Transcendente, livros e fundamentos da fé judaica

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Os teólogos judeus, especialmente desde a Idade Média, descreveram a transcendência de Deus em termos de simplicidade divina, explicando as características tradicionais de Deus como onisciente e onipotente.

Apresentamos breve histórico dos imigrantes judeus que habitam a região norte do RS desde 1912, estabelecendo aqui suas raízes, suas crenças e tradições. Apresentamos, também uma conversa/entrevista com o líder religioso Berel Natan Engelman que, com muita sabedoria, serenidade e experiência vem conduzindo esta comunidade religiosa há 24 anos.

Os primeiros judeus a se estabelecerem em Passo Fundo datam de 1912. Após 10 anos, em 1922 fundaram a União Israelita Passofundense e logo providenciaram uma biblioteca. Nas ocasiões das grandes festas religiosas iam para o Município de Quatro Irmãos agregando-se aos demais judeus que lá viviam.

No ano seguinte em 1923, a Sociedade Israelita instalou-se em casa alugada, a Sinagoga, a biblioteca e a sede social e já na sequência, a escola com aulas de instrução religiosa. Na necrópole municipal, a Sociedade possui o Cemitério Israelita, este fundado em 1924. Nesta época a Sociedade Israelita, além da Sinagoga, havia também uma escola e um salão onde realizavam-se festas, bailes e teatros. Na escola havia um professor chamado Boruch Bariach que ministrava aulas para o primário e ensino judaico.

Moravam em Passo Fundo cerca de cinquenta famílias. Samuel Chmelnitzky e Celina Milman organizavam e dirigiam um grupo de amadores que apresentavam quadros e peças em Yidish (dialeto adotado pelos judeus na Europa Central). O Sr. Chmelnitzky também dirigia um coro misto que se apresentava para a comunidade com canções em Idish e Hebraico. Em 1944 havia cerca de setenta famílias judias em Passo Fundo. Quatro Irmãos fornecia população para Erechim, Passo Fundo e Porto Alegre. Philipson para Santa Maria, Cruz Alta e também para a capital.

A Sinagoga teve três incêndios em anos diferentes, mas o Sefer Torá (Rolo Sagrado) sempre foram salvos sem sofrerem danos. No último sinistro ocorrido, a Comunidade judaica se uniu novamente e reconstruíram a Sinagoga em dois meses, ficando pronta para as grandes festas religiosas. (Comunidades Judaicas-Leon Back.vol.IV-1958).

Atualmente vivem em Passo Fundo somente quinze famílias judaicas.Vários fatores contribuíram para este fenômeno. O primeiro é a diminuição dos filhos, acompanhando uma tendência geral da sociedade, pressionada pelas questões socioeconômicas e culturais. O segundo fator é a migração de jovens para outros estados ou países, seja por causa de estudos, atrás de emprego, ou simplesmente buscando vida nova em outros lugares. Entre os chefes de família, todos os judeus desta região são de origem Askenazi, judeus provenientes da Europa Central e Europa Oriental.

A Coletividade Israelita local segue um calendário anual com datas a serem lembradas, dentre elas as Grandes Festas e tem como tradição à celebração do Cabalat Shabat todas as sextas-feiras na Sinagoga Abrahão Melnick.

Conheça também uma outra interessante matéria, já publicada no site. Leia aqui.

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SITE NEIPIES: Como a tradição judaica concebe o Transcendente?

BEREL ENGELMAN: A Transcendência Judaica no transcurso da História se vincula a fatores diversos, dentre os quais a Essência de D’us, a Divina Providência e os Mandamentos.

1 – A Essência de D’us:

O alicerce ou a base transcendental de Israel enquanto Povo Judeu, reside na crença de D’us como o Criador de toda a existência física e espiritual.

Como Criador de todos os mundos e de tudo o que neles há, a existência de D’us é precedente e diferente de Sua criação.

Quando a Torá afirma que D’us criou o homem a Sua imagem (Gênesis 1:27), ela não está insinuando que D’us se parece com o homem. Mas, sim, que o homem compartilha dos mesmos Atributos – as Sefirot Intelectuais e Emocionais -, que D’us emprega ao interagir com o mundo. Nada pode descrevê-Lo, nenhuma palavra e nenhum enaltecimento, porque D’us é incompreensível, inominável e anônimo.

2 – A Divina Providência:

A base do Ensinamento Chassídico reside no fato, de que a Providência Divina se aplica a todos e a tudo.

D’us não apenas “determina os passos do homem” (Salmo 37:23), mas também provê a cada uma das criaturas do mundo, direcionando-as ao objetivo pré-determinado a cada uma delas.

A Divina Providência, então, cuida de todas as necessidades de cada uma das criaturas, mesmo daquelas primitivas como as minhocas – que no Plano Perfeito da Criação, têm seu lugar e um papel a cumprir.

Esta é a resposta Cabalística, para a Divina Providência:

D’us se preocupa com tudo, com cada detalhe ínfimo de toda a Sua Criação.

3 – Os Mandamentos: Fisicalidade e Espiritualidade

Os Mandamentos da Torá, tanto os Físicos quanto os Espirituais, podem ser comparados a uma ponte criada por D’us, que permitem ao homem (a Humanidade) conectar-se a Ele.

Os Mandamentos Divinos, que são cumpridos física e espiritualmente, são os meios pelos quais as criaturas finitas podem vivenciar a D’us.

Estes aspectos de Transcendentalidade permanecem imutáveis na vida Judaica, nem o tempo histórico, o espaço geográfico e o antissemitismo conseguiram mudar tais aspectos PÉTREOS do Judaísmo.

Resta, porém, nesta síntese, abordar o Imanente e o Transcendente, em D’us.

Imanente: a Essência de D’us em Si mesma, a qualidade do que pertence à Substância interna de D’us.

Transcendente: a “Exterioridade” de D’us, que se faz notar por meio de Seus Atributos manifestados nas Sefirot, na parte correspondente à metafísica da vida.

Fonte: (MORASHÁ + BDR)

SITE NEIPIES: Qual é a importância dos livros sagrados para a observância e seguimento dos fundamentos da fé judaica?

BEREL ENGELMAN: Todas as religiões têm seus próprios livros sagrados e certamente muito importante para àqueles que seguem sua fé. Dentre outros livros sagrados para o judaísmo, falamos aqui especialmente da Torá.

As cinco partes que constituem a Torá são nomeadas de acordo com a primeira palavra de seu texto, e são assim chamadas:

Em Bereshit é narrada a criação do mundo e do homem sob o ponto de vista israelita, e segue linearmente até o pacto da Divindade com Abraão. São apresentados os motivos dos sofrimentos do mundo, a constante corrupção do gênero humano e a aliança que a Divindade faz com Abraão e seus filhos, justificados pela sua fé monoteísta, em um mundo que se torna mais idólatra e violento. Nos é apresentada a genealogia dos povos do Oriente Médio, e as histórias dos descendentes de Abraão, até o exílio de Yaakov e de seus doze filhos em Egito.

Em Shemot mostram-se os fatos ocorridos neste exílio, quando os israelitas tornam-se escravos na terra de Egito, a Divindade se manifesta a um israelita-egípcio, Moisés, e o utiliza como líder para libertação dos israelitas, que pretendem tomar Canaã como a terra prometida aos seus ancestrais. Após eventos miraculosos, os israelitas fogem para o deserto, e recebem a Torá dada por Yahweh. Aqui são narrados os primeiros mandamentos para Israel enquanto povo (antes a Bíblia menciona que eram seguidos mandamentos tribais), e mostra as primeiras revoltas do povo israelita contra a liderança de Moisés e as condições da peregrinação.

Em Vayikrah são apresentados os aspectos mais básicos do oferecimento dos korbanot, das regras de cashrut e a sistematização do ministério sacerdotal.

Em Bamidbar continuam-se as narrações da saga dos israelitas no deserto, as revoltas do povo no deserto e a condenação da Divindade à peregrinação de quarenta anos no deserto.

Em Devarim estão compilados os últimos discursos de Moisés antes de sua morte e da entrada na Terra de Israel.

Os fundamentos da fé judaica podemos nos basear desta forma:

10 Mandamentos

Os dez mandamentos foram escritos com 620 letras: abrangem 613 preceitos ao povo judeu e 7 Leis de Nôach para a humanidade, que somam 620.

13 Princípios

Ao formular os Treze Princípios de Fé, Maimônides estabeleceu os principais pontos de afirmação e crença em um D’us único e em Sua revelação a Moshê, o líder de nosso povo.

As Sete Leis de Noé

Este Código de Leis fornece um propósito à vida para todos os tempos, guiando a humanidade a perceber seu potencial máximo e sua semelhança com o Criado

Conceitos: Os Três Pilares do Judaísmo

Os três pilares de nosso serviço a D’us são Teshuvá (arrependimento), Tefilá (prece) e Tsedacá (caridade), no entanto estas traduções não expressam os verdadeiros conceitos judaicos destes três elementos essenciais de nossa fé.

Os sete poderes espirituais da alma

Toda alma humana possui 10 sefirot, ou poderes espirituais. Os primeiros três são intelectuais, enquanto que os sete remanescentes estão relacionados às emoções.

SITE NEIPIES: Como os judeus percebem a presença e a força do Transcendente no dia a dia e ao longo da história da história da humanidade?

BEREL ENGELMAN: Os teólogos judeus, especialmente desde a Idade Média, descreveram a transcendência de Deus em termos de simplicidade divina, explicando as características tradicionais de Deus como onisciente e onipotente. Intervenções da transcendência divina ocorrem sob a forma de eventos fora do campo da ocorrência natural, como milagres e a revelação dos Dez Mandamentos a Moisés no Monte Sinai, ou como providência divina, que é parte do Deus transcendente, segundo Fílon de Alexandria (século I) por ser Ele a causa ativa na manutenção do universo.

Na cosmologia cabalística judaica, Deus é descrito como o “Ein Sof” (literalmente, sem fim) como referência à simplicidade divina de Deus e à incognoscibilidade essencial. A emanação da criação do Ein Sof é explicada através de um processo de filtragem. 

No mito da criação da cabala luriânica, chamado de “quebra dos vasos”, a filtragem era necessária porque, caso contrário, essa essência simples e intensa sobrecarregaria e tornaria impossível o surgimento de criações distintas. Cada filtro, descrito como um vaso ou recipiente, capturou a emanação dessa força criativa até que foi sobrecarregado e quebrado pela intensidade da essência simples de Deus. Uma vez quebrados, os fragmentos dos vasos, cheios de “centelhas divinas” absorvidas, caíram em um vaso abaixo. Esse processo finalmente continuou até que a “luz” da Divindade fosse suficientemente reduzida, “ocultada” para permitir que o mundo em que habitamos fosse sustentado sem romper.

A criação deste mundo, no entanto, vem com a consequência de que a transcendência divina está oculta ou “exilada” (do mundo imanente). Somente através da revelação de faíscas escondidas dentro dos fragmentos embutidos em nosso mundo material é que essa transcendência pode ser reconhecida novamente. No pensamento hassídico, as faíscas divinas são reveladas através do cumprimento de mandamentos ou “mitzvot” (literalmente, as obrigações e proibições descritas na Torá). Uma explicação cabalística para a existência de malevolência no mundo é que essas coisas terríveis são possíveis com as faíscas divinas sendo escondidas. Portanto, existe alguma urgência em executar mitzvot, a fim de liberar as faíscas ocultas e executar um ” tikkun olam ” (literalmente, a cura do mundo). Até então, o mundo é presidido pelo aspecto imanente de Deus, frequentemente chamado de Shekhinah ou espírito divino, e em termos femininos.

SITE NEIPIES: Quais são os pilares fundamentais da fé judaica?

BEREL ENGELMAN: Segundo os judeus, existe somente um D’us, todo-poderoso que criou o universo e tudo o que nele há. Os judeus acreditam que Deus tenha uma relação especial com o seu povo, consolidada no pacto que fez com Moisés no Monte Sinai, 3,5 mil anos atrás.

Os Treze princípios do Judaísmo:

  1. Confio plenamente que D’us é o Criador e guia de todos os seres, ou seja, que só Ele fez, faz e fará tudo.
  2. Confio plenamente que o Criador é um e único; que não existe unidade de qualquer forma igual à d’Ele; e que somente Ele é nosso D’us, foi e será.
  3. Confio plenamente que o Criador é incorpóreo e que está isento de qualquer propriedade antropomórfica.
  4. Confio plenamente que o Criador foi o primeiro (nada existiu antes d’Ele) e que será o último (nada existirá depois d’Ele).
  5. Confio plenamente que o Criador é o único a quem é apropriado rezar, e que é proibido dirigir preces a qualquer outra entidade.
  6. Confio plenamente que todas as palavras dos profetas são verdadeiras.
  7. Confio plenamente que a profecia de Moshe Rabeinu (Moisés) é verídica, e que ele foi o pai dos profetas, tanto dos que o precederam como dos que o sucederam.
  8. Confio plenamente que toda a Torá que agora possuímos foi dada pelo Criador a Moshe Rabeinu.
  9. Confio plenamente que esta Torá não será modificada e nem haverá outra outorgada pelo Criador.
  10. Confio plenamente que o Criador conhece todos os atos e pensamentos dos seres humanos, eis que está escrito: “Ele forma os corações de todos e percebe todas as suas ações” (Tehilim 33:15).
  11. Confio plenamente que o Criador recompensa aqueles que cumprem os Seus mandamentos, e pune os que transgridem Suas leis.
  12. Confio plenamente na vinda do Mashiach (Messias) e, embora ele possa demorar, aguardo todos os dias a sua chegada.
  13. Confio plenamente que haverá o renascimento dos mortos quando for a vontade do Criador.



Qual a origem da religião judaica? Quais inovações o Judaísmo trouxe para a Humanidade? No que acreditam os judeus? Quais são as subdivisões da religião? É possível ser judeu e não ser religioso? Qual a origem do antissemitismo? Como a tradição judaica contribuiu para a cultura ocidental? Neste vídeo, trago reflexões sobre a primeira religião monoteísta da História. (LEANDRO KARNAL)

O judaísmo é a religião monoteísta que possui o menor número de adeptos no mundo, cerca de 12 a 15 milhões. Essa religião originou-se por volta do século XVIII a.C. Veja mais aqui.




Sugestões de uma atividade pedagógica

A matéria “Transcendente, livros e fundamentos da fé judaica” é escrita com base nas crenças e práticas religiosas judaicas. Nem todas as religiões pensam o Transcendente (Ser Superior) do mesmo jeito, mas independentemente dos nomes e das ideias que se tem dele, a busca é muito parecida nas diferentes religiões ou tradições religiosas.

Esta atividade pode ser aplicada a turmas do nono ano do Ensino Fundamental, seguindo orientações da Nova BNCC no Componente Curricular Ensino Religioso. Unidade temática: Crenças religiosas e filosofias de vida. Objeto de Conhecimento: Imanência e transcendência. Habilidades: (EF09ER01RS-01) Definir imanência e transcendência expressas pelas Tradições Religiosas em seus livros sagrados. (EF09ER02RS-01) Propor, com base nos escritos sagrados, soluções cotidianas que contemplem a valorização da vida, o respeito, altruísmo.

Questões para aprofundamento:

  1. Após leitura da entrevista do líder religioso Berel Natan Engelman, descreva quais são algumas características do Transcendente, no judaísmo D’us?
  2. Por que o Judaísmo é a primeira religião monoteísta e porque é a religião com menor número de adeptos no mundo?
  3. Quais inovações o Judaísmo trouxe para a Humanidade? (Assista o vídeo de Leandro Karnal para responder: https://www.youtube.com/watch?v=wBB1OhBK_-c&feature=youtu.be
  4. Quais são as cinco partes ou cinco livros que compõem a Torá?
  5. Escolha um dos conteúdos desta matéria sobre judaísmo que mais lhe chamaram atenção. Copie e faça um breve comentário.

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