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Vida a Crédito

Será que precisamos comprar tudo aquilo que desejamos para ter uma vida feliz?

Vida a Crédito é o título de um dos livros do sociólogo polonês Zigmunt Bauman (Zahar, 2010), no qual analisa profundamente a recessão iniciada em Wall Street, nos Estados Unidos em 2008, e que rapidamente atormentou o mundo todo. Em tempos de crise como estamos vivendo, onde os noticiários não cessam de anunciar a falta de dinheiro e o endividamento generalizado, a leitura e estudo de Vida a Crédito pode nos ajudar a entender melhor os fatores da crise e a possibilidade de aprendermos com os erros.

Bauman inicia sua análise dizendo que estamos vivendo nas últimas décadas uma transição da sociedade de produtores (onde os lucros eram obtidos sobretudo da exploração do trabalho assalariado) para a sociedade de consumidores (onde os lucros são oriundos sobretudo da exploração dos desejos de consumo).

Para “alimentar” a sociedade do consumo e criar sempre mais “fome” de consumir, a “filosofia empresarial” criou um conjunto de estratégias, cujas finalidades sejam satisfeitas e, de preferência, induzir, capturar e ampliar novas necessidades e desejos de consumo.

Para garantir essa prática consumista insaciável e retroalimentar o desejo sempre insatisfeito de comprar cada vez mais, a oferta de crédito por meio de empréstimos se tornou imprescindível. Por essa razão, assistimos nos últimos anos a introdução de cartões de crédito em quase todas as camadas sociais.

O lema básico desta nova forma de vida foi: “não adie a realização do seu desejo”. Com um cartão de crédito em mão se tornou possível “desfrutar agora e pagar depois”. O cartão de crédito criou a doce ilusão de que “cada um é livre para administrar sua própria satisfação” e obter as coisas que desejar, sem esperar o tempo para juntar recursos suficientes para comprá-la. Assim, do automóvel ao vestuário, do jantar em um restaurante sofisticado à viagem dos sonhos, da televisão gigantesca à festa inesquecível, tudo se resume em antecipar o prazer e retardar a realidade.

No entanto, como nos adverte o próprio Bauman, não pensar no “depois” significa, como sempre, acumular problemas. Quem não se preocupa com o futuro pagará um preço pesado pela sua imprudência. Mais cedo do que tarde se descobre a triste e desagradável realidade de que “o prazer da satisfação” se transformou na “punição da cobrança”.

Assim, a falta de planejamento dos gastos, a suposta facilidade do crédito e a felicidade efêmera do consumo se tornaram rapidamente em pesadelo, mal-estar, incômodo, depressão e tantas outras patologias provenientes desta embaraçosa situação.

A dura realidade se faz sentir, principalmente, quando se anuncia uma crise, quando aquilo que parecia funcionar tão bem perde, sem aviso prévio, o rumo dos acontecimentos. E como já dizia a lei de Murphy “que se algo pode dar errado, dará”, nos damos conta que até o crédito para pagar nossas dívidas vai se tornando escasso, difícil, impagável.

Aos poucos nossa própria vida, considerada o bem mais precioso e inalienável, se transforma num objeto de venda, de troca, de hipoteca. E assim nos tornamos escravos de nossos próprios desejos e de um monstro invisível chamado consumismo que toma conta de nossas escolhas.

Os antigos nos ensinaram que a prática da prudência e o exercício da reflexão podem se tornarem o remédio amargo para nos curarmos de nossos próprios desejos e de nossa própria servidão.

Cabe, por fim, um questionamento: será que precisamos comprar tudo aquilo que desejamos para ter uma vida feliz?

Para os que desejarem conhecer mais o pensamento de Bauman, além das leituras do seu livro, sugiro o Dicionário Crítico-Hermenêutico que acaba de sair e está disponível publicamente em PDF.

Segue o link de acesso: https://www.researchgate.net/publication/356290134_Dicionario_Critico-Hermeneutico_Zygmunt_Bauman

Autor: Dr. Altair Alberto Fávero

Edição: Alex Rosset

O ano letivo termina. Que ano foi esse? Que ano virá?

Podemos fazer a diferença na vida dos alunos. O ano que finda, tão desafiador e singular, nos permite o reforço desse pensamento. Permite também ampliar a certeza de que o papel do professor é imenso, intenso, para além da visão que se reduz ao ensino, que tanto insistem em enfatizar, com o propósito de diminuir ou anular toda a grandiosidade e força das relações que só se constituem na escola.

Reconhecemos que foi um ano desafiador. Por tudo!

A situação pandêmica causada pelo Covid-19, o retorno à escola na modalidade híbrida e, posteriormente, o desafio do retorno totalmente presencial. Mesmo estando no final do percurso, o que temos em maioria são estudantes em processo de construção de vínculos afetivos com professores e especialmente com o grupo que, durante o escalonamento, não teve a convivência garantida e plenamente satisfeita.

Mesmo que o ano acabe, o que temos em maioria são estudantes desejosos pela vida escolar, dinâmica, viva.  A escola é o lugar que querem estar, permanecer, viver. Isso porque a modalidade remota, lamento informar, não se configurou como a mais desejada, embora ainda tenha quem acredite nisso.

 Mesmo que o fim do ano esteja próximo, reconhecemos que no percurso dele acabamos por desenvolver capacidades que nos permitiram crescer. Quem não aprendeu diante dos desafios deste ano? Sem contar o ano de 2020. É porque somos feitos de desafios! São eles que nos fazem crescer enquanto humanos.

O fato é que ninguém gosta de se sentir sacudido, de lá para cá, ou de cá para lá, sem direção, como se o piloto tivesse abandonado a embarcação. São rotinas muitas vezes distantes ou distorcidas em relação ao que de fato é necessário. O que se pretende dizer com isso?

Que, ao final deste ano, seja possível afirmar que houve uma entrega plena e verdadeira no que fizemos enquanto educadores, e por essa razão nos tornamos melhores em muitas dimensões.  Inclusive para dizer que tudo tem limite! Chegamos ao limite em relação ao uso tecnológico-remoto e nos tornamos ávidos pelo cheiro da escola (mesmo com máscara), barulho da sala de aula, olho no olho e toque (com muito álcool em gel depois).

O professor precisa olhar, ouvir, sentir, tocar. Tem que perceber para além do que os alunos demonstram. O que acontece na escola, e só na escola, e está inteiramente ligado e dependente com o que se passa com seus alunos fora dela.  E a modalidade remota não tem esse alcance! Lamento, mas não tem. Por isso que a escola é mais do que um espaço privilegiado para o ensino, é sobretudo um espaço social, diverso e complexo de relações. Enquanto professor, se os olhos se fecharem para isso, certamente restará o fracasso.

É que na condição de professor, é no chão da escola que se pode fazer a diferença na vida dos alunos. Claro, se eles forem o foco. E convenhamos, é questionável se no atual cenário eles de fato são o foco. Parece que estamos nos distanciando cada vez mais desse propósito, apesar de ter quem discurse o oposto. Mas, como dito anteriormente, nos capacitamos muito durante este tempo difícil, tanto que podemos dizer tudo tem limite! Sabemos o que estão fazendo. Sabemos dos seus planos futuros…

Na condição de professor, podemos fazer a diferença na vida dos alunos. O ano que finda, tão desafiador e singular, nos permite o reforço desse pensamento. Permite também ampliar a certeza de que o papel do professor é imenso, intenso, para além da visão que se reduz ao ensino, que tanto insistem em enfatizar, com o propósito de diminuir ou anular toda a grandiosidade e força das relações que só se constituem na escola. 

Como nos humanizamos? Assista: https://youtu.be/Il_XyDpcsgY?t=12

As modificações da sociedade exigem agilidade dos profissionais da educação em relação ao rendimento dos estudantes. Para cumprir com as determinações legais e alcançar o perfil em voga, os professores acabam por se amparar em programas e projetos que (de)formam exclusivamente para um tipo de sociedade. Dito de outro modo, logo perceberemos a competição entre nossas escolas, num ambiente restritivo, que não contempla os sentidos plurais e inteligentes do ser humano. Estaremos imersos em práticas verticalizadas que encerram o ser humano num mundo desprovido de possibilidades, isso tudo porque se tem como pano de fundo a lógica da competição e da lucratividade. 

No entanto, em contextos social, cultural e economicamente diversos, mais do que conhecer as realidades, é fundamental compreender as situações em que os indivíduos vivem (ou muitas vezes sobrevivem).

Então, qual é conhecimento que se consolida como essencial e que se torna o diferencial na vida do aprendiz? É aquele que permite entender o outro.  Para tanto, é necessário que nos coloquemos no lugar desses outros, com a acolhida, a escuta e a relação humanizada. Isso é o que deveras importa.  Essa perspectiva ultrapassa o processo de ensino, porque almeja algo maior: a compreensão do outro.  E quando alcançamos esse entendimento, conseguimos fazer a verdadeira diferença. Ambas as vidas mudam, a do outro e a minha. Isso é educação plena! E ao mesmo tempo, é do que mais estamos carentes!

Acontece que a escola contemporânea atua como uma empresa. Reestrutura-se para estar em concordância com os objetivos comerciais. Atende um “conjunto de discursos, práticas e dispositivos que determinam um novo modo de governo dos homens segundo o princípio universal da concorrência” (DARDOT; LAVAL, 2016, p. 17). Por esta concepção de característica utilitarista e excludente, ocorre o esquecimento da história pessoal de cada ser e os pilares necessários à vida coletiva.

A realidade de muitas escolas é dura e esgotante. Muitas vezes agimos como o professor que não gostaríamos de ser: apressado; tenso; preocupado; o que fala alto; o que faz a pergunta e dá a resposta; o que perde a paciência; o que não ouve; o que usa e abusa dos manuais; o que usa e abusa da tecnologia; o que fala sem pensar; o que só pensa e não fala; o que diz coisas que não quer e não sente; o que é absorvido pelo cansaço… Tudo isso nos faz mais fracos, e na fragilidade nos esquecemos de argumentar e combater os despropósitos que por vezes nos impõe, e um deles é o que nos limita a só transmitir conhecimento, impedindo a verdadeira compreensão do outro.

Não é fácil conseguir energia para lidar com as adversidades que surgem, mas não é momento para atirar a toalha ao chão! E é isto que deve ser lembrado e até transformado em mantra.  Temos que pensar no ano que virá e oferecer uma educação de qualidade, independente das imposições! E isso implicará alguns embates, pois não haverá garantia dela sem eles. E a qualidade requer que alguns direitos sejam assegurados/respeitados. Mas quais direitos?

De ter uma escola permeada por relações dialógicas. De ter uma escola com possibilidades para aprender com o outro. De ter uma escola que seja possível conhecer e compreender o outro. De ter uma escola que seja possível participar. De ter uma escola comprometida com memórias, momentos e experiências e situações de vida. De ter uma escola que permita a leitura do mundo. De ter uma escola consciente e crítica acerca da realidade, e disposta a agir para melhorá-la. De ter uma escola que prefere cooperar ao invés de competir. De ter uma escola de resistência ao que (de)forma e (des)educa. De ter uma escola com capacidade e coragem para dizer: NÃO. ISSO NÃO É EDUCAÇÃO!

As escolas só serão locais de profusão de solidariedade se fizerem de seus espaços, locais onde se alimenta sonhos. Há muito as escolas deixaram de ser o local onde se vive sonhos. (Everaldo Reis) Leia mais: https://www.neipies.com/escolas-mais-solidarias-pos-pandemia/

Referências bibliográficas:

DARDOT, Pierre; LAVAL, Christian: A escola não é uma empresa: o neoliberalismo em ataque ao ensino público. São Paulo: Boitempo, 2019.

DARDOT, Pierre; LAVAL, Christian:  A nova razão do mundo: Ensaio sobre a sociedade neoliberal. São Paulo: Boitempo, 2016.

Autora: Ana Lúcia Vieira

Edição: Alex Rosset

 

Meninos pensantes, sábios e capazes de solucionar problemas

Apresentamos pequenas histórias de meninos que sabem muitas coisas e que acreditam no poder de suas ideias. Meninos que sabem gerenciar suas emoções, que sabem superar suas tristezas, que lidam com as surpresas da vida e que não tem medo de lidar com suas tristezas.

A partir de cada pequena história, seguem propostas de atividades pedagógicas que podem ser aplicadas com estudantes das séries iniciais do Ensino Fundamental.

O menino que gerenciava as suas emoções

Era uma vez um menino que aprendeu a gerenciar as suas emoções, ou seja, ele não perdia o controle das coisas, nunca ficava nervoso ou tenso demais e sabia o momento certo de chorar.

O menino que gerenciava as suas emoções sempre se saía bem nas rodas de conversas e nas provas da escola. Não precisava estudar muito tempo, bastava o suficiente.

O menino gerenciava as suas emoções com cuidado. Claro era que quando não suportava mais a raiva ele falava com a pessoa sobre o que estava o aborrecendo, mas nunca explodia.

Exercícios para o bom pensar.

1 – O que é gerenciar?

2 – Por que devemos aprender a gerenciar as coisas?

3 – Como gerenciar as nossas emoções?

Desenhe você gerenciando as suas emoções.

O menino tristonho

Era uma vez um menino bonito e educado que dizia ter uma tristeza grande dentro de si, uma espécie de vazio. Quiseram preencher o vazio do menino com uma bicicleta, um trem elétrico, um urso de pelúcia, mas nada disso foi suficiente. O vazio só crescia dentro do menino e a sua tristeza também.

Certo dia, o menino encontrou um amigo que gostava de ouvir os vazios das pessoas. E ficou conversando com ele a tarde inteira. Esse amigo emprestou-lhe um pensamento bom para guardar dentro do vazio. Pela primeira vez, o menino sentiu-se um pouco aliviado da sua tristeza. Porém, não sabia o que significava aquele pensamento bom do seu amigo, mas voltou no dia seguinte e pediu mais pensamentos bons para colocar dentro do seu vazio e assim foi preenchendo o vazio de pensamentos bons, de forma que a tristeza foi embora e nunca mais voltou.

Exercícios para o bom pensar.

1 – O que é a tristeza?

2 – O que é o vazio?

3 – Por que sentimos um vazio dentro da gente sempre que estamos tristonhos?

Desenhe você recebendo um pensamento bom.

O menino surpreso

O menino surpreso, às vezes sentia alegria com as coisas e noutras ficava triste. Dependia da surpresa. Há surpresas boas e outras não.

Mas quando queriam tomar uma das estrelas do seu céu, ficava surpreso e triste com aquela pessoa, pois não esperava que alguém pudesse ser mal com uma criança.

O menino surpreso sentia o coração bater mais forte e as mãos suarem com o tamanho da surpresa. Mas era apenas um menino como todo outro que gostava de surpresas boas.

Exercícios para o bom pensar.

1 – O que é uma surpresa?

2 – Por que há surpresas boas e más?

3 – Como você fica com uma surpresa boa?

Desenhe você se surpreendendo com um amigo.

O menino dos problemas

Era uma vez um menino com muitos problemas. Ele não sabia mais o que fazer com aqueles problemas que enchiam a sua cabeça. Então, ele teve uma grande ideia.

O menino dos problemas foi olhar as montanhas, os rios, as árvores e os pássaros, entregou a cada um deles um pouco dos seus problemas.

Daquele dia em diante, o único problema do menino era cuidar das suas galinhas barulhentas, pois entregou à natureza tudo aquilo que o perturbava.

Exercícios para o bom pensar.

1 – O que são problemas?

2 – Por que os problemas nos sufocam?

3 – Como os problemas nos afligem?

Desenhe você resolvendo um problema.

Autora: Rosângela Trajano

Edição: Alex Rosset

Orçamento 2022 fica devendo para saúde e educação

Na manhã desta terça-feira (23), antes de sair para a terceira semana da sua caravana pelo Rio Grande do Sul, a direção do CPERS esteve na Assembleia Legislativa reivindicando aos deputados um destaque na emenda que prevê a reposição salarial de 47,82% no salário de professores e funcionários de escola, ativos e inativos na LOA 2022. 

Leia mais sobre a Caravana pelo Rio Grande do Sul: https://cpers.com.br/caravanacpers-escancara-descaso-do-governo-leite-com-a-educacao-e-mobiliza-mais-de-dez-cidades/

A emenda foi protocolada no projeto de lei do orçamento de 2022, mas foi rejeitada pelo relator do projeto na Comissão de Finanças.

O sindicato agora solicita o apoio dos deputados em garantir que a proposta seja rediscutida pelo pleno durante a votação em plenário.

Segundo análise do DIEESE, na LOA de 2022 o executivo estima um crescimento de 6,9% na arrecadação e maior receita em comparação a 2021, no entanto, o investimento em educação diminui 0,3% da sua fatia no orçamento e a previsão de gastos com pessoal também cai 3,3%. Para os altos salários do TJ, MP e Assembleia Legislativa, o governo do Estado prevê dotação de aumento

“Estamos percorrendo o estado e mostrando a realidade da educação pública: as escolas estão sucateadas e nossos salários defasados. A gestão Eduardo Leite não avança, ela retrocede! A educação não pode mais esperar. Pedimos apoio dos parlamentares que acreditam na força da escola pública para que peçam destaque e reavaliem a proposta de reposição salarial dos educadores(as)”, afirma a presidente do Sindicato, Helenir Aguiar Schürer.

Na agenda, os dirigentes do CPERS puderam conversar com os deputados Valdeci Oliveira (PT), Pepe Vargas (PT), Zé Nunes (PT) e Issur Koch (PP), que manifestaram apoio à iniciativa. O presidente da ALERGS, Gabriel Souza (MDB), recebeu a comitiva e se comprometeu em levar para a avaliação da bancada.  

O CPERS seguirá com a mobilização junto aos parlamentares nos próximos dias. Clique aqui e contate os parlamentares reivindicando apoio à #ReposiçãoJá!

Saúde em apuros

Não é só a educação pública que está sofrendo com a previsão orçamentária do governo Leite para 2022.  56 hospitais gaúchos foram atingidos pelos cortes do governo Leite no chamado Programa Assistir.

Edição: Alex Rosset

A brasileira que os jornais esconderam

A brasileira que falou para o mundo mora em Rondônia, tem 24 anos, é do povo Paiter Suruí e fundadora do Movimento da Juventude Indígena no Estado. Txai é estudante de Direito.

Não, esta bela foto de Txai Suruí em Glasgow não é de nenhum grande jornal brasileiro. É de uma reportagem do The New York Times sobre a brasileira que brilhou na abertura da COP26.

Enquanto Txai Suruí discursava para os líderes mundiais, em defesa da Terra, dos povos e dos bichos das florestas, o presidente do Brasil fazia turismo na Itália ao lado do filho Carluxo e de um grupo de militares.

A foto é de Oli Scarff, da France-Presse/Getty Images. Nenhum dos grandes jornais brasileiros, nenhum, deu na capa a foto de Txai Suruí. Nem essa, nem a do discurso. Deram só nos cantinhos. Essa aí, tirada do NYT, também está no UOL.

A brasileira que falou para o mundo mora em Rondônia, tem 24 anos, é do povo Paiter Suruí e fundadora do Movimento da Juventude Indígena no Estado. Txai é estudante de Direito.

O único jornal online da grande imprensa que deu ontem na capa do site a foto de Txai Suruí discursando em Glasgow foi o Globo. Só os jornais, sites independentes e blogs destacaram a presença da estudante.

Hoje, nenhum dos grandes jornais deu a imagem na capa em suas versões impressas.

Nos anos 70, nos piores momentos da ditadura, quando as redações eram tomadas por militantes ambientalistas, é quase certo que Txai Suruí seria imposta aos editores pelos repórteres de ecologia (como eram chamados) como imagem de capa.

Hoje, não. Txai Suruí somente sairia na capa dos jornais se estivesse vestindo uma camisa do Flamengo com a propaganda das lojas do dono da Havan.

Abaixo, o discurso que a brasileira fez na aberta da conferência:

“Meu nome é Txai Suruí, eu tenho só 24, mas meu povo vive há pelo menos 6 mil anos na floresta Amazônica. Meu pai, o grande cacique Almir Suruí me ensinou que devemos ouvir as estrelas, a Lua, o vento, os animais e as árvores.

Hoje o clima está esquentando, os animais estão desaparecendo, os rios estão morrendo, nossas plantações não florescem como antes. A Terra está falando.

Ela nos diz que não temos mais tempo.

Uma companheira disse: vamos continuar pensando que com pomadas e analgésicos os golpes de hoje se resolvem, embora saibamos que amanhã a ferida será maior e mais profunda?

Precisamos tomar outro caminho com mudanças corajosas e globais. Não é 2030 ou 2050, é agora!

Enquanto vocês estão fechando os olhos para a realidade, o guardião da floresta Ari Uru-Eu-Wau-Wau, meu amigo de infância, foi assassinado por proteger a natureza.

Os povos indígenas estão na linha de frente da emergência climática, por isso devemos estar no centro das decisões que acontecem aqui. Nós temos ideias para adiar o fim do mundo.

Vamos frear as emissões de promessas mentirosas e irresponsáveis; vamos acabar com a poluição das palavras vazias, e vamos lutar por um futuro e um presente habitáveis.

É necessário sempre acreditar que o sonho é possível.

Que a nossa utopia seja um futuro na Terra.

Obrigada!”

 Autor: Moisés Mendes

Edição: Alex Rosset

Antes de novos modelos, mudemos as escolas que existem!

Não precisamos construir escolas modelos para mudar a educação. Temos que mudar as nossas! Temos que mudar nossos pensamentos e atitudes. Temos de sair do ostracismo, abrindo-nos ao estudo, formações, mudanças e à superação de velhos conceitos.

“Meus cumprimentos a todas as autoridades presentes nesta solenidade de reconhecimento do Professor Emérito, na qual sou a agraciada neste ano de 2021.

Boa tarde meus professores, alunos, funcionárias da Escola Municipal de Ensino Fundamental Daniel Dipp, de Passo Fundo, RS, e família.

Não posso fugir dos tradicionais agradecimentos, pois seria injusto receber o Título de Professora Emérita 2021 sem agradecer quem esteve junto comigo.

Deus, meu fiel Pai.

Muito obrigada aos filhos Marcelo e Gabriel por todas as vezes que não dei atenção a vocês pois estava trabalhando, mesmo fora de horário, sábados, domingos, feriados e férias. Creio que, por muitas vezes, se sentiram deixados de lado e não entendiam o porquê de tanta dedicação. Hoje, vocês, filhos, homens feitos, conhecem a minha missão e orgulham-se de sua mãe.

Obrigada meu esposo Jaime que também por várias vezes deixei de lado, mas sempre esteve ao meu lado, me apoiando, incentivando e buscando colaboração financeira junto aos amigos para ajudar a escola.

Minhas noras amadas, Cristine e Samara, filhas que Deus me deu.

Em 2016, quando entrei para direção desta escola, sempre tive uma equipe maravilhosa. Em primeiro lugar a vice diretora Nádia Bolzam que sempre esteve junto. Amiga querida e irmã de coração. Sonhamos juntas e batalhamos para que acontecesse. Sempre digo que ela é a razão e eu a emoção. Minha vice guerreira e missioneira.

 Agradecer a colegas que fizeram parte das gestões passada.  Soeli Cavalheiro e Thiane Vargas que acreditaram em uma proposta nova para a escola, sempre estiveram batalhando juntas.

Meu muito obrigada a Angela Lili Heidrich, nossa coordenadora impecável, sempre com tudo em dia e muito bem-feito. Pessoa simples de coração imensurável, juntamente com a coordenadora Camila Santos, nossa cantora, nosso espirito jovem, pessoa determinada. Obrigada Maria Andreia, nossa orientadora educacional e que cuida de nossos alunos e da espiritualidade. Agradeço a Vera Mazuco por todo olhar carinho e dedicação com nossos alunos incluídos.

Assim, agradeço meus professores, professoras, funcionárias que nunca me abandonaram, nem mediram esforços para que a Escola melhorasse cada vez mais. Mesmo nas minhas ideias mais malucas, sempre estiveram juntos.

Obrigada Andréia e Cidinei, meus secretários que tornam nossos dias mais leves e abençoados.

Aos meus alunos, obrigada por serem o objetivo maior de nossas lutas.

Uma escola é feita de olhar, de diagnósticos, de amor, de cor, de vida, de toque, de transformações constantes, onde o aluno consiga ler o mundo e suas descobertas, desvende suas curiosidades e dúvidas e seja protagonista da sua vida.

Não precisamos construir escolas modelos para mudar a educação. Temos que mudar as nossas! Temos que mudar nossos pensamentos e atitudes. Temos de sair do ostracismo, abrindo-nos ao estudo, formações, mudanças e à superação de velhos conceitos.

Reconheço que fizemos uma trajetória juntos nesta escola, centrados na ideia de uma escola humanizadora, uma escola em que todos e todas se sintam felizes, trocando experiências, aprendendo e ensinando.

Mas reconheço, sobretudo, a necessidade de qualidade. Qualidade significa melhorar a vida das pessoas, de todas as pessoas. Precisamos um olhar de integralidade, onde nossos alunos de periferia tenham a melhor educação para concorrer com demais alunos. A qualidade da educação é condição da eficiência econômica.

Na atual conjuntura social, existe a exigência de autonomia intelectual, capacidade de pensar, de agir e reagir, criatividade, “de ser cidadão”.  Estamos em uma fase nova, uma visão nova sobre a educação onde o espaço escolar está sendo integrado pelas tecnologias.

 Peço aos nobres vereadores que a educação seja a meta de seus mandatos. Não teremos saúde, segurança, desenvolvimento se não tivermos políticas públicas voltadas a educação. São metas a curto, médio e longo prazo. Mas precisamos ter este olhar sim.

Confesso a vocês que sempre fui filiada em um partido, hoje vou contar a vocês: PE (Partido da Educação). É por ele que que luto diariamente. Como seria proveitoso se tivéssemos muitos confrades, lutando pelo mesmo ideal.

Excelentíssimo Senhor prefeito Pedro Almeida, tenha sempre como a meninas dos seus olhos as escolas de Passo Fundo. Somos profissionais comprometidas. Podemos ser referência de melhor Cidade Educadora, temos todas as condições de despontar na educação. Acreditamos no seu governo. Acredite, confie e valorize seus professores e funcionários.

Como diz Arthur Lews: Educação nunca foi despesa. Sempre foi investimento com retorno garantido!

Em nome do ilustríssimo Sr. Adriano Canabarro – Secretário de Educação – quero imensamente agradecer a Secretaria de educação que sempre teve muito respeito e carinho por minha pessoa e pela escola. Secretário de Educação. O Senhor é nosso timoneiro, conduza-nos de forma humanitária, transparente. O senhor é o tripulante responsável pela navegação da educação em nossa cidade.

Ser emérita 2021 é uma honra, e agradeço cada voto e confiança em minha pessoa. Porém, divido este prêmio com todas as pessoas envolvidas na educação de Passo Fundo.

Muito obrigada!”

Autora: Ana Delise Claich Cassol, mensagem lida no ato formal de reconhecimento do Professor Emérito 2021.

“No Dipp, não há sala da diretora. A direção é um espaço amplo, onde todos podem estar. Fazer com que os alunos sentissem medo da equipe diretiva nunca foi a intenção de Ana Delise, pelo contrário, ela acredita em conversas abertas e em dar chances. Embora seja firme – uma ‘tigra’ – quando é preciso. “Quando o aluno tem medo da diretora é porque a única metodologia utilizada é a da ameaça. Nesses casos, não existe liberdade para o estudante”. Leia mais: https://www.neipies.com/da-sala-de-aula-para-o-mundo/

Título Professor Emérito

Através de lei municipal, anualmente, um professor em atuação na rede municipal de ensino em Passo Fundo, RS, é homenageado. O reconhecimento é prestado pelo município por meio de indicações dos educadores de todas as escolas. A escolha foi efetuada através de consulta on-line.  

A entrega do título foi feita oficialmente pelo Município no dia 12/11/2021.

Créditos foto de capa: Diogo Zanatta

Outras fotos: Divulgação/arquivo pessoal/ Márcia Machado/CMPF

Edição: Alex Rosset

O que é greenwashing e por que falar sobre isso com as crianças?

O greenwashing corresponde a uma propaganda enganosa feita por organizações que divulgam informações sobre defesa do meio ambiente. Porém, na realidade essas empresas não praticam nenhuma ação que colabore com a minimização dos impactos ambientais.

O cantor e compositor Toquinho canta na sua bela canção Natureza Distraída os seguintes versos “Quando a natureza distraída / Fere a flor ou um embrião / O ser humano, mais que as flores / Precisa na vida / De muito afeto e toda compreensão”.

Assista ao vídeo: https://youtu.be/wS1txfDk2eo?t=25

Com isso, ele quer nos dizer que o ser humano precisa de amor, de respeito, de liberdade e, principalmente, da sua dignidade garantida para poder sentir-se bem e poder viver de uma forma que toda igualdade de direitos seja-lhe resguardada sem mentiras ou maldades que acabam prejudicando as relações sociais.

Tenho um professor que gosta de falar da natureza não essa natureza orgânica ou essa natureza que se apresenta aos nossos olhos como plantas e animais, mas de uma natureza que se sobressai as aparências do olhar humano, que se localiza na consciência de si para mostrar o ser na sua mais pura essência, esse ser que é constituído pelo lado bom e mau de uma sociedade regida por leis e normas que nem sempre são respeitadas. Muitas vezes o homem é o lobo de si mesmo, assim como dizia Hobbes.

Esta natureza da qual o meu professor gosta sempre de falar traz-nos uma possibilidade de refletir sobre a forma como agimos uns com os outros, com nós mesmos e com aqueles que são mais frágeis e estão propensos a serem enganados com as nossas falsas ideias e mentiras que inventamos muitas vezes tendo em vista vantagens ligadas à economia de um capitalismo que nos engole todos os dias com as suas mais diversas mesquinharias e propagandas enganosas a respeito de coisas que dizemos fazer ou ter e, na verdade, não as fazemos e nem as temos. Por que somos assim? Por que mentimos?

Quero hoje, junto com vocês, refletir sobre o termo inglês “greenwashing”. O seu significado em português é “lavagem verde”. O seu surgimento tem muito a ver com a forma como nos comportamos atualmente diante das nossas preocupações com o meio ambiente e a sua sustentabilidade.

A forma como agimos para que o planeta possa respirar melhor e haja menos lixo nas praias e mais uso consciente de produtos ecológicos. Sim, estamos mais preocupados com o meio ambiente do que estávamos há algumas décadas e isso tem sido bom porque influenciamos empresas e empresários, governos e autoridades, ONGs e até mesmo pessoas físicas a se conscientizarem de que o melhor para o mundo é produzir sem agressão ao meio ambiente.

Contudo, muitas dessas empresas ou pessoas físicas estão mentindo para nós quando dizem nos rótulos dos seus produtos e nas suas propagandas nas diversas mídias, que são sustentáveis e ecológicas. Muitas até mesmo chegam a conquistarem selos verdes de instituições que apoiam quem ajuda o meio ambiente. Ao invés de protegerem o meio ambiente como afirmam, essas empresas muitas vezes colaboram para a sua poluição. Não fazem o que nos dizem.

O greenwashing corresponde a uma propaganda enganosa feita por organizações que divulgam informações sobre defesa do meio ambiente. Porém, na realidade essas empresas não praticam nenhuma ação que colabore com a minimização dos impactos ambientais. Na verdade, muitas vezes essas organizações fazem exatamente o contrário do que divulgam.

Essas organizações através de rótulos verdes, certificados ou marketing de verde, utilizam termos que fazem o consumidor acreditar que está consumindo produtos ecológicos e sustentáveis. Nos passam uma ideia de que estamos consumindo produtos que contribuem com a sustentabilidade do meio ambiente, mas na verdade elas não adotam nenhuma prática sustentável em seus processos ou aquele determinado produto não traz
nenhuma proteção ambiental, pelo contrário, gera sérios impactos negativos ao meio ambiente.

Essa má prática de marketing verde surgiu com o aumento de consumidores preocupados com o meio ambiente e que só compram de empresas sustentáveis. A fim de conquistar esse mercado consumidor de grande expressão na economia, diversas organizações passaram a utilizar uma comunicação com apelos ecológicos em seus rótulos. O consumidor acredita no que lê nesses rótulos e sempre compra o produto da empresa que diz preocupar-se com o meio ambiente porque ele também está preocupado com o bem-estar do planeta. Mas não sabe que está sendo enganado.

Assim, como grande parte das empresas são os políticos e pessoas físicas que se dizem preocupadas com o meio ambiente. Nos períodos de eleições, os políticos sobem nos seus palanques para anunciarem obras e projetos que visam a despoluição de rios e lagoas, a limpeza de lixos das praias, coletores de lixos eletrônicos em pontos estratégicos e etc., mas dizem tudo isso da boca pra fora. Mentem para os seus eleitores. O objetivo é conquistar votos dos menos informados e se elegerem.

Do mesmo jeito ocorre com muita gente que se diz ativista ambiental. Pessoas físicas que se autodeclaram preocupadas com o meio ambiente e que jogam garrafas plásticas pelos vidros das janelas dos seus carros ou jogam lixo no terreno baldio perto de casa quando não tem ninguém na rua ou é madrugada. Essas pessoas pensam que estão nos enganando. Na verdade, elas estão enganando a si mesmas e contribuindo para um mundo cada vez mais doente.

As crianças nas suas inocências não tomam conhecimento desse tipo de prática e acabam pedindo aos pais ou responsáveis que comprem este ou aquele produto de tal indústria porque viu na propagando da televisão que ela cuida das florestas e dos animais. Sim, as crianças também são enganadas porque mesmo tão pequeninas já são consumidoras de muitos produtos como biscoitos recheados, sucos engarrafados, produtos de higiene e vestimentas. Muitas vezes são levadas pelos pais para fazerem a feira juntos ou comprarem algo bacana no shopping.

Cabe aos professores e aos pais ensinar as crianças sobre o significado da prática do greenwashing e incentivá-las a pesquisarem os históricos dessas empresas que fabricam os produtos e brinquedos que tanto gostam para terem a certeza se praticam mesmo o cuidado com o meio ambiente. As crianças são grandes curiosas e como têm mais tempo do que os adultos podem passar mais horas na internet pesquisando sobre essas empresas.

O nosso governo pratica o greenwashing quando tenta convencer a sociedade e as autoridades internacionais de que se preocupa com a Amazônia. As suas preocupações até o presente momento ainda não foram vistas verdadeiramente. Enquanto ele vai para a televisão falar de que não há desmatamento e que as queimadas são frutos de uma ação da natureza e que ações já estão sendo tomadas, nós vemos as nossas florestas sendo destruídas e os nossos animais sendo mortos queimados.

As crianças devem ser convidadas pelos seus professores na sala de aula para dialogarem sobre o greenwashing. Começando pela propagando enganosa até chegar propriamente no termo. Deixar que a criança exponha as suas ideias e soluções para acabarmos com esse tipo de propaganda e não nos deixarmos ser enganados. Pedir para as crianças pesquisarem sobre empresas que praticam de verdade boas práticas quanto a preservação do meio ambiente e até mesmo incentivando as crianças a escreverem cartinhas e poemas agradecendo a essas empresas pelos seus gestos e atitudes que proporcionam um lugar melhor onde vivermos.

Incentivar as crianças a criarem ideias de sustentabilidade de forma que possam mostrar nas feiras de ciências e terem essas ideias publicadas e apresentadas a algumas empresas que estejam preocupadas com a sustentabilidade. As crianças não gostam de serem enganadas. Mentir para uma criança é a coisa mais feia que um adulto pode fazer, e quando ela descobre nunca mais acredita naquela pessoa. A criança bem-informada sabe que muitas pessoas mentem quando falam em proteger o meio ambiente, mas que nada fazem para isso. Ela pode até mesmo chamar a sua atenção em público, de forma inocente, mas consciente de que você está mentindo para as pessoas. Afinal, para a criança mentir é muito feio, pois é assim que elas aprendem desde cedo.

Muitas empresas utilizam informações falsas sobre os seus produtos, ocultam características nocivas, utilizam dados incorretos ou utilizam selos e certificados que não são verdadeiros. Tudo isso é considerado greenwashing. Algumas empresas afirmam que mudaram um componente ou outro das suas fórmulas para não prejudicar o meio ambiente, mas tudo isso muitas vezes é mentira. Precisamos ter cuidado com esse tipo de informação. Investigar, pesquisar, buscar os históricos dessas empresas na Internet e consultar outros consumidores é importante para que possamos acabar com o greenwashing.

Sabemos que, atualmente, há muitas formas de se fazer propagandas e que algumas empresas se aproveitam dessa facilidade para se dizerem comprometidas com o selo verde. As redes sociais nos oferecem produtos de todas as formas e somos levados a ver vários tipos de propagandas quando estamos navegando em um site ou assistindo um vídeo. Se não tivermos cuidado essas propagandas muitas vezes são tão apelativas que acabam nos seduzindo e de uma forma inconsciente acabamos comprando os seus produtos nos supermercados porque também estão sempre mais expostos nas prateleiras e ficam mais perto dos nossos olhos.

O consumidor é o principal responsável pelo fim do greenwashing. Evitar a compra de produtos e mercadorias dessas empresas que só visam o lucro e propagandeiam o selo verde sem ser verdade é um crime ao código de defesa do consumidor. Devemos levar para as nossas casas produtos e mercadorias que cumpram com os seus deveres perante as leis que protegem o meio ambiente.

Faça com que a sua criança aprenda a ler os rótulos dos produtos e não se deixe ser levada por aquela empresa de marca que vive a fazer propagandas de sustentabilidade quando na verdade vive a derrubar árvores. Denuncie nas redes sociais e aos órgãos ambientais e do consumidor da sua cidade. A propaganda enganosa é um desrespeito para com o cidadão.

E assim como nos canta Chico Buarque em Passaredo “Te esconde, bem-te-vi / Voa, bicudo / Voa, sanhaço / Vai, juriti / Bico calado / Muito cuidado / Que o homem vem aí / O homem vem aí / O homem vem aí” que nós possamos ser esse homem, mulher, criança idoso, travesti a vigiar atentamente essas empresas que praticam o greenwashing. Coelho passa ou não passa? Passa, sim!

Autora: Rosângela Trajano

Edição: Alex Rosset

Tempos de ebulição

Segundo vários analistas, estamos avançando a passos largos na era do antropoceno. É o ser humano no centro de sua autodestruição.

A água é formada por dois átomos de hidrogênio e um de oxigênio (H2O). Aos 0ºC, congela; aos 100ºC, entra em ebulição. Cada substância química tem seu próprio ponto de ebulição, em que passa do estado líquido para o gasoso. Esse fenômeno da natureza pode servir de metáfora elucidativa do contexto presente em que vive a humanidade. Tempos de profundas, intensas, extensas e complexas metamorfoses.

Conforme analisa o sociólogo Zygmunt Bauman, são marcadamente tempos líquidos e efêmeros. Tempus fugit e galopantes. E são também tempos em ebulição.

Mas, o que é o tempo? Para alguns, ele é o senhor da história. Para outros, é remédio. Outros ainda o tem como o melhor professor. Porém, ele flui independente da nossa teimosia, rebeldia ou reprovação. É implacável, indelével e irreversível.

Contra o tempo não adianta lutar, pois que a batalha está perdida já antes de começar. Com o tempo é melhor ir a favor. Usufruir do seu favor e do seu valor. Querer defini-lo é perda de tempo, até porque é melhor vivê-lo do que tentar definir o que nos define. Entretanto, é altamente necessário refletir sobre ele. Nisso os profetas e os poetas são especialistas.  

No poema “O tempo”, Mário Quintana exprime com fineza a lógica temporal. Assim enuncia: “A vida é o dever que nós trouxemos para fazer em casa. Quando se vê, já são seis horas! Quando se vê, já é sexta-feira! Quando se vê, já é natal…  Quando se vê, já terminou o ano… Quando se vê perdemos o amor da nossa vida. Quando se vê passaram 50 anos! Agora é tarde demais para ser reprovado… Se me fosse dado um dia, outra oportunidade, eu nem olhava o relógio…”.

Assista ao vídeo: https://youtu.be/JK9SsetuLzE?t=17

Há o tempo cronológico, o psicológico e o ontológico; o tempo da feliz espera, o tempo do amor e o tempo da dor. Também o tempo da fusão e da ebulição. Já advertia o autor do livro do Eclesiastes (3,1-8) de que há tempo para tudo debaixo do céu. Todavia, em tempos como o nosso, parece prevalecer as situações de destruição. Muitas vezes tem-se a impressão de que “debaixo do céu” sobressai o purgatório com amostras vigorosas de inferno. Aquele de Dante e outros que são criados e mantidos pelos impulsos e instintos desumanos e desumanizadores.

Aqui e acolá, alguém adverte para não perder tempo. Para aproveitar bem a vida. Mas, em que consiste essa recomendação? Ela pode significar coisas bem distintas. Pode representar um estímulo ao fruir, ao consumir, ao tirar proveito prazeroso sem se importar com o sofrimento dos outros. Por outro lado, pode denotar atitude de cuidado a quem necessita, busca de crescimento na espiritualidade, no conhecimento, na solidariedade e no processo humanizatório.

Estamos dentro de uma “grande engrenagem”, condicionados por um tempo histórico e um espaço geográfico. Essa engrenagem, toda ela, está em pleno aquecimento. Não apenas em metamorfose, em rito veloz, mas também em efervescência.

Tal parábola pode aludir às questões ambientais, sociais, econômicas, políticas, culturais, religiosas, etc. Segundo vários analistas, estamos avançando a passos largos na era do antropoceno. É o ser humano no centro de sua autodestruição.

A termodinâmica não é suficiente para nos ajudar a entender a complexidade da ebulição societária e planetária que estamos experimentando. Necessário será o recurso da psicologia, da psicanálise, da psiquiatria, da teologia, da sociologia, da antropologia e de outras tantas ciências. Mas, não basta entender. É preciso agir. Quando a casa está queimando, não é suficiente identificar a causa. Será necessário utilizar com rapidez e de forma adequada os recursos para combater o incêndio. E por mais que se acelere a contenção do fogo, algum dano sempre haverá.

O globo aquece e a sociedade ferve. Nesse ambiente (chamado de meio), muitos sucumbem inteiramente. Quando não vêm a óbito, resultam marcados por sequelas. Não raro, são graves, vitalícias e irreparáveis. Ocorre que é tempo de fome, de agonia, de ódio, de violência, de pandemia, de múltiplas outras doenças; tempo de política malfadada e de necrófila economia. Tempo de corrosão das bases democráticas, dos princípios republicanos (res publica = coisa pública), de ataques à educação humanista e de degradação das belezas naturais.

E a 26ª Conferência do Clima da Organização das Nações Unidas (COP26) conseguirá chamar a atenção da humanidade para a gravidade do tempo presente?

O texto final da COP26, encerrada dia 13 de novembro, defende a redução gradativa do uso de combustíveis fósseis como forma de conter o avanço do aquecimento global. Embora os quase 200 países membros da ONU tenham assinado o documento, ele está longe de ser uma unanimidade. E entre a decisão e a concretização, geralmente há muita defasagem, muito faz de conta, muita insensibilidade com os danos impostos aos outros das presentes e das futuras gerações.

Em tempos de aquecimento e de ebulição, não há tempo a perder! O que, quem e como fazer?

Na abertura da COP26, o Secretário Geral da ONU, António Guterres, reafirmou que “é hora de dizer chega. Chega de brutalizar a biodiversidade. Chega de matarmos com carbono. Chega de tratar a natureza como um banheiro. Chega de queimar, perfurar e minerar cada vez mais fundo. Estamos cavando nossas próprias covas”. Pensamento complementado por Boris Johnson, ministro da Inglaterra, ao afirmar que “quanto mais demorarmos para agir, pior fica” e, que, “se falharmos, não seremos perdoados”, especialmente pela própria natureza. Leia mais: https://www.neipies.com/crises-climaticas-e-educacao-ambiental/

Autor: Dirceu Benincá

Edição: Alex Rosset

A fome, o bezerro de ouro e a idolatria do capital

O que para alguns simboliza a força do mercado financeiro, para outros é um símbolo da fome, da miséria e da exploração do trabalho.

Enquanto açougues vendem gordura e ossos de boi para consumo de famílias empobrecidas pela crise econômica do país, e pessoas são flagradas invadindo caçambas de lixo atrás de resto de comida, nesta semana, a Bolsa de Valores instalou a estátua do Touro de Ouro no Centro de São Paulo inspirada na Harging Bull, o touro de bronze no coração financeiro do mundo, Wall Street em Nova York. Um verdadeiro acinte à dignidade de milhões de brasileiros entregues à miséria.

O que para alguns simboliza a força do mercado financeiro, para outros é um símbolo da fome, da miséria e da exploração do trabalho.

O Harging Bull é o maior símbolo de poder da bolsa de valores de Wall Street e é uma das atrações gratuitas mais visitadas pelo turistas em Nova York. A escultura de bronze idealizada por Arturo di Modica tem se tornado no símbolo do capitalismo americano.

Muitos acreditam que esfregar a mão em seu chifre, focinho ou em seus testículos, atrai sorte, prosperidade e dinheiro. Turistas esperam horas em filhas gigantescas para tirar fotos agachados apalpando os testículos do touro. Crendices às parte, o fato é que, para quem conhece um pouco das Escrituras, é impossível não associar o símbolo do capitalismo com o bezerro de ouro confeccionado pelos hebreus enquanto esperavam por Moisés que se demorava no monte para receber das mãos de Deus as tábuas da Lei.

Seria o capitalismo uma espécie de ídolo moderno?

O momento político em que estamos vivendo tem o mérito de trazer de volta questões ideológicas para o centro das atenções, fomentando discussões acaloradas em torno de quais seriam as atribuições do Estado e os limites de sua atuação. Distinções antes consideradas superadas voltaram à cena. Termos que já não inspiravam qualquer ameaça são agora considerados abomináveis por alguns setores mais reacionários da sociedade.

“Esquerdopatas!”, grita um tele-pastor conhecido por suas posições anacrônicas. “Petralhas!”, “comunas!”, brada o pastor blogueiro. Como se não bastasse o uso de expressões chulas, tentam espiritualizar o debate, tratando seus oponentes como verdadeiros hereges.

De acordo com alguns cristãos conservadores identificados com a ala direita do espectro ideológico, os esquerdistas atribuiriam ao Estado papéis divinos. Em sua opinião, não competiria ao Estado prover educação, saúde, programas assistenciais, nem tampouco tentar regular a economia. Agindo assim, o Estado estaria usurpando o lugar de Deus.

Todavia, por trás deste discurso aparentemente piedoso se esconde motivações nada louváveis. Mesmo um conservador não cristão vai defender que não é justo usar seus impostos para socorrer os menos favorecidos. Já os do outro lado do espectro pensam de maneira inversa. Compete ao Estado diminuir a distância entre as classes, tirando das mais abastadas através de impostos, e provendo serviços que beneficiem a todos, sobretudo, aos mais necessitados.

Para o cristão de direita, o papel do Estado se limita ao que Paulo sucintamente apresenta em Romanos 13:

“Porque os magistrados não são motivo de temor para os que fazem o bem, mas para os que fazem o mal. Queres tu, pois, não temer a autoridade? Faze o bem, e terás louvor dela; porquanto ela é ministro de Deus para teu bem. Mas, se fizeres o mal, teme, pois não traz debalde a espada; porque é ministro de Deus, e vingador em ira contra aquele que pratica o mal.” Romanos 13:3-4

Resumindo: Estabelecer a ordem, coibindo o avanço da maldade através do uso da lei e da força, julgando e punindo os criminosos. Isso justificaria forte investimento em segurança através do aparelhamento das forças armadas e das polícias. Um ambiente seguro garantiria um terreno fértil para o desenvolvimento de outras atividades e, consequentemente, a prosperidade da sociedade.

Se observarmos mais atentamente o texto, perceberemos que o papel do Estado vai além de garantir segurança aos seus cidadãos. Ele também deve ser ministro de Deus para a promoção do bem. Portanto, não basta coibir o mal, tem que promover o bem. E o que abrangeria este “bem”? Poderíamos incluir a saúde, a educação? E mais: o Estado deveria igualmente estimular a livre iniciativa que vise o bem comum? Creio que com base neste texto, a resposta é um sonoro sim.

Receber louvor do Estado nada mais é do que receber estímulo, incentivo, inclusive de ordem econômica. Estimula-se o desenvolvimento de uma sociedade provendo-lhe educação, qualificando profissionalmente os seus cidadãos, investindo em pesquisas. Estimula-se o progresso econômico através da desburocratização, e de incentivos fiscais, desonerando serviços essenciais à população, viabilizando o crédito, incentivando a produção.

Não se trata de atribuir ao Estado papéis divinos e sim de conferir-lhe o papel que as Escrituras lhe atribuem: ser ministro de Deus.

Lutero costumava dizer que Deus age no mundo através de dois braços, o Estado e a Igreja, a Lei e a Graça. Como promotor do bem comum, compete ao Estado contribuir na distribuição de renda. Jamais foi plano de Deus que as riquezas deste mundo fossem concentradas em poucas mãos. A justiça do reino de Deus se caracteriza, sobretudo, pela distribuição equitativa dos recursos. Por isso, Paulo nos fala de um Deus que espalha, dá aos pobres, de modo que, “a sua justiça permanece para sempre” (2 Coríntios 9:9).

Tanto a igreja, quanto o Estado têm a obrigação de ser agentes de Deus para espalhar, e não para concentrar. Não se trata de ser uma espécie de Robin Hood, que tira dos ricos para dar aos pobres. A propriedade privada deve ser garantida. O primeiro a comer do fruto do seu trabalho é aquele que o produziu (confira 2 Tim.2:6). Todavia, ser o primeiro não significa ser o único. Paulo nos adverte a trabalhar, “fazendo com as mãos o que é bom”, para que tenhamos “o que repartir com o que tiver necessidade” (Efésios 4:28).

A diferença entre o Estado e a igreja é que o primeiro age por força da lei, enquanto a igreja promove o bem através da conscientização. O Estado não pode me obrigar a partilhar os meus bens com quem quer que seja. O que ele pode e deve é usar os meus impostos para beneficiar a todos, sobretudo aos mais necessitados. Porém, cabe à igreja conscientizar-nos da importância da partilha. Não uma partilha imposta por lei, mas voluntária, motivada pelo amor. O Estado coage pela força. A igreja constrange pelo amor. O Estado impõe. A igreja propõe. O Estado busca prevalecer-se. A igreja, compadecer-se.

A igreja primitiva serve-nos de modelo de uma sociedade justa. Somos informados que “era um o coração e a alma da multidão dos que criam, e ninguém dizia que coisa alguma do que possuía era sua própria, mas todas as coisas lhes eram comuns” (Atos 4:32). Consequentemente, “não havia, pois, entre eles necessitado algum” (v.34). Tudo era repartido entre eles. Não de maneira compulsória, mas por amor.

O Estado incentiva, a igreja motiva. O Estado distribuiu através de serviços pagos pelos impostos dos seus cidadãos, a igreja distribuiu através da partilha voluntária. O bem promovido pela igreja não se limita aos seus membros, ainda que estes lhe sejam prioridade. Paulo orienta a que “enquanto temos oportunidade, façamos bem a todos, mas principalmente aos domésticos da fé” (Gl 6:10). Porém, há aqueles que, motivados por amor, invertem esta prioridade. João dá testemunho disso ao afirmar acerca daquele a quem sua terceira epístola era endereçada: “Amado, procedes fielmente em tudo o que fazes para com os irmãos, especialmente para com os estranhos, os quais diante da igreja testificaram do teu amor” (3 Jo 1:5-6). Sem importar se priorizaremos uns ou outros, o importante é que façamos o bem a todos. E fazer o bem implica repartir.

Nosso maior problema não é o Estado. Se fosse, Paulo teria dito que o amor ao Estado é a raiz de todos os males. Em vez disso, ele diz que o amor ao dinheiro é que é a raiz de todos os males. É o capital, tão defendido por eles, que promiscui o Estado.

Nem mesmo Jesus enxergava no Estado um rival a ser combatido. Pelo contrário, Ele diz que é possível ser fiel a Deus, e ainda assim, ser leal ao Estado. Basta dar a César o que é de César, porém, sem negar a Deus o que é de Deus. Não obstante, Jesus afirma que não se pode servir a Deus e ao dinheiro.

Na verdade, tanto o Estado quanto o Capital têm potencial de se tornarem ídolos. Mas deles, nenhum é tão voraz quanto o dinheiro. O amor a ele é a raiz da corrupção. Quando o Estado se torna na grande prostituta, o Capital é o seu cafetão.

Alguns alegam que o Estado não possui competência para atuar em certas áreas e que a prova disso seria o caos encontrado na saúde, na educação e em tantas outras áreas que deixam a desejar. Para estes, só haveria uma maneira de resolver o problema: privatização. Defendem, inclusive, que uma eventual privatização da Petrobrás, por exemplo, reduziria o preço do combustível. Interessante o argumento. Parece até que faz sentido. Porém, a experiência diz outra coisa. A telefonia foi privatizada e hoje pagamos mais pelo uso do celular que qualquer outro país do mundo.

O buraco é bem mais embaixo.

Qual a real razão de nossos hospitais e universidades públicas estarem sucateados? O que estaria por trás da educação de má qualidade?

Tomemos como exemplo o SUS (Sistema Único de Saúde), que poderia ser considerada uma das maiores conquistas da sociedade brasileira, que já rendeu elogios até de Barack Obama durante sua gestão como presidente dos EUA. O SUS foi criado para prestar atendimento universal e gratuito, sem distinção de classe ou categoria profissional.

Obviamente, não interessa aos gestores dos grandes planos de saúde que algo como o SUS garanta atendimento de qualidade a todos. Quem pagaria uma fortuna a Amil, podendo recorrer à saúde pública, caso esta oferecesse um serviço de qualidade? Nas últimas eleições, os planos de saúde distribuíram R$ 52 milhões em doações para 131 candidaturas de 23 partidos diferentes.

Na hora de votar o orçamento para a saúde pública, a bancada eleita pela máfia dos planos de saúde vai trabalhar arduamente para sabotar qualquer tentativa de melhorar os serviços. O mesmo ocorre com a educação. Colégios e Universidades privadas investiram milhões na eleição de representantes para sabotar o ensino público e assim garantir seus lucros galopantes.

Se quisermos, de fato, que o país mude de rumo, precisamos urgentemente de uma reforma política que inclui o financiamento público das campanhas políticas, acabando de vez com esta orgia que mistura interesses públicos e privados. Somente assim, voltaremos a ter esperança de que o Estado cumprirá cabalmente seu papel de promover o bem comum em vez de aprofundar o abismo entre classes.

Não há regimes ou ideologias perfeitas. Creio que todos estão preparando o caminho para a grande síntese, o reino de Deus. É por ele que a humanidade tanto anseia. Nele a justiça e a liberdade, tão caros à civilização, finalmente se entrelaçarão. E o cupido que promoverá este encontro épico será o amor.

Autor: Hermes C. Fernandes

Edição: Alex Rosset

Crises climáticas e educação ambiental

“A gente tem que agir. Se a gente quiser ter alguma chance de não viver num planeta muito hostil para a nossa espécie e várias outras, a gente vai ter que se transformar em outro tipo de gente muito rapidamente” (Eliane Brum, jornalista e escritora).

O planeta caminha para um impacto “irreversível” sobre a humanidade. O aquecimento projetado, o estresse hídrico e os extremos climáticos aumentarão a variabilidade espacial e temporal na produção agrícola, exacerbando a insegurança alimentar regional e a desnutrição, crises humanitárias, tais como deslocamento e migração forçada e conflitos violentos poderão levar a pontos de rupturas sociais, advertem os estudiosos das condições climáticas.

O relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC) da ONU, divulgado em agosto 2021, bem como a 26ª Conferência das Nações Unidas sobre o Clima (COP26), que está ocorrendo em Glasgow, na Escócia, reafirmam que o impacto da ação humana sobre o meio natural está produzindo efeitos climáticos piores e mais velozes que se temia. A raiz do problema está nas ações causadas por nós: humanos. O total de objetos construídos pela humanidade já ultrapassou a massa total de todas as formas de vida na Terra.

Esta é uma das consequências do pensamento ocidental moderno mercantilista que nos vendeu a promessa de progresso por meio da ciência como conhecimento e domínio da natureza (Bacon, Descartes, Newton e outros). O resultado, imediatamente posterior, foi representado na revolução industrial e no desenvolvimento tecnológico que possibilitaram grandes transformações, mas, também, a exploração e destruição da natureza.

Transcorridos 200 anos, a conta chegou. Esse modelo de desenvolvimento coloca a vida humana no Planeta Terra em risco. O atual nível de aquecimento e os eventos climáticos em cursos colocam em risco nossa possibilidade de existir neste planeta.

Nas últimas décadas estudos, pesquisas, conferências mundiais, acordos diplomáticos, declarações, atos, protocolos, leis, 26 COPs e inúmeros compromissos foram firmados. Porém, continuamos ignorando a maioria das manifestações e intensificamos nosso modelo cultural consumista irresponsável.

“Nada é mais poderoso do que uma ideia cuja hora chegou” (Victor Hugo, dramaturgo e romancista francês)

Após mais de 60 anos alertando a humanidade que a crise ambiental colocaria nossa existência em risco o momento já chegou e, para alguns especialistas, já passou. Não temos mais tempo. Agora, é mudar nossa relação com a natureza ou perecer, pois não teremos mais condições de sobrevivência. Eventos climáticos e pandemias estão aí para quem quer ver.

Na abertura da COP26, o Secretário Geral da ONU, António Guterres, reafirmou que “é hora de dizer chega. Chega de brutalizar a biodiversidade. Chega de matarmos com carbono. Chega de tratar a natureza como um banheiro. Chega de queimar, perfurar e minerar cada vez mais fundo. Estamos cavando nossas próprias covas”. Pensamento complementado por Boris Johnson, ministro da Inglaterra, ao afirmar que “quanto mais demorarmos para agir, pior fica” e, que, “se falharmos, não seremos perdoados”, especialmente pela própria natureza.

Já a jovem indígena, fundadora do Movimento da Juventude Indígena de Rondônia, que pronunciou-se na abertura da COP26, criticou as “mentiras vazias e promessas falsas” comuns nestes temas. Defendeu que “se não houver proteção aos territórios e direitos indígenas, também não haverá solução para a crise climática, porque fazemos parte dessa solução. Precisamos salvar urgentemente nossos territórios para proteger as vidas dos povos indígenas e o futuro de nosso planeta”. E lembrou que “nunca alcançaremos justiça climática sem justiça social para os povos indígenas, que estão na linha de frente na luta das mudanças climáticas”.

Não sejamos seres ingênuos, nem hipócritas. A grande causa do colapso ambiental em curso é o capitalismo

Esse sistema econômico triunfou porque se mostrou, de todos, o mais capaz de acumular riqueza, de criar excedente e de se expandir. Mas, justamente porque prima por essas qualidades que o definem, esse sistema econômico é prisioneiro delas. Ele não tem liberdade de se autolimitar. Ele é incapaz de não destruir, em sua engrenagem acumulativa, a riqueza biológica de nosso planeta e os equilíbrios do sistema Terra, afirma Luiz Marques (UNICSMP), autor livro Capitalismo e Colapso Ambiental.

A verdadeira ameaça, mais que a continuidade da existência biológica do homem, é a existência do homem, a existência dessa grande criação que caminhou pari passu com a crescente destruição das condições que a tornaram possível. Aqui está, lembra Luiz Marques, o paradoxo da função do espírito no mundo: graças a ele, toda essa grande aventura da humanidade vale a pena, mas ao mesmo tempo o espírito destrói também as condições que permitem prosseguir essa aventura.

Neste cenário, cabe nos indagarmos: qual a função da Ciência, da Educação, da Universidade e da Escola?

Inicialmente, precisamos ter a capacidade de (re)pensar sobre nós mesmos para não corrermos o risco de sermos cúmplices e vítimas dos nossos próprios erros e omissões. Praticar o exercício pleno e coletivo da reflexão crítica e interdisciplinar de pesquisas e processos de ensino/aprendizagem é condição para nos reinventarmos e construirmos pontes de comunicação entre os diversos conhecimentos ancestrais, científicos, filosóficos e populares existentes em nosso meio.

As universidades e as escolas não são uma torre de marfim alheias às dinâmicas e contradições econômicas, sociais e ambientais. Ao contrário, instaura-se em seu meio o pensamento hegemônico que apela ao mito da liberdade individual, à mercantilização de todas as facetas da vida social, à racionalização meritocrática, à sucção e lapidação da práxis política, e ao esvaziamento do Estado, adverte o sociólogo e economista Isaac Enríquez Peres da Universidade Autônoma do México (Unam).

As instituições de ensino são atacadas, por fora, por poderes fáticos, sejam empresariais, clericais, governamentais e, até, criminais, que descarregam o implacável chicote do mercado e do consumismo, a idolatria do lucro e da austeridade fiscal. Por dentro, são atacadas pelas mesmas estruturas de poder e burocratismo parasitário que, também, reproduzem lógicas e práticas que a fazem involuir e se aniquilar. O desprezo para com o conhecimento e a diversidade se irradia de ambos os lados.

Porém, tanto os sistemas econômicos como os argumentos que os legitimam, são criações e concepções da própria cultura humana

A lógica econômica e a narrativa de um desenvolvimento científico e tecnológico dominador e explorador da natureza não é produção divina e, muito menos, natural e inevitável. Logo, a resistência e reversão destes processos compete a nós humanos, causadores de todos estes impactos.

Os conhecimentos acumulados de sabedoria dos povos ancestrais e a epistemologia das ciências ambientais constituem evidências suficientes e capazes para uma conscientização e formação de uma nova mentalidade das atuais e futuras gerações.

Como parte do processo educativo mais amplo, todos têm direito à educação ambiental, incumbindo ao Poder Público definir políticas; às instituições educativas, promover a educação ambiental (EA); aos órgãos integrantes do Sistema Nacional de Meio Ambiente promover ações de EA integradas; aos meios de comunicação divulgar práticas educativas e, às empresas, entidades de classe, instituições públicas e privadas, promover programas destinados à capacitação dos trabalhadores.

Ou seja, conforme Lei Federal nº 9.795 de 1999, a educação ambiental é responsabilidade de todos

Uma ética da totalidade que considera que, ao maltratar o mundo, você está maltratando a si mesmo –, propondo, em lugar da conquista da natureza pelo homem, promover a libertação de ambos, é uma perspectiva espinosiana a perseguir. Nessa ética, ao demonstrar que Deus e Natureza constituem uma só coisa, Espinosa está afirmando que a Natureza é o ser fundante de todos os seres, é a substância que existe no interior de todos eles.

Então, cada realidade individual é uma manifestação deste Todo, que se individualiza e se concretiza em unidades autônomas, como os homens, os animais e o meio ambiente. Daí se deduz que todos os seres estão intimamente interligados, embora cada um mantenha sua dignidade de realidade singular na plenitude de sua especificidade. Isto significa que não é correto falar em supremacia do homem sobre o meio ambiente. Ambos constituem uma unidade, de forma que a saúde de um depende da do outro. E mais, “se uma parte do Todo se anulasse, tudo se aniquilaria”. Ou seja, ao destruirmos a natureza estamos nos destruindo.

E quem pode transformar as pessoas? A educação

Por esta razão, todas as instituição de ensino, da educação infantil à pós-graduação, precisam, emergencialmente, se transformarem em espaços integrais de educação ambiental sustentáveis. Uma educação ambiental permanente, não neutra, crítica, integradora, prática, transversal, inter e multidisciplinar, vivencial e com participação da sociedade e da comunidade.

Na natureza nada é em vão. É nosso dever proteger nosso patrimônio natural, pois a nação que destrói seu solo destrói a si mesma.

*Esta publicação foi originalmente publicada no jornal do SINPRO-RS, Extra-classe. Segue o link: Crises climáticas e educação ambiental – Extra Classe

Autor: Gabriel Grabowski

Edição: Alex Rosset

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