore amanhã”. Fiquei encantada com esta lembrança. Passei a festa inteira levando a minha lembrancinha pra cima e pra baixo com muito cuidado, afinal as mudas das plantas são iguais a bebês e necessitam de todos os nossos cuidados.

Ao chegar em casa reguei a mudinha com um pouco de água e a coloquei à janela do meu quarto. Fiquei pensando em como seria bom se a maioria das pessoas que fazem eventos sejam eles os mais diversos fizessem lembrancinhas de mudas de plantas. A minha se tornará um ipê lindo que pretendo plantar de frente a minha casa para florir a rua.

As lembrancinhas feitas de mudas de plantas é um sinal de que as pessoas daquele evento estão preocupadas com as questões ambientais, são conhecedoras da importância das plantas para o planeta Terra e o mais importante têm consciência de que devemos plantar cada vez mais árvores e plantas de todas as espécies ao nosso redor. Não custa quase nada fazer lembrancinhas de mudas de plantas.

Você não precisa comprar as mudas se não tiver com dinheiro sobrando. Pode recebê-las como doação de algum horto público ou privado da sua cidade. Os vasos de cerâmica podem ser comprados no atacado e não precisam ser grandes. Garanto que dar lembrancinhas de mudas sai mais barato do que se preocupar com algo mais chique e elegante.

Para mim não existe algo mais chique do que se preocupar com o meio ambiente. Você pode colocar no vaso um pequeno poema sobre árvores e no final o seu nome. Acho extremamente delicado e necessário que façamos lembrancinhas desse tipo. De preferência que possamos fazer nas festas de aniversários dos nossos filhos quanto menores eles foram mais tomarão consciência da necessidade da preservação do meio ambiente.

Uma das plantinhas que mais está sendo usada nos casamentos é a suculenta, pois é bastante resistente e armazena bastante água. Além disso ela traz consigo um grande significado, segundo o Feng Shui, elas são purificadoras de ar, e são consideradas guardiãs. Tê-las por perto é um lembrete de vitalidade, persistência e integração com tudo o que está a sua volta, sendo assim, uma ótima opção de lembrancinha.

Dê preferência a espécies resistentes. Entre as espécies que combinam com o estilo do evento, é interessante que você invista naquelas que floresçam na estação em que ele ocorrerá para evitar aparência ruim e preço elevado.

Na internet fiz uma rápida pesquisa e encontrei vários sites que oferecem este serviço, mas como disse acima você não precisa desprender muito dinheiro para fazer as suas lembrancinhas de mudas, basta ser criativo e ter por perto um lugar que doe mudas de plantas. Acho que em toda cidade tem uma ONG e ou órgão público que realiza esse trabalho.

Você pode levar o seu filho junto com você para escolherem as mudas e montarem as lembrancinhas juntos. A criança vai sentir e aprender a necessidade de se plantar árvores onde for possível. Ela vai perceber a sua preocupação e interesse com o meio ambiente, vai levar isso para as outras crianças e será capaz até de contar na sala de aula sobre o seu gesto.

Para que a criança fique fascinada com as lembrancinhas de mudas, é bom que ela mesma seja orientada a oferecê-las no final da festa aos seus convidados dizendo em poucas palavras que as árvores são importantes para todos nós e por isso ela está presenteando a pessoa com uma. É um gesto educativo e rico para a criança e também para quem recebe.

Mudas de plantas como lembrancinhas de eventos têm se tornado um hábito cada vez maior entre as pessoas que se preocupam com o meio ambiente e penso que todos nós temos responsabilidades para com o nosso planeta.

Ensinar as nossas crianças que cuidar de uma muda de planta até ela crescer poderá melhorar o ar que respiramos, nos dar sombra e frutos é muito rico para a sua formação enquanto cidadã e parte da mãe Terra. Esta mãe que nos abraça e nos envolve em seus cuidados maternos dando-nos sempre a atenção necessária para que possamos aprender que o melhor para todos nós é aprendermos a amar incondicionalmente a natureza ao nosso redor.

Experimente nos seus próximos eventos dar mudas como lembrancinhas e anote os comentários dos seus convidados. Se possível registre o momento da entrega através de fotografias ou vídeos. Surpreenda os seus convidados. Muitos dirão que não têm espaço, outros dirão que nunca cuidaram de uma planta e ainda terão aqueles que vão dizer que não têm tempo para cuidarem de plantas.

Como qualquer outra lembrancinha, é interessante que as mudas de plantas passem por algum tipo de acabamento que seja capaz de integrá-las à decoração do evento e lembre os convidados de onde elas vieram. Em festas rústicas, é normal envolver as mudinhas com juta, por exemplo.

Para finalizar, é só prender uma tag com o nome do aniversariante, a data do evento e, se tiver espaço, uma frase fofa, o significado da espécie ou como cuidar dela. A frase da minha mudinha eu nunca vou esquecer. Seja criativo e invente a sua própria frase assim como o seu próprio poema. Todo mundo pode se tornar um poeta num momento de amor.

Você terá um milhão de motivos para convencer os seus convidados a cuidarem da sua lembrancinha porque ela é como se fosse uma parte de você. Sim, diga isso para os seus convidados. Provoque-os a tirarem a resistência fora e aceitarem a cuidar da mudinha da planta que você está os presenteando. Faça-os sentirem-se parte do meio ambiente.

É claro que as mudas como lembrancinhas só farão sentido se os eventos forem realizados em locais apropriados para que elas sejam oferecidas. Em grandes salões urbanos fica meio difícil, mas ainda assim é possível dar um jeitinho.

As amigas da minha mãe quando vêm aqui em casa e visitam o nosso jardim se apaixonam pelas nossas plantas e pedem sempre uma mudinha para levarem de lembranças. Mamãe faz a muda com todo o carinho colocando num saco plástico preto ou quando temos em casa num vasinho de barro. Elas ficam todas felizes por levarem uma parte do nosso jardim com elas.

As mudinhas de plantas são lembranças especiais, marcantes e com vida. Quando você presenteia alguém com algo vivo aquela pessoa assume a responsabilidade de cuidar daquele presente com muito mais cuidado e responsabilidade, pois sabe que se deixá-lo morrer se sentirá culpada diante de você. Ninguém se sente bem ao matar uma plantinha por falta de cuidados, por isso o seu convidado se sentirá tentado a cuidar da lembrancinha com todo o carinho do mundo.

Faz-se necessário educar as pessoas para o gesto do cuidado não somente com o outro o que ainda é pouco diante do ódio e da violência que vemos nos jornais todos os dias, mas um cuidado que está começando a aparecer nas gerações de adolescentes nascidos depois dos anos 2000 onde eles querem cuidar de maneira especial da vida e que essa vida esteja acima de todas as coisas nos seus cotidianos.

As mudas de plantas como lembrancinhas estão fazendo o maior sucesso entre os cuidadores do planeta Terra. Seja você mais um cuidador dando mudas de plantas como lembrancinhas dos seus eventos ajudando assim o mundo a se tornar cada vez melhor. Quando adotamos questões ambientais no nosso viver estamos antes de tudo cuidando de nós.

Autora: Rosângela Trajano

Edição: Alexsandro Rosset

Por onde passa o futuro das Cidades Educadoras?

Dedicamos esta crônica a educadores brasileiros como Darcy Ribeiro e Paulo Freire. Dedicamos também esta crônica à estudiosa Jaqueline Moll e ao professor Márcio Taschetto, que não medem esforços para disseminar as ideias das Cidades Educadoras no RS e no Brasil.

Participamos da Abertura do Evento Encontro das Cidades Educadoras região Norte do RS neste último dia 19 de maio de 2022, na cidade de Marau, RS. Foi uma noite de muitas aprendizagens e de muitas trocas entre os participantes e os Convidados.

Esta crônica pretende sistematizar algumas ideias apresentadas no evento, cuja intenção é de colaborar nas discussões e na apropriação dos conceitos de cidades educadoras, seja de professores ou professoras, seja da comunidade em geral.

Chama-nos atenção que Cidades Educadoras fazem parte de um movimento, de uma metodologia, de um horizonte de concepção de uma boa cidade: participativa, solidária, inclusivas, democrática.Como uma cidade pode dar errado se ela tem tantos talentos, tantas possibilidades de vivenciar a cidadania, tantas pessoas querendo ajudar para que ela se torne um bom lugar para se viver?

A cidade que se pretende Educadora deveria responder a questão: Por que queremos ser Cidade Educadora? Antes de ser slogan ou prêmio, é um compromisso que envolve toda a comunidade, que participa das proposições e das realizações que se farão na cidade.

Para que uma Cidade Educadora se concretize precisa de 04 aspectos:

*decisão da gestão;

* políticas públicas;

* continuidade dos processos e

* pessoas comprometidas.

Valendo-se de suas experiências e vivências em diversos processos e territórios (inclusive em solo africano), o professor Alexsandro dos Santos Machado, convidado especial do Evento em Marau, RS, está coordenando a retomada dos processos da cidade de Porto Alegre como Cidade Educadora e pontuou a importância do pertencimento e do reconhecimento dos talentos como parte fundamental.

Citando Marcel Mauss em Ensaio sobre a dádiva, reflete sobre o dom, sobra a graça. A partir do DAR, do RECEBER e do RETRIBUIR, ocorre o reconhecimento dos dons de cada um. A partilha de saberes oportuniza da gente se dar, se dar no dom: receber e retribuir. Observa-se a necessidade de potencializar territórios e favorecer o pertencimento,sobretudo das crianças e dos mais velhos.

Que cidades criamos onde esquecemos as origens e as conexões com os territórios, com os lugares onde vivemos e habitamos? Sem reconhecer as pessoas, as suas histórias, os seus desejos, não vale a pena.

Como as Cidades Educadoras trabalham com as contradições e com as diferenças de pensamento?

Pelo observado e apontado nas falas do evento, “um dos desafios da Cidade Educadora é promover o equilíbrio e a harmonia entre a identidade e a diversidade, tendo em conta os diversos contributos das comunidades que a constituem e o direito de todas as pessoas que nela vivem a sentirem-se reconhecidas pela sua identidade cultural própria. Para tal, é imperativo lutar contra o racismo e todas as formas de exclusão. O desafio atual é reconhecer o direito às singularidades sem colocar em risco a construção do que é comum. As Cidades Educadoras sentem-se portadoras do ideal de inclusão, acolhendo cada pessoa como ela é e convidando-a a participar num projeto comum de cidade”. (fragmento Carta das Cidades Educadoras)

Neste sentido, a pedagogia do diálogo fará aumentar as potências, a tração para novas perspectivas e soluções das cidades. É necessário conviver com o outro e não destituí-lo de seu legítimo espaço e lugar de fala.

A potência de uma cidade educadora está no fato de valorizar todas as pessoas, quando as mesmas ressignificam as suas vivências e histórias, quando são acolhidas em seu trabalho e suas habilidades e talentos, quando o poder público realiza diálogos com seus entes e articula políticas públicas a partir da percepção e da necessidade das pessoas. Uma cidade educadora não pode ser um conjunto esporádico de empregos, mas quando se transforma numa política de estado, com perspectivas de continuidade nas ações.

Cidade educadora não assume somente protagonismo disfarçados de cidadania como “Ação Global”, mas reconhece os diferentes protagonismos dos sujeitos da cidade, promove permanentemente eventos e oportunidades de cidadania e vivência de direitos. Todo espaço da cidade é um espaço educador.

Cidades Educadoras sob a ótica dos professores e professoras

Como afirma o provérbio africano, “é preciso uma aldeia inteira para educar uma criança”. Os professores e professoras darão sua contribuição para que suas cidades sejam verdadeiramente Educadoras, mas precisam do reconhecimento com aquilo que os conecta, que os envolve no trabalho pedagógico dentro das salas de aula e nas comunidades em que nossas escolas estão inseridas.

Como Cidade Educadora não é, de longe, uma ação específica da Secretaria Municipal de Educação, os professores/as e as suas escolas, a partir das respectivas comunidades escolares, podem fazer importantes ligações e interfaces com as demandas e as necessidades das comunidades locais. A escola pode se tornar um centro irradiador de estudos, de articulações e de realização de atividades que reúnam os diferentes sujeitos sociais das comunidades.

Os professores e professoras de uma Cidade Educadora precisam ser valorizados, reconhecidos e convidamos para serem também os protagonistas da mudança das realidades, a partir dos territórios que circundam as comunidades escolares.

Os princípios da Carta das Cidades Educadoras

Consultamos a Carta das Cidades Educadoras e destacamos, para conhecimento de todos que:

“Na Cidade Educadora, a educação transcende as paredes da escola para impregnar toda a cidade. Uma educação para a cidadania, na qual todas as administrações assumem a sua responsabilidade na educação e na transformação da cidade num espaço de respeito pela vida e pela diversidade.

A Cidade Educadora vive um processo permanente que tem como finalidade a construção da comunidade e de uma cidadania livre, responsável e solidária, capaz de conviver na diferença, de solucionar pacificamente os seus conflitos e de trabalhar “pelo bem comum”. Uma cidadania consciente dos desafios que a humanidade enfrenta atualmente, com conhecimentos e competências que lhes permitam tornar-se corresponsáveis pela procura de soluções exigidas pelo momento histórico que vivemos”. (Preâmbulo da Carta das Cidades Educadoras)

São princípios de uma cidade Educadora:

O DIREITO À CIDADE EDUCADORA

 Educação inclusiva ao longo da vida Política educativa ampla;

Diversidade e não discriminação;

Acesso à cultura Diálogo intergeracional.

O COMPROMISSO DA CIDADE

Conhecimento do território;

Acesso à informação;

Governança e participação dos cidadãos;

Acompanhamento e melhoria contínua;

Identidade da cidade;

Espaço público habitável;

Adequação dos equipamentos e serviços municipais;

Sustentabilidade.

O SERVIÇO INTEGRAL DAS PESSOAS

Promoção da saúde;

Formação de agentes educativos;

Orientação e inserção laboral inclusiva Inclusão e coesão social;

Corresponsabilidade contra as desigualdades;

Promoção do associativismo e do voluntariado;

Educação para uma cidadania democrática e global.

Como podemos observar, os princípios da Carta que são assinados e assumidos pelas cidades educadoras apontam para uma exigência cada vez maior de cidadania e de reconhecimento dos direitos de todos os cidadãos e cidadãs da cidade. Quem imaginar que Cidade educadora é apenas um prêmio ou um slogan logo perceberá que haverá cobranças e exigências legítimas da população sobre a qualidade dos serviços e as oportunidades de cidadania para todos.

E que futuro nos reservas, Cidade Educadora?

Como lembrado na abertura dos trabalhos em Marau, pelo Professor Márcio Taschetto, fazendo referência a Millôr Fernandes: “há muito passado no futuro do Brasil”. Então como poderemos, a partir de um legado histórico assentado em valores pouco nobres, como escravidão, desigualdade social, violência impregnada em nossa sociedade, sucessivos golpes de estado, falta de saneamento básico… fazermos essa ruptura?

Temos certeza que não é uma tarefa fácil, afinal, problemas complexos e estruturantes demandam da mesma forma, respostas complexas e estruturantes. Em algum momento teremos de dar o primeiro passo em direção a sociedade que almejamos.

Séculos vivenciando as infelizes experiências citadas acima, servem ao menos para ilustrar que tipo de sociedade não queremos? E isso já é muito.

Sabedores do horizonte que buscamos, nossas cidades devem intensificar seu papel de acolhimento e de reconhecimento das habilidades de cada cidadão que a habita.

Que nossas cidades sejam espaços de oportunidade, onde todos possam nela se desenvolver e, da mesma forma, contribuir para outros se desenvolvam e assim, se tornem seres humanos felizes.

Que possamos conviver com o contraditório, onde o calor do debate seja acolhido e não suprimido, pois um dos princípios básicos da democracia é a divergência. Temos certeza que assim nos tornaremos uma sociedade mais solidária e fraterna.

Como referido anteriormente, não se trata de uma tarefa fácil, mas como dizia Eduardo Galeano, as utopias são necessárias para continuarmos indo em frente: “A utopia está lá no horizonte. Me aproximo dois passos, ela se afasta dois passos. Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos. Por mais que eu caminhe, jamais alcançarei. Para que serve a utopia? Serve para isso: para que eu não deixe de caminhar.”

Imagens do evento: Créditos Divulgação Iura Kurtz, Prefeito Municipal de Marau, RS.

Se interessar, acesse evento gravado e disponibilizado neste link: https://fb.watch/d7eRX2oULV/

Autor: Tiago Machado

Edição: Alexsandro Rosset

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