É inegável que, com o advento da internet e das redes sociais, se popularizaram a escrita e a possibilidade de emitir opinião sobre os mais variados temas. Isso é bom! Porém o que refiro como derrota do pensamento é o nivelamento de todas as pessoas (ou quase todas), pois há muito de exclusão social e digital na abordagem dos temas. (Rui Antonio de Souza)
Já começo me explicando. Aliás, a filosofia sempre teve de justificar sua existência e sua utilidade. Coitada!
Ser professor ou professora de filosofia neste início de século é essencial, necessário e urgente. Mais do que nunca, é preciso fazer o enfrentamento das ideias, é necessário fazer a relação do conhecimento com as novas mídias para apresentar-lhes a criticidade, é urgente fazer o resgate do sentido do conhecimento crítico/reflexivo e científico.
A filosofia se coloca, mais do que nunca, na perspectiva inter e transdisciplinar do conhecimento, principalmente na área de Ciências Humanas, como uma atitude filosófica, como uma postura crítica diante da vida e dos fenômenos, como um viés investigativo/científico e crítico da realidade social, tanto no ensino fundamental quanto no ensino médio.
Nossa participação em Encontro Virtual com professor Israel Kujawa e Marciano Pereira, com abordagem do tema: Mundo digital: ensino da filosofia na educação básica.
Alguém sabe quando filosofia e sociologia retornaram às nossas escolas? Confesso-lhes que, apesar de sua recente volta, seu destino pode ser novamente o desaparecimento. Transcrevo artigo de minha autoria, escrito em 2008, que esclarece algumas pertinentes questões.
Filosofia e sociologia: bem-vindas!
“Numa espécie de “revolução silenciosa”, construída através da garra de estudantes, professores e mestres da educação, a filosofia e a sociologia retornam aos nossos currículos escolares, em 2007, em mais de 23 mil escolas de ensino médio em nosso país, através de uma Resolução do Conselho Nacional de Educação.
Bem-vindas! As suas contribuições, para além do esforço de uma formação mais integral e integradora, nos fazem crer que ainda há tempo para sermos menos céticos, mais críticos, mais atentos, mais cidadãos e cidadãs, com mais atitude, mais compreensivos, mais tolerantes, mais humanos e felizes, mais gente.
As disciplinas de filosofia, sociologia e história são importantes ferramentas para auxiliar na compreensão do ser humano, consciente e conhecedor de si mesmo e, igualmente, inserido em seu contexto social.
Temos insistido, em nossa prática cotidiana de sala de aula, na ideia de que pensar bem, como acreditavam os gregos, nos faz viver melhor. Pensar é algo inerente ao ser humano mas, estranhamente, explícita ou de forma silenciosa, muitos professam seu descrédito no pensar.
Desistindo de pensar, abrimos mão de conduzir nossos próprios rumos, uma vez que não pensar significa ser pensado pelos outros. Não se assumir, em pensamentos e ações, é também diminuir-se como ser humano.
Eu e os outros: sempre em relação
Outra percepção em nossos dias atuais é a grande dificuldade de convivência social. Vivemos permanentemente o conflito de nossas diferenças, a tensão de sermos, ao mesmo tempo, indivíduos e sociedade. Neste sentido, a sociologia, para além de nos ajudar a compreender os fenômenos sociais, poderá nos ajudar a compreender os fenômenos sociais, poderá nos ajudar a constituir e reconhecer novos valores e parâmetros de convivência.
Viver é con-viver, é tolerar, é respeitar, é somar diferenças, é sentir-se parte de uma determinada cultura que se inova e renova constantemente.
Em tempos que somos regidos pela velocidade das informações e do conhecimento, carecemos de habilidades de interpretação e compreensão do mundo. Compreendendo melhor o mundo, ampliam-se nossas oportunidades de nele intervir e com ele colaborar.
O que pode nos mudar são nossas atitudes!
Do conformismo para uma vida social mais ativa, seremos capazes de compreender o alerta de Bertold Brecht: “não diga nunca: isto é natural para que nada passe a ser imutável”.
Roda de Conversa 2- Experiências atuais no Ensino da Filosofia: em busca de perspectivas (GEPES – UPF) Assista!
Com que metodologia trabalhar com os estudantes?
Seguem algumas pistas, construídas pelo trabalho especifico de 15 anos com este componente curricular.
Acredito, como Kant, que “não se ensina a filosofia, ensina-se a filosofar”. Defendo a ideia de que professores são parturientes, seguindo a Maiêutica de Sócrates. Através do diálogo, os estudantes são desafiados a confrontar-se com seus próprios pensamentos, motivados por professores e professoras que lhes sugerem perguntas boas e essenciais, que tenham sentido para sua existência.
A partir de leituras prévias, seguidas de debate e apresentação dos diferentes entendimentos, os estudantes devem ser convidados a sistematizarem o que leram e debateram. A construção textual, feita de várias maneiras (resumos, resenhas, pequenos textos, reflexões) contribuem para fortalecer a construção dos conhecimentos, sempre além da informação e da mera opinião. Depois das leituras de textos, é importante colocar “questões para pensar”.
Outra estratégia metodológica importante é trabalhar a construção de conceitos, que nada mais é do que “dar nome às coisas, dizer o que as coisas são”. O exercício de conceituar, de resumir, de definir é tão importante quanto descrever. Reparem que, talvez, seja mais fácil para muitos de nós escrever um texto sobre felicidade, por exemplo, do que construir uma definição, mesmo que sempre provisória, da coisa felicidade.
Uma aproximação da filosofia com outros campos de conhecimento como a literatura pode favorecer o interesse e a dinamização dos conhecimentos filosóficos.
A filosofia é sempre atividade perigosa, porque instiga a pensar. Pensar bem, para viver melhor, era desejo dos gregos. Para alcançar o real desenvolvimento humano, recomendavam a sabedoria, a coragem, a temperança e a justiça. Na Grécia Antiga competia-se em tudo, sobretudo no campo das ideias e dos destinos da cidade (polis), tendo em vista ser cidadão (capaz de governar e ser governado). Neste sentido, herdamos o desafio de formarmos seres humanos preparados para viver a vida e a cidadania. Leia mais!
Problemáticas atuais do Ensino da Filosofia nas escolas
Elencamos algumas dificuldades que se perpetuam no Ensino da Filosofia nas últimas décadas:
- Pouca valorização deste componente curricular nas escolas;
- A maioria dos professores que atuam com disciplina não tem formação específica em Filosofia, dificultando o entendimento sobre os objetos de conhecimento e as finalidades da mesma na formação dos estudantes;
- Poucos períodos de aula para a abrangência das competências e habilidades da Filosofia. Na contramão desta situação, no estado do Amapá, Resolução do Conselho Estadual de educação amplia para 2 períodos semanais as disciplinas de filosofia e sociologia. Leia mais!
- A questão do pensar crítico é atribuída, muitas vezes, somente ao professor de filosofia, quando deveria ser função de toda escola e de todos os componentes curriculares;
- Proposta interdisciplinar da Filosofia pode reduzir a mesma a pó, por conta da falta de professores com entendimento sobre suas especificidades. Como integrar a Filosofia aos demais componentes curriculares sem a devida compreensão do seu objeto de estudo e das suas finalidades na formação crítica e cidadã dos estudantes?
- Muitos estudantes chegam ao Ensino Médio com pouca bagagem de conhecimentos filosóficos e poucas habilidades críticas diante da vida, dos conhecimentos e dos fenômenos sociais e culturais. Leia mais!
As temáticas apresentadas para a filosofia procuram caracterizar o objeto do conhecimento, que é o pensamento crítico e reflexivo. Para tanto, remetem sempre ao que é filosofar, aos grandes temas abordados pelos filósofos ao longo da história da humanidade , qual é o papel da lógica e da ética, da ciência e da política. A filosofia, ou o filosofar, devem ajudar a problematizar o nosso cotidiano, em busca de respostas mais elaboradas e mais consistentes e conscientes. Leia mais!
Autor: Nei Alberto Pies
Edição: Alex Rosset