Certamente, todos já ouviram falar sobre a importância da concisão na escrita. Mas você sabia que há um gênero de texto em que tal atributo é palavra de ordem? Trata-se do microconto.
Como o prefixo já indica, o microconto constitui uma narrativa curta, uma história completa, condensada em poucas palavras. Dependendo do grau de brevidade do texto, sua denominação pode variar. Geralmente, de 50 a 300 palavras, considera-se um miniconto; até 50 palavras, um microconto; e até 20 palavras, um nanoconto.
Nomenclaturas à parte, o fato é que essas micronarrativas de ficção, já desenvolvidas por grandes autores internacionais como Franz Kafka, Anton Tchekhov, Jorge Luis Borges e também nacionais, como Dalton Trevisan, Lygia Fagundes Telles e Marina Colasanti, têm se tornado febre nos últimos anos, impulsionadas pela dinamicidade das redes sociais.
Brevidade, contudo, não significa superficialidade. Muito pelo contrário. A principal característica dessas narrativas é justamente dizer o máximo com o mínimo. Para isso, haja criatividade do escritor: metáforas, ironias, intertextualidade, uma imensidão de recursos para sugerir sentidos ao leitor, o qual precisa servir-se de seu conhecimento de mundo e de suas habilidades de leitura para depreendê-los. Um fascinante jogo que já me conquistou há algum tempo. Lanço aqui o desafio com algumas de minhas produções. Vamos mergulhar juntos nesse mundo?
TRATAMENTO PREVENTIVO
A saúde oftálmica do príncipe exige cuidados rigorosos. Rapunzel decide ir ao cabeleireiro. Não sem antes conferir a cotação no mercado de cabelos para Mega Hair. A saúde financeira da princesa exige cuidados redobrados.
(Semifinalista no Prêmio Microconto de Ouro-2024, promovido pela Casa Brasileira de Livros)
SORRISO SARCÁSTICO
Ela tinha o mar no nome, mas o mar não conhecia.
– Muié, ganhemu o sorteiu da Rádiu! Vamu passá o Reveião no Rio!
– A sorte, finalmente, sorriu pra gente! – pensou ela.
O ônibus corria… não mais que seu coração.
Uma curva fechada. O salto no vazio. O grito desesperado do marido:
– MAR-IIIIII-A!
RENASCIMENTO DE NARCISO
Ainda criança, dançava flamenco. Narciso vermelho no cabelo, graça no corpo.
-Moça de respeito não dança, casa! – diz o pai.
Cortam-se sonho e flor. Concreta-se o jardim.
Filhos crescem. Marido morre. Concreto racha. Pela fenda, surge o broto. Pela orelha, sente ela os ramos. E a flor desabrocha.
ÚLTIMA VISITA AO MUSEU
– Amor, olha que incrível! A Inteligência Artificial dá vida às pinturas!
Ele não respondeu. E nem mais o poderia. Estático permanecia em frente ao quadro da Medusa.
METAMORFOSE II
“Certa manhã, ao despertar de sonhos agitados, Gregor Samsa deu consigo na cama”. Numa cama estranha. E com um estranho!?
Ao avistar o gato, constatou que havia sido transformado em um monstruoso presente…
Autora: Rosemery Lorenz
Ahazou na explicação e na criatividade dos textos. Queremos mais! S2 o/
Obrigada, Mariana! A ideia é essa mesmo: oferecer ao leitor pequenos mergulhos na ficção, refletindo sobre a realidade que nos cerca. 😍😍
Melhor não brincar com as felinas, Marcos. Quem avisa, amiga é…🤣🤣
Texto maravilhoso! Quando me dei conta, estava sorrindo mergulhada em tanta criatividade! Amei.
Adoro o gênero. Os dois. O da escritora e da escrita. Duas felinas num rugido estremecedor. Miau. 🥰🥰